Formação do Estado Brasileiro PDF
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2023
Câmara 2023
Maria das Graças Rua
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This document is about the formation of the Brazilian state. The contents are lecture notes on origins of the state, independence, republics and other important political events and thoughts. The document comprises texts from several sources and presents an overview of the evolution of the Brazilian political system.
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MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro Prof. Dra. Maria das Graças Rua Ciência Política [Câmara 2023]Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br Formação do Estado Brasileiro ‘ 1 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro Conteúdo...
MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro Prof. Dra. Maria das Graças Rua Ciência Política [Câmara 2023]Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br Formação do Estado Brasileiro ‘ 1 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro Conteúdo Origens da formação do Estado no Brasil ..................................................................... 03 A Independência ....................................................................................................... 04 A república brasileira ................................................................................................. 08 O Constituição de 1946 .............................................................................................. 21 A experiência democrática ou República Populista ......................................................... 24 A ditadura militar no Brasil ......................................................................................... 31 A Constituição Brasileira de 1988 ................................................................................ 48 O processo democrático a partir de 1985 ..................................................................... 43 A Constituição Brasileira de 1988 ................................................................................ 48 O movimento de concentração de poder do Estado no Brasil .......................................... 55 Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 2 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro 1. ORIGENS DA FORMAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL: A CORTE PORTUGUESA NO BRASIL A formação do Estado brasileiro tem como marco inicial o ano de 1808, com a transferência da família real portuguesa para o Brasil, carregada de peculiaridades. Em primeiro lugar, a própria escolha das pessoas que comporiam a lotação dos navios, diz alguma coisa sobre as instituições e espaços de poder que estavam sendo transplantados. Em segundo lugar, a seleção dos bens que era possível carregar, além dos tesouros e objetos de indiscutível valor, contemplava material, livros, papéis, artefatos, instrumentos e símbolos necessários à administração. Em terceiro lugar, a instituição de um simulacro de governo em solo europeu, que se deu na forma de uma regência, logo destituída pelo ocupante. O fato é que a transferência da Corte e mais tarde a elevação do Brasil a parte integrante do Reino Unido de Portugal constituíram as bases do Estado brasileiro, com todo o aparato necessário à afirmação da soberania e ao funcionamento do autogoverno. Mas o Estado que se forma apresenta importante especificidade: a herança patrimonialista. Em “Os donos do poder”, Faoro defende a tese segundo a qual, durante seis séculos de história, a estrutura política e social herdada de Portugal resistiu a mudanças fundamentais, permanecendo altamente centralizadora e patrimonial. Um fato fundamental é o de que, como não havia uma sociedade civil organizada, o Estado, no Brasil, antecede a sociedade. Ao invés de o Estado se constituir a partir da sociedade, é esta que se organiza a partir do Estado. E o Estado que coloniza o Brasil, sem sombra de dúvidas, é um Estado Absolutista, onde não existiam questionamentos bem-sucedidos sobre suas estruturas de poder. Esta estrutura se caracterizava pela ausência de um sistema contratual entre o Estado e a sociedade. “Patrimonial e não feudal era o mundo português, cujos ecos soam no mundo brasileiro atual, as relações entre o homem e o poder são de outra feição, bem como de outra índole a natureza da ordem econômica, ainda hoje persistente, obstinadamente persistente. Na sua falta, o soberano e o súdito não se sentem vinculados à noção de relações contratuais, que ditam limites ao príncipe e, no outro lado, asseguram o direito de resistência, se ultrapassadas as fronteiras de comando.” (FAORO, 1998, p. 17-18 in Corporativismo no Brasil, 19301945http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/16279/16279_4.PDF) Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 3 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro O sistema colonial dos países ibéricos levou-os a considerar suas colônias como negócios a serem explorados, pois “... à época da descoberta, Portugal já não vivia em regime feudal: o rei é um “autêntico capitalista”, seus vassalos chegam ao Novo Mundo com o desejo de enriquecer. Os poderes que lhes são delegados têm apenas o objetivo de assegurar-lhes lucros. Apenas a forma jurídica dessa concessão assemelha-se às instituições feudais. Seu conteúdo, em compensação, é exclusivamente capitalista.” (TOPALOV, 1978, p. 14, citado por RAPOSO, 2008a, p. 66. Corporativismo no Brasil, 19301945. Consultado em http://www.maxwell.lambda.ele.pucrio.br/16279/16279_4.PDF p.35) “Para compreender o patrimonialismo, é preciso primeiro compreender a sua base, isto é, a dominação tradicional. Weber denomina dominação tradicional aquela cuja legitimidade “descansa na santidade de ordenações e poderes de mando herdados de tempos imemoriais...é assim porque sempre foi assim. No patrimonialismo, o chefe (rei, senhor etc.), que tem legitimidade através da tradição, exerce seu poder sem nenhum contrato que o limite. Isto contrasta com o feudalismo, em que existe uma relação contratual entre o governo e a vassalagem.” (Corporativismo no Brasil, 1930-1945 http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/16279/16279_4.PDF, p.36) 2. A INDEPENDÊNCIA A Independência é um dos fatos históricos mais importantes da política brasileira, pois marca o fim do domínio português, após uma série de lutas e enfretamentos. Após o Dia do Fico1, D. Pedro tomou diversas medidas que desagradaram a Portugal, pois preparavam caminho para a independência do Brasil: convocou uma Assembleia Constituinte, organizou a Marinha de Guerra, obrigou as tropas de Portugal a voltarem para o reino. Além disso, determinou também que nenhuma lei de Portugal seria colocada em vigor sem o "cumpra-se", ou seja, sem a sua aprovação. Finalmente, o futuro imperador do Brasil, conclamava o povo a lutar pela independência. 1 Em 9 de janeiro de 1822, D. Pedro I recebeu uma carta das cortes de Lisboa, exigindo seu retorno para Portugal. Porém, D. Pedro respondeu negativamente aos chamados de Portugal e proclamou: "Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, diga ao povo que fico." Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 4 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro A Independência do Brasil2 não foi um processo consensual. A chamada Guerra da Independência do Brasil estendeu-se de 1822, ano da proclamação da Independência, a 1824. A Guerra da Independência acabou por ser uma guerra civil Luso-Brasileira, já que portugueses e brasileiros combateram em ambos os lados. O que inicialmente começou como uma rebelião antilusitana em Salvador em 18 de fevereiro de 1822, se transformou, após a proclamação da independência, em 7 de setembro de 1822, em lutas mais encarniçadas nas regiões onde, por razões estratégicas, se registrava maior concentração de tropas do exército português, a saber, nas então Províncias Cisplatina (Uruguai), da Bahia, do Piauí, do Maranhão e do Grão-Pará3. Como a maior parte da oficialidade era de origem portuguesa, o governo brasileiro, através do Ministro José Bonifácio de Andrada e Silva, adotou as providências para eliminar a resistência portuguesa: a compra de armas e navios, o recrutamento de tropas nacionais e a contratação de estrangeiros (mercenários), bem como medidas repressivas como o confisco de bens e a expulsão daqueles que não aceitassem a emancipação política do Brasil. No plano econômico, proibiu-se o comércio, e, no diplomático, autorizou-se a guerra de corso (autorização para pilhar navios), contra Portugal. 2.1 A Constituição de 1824 A primeira Constituição do Brasil mantinha a monarquia, a dinastia da Casa de Orléans e Bragança e d. Pedro I como imperador e defensor perpétuo do Brasil. Constituía um Estado unitário e centralizador, cujo território era dividido em províncias, que substituíam as antigas capitanias. 2 O príncipe fez uma rápida viagem à Minas Gerais e a São Paulo para acalmar setores da sociedade que estavam preocupados com os últimos acontecimento, pois acreditavam que tudo isto poderia ocasionar uma desestabilização social. Durante a viagem, D. Pedro recebeu uma nova carta de Portugal que anulava a Assembleia Constituinte e exigia a volta imediata dele para a metrópole. Em resposta, proclamou a independência. 3 Houve cisão no Exército luso-brasileiro que ocupava a Cisplatina(Uruguai). Regimentos portugueses recuaram para Montevidéu e foram cercados pelos ex-companheiros, os brasileiros, liderados pelo Barão de Laguna. No norte do Pará e Maranhão, juntas pró-portuguesas declararam lealdade à pátriamãe. Pernambuco era favorável à independência, mas, na Bahia, não havia consenso entre a população, o que deu origem a árduas batalhas na Campanha da Bahia. Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 5 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro Os poderes políticos eram quatro — Legislativo, Moderador, Executivo e Judicial. Cada província era dirigida por um presidente nomeado pelo imperador, que tomava posse perante a câmara da capital. Em cada uma delas havia também um conselho geral, cujos membros eram eleitos juntamente com a representação nacional. O monarca exercia o Poder Moderador, com o apoio do Conselho de Estado, órgão de caráter consultivo e, ao mesmo tempo, o Poder Executivo, auxiliado pelos seus ministros de Estado. O Poder Legislativo era exercido pela Assembleia Geral, formada pela Câmara dos Deputados e pela Câmara dos Senadores ou Senado do império. O Poder Judicial era exercido pelos juízes de direito e pelos juízes de paz, para as tentativas de conciliação prévias a qualquer processo. Na capital do império e nas províncias havia um Supremo Tribunal de Justiça, composto de juízes letrados. A organização dos municípios não mudou de forma significativa, mantendo as câmaras o mesmo papel que exerciam na colônia. 2.2 A Crise da Monarquia O sistema monárquico brasileiro encontrava-se desgastado e era questionado por vários setores da sociedade brasileira. O exército não aceitava mais a corrupção dentro do governo monárquico. Algumas imposições feitas pelo imperador também eram questionadas pelos militares. Entre elas, a proibição de oficiais do exército brasileiro em se manifestar na imprensa, sem a autorização do Ministro da Guerra. Os membros da Igreja Católica Brasileira também estavam descontentes com o governo de Dom Pedro II, pois havia muita interferência real nos assuntos religiosos. No final do século XIX, a monarquia era uma forma de governo questionada em todo o mundo ocidental. Muitos países importantes já haviam adotado a República, que possibilitava maior participação política dos cidadãos. No Brasil, a classe média, estudantes e profissionais liberais, simpáticos ao regime republicano, passaram a fazer oposição à Monarquia brasileira4. Queriam a implantação da 4 Além de não conseguir deter a campanha abolicionista, o governo imperial envolveu-se numa séria desavença com a Igreja Católica, conhecida como Questão Religiosa (1872-1875), a qual contribuiu para desgastar mais ainda as bases de sustentação do regime monárquico. Depois de 1880, o abolicionismo ganhou novo fôlego. Os abolicionistas conquistaram adeptos também nos círculos militares, onde já se Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 6 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro República, para que pudessem ganhar mais poder e influência nas decisões políticas e administrativas do país. Havia também um grande descontentamento entre os fazendeiros conservadores, que foram proprietários de grandes quantidades de escravos e não receberam indenização do governo após a abolição. Antes adeptos da Monarquia, estes fazendeiros retiraram o apoio político que davam à Monarquia após a abolição da escravatura em 1888. Os setores progressistas da sociedade brasileira, por sua vez, eram contrários a uma série de situações mantidas pelo regime monárquico, tais como: voto censitário, miséria, ensino público para poucos, elevado índice de analfabetismo. 2.3 A crise Econômica Desde o começo do século XIX, o café tinha se tornado um produto economicamente importante para o país. As grandes fazendas de café se expandiram por onde hoje é a região Sudeste, especialmente São Paulo, que ao final do século XIX respondia por mais da metade da produção nacional. O avanço do café coincidiu com a decadência das lavouras tradicionais de algodão e açúcar. Entre 1837 e 1838, as exportações de café, destinadas principalmente aos Estados Unidos, correspondiam a mais da metade do valor das exportações brasileiras. A lavoura cafeeira proporcionou aos grandes proprietários rurais do Sudeste (os barões do café) o suporte econômico necessário para consolidarem sua supremacia política perante as demais províncias do país. Nas décadas finais do século XIX, o Rio de Janeiro passou por um grande crescimento demográfico, com um contingente populacional quase que dobrando entre 1872 e 1890. Isso, claro, provocou diversos problemas estruturais e de higiene na região. Cresceu o número de pessoas buscando emprego, consequentemente, de desempregados. Aumentou a quantidade de pessoas a morar em cortiços, agravando os problemas decorrentes da falta de saneamento básico e do abastecimento de água: surtos de malária, varíola, febre amarela e tuberculose. havia difundido a filosofia positivista, por iniciativa de Benjamin Constant. A recusa do exército em perseguir os escravos que fugiam em massa das fazendas (muitas vezes com a ajuda da ala mais radical dos abolicionistas) deu origem a Questão Militar. Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 7 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro A crise econômica em que o Brasil se encontrava fez com que aumentasse o descontentamento da população brasileira e também influenciou na Proclamação da República. Esta crise foi agravada com a Guerra do Paraguai, pois o Brasil recorreu aos empréstimos ingleses, aumentando assim a dívida externa. 2.4 O Positivismo O positivismo foi uma corrente filosófica que surgiu na França no século XIX e ganhou força no Brasil no final do mesmo século5. Militares, profissionais liberais e intelectuais defendiam os ideais positivistas. Estes ideais eram favoráveis ao regime republicano e, portanto, contrários à Monarquia. A inscrição "Ordem e Progresso" na bandeira brasileira, criada após a Proclamação da República, reflete a importância do Positivismo no processo republicano brasileiro. 3. A REPÚBLICA BRASILEIRA Inicialmente, “república” é a forma de governo na qual os governantes são eletivos e temporários, por oposição à monarquia, na qual os governantes são hereditários e vitalícios. Porém, o termo tem um significado mais amplo e filosófico, como mostra Maria Helena Versiani, na Revista Brasileira de Historia, 2010 no texto “Uma 5 O Positivismo, doutrina criada por Augusto Comte, defendia a ideia de que o conhecimento científico é a única forma de conhecimento verdadeiro, desconsiderando todas as outras formas do conhecimento humano que não pudessem ser comprovadas cientificamente. Tudo aquilo que não puder ser provado pela ciência é considerado como pertencente ao domínio teológico-metafísico caracterizado por crendices e vãs superstições. Para os positivistas o progresso da humanidade depende única e exclusivamente dos avanços científicos, único meio capaz de transformar a sociedade no ideal desejado. O positivismo de Augusto Comte era caracterizado pela ênfase no determinismo, na hierarquia e na obediência, na concepção de evolução para o progresso, na crença no governo da elite intelectual e no desprezo à teologia e à metafísica A ideia-chave do Positivismo Comtiano é a Lei dos Três Estados, de acordo com a qual o entendimento humano compreende três estágios na forma de conceber as suas ideias e a realidade: (1)Teológico: o ser humano explica a realidade por meio de entidades supranaturais (os "deuses"), buscando responder a questões como "de onde viemos?" e "para onde vamos?"; além disso, busca-se o absoluto. (2)Metafísico: é uma espécie de meio-termo entre a teologia e a positividade. No lugar dos deuses há entidades abstratas para explicar a realidade: "o Éter", "o Povo", "o Mercado financeiro", etc. Continua-se a procurar responder a questões como "de onde viemos?" e "para onde vamos?" e procurando o absoluto. É a busca da razão e destino das coisas, é o meio termo entre teológico e metafisico.(3)Positivo: etapa final e definitiva, não se busca mais o "porquê" das coisas, mas sim o "como", por meio da descoberta e do estudo das leis naturais, ou seja, relações constantes de sucessão ou de coexistência. A imaginação subordina-se à observação e busca-se apenas pelo observável e concreto. O lema do positivismo era: "Amor como princípio e ordem como base; o progresso como meta", e inspirou os dizeres da bandeira nacional brasileira “Ordem e Progresso”. Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 8 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro República na Constituinte (1985-1988)” (http://www.scielo.br/pdf/rbh/v30n60/a13v3060.pdf ): Por princípio, nas sociedades republicanas, a regulação política e as práticas sociais devem engendrar a noção de que é responsabilidade de todos consolidar o bem público. Assim, o terreno da República supõe alguma renúncia à lógica privada em favor da coisa pública, de modo que todos devem orientar as suas ações tendo em vista a supremacia do bem comum. Mas nem sempre foi isso o que aconteceu. 3.1 A Primeira República ou República Velha O período que vai de 1889 a 1930 é conhecido como a República Velha. Este período da História do Brasil é marcado pelo domínio político das elites agrárias6 mineiras, paulistas e cariocas. Nesse período o Brasil firmou-se como um país exportador de café, e a indústria apresentou significativo avanço. Porém, na área social, ocorreram várias revoltas 7. 6 A concepção de um povo “bestializado”, surge quando, após a conquista da República, por falta de uma organização política pela sociedade, o poder é dado a gente envolvida com o liberalismo imperial. Com a Constituição de 1891 não dando obrigatoriedade, ao estado, em fornecer educação ao povo, e, o direito de voto só ser dado àqueles não analfabetos, a grande maioria da população é excluída da participação na comunidade política. Como é a primeira vez que o povo vê um modelo de república, há um descontentamento generalizado, inclusive desejando-se o retorno ao próprio modelo monarca, devido à simpatia a D.Pedro II e a princesa Isabel. Então, essa falta de intervenção do povo, quanto ao processo de consolidação da República, faz com que estudiosos os chamem de “bestializados”. E assim são tratados até a Revolta da Vacina, em que eclodiu um sentimento tão esperado pela defesa da honra e de seus direitos. Esses aspectos são examinados por José Murilo de Carvalho no livro Os Bestializados: O Rio de Janeiro e a República que não foi,1987.Embora a frase de Aristides Lobo (jornalista e líder republicano paulista, depois feito ministro do governo provisório), "O povo assistiu bestializado" à proclamação da república, tenha entrado para a história, pesquisas históricas, mais recentes, têm dado outra versão à aceitação da república entre o povo brasileiro. A tese defendida por Maria Tereza Chaves de Mello (A República Consentida, Editora da FGV, EDUR, 2007), indica que a república, antes e depois da proclamação, era vista popularmente como um regime político que traria o desenvolvimento, em sentido amplo, para o país. 7 1896 – Os sertanejos liderados por Antônio Conselheiro foram derrotados pelas forças governamentais na Guerra de Canudos 1904 – Oswaldo Cruz com sua Lei da Vacina fez com que a população do Rio de Janeiro se rebelasse na Revolta da Vacina. 1910 – Os castigos corporais aplicado aos soldados da Marinha fez com que os mesmos se rebelassem contra os seus superiores na Revolta da Chibata. 1912 – No sul do Brasil as disputas por território entre Santa Catarina e Paraná gerou a Guerra do Contestado. Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 9 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro A República da Espada, 1889-1894 foi a primeira fase da República Velha. Em 15 de novembro de 1889, aconteceu a Proclamação da República, liderada pelo Marechal Deodoro da Fonseca. Nos cinco anos iniciais, o Brasil foi governado por militares. Deodoro da Fonseca tornou-se Chefe do Governo Provisório. Em 1891, renunciou e quem assumiu foi o vice-presidente Floriano Peixoto, que intensificou a repressão aos que ainda lutavam pela monarquia. Portanto, quando o governo brasileiro se tornou republicano, foram os militares que assumiram as duas primeiras presidências do país. Ao final do mandato de Floriano Peixoto, a elite agrária subiu ao poder dando início ao período conhecido como República do Café com Leite, ou República Velha. A Constituição de 1891, a primeira da República, garantiu alguns avanços políticos, embora apresentasse várias limitações, pois representava os interesses das elites agrárias do país. Por isso, embora a escravidão já tivesse sido abolida e houvesse enormes contingentes de ex-escravos totalmente sem proteção social, a CF-91 rejeitava a obrigação social do Estado (assistência social e educação). A nova constituição implantou o voto universal (mas as mulheres, analfabetos, clérigos, militares de baixa patente ficavam de fora) instituiu o federalismo, o presidencialismo e o voto aberto do eleitor (o que deu margem à intimidação eleitoral). Nos primeiros anos, após a proclamação da República, vigorava no Brasil um sistema financeiro retrógrado e uma estrutura econômica arcaica, baseada no café, um produto supérfluo extremamente sujeito às flutuações do mercado internacional. O Ministro da Fazenda, Rui Barbosa, adotou uma política que visava estimular a industrialização e o desenvolvimento de novos negócios, os bancos passariam a liberar empréstimos livremente às pessoas, sem mesmo saber de suas reais condições de pagamento. Esta política ficou conhecida como encilhamento. Para financiar o enorme volume de empréstimos, o governo foi obrigado a fazer grandes emissões de moeda, desvalorizando-a,o que resultou em altíssimos níveis de inflação e acabou desencadeando uma das mais graves crises econômicas vividas pelo Brasil. O período que vai de 1894 a 1930 foi marcado pelo governo de presidentes civis, apoiados pelas elites agrárias do país. Todos os Estados da Federação tinham o seu Partido Republicano. Os presidentes da República saiam dos seguintes partidos: Partido Republicano Paulista (PRP) e Partido Republicano Mineiro (PRM). Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 10 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro Os estados de São Paulo e Minas Gerais controlavam as eleições, mantendo-se no poder de maneira alternada : era a “política do café com leite”, pois São Paulo era grande produtor de café e Minas Gerais era grande produtor de leite. Estes eram os estados mais ricos do país, por isso, dominavam o cenário político da república. Saídos das elites mineiras e paulistas, os presidentes acabavam favorecendo sempre o setor agrícola, principalmente do café (paulista) e do leite (mineiro). A política do café-com-leite sofreu duras críticas de empresários ligados à indústria, que estava em expansão neste período. Se, por um lado, a política do café-com-leite privilegiou e favoreceu o crescimento da agricultura e da pecuária na região Sudeste, por outro, acabou provocando um abandono das outras regiões do país. Os outros estados brasileiros, deixados de lado pela oligarquia cafeeira, especialmente das regiões Nordeste, Norte8 e Centro-Oeste tiveram seus problemas sociais agravados e passaram a fazer forte oposição à política do café com leite. Na época, o café era o principal produto da economia agroexportadora brasileira. Devido à instabilidade dos preços do café no mercado internacional, em benefícios dos cafeicultores adotou-se uma política de proteção: o Convênio de Taubaté. Quando o preço do café caía muito no mercado externo, o governo federal comprava o excedente e estocava. Esperava-se a alta do preço do café e então os estoques eram liberados. Esta política mantinha o preço do café, principal produto de exportação, sempre em alta e garantia os lucros dos cafeicultores. Porém só funcionava até um certo limite: a grande crise do sistema resultou justamente da incapacidade de operação de tais estoques reguladores em contextos de acentuada desvalorização combinada com superprodução do café. Foi um dos fatores críticos que levaram à crise de 1929 e às mudanças políticas que se seguiram. Instituída no governo do presidente paulista Campos Salles (18981902), a “política dos governadores” visava manter no poder as oligarquias: era uma troca de favores políticos entre governadores e presidente. O presidente apoiava os candidatos dos partidos governistas nos estados, enquanto estes políticos davam suporte à candidatura presidencial e ao governo. Esse acordo era parte do fenômeno que veio a ser conhecido como “coronelismo”. 8 Com exceção do Estado do Amazonas que prosperou (no ciclo da borracha) graças à produção de borracha natural. Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 11 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro Descrito por Vitor Nunes Leal no livro Coronelismo, Enxada e Voto, o coronelismo foi um fenômeno típico da República Velha. Resultava do fato de que o poder do Estado brasileiro (presidência) e dos chefes dos Estados (governadores) não chegava aos grotões do interior. Por não estar presentes nesses locais, tanto o governo federal como os governadores precisavam do apoio da autoridade do senhor local - o “coronel” - para manter a população sob controle e proporcionar legitimação pelo voto9. Ou seja: foi um ponto de equilíbrio, um troca de apoio, entre o poder central que se fortalecia, mas ainda não havia se consolidado e o poder local, que vinha se fragilizando, mas ainda retinha significativo controle sobre a população nos municípios interioranos. O arranjo se sustentava à base de trocas clientelistas entre os coronéis e o povo, entre os governadores e os coronéis e entre o governo central e os governos estaduais. Com o tempo, esse sistema passou a ser execrado pelas classes médias urbanas e setores mais esclarecidos da sociedade. O tenentismo foi um movimento que ganhou força entre militares de média e baixa patente durante os últimos anos da República Velha. O levante dos militares expressava, em parte, a inconformidade das classes médias urbanas para com os desmandos e o conservadorismo que caracterizavam a política nacional. Ao mesmo tempo, o tenentismo era mais uma clara evidência do processo de diluição da hegemonia dos grupos políticos vinculados ao meio rural brasileiro. Influenciados pelos anseios políticos das populações urbanas, os militares envolvidos nesse movimento se mostraram favoráveis às tendências políticas republicanas liberais. Entre outros pontos, reivindicavam uma reforma constitucional capaz de trazer critérios mais justos ao cenário político nacional. Exigiam que o processo eleitoral fosse feito com o uso do voto secreto e criticavam os vários episódios de fraude e corrupção que marcavam as eleições. Além disso, eram favoráveis à liberdade dos meios de comunicação, exigiam que o poder Executivo tivesse suas atribuições restringidas, maior autonomia às autoridades judiciais e a moralização dos representantes que compunham o Poder Legislativo. Entretanto, todo esse discurso liberal e moralizador também convivia com a opinião de alguns oficiais que 9 O coronel era um grande fazendeiro que geralmente dominava a política em um município, e utilizava seu poder econômico para garantir a eleição dos candidatos que apoiava. Era usado o “voto de cabresto”, em que o coronel (fazendeiro) obrigava e usava até mesmo a violência para que os eleitores de seu "curral eleitoral" votassem nos candidatos apoiados por ele. Como o voto era aberto, os eleitores eram pressionados e fiscalizados por capangas do coronel, para que votassem nos candidatos indicados. O coronel também utilizava outros "recursos" para conseguir seus objetivos políticos, principalmente o clientelismo (troca de um bem público pelo voto) e a intimidação, em práticas como: compra de votos, votos fantasmas, troca de favores, fraudes eleitorais e violência. Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 12 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro defendiam a presença de um poder forte, centralizado e comprometido com mal definidas necessidades da nação brasileira10. A oligarquia cafeeira conseguiu dominar o cenário político brasileiro por mais de duas décadas. Os outros estados brasileiros, à margem do poder, passaram a fazer forte oposição ao governo oligárquico. Jovens oficiais do exército (tenentes), também estavam insatisfeitos com os rumos políticos do Brasil. Aproveitando a dissidência de algumas oligarquias estaduais, em 1922 os tenentes apoiaram a candidatura de Nilo Peçanha em oposição ao mineiro Arthur Bernardes, politicamente comprometido com as demandas dos grandes cafeicultores. A eleição presidencial de 1922 foi mais agitada da República Velha. Ao final, Artur Bernardes foi eleito novo Presidente da República, dando continuidade à política do café com leite. Os militares acreditavam que o candidato da oposição, Nilo Peçanha, era o verdadeiro vencedor das eleições presidenciais. Inconformados com mais um ato de corrupção por parte do governo, um grupo de militares, julgando-se defensores da moralização política do Brasil, iniciou uma série de revoltas contrárias à posse de Artur Bernardes como presidente. A primeira revolta a acontecer foi a Revolta do Forte de Copacabana. Os tenentes haviam tentado controlar as principais guarnições do Rio de Janeiro a fim de pressionar o governo a anular a eleição vencida por Artur Bernardes. No andamento da revolta, somente um grupo pequeno de rebeldes, conhecidos como os 18 do Forte de Copacabana, continuaram a lutar. Os rebeldes foram facilmente derrotados pelas forças do governo. Do grupo dos Dezoito do Forte de Copacabana, apenas dois sobreviveram. Nesse momento, 10 Esse parágrafo, bem como a Nota que se segue são de autoria de Rainer Sousa, publicados em http://www.brasilescola.com/historiab/tenentismo.htm, não paginado, em 08/07/2013. “As primeiras manifestações militares que ganharam corpo durante a República Oligárquica aconteceram nas eleições de 1922. Durante essas eleições a tensão entre os militares e o governo aumentou quando diversas críticas contra os militares, falsamente atribuídas a Arthur Bernardes, foram veiculadas nos jornais da época. Com a vitória eleitoral das oligarquias, a primeira manifestação tenentista veio à tona com uma série de levantes militares que ficaram marcados pelo episódio dos “18 do Forte de Copacabana”, ocorrido no Rio de Janeiro, em julho de 1922.Nos dois anos seguintes, duas novas revoltas militares, uma no Rio Grande do Sul (1923) e outra em São Paulo (1924), mostrou que a presença dos tenentistas no cenário político se reafirmava. Após terem suas pretensões abafadas pelas forças fiéis ao governo, esses dois grupos se juntaram para a formação de uma guerrilha conhecida como Coluna Prestes. Entre 1925 e 1927, esse grupo composto por civis e militares armados entrecortou mais de 24 mil quilômetros sob a liderança de Luís Carlos Prestes. A falta de apelo entre os setores mais populares, e as intensas perseguições e cercos promovidos pelo governo acabaram dispersando esse movimento. Luís Carlos Prestes, notando a ausência de um conteúdo ideológico mais consistente à causa militar, resolveu aproximar-se das concepções políticas do Partido Comunista Brasileiro. Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 13 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro a falta de unidade política dos militares acabou enfraquecendo essa primeira manifestação conhecida como Reação Republicana. Passados dois anos da revolta militar ocorrida no Rio de Janeiro, o Movimento Tenentista iniciou uma nova revolta, desta vez em São Paulo, que ficou conhecido como Revolta Militar de 192411.No Norte do Brasil, os Tenentes também aderiram a Revolução de 1924. No Amazonas ocorreu a chamada Comuna de Manaus. Fracassada a tentativa de controlar São Paulo, os militares da Revolução de 1924 foram em direção ao Sul do país para se encontrar com as forças militares que haviam se rebelado no Rio Grande do Sul. A união dos dois grupos gerou a famosa Coluna Prestes, força militar que marchou por boa parte do território brasileiro a fim de provocar uma revolução. Apesar de toda essa mobilização, o Tenentismo não obteve êxito em acabar com o governo oligárquico. Em 1930, alguns dos ativistas do Movimento Tenentista, tomaram parte na revolta que derrubou o governo de Washington Luís. Wanderley Guilherme dos Santos, O Sistema Oligárquico Representativo da Primeira República, Dados, 2013. A íntegra desse artigo encontra-se em http://www.scielo.br/pdf/dados/v56n1/a02v56n1.pdf “A implantação da República, em 1889, aboliu as instituições monárquicas, entre elas, a do Poder Moderador; ratificou a mobilidade relativa do fator trabalho, instituída pela Abolição da Escravatura no ano anterior; extinguiu completamente o requisito de renda para a participação eleitoral, à frente de todos os países em que existiam eleições, mas manteve os vetos à participação feminina e dos analfabetos12. “Instalava-se por inteiro o sistema representativo oligárquico, com todas as peculiaridades institucionais: conflito altamente regulado entre as elites e extensa exclusão nos direitos à participação. “A verdade é que os primeiros quarenta anos da república oligárquica brasileira transcorreram sem qualquer transtorno sério e eficaz na obediência às normas políticas. Não houve interrupção nas eleições legislativas, não houve deposição de presidentes, antes de 1930, nem 11 Eduardo Gomes e Siqueira Campos, únicos sobreviventes dos 18 do Forte de Copacabana, inspiraram o militar Isidoro Dias a comandar um grande número de militares no combate ao governo oligárquico. 12 E também: do clero, dos militares da baixa patente e dos mendigos. Nota da Profa. Maria das Graças Rua. Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 14 MÓDULO: Formação do Estado Brasileiro houve manifestações militares bem-sucedidas. Algumas tentativas de revolução na década de 1920, sim, embora todas fracassadas, violência na política local, sim, como é usual na política de sistemas oligárquicos, mas golpe de estado bem-sucedido, não. Ao contrário, todas as eleições presidenciais, seguidas da posse dos eleitos, foram pacíficas. As regras de competição intraoligárquicas foram eficazes a nível nacional, enquanto a nível local prevalecia a disputa com base no voto, na violência e na corrupção, esta última ausente, por desnecessária, das eleições presidenciais. “A partir de 1902, as eleições presidenciais eram decididas por um colégio informal de que faziam parte os representantes dos estados federados e a liderança governista. (...) O consenso prévio às disputas presidenciais garantia a estabilidade governativa das administrações, que transcorriam sem os grandes estremecimentos característicos das reformas ministeriais. (...) Por certo, o consenso característico da sucessão presidencial não se reproduzia nas disputas locais, em que famílias competiam pelo privilégio de nomear o delegado, o juiz de direito, o diretor da escola pública e o arrecadador de impostos. À centralização federal correspondiam feudos paroquiais, suficientemente radicalizados como para substituir em grande parte a representação do estado na Câmara dos Deputados a cada eleição. “Os revolucionários de 1930 referiam-se aos membros da elite destituída como oligarcas, do mesmo modo que, depois da Constituinte de 1987-88, se tornou usual identificar a classe política do período 1945-1964 como a representante da oligarquia hegemônica no Brasil de então. “Oligarca” e “oligarquia”, a literatura especializada o comprova, são termos carentes de significado preciso e consensual na história brasileira.” 3.2 A Era Vargas A Era Vargas, ou Período Getulista durando de 1930 a 1945, iniciou-se com a consumação da Revolução de 1930, que marca o fim da República das Oligarquias ou República Velha e da “política do café com leite”. A Revolução de 1930 foi um movimento de revolta armado13, que tirou do poder, através de um golpe de Estado, o presidente Washington 13 “A revolta armada começou no Rio Grande do Sul, sob o comando do General Góes Monteiro, em 3 de outubro de 1930. No dia seguinte, foi a vez do Nordeste, sob o comando de Juarez Távora.Porém, Câmara dos Deputados Ciência Política - [Pós-Edital 2023] - Prof. Dra. Maria das Graças Rua - www.igepp.com.br ‘ 15