Desafios e Possibilidades na Apropriação Cultural Política (PDF)

Summary

Este artigo explora os desafios e as possibilidades da apropriação cultural política na historiografia brasileira, com foco em reflexões de pesquisadores brasileiros. O texto analisa a atuação do Partido Comunista em Belo Horizonte no pós-Segunda Guerra Mundial, demonstrando como as culturas políticas se manifestam e se adaptam ao tempo.

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. '"'- ~' H'"''·"'~ 1 1 J. 0 ~~\IÜ; Com Raquel Pereira, no capítulo 9, (1 foco retoma pat a a cultura co- CAPÍTULO 1 munista, ,em estudo que privilegia a atuação do PCB em Belo Horizonte, no contexto pós-Segu...

. '"'- ~' H'"''·"'~ 1 1 J. 0 ~~\IÜ; Com Raquel Pereira, no capítulo 9, (1 foco retoma pat a a cultura co- CAPÍTULO 1 munista, ,em estudo que privilegia a atuação do PCB em Belo Horizonte, no contexto pós-Segunda Guerra. O texto anal;isa as estratégias de mobilização do Partido Comunista par~ ocupar espaços físicos na cidade, em que se ex- ·/)esafios e possibilidades na apropriação de pressaraiih traços da cultura política dos cqmunistas. A atuàção do Partido cultura política pela historiografia criou espáços de entretenimento que se torparam também denários da luta política. A estrutura ramifi_cada do PCB, c.om células e comitês instalados em diversos pontos da cidq~de, produziu relMão diferenciad,a com o espaço urbano, permitindo a identificação de umq; cartografia polí~ica da atuação do Parti~ê em Belo Horiztmte. Rodrigo Patto Sá Motta No último texto da coletânea, Rosâng~la Assunção se inspira nas dis- cussões teóricas em torno da categoria culpura política pará compreender o comportamento dos poliG]ais do DOPS m~neiro. O trabalho sinaliza para a correlaç,ão existente entr,e a instância polltica e a dimensão cultural, em que questoes como valores, crenças, atitudes, linguagem e imaginário são Este texto é baseado em reflexões acumuladas nos últimos dez anos, essenciais para compreenara a maioria das reflexões dos historiadores brasileiros ~ngajados no debate. A força de a.tração exercida por cultura política em anos re,centes deve-se, principalmente, à hegemoqia do paradigma. culturalist~. Em outros momentos a política, a economia ou fatores sociológicos assumuam o papel 1Contribuições significativas ao debate teórico sobre cultura política têm sidQ publi- cadas por historiadores e cientistas soci;ais brasileiros: Gomes (2005); Dutra (2001); Kuschnir e Carneiro (1999); Krischke ;(1997); e Rennó (}998). 1? pqssibilidadtlS ill$Ügante:s de #largar nossos ho:rizontes de conhecimento e li 1~,xplkut;1 o úiU.rnü para O$ ptocessos históricos, mas hoje a eultura ocupa C()rnpreensãQ. Por isso, a exp,osição se centratá na discussão 4os aspectos eHHt' lu?at·. Nos dias ~ttu.ais é muito influente a percepção de que a cul,tura pt:?blemátieos do uso de cultura política, mas ~ambém nas potencialidades dete;n nma o desenro~ar dos acontecim,e ntos, da mesma forma como décadas que ele oferece. Antes, porém, serão neces~árias breves referências às atrás se pensava que a economia ou os interesses sociais ofereciam a chave ··origens do conceito, para situar a discussão e esclarecer a m~neira como para co~preender. a din~mica da história. Em se tratando do paradigma c~lt~.ahsta,. o mais preciso não é falar em dinâmica, ou movimento da we será apropriado neste tex~o. hist~na, e sim em permanências e mudanças lentas. ,Como tudo tem sido exphc~do p~la infl~ência dos fatores culturais, a política não poderia ser exc~çao, dm o carater sedutor de cultura política, que permite uma abor- *** dagem c~lturalista ?os fenômenos relacionados às disputas pelo podei. O numero de mteressados por €ultura política aumentou muito nos A categ(>ria cultura política foi construí~a no século XX, mas seus últimos anos e transbordou os estreitos limites do universo acadêmico. O formuladores retiraram inspiração de autores ,que escreveram ~m períodos conc.eito tem sido cada vez mais utiliz.~do pela mídia e, num sinal da f~rça '~fitt'lriores. Um deles foi Alexis de Tocqueville, no livro A Del'nocracia na crescen~e d:_ seu ap~l~, tem sido mobilizado até por políticos profissiol,lais '4:rnérica, de 1835. Nesse trabalho, hoje um tlássico, o pens~;~dor francês e orgamzaçoes sociaiS. Daí outra motivação para escrever este texto: a... cl~l>envolveu a idéia de que a força da organização política do~ norte-ame- percepção ~e que cultura política cor;re o risco de baJiialização, graças ao., tiéanos deriwava não somente das instituiçõ~s, mas tinha relação com os uso generalizado. To,rnou-se conceito da moda.. Há muitos incentivos ao hábitos e costumes daquele povo, o que ele chamou "h~bitos.do coração" usá-lp, sob:etudo ~ d,esejo de mostrar-se atualizado, çnas nem sempre há (E.. ()rmisano, 2001:393-426); Tal insight serià aprove(tado e como o medo. Influenciados por tais representações, os tradição. Por isso, não há lugar para o efêmero. orientam suas ações, e às vezes agem movidos por paixões que As diferentes culturas políticas não devem ser encaradas como reali- dades estanques, como se estivessem encerrada'S em si mesmas e imunes importante considerar, seguindo sugestiva análise de Serge Berstein ao contato com as outras, concorrentes na disputa pelo espaço público e en,ml'vertao argumento original de Almond e Verba), a existência de pelo controle do Estado. Embora sejam adversárias, e com freqüência sociais responsáveis pela reprodução das culturas políticas, com.o possuam características antitéticas, às vezes elas se deixam influenciar por instituições educacionais, corporações militares, partidos e sin- valores defendidos pelas concorrentes, sobretudo quando eles encontram Nada mais natural, quando lidamos com categoria que pressupõe grande aceitação social. De maneira semelhapte, as culturas políticas escolhas políticas dos indivíduos são determinadas por filiação a não são infensas à ação do tempo. Embora mantendo as características · &/ou a tradições. A essa lista vale agregar outros vetores de sociali- básicas que lhes garantem a identidade, elas podem adaptar-se às mu- as Igrejas, e também adicionar a importância dos veículos de danças experimentadas pelas sociedades ao longo do tempo, que tornam impressos, como periódicos e livros. Nos casos de famílias determinados temas obsoletos e trazem à tona novos problemas. As que estamos diante de algo que envolve a ligação dos indivíduos a. H!JiliHG(> I'A1' 1'0 SÁ MO'I' l'A TH~~M'I íJS 1!: I'O!:lSfiiU,IJJt\l>ES N't\ t\[tí'l ói!JlJA !,~. O llE Clll.T\Jl(A.I'OI.i.TIsa.s, em vista dos argumentos sobre a suposta fragilidade dos laços Segunda observação sobre o reducionismo culturalista: há estudos os brasileiros e a política. A seguir tal linha de pensamento, ela im- que enfocam as representações como uma espécie de fenômeno etéreo, l: tH'Ül a existência de. cultura: po~'ticas frágeis no paí~, p~uco enraiza~as pairando acima e fora da dinâmica social. Tal tendência está relacionada c~ nn adesão superficial. A nao s r na vertente eurocentnca do conceito, a certo modo de encarar os laços entre representações e realidade, eivada. a, qual, então, o Brasil não ten cultura política, seria politicamente de relativismo radical. Nessa vertente, o real só existe enquanto represen- · essa constatação não tira a legitimidade da aplicação da categoria tação, e como todas as representações são igualmente incapazes de revelar do nosso país. Como disse antes, esse pode ser um traço da cul- a verdade todas são válidas. Por isso, estudar as representações hasta pqlitica brasileira: frágil cidadania, pouco envolvimento da população para alguns autores, sem preocupar-se em distinguir as mais próximas da a coisa pública. De qualquer forma, é um dado a ser considerado realidade ou as mais fantasiosas (às vezes pura falsificação), tampouco em futuras pesquisas, para que se possa dimensionar adequadamente as pesquisar os impactos que produzem na realidade. Essa discussão remete de manifestação de cultura política no Brasil. a uma polêmica que não é possível aprofundar aqui, e que na verdade Outro desafio para os historiadores interessados é a necessidade de persegue a teoria do conhecimento desde suas origens, sem solução visível: mais na discussão sobre metodologias de pesquisa. Na historiogra- a questão da realidade e da verdade, se é possível representar ou não o ' l'ccente, os trabalhos sobre cultura política têm privilegiado o uso de mundo. Mas o relativismo radical deve ser evitado, pois leva à conclusão u ,,ua.uv.a.,. Mas a utilização de dados quantitativos pode trazer bons de que qualquer representação é aceitável, pois todas são parciais. Não é ""'""u'u". sobretudo se combinados com boas análises qualitativas. 23 Por verdade: algumas são mais distorcidas, às vezes falsas, enquanto outras ''XI' tl1.plo, fontes quantitativas podem servir para testar hipóteses correntes produzem versões mais próximas da realidade. 22 tttl}we comportamentos políticos supostamente calcados na tradição. As- Evitando tanto o relativismo quanto o cientificismo ingênuo, a ma- ~1 famosa moderação dos mineiros poderia ser verificada a partir dos neira mais fértil de encarar as relações entre realidade e representações · ··~''c.o."'u"' eleitorais para disputas m~oritárias, arquivados nos tribunais é reconhecer a interdependência das duas esferas, perceber os laços in- Poderiam ser avaliados e contrastados os resultados obtidos por trincados que as atam de maneira forte. As representações estão calcadas I'U flcliclatos afinados com discursos (e imagens) políticos moderados ou na realidade, estão em diálogo com o mundo social, a vida concreta, e ao Hlicais, em comparação com a situação em outros estados da federação. mesmo tempo interferem no seu desenrolar. No campo político, há inúmeros mbém poderia ser averiguada a fidelidade de determinadas regiões a exemplos para ilustrar situações em que representações imprimem rumo valores políticos, testando, através de séries eleitorais históricas, se à realidade. Vejamos um deles: o temor ao comunismo, freqüentemente ' imagens da baixada santista ou do Recife como bastiões "vermelhos" desproporcional à força efetiva dos revolucionários, abrindo caminho a anos 1940-1960, por exemplo, correspondem à realidade eleitoral. golpes de Estado e a regimes autoritários. Em suma, as culturas políticas uma possibilidade: usar os resultados das pesquisas de opinião resultam da imbricação entre práticas e representações, e o olhar sensível , ,...... ~v pelo menos desde os anos de 1950 na tentativa de encontrar a apenas uma das esferas é empobrecedor. estáveis de comportamento e valores políticos. Enfim, há muitos desafios, problemas e polêmicas envolvidos nas pes- lJUi ·us sobre o fenômeno da cultura política, mas as possibilidades que se iiU!SilOTtinam à nossa frente são bastante instigantes, fazendo com que os 22 "As fontes não são nem janelas escancaradas, como acreditam os positivistas,. implicados no trabalho com esse campo conceitual valham a pena. nem muros que obstruem a visão, como pensam os cépticos: no máximo poderíamos compàrá-las a espelhos deformantes. A análise da distorção específica de qualquer fonte implica já um elemento construtivo. Mas a construção [... ) não é incompatível com a prova: a projeção do desejo, sem o qual não há pesquisa, não é incompatível terreno pode-se tirar bom p~oveito das pesquisas e dos métodos desenvolvidos com os desmentidos infligidos pelo princípio de realidade. O conhecimento (mesmo IJÍ

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