🎧 New: AI-Generated Podcasts Turn your study notes into engaging audio conversations. Learn more

A Educação Não Formal como ambiente educacinal.pdf

Loading...
Loading...
Loading...
Loading...
Loading...
Loading...
Loading...

Full Transcript

ISSN: 2179‐4901 A Educação Não Formal como ambiente educacional para usos e aplicações da Pedagogia dos Multiletramentos Eixo 05 - Multiletramentos, educação e mídias;...

ISSN: 2179‐4901 A Educação Não Formal como ambiente educacional para usos e aplicações da Pedagogia dos Multiletramentos Eixo 05 - Multiletramentos, educação e mídias; Wilson Rodrigues de MELO NETO1 Valéria Pinto FREIRE2 RESUMO O objetivo deste artigo é apresentar um estudo bibliográfico com a finalidade de refletir sobre o campo da Educação Não Formal enquanto ambiente socioeducacional propício para a utilização da Pedagogia dos Multiletramentos. Para atingir esta proposição torna- se necessário apresentar tais conceitos como elementos construtores de um caminho que discute a alfabetização (SAITO E SOUZA, 2011; FREIRE, 1991) enquanto aquisição técnica do código da leitura e escrita, perpassando pelo letramento (LOURENÇO, 2013; SAITO E SOUZA, 2011, DIONÍSIO, 2007) que vê a utilização das práticas de leitura e escrita relacionadas às práticas sociais a fim de chegar aos multiletramentos (LOURENÇO, 2013; ROJO, 2012; SILVA, 2016) onde a multiplicidade das práticas letradas se expressam na multiplicidade cultural das populações e multiplicidade semiótica dos textos. Em um segundo momento é posto em discussão a necessidade de uma Pedagogia dos Multiletramentos, visto que, reconhece a diversidade linguística e cultural através do fluxo de informações e da dinamicidade da comunicação proporcionada por uma sociedade que faz usos ininterruptos das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC). Por fim é apresentado a Educação Não Formal (GOHN, 2010) como um espaço propício para a utilização da Pedagogia dos Multiletramentos já que se caracteriza por ter em seus processos de ensino/aprendizagem a leitura crítica do mundo objetivando o pleno exercício da cidadania. PALAVRAS-CHAVES: Multiletramento, Pedagogia dos Multiletramentos, Educação Não Formal. RESUMEN El objetivo de este artículo es presentar un estudio bibliográfico con la finalidad de reflexionar sobre el campo de la Educación No Formal como ambiente socioeducativo propicio para la utilización de la Pedagogía de los Multiletramentos. Para alcanzar esa proposición fue necesario presentar los conceptos en la construcción de un camino entre la alfabetización (SAITO Y SOUZA, 2011; FREIRE, 1991) como adquisición técnica 1 Instituto Luciano Barreto Júnior; Graduando em Letras Português Espanhol (Estácio-Sergipe), Bacharel em Comunicação Social – Hab. Jornalismo (UNIT); e-mail: [email protected] 2 Doutoranda em Ciência da Informação (UCM), Mestre em Educação (UNIT), Especialista em Educação Estética Semiótica e Cultura (UFBA), Especialista em Tecnologia Educaciona (UNIT), Graduada em Comunicação Social (UNIT), vice coordenadora do GECES – Grupo de Estudo e Pesquisa Comunicação, Educação e Sociedade CNPq/UNIT, membro do GESPME – Grupo de Estudo e Pesquisa Mídias na Educação CNPq/UFPE; e-mail: [email protected]. 1 ISSN: 2179‐4901 del código de lectura y escritura, pasando por el letramento (LOURENÇO, 2013; SAITO Y SOUZA, 2011; DIONÍSIO, 2007) dónde la multiplicidad de prácticas letradas se expresa en la multiplicidad cultural de las poblaciones y multiplicidad semiótica de los textos. En un segundo momento se pone en discusión la necesidad de una Pedagogía de los Multiletramentos, ya que ésta reconoce la diversidad lingüística y cultural a través de la dinámica de la comunicación proporcionada por una sociedad usos ininterrumpidos de las Tecnologías Digitales de Información y Comunicación (TDIC). Por último se presenta la Educación No Formal (GOHN, 2010) como un espacio propicio para la utilización de las Pedagogías de los Multiletramentos ya que se caracteriza por tener en sus procesos de enseñanza/aprendizaje la lectura crítica del mundo objetivando la ciudadanía. Palavras chaves: Multiletramentos, Pedagogia dos Multiletramentos, Educação Não Formal 1 Introdução A sociedade contemporânea denominada de Sociedade da Informação (CASTELLS, 2003) está mergulhada em novas práticas e lógicas de leitura e escrita que vão desde o tradicional letramento - que se apresenta como processo em que o ensino da leitura e escrita ocorrem dentro de um contexto sociocultural - ao que hoje se apresenta como multiletramentos, segundo Cope e Kalantzis (2000), identificados como New London Group e Rojo (2012). Estes novos letramentos redimensionam-se a partir da inserção das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) nos processos de ensinar e aprender, possibilitando a criatividade e inovação em seus procedimentos. Partindo dessessw3 pressupostos têm surgido pesquisas que tem como objetivo entender como é possível apropriar-se dessas novas possibilidades, as quais deram origem ao termo multiletramentos. O presente artigo tem como objetivo apresentar uma reflexão acerca das possibilidades da Educação Não Formal se constituir espaço propícia para os usos e aplicações da Pedagogia dos Multiletramentos em suas dimensões teórico- metodológicas. Diante disto, a interlocução entre tais conceitos nos aponta para a dinamização dos processos de ensinar e aprender, oportunizando neste sentido, o desenvolvimento de competências que habilite o aluno a inserir-se na Sociedade da 2 ISSN: 2179‐4901 Informação (CASTELLS, 2003) e possa com isto ampliar seu repertório tendo em vista prepará-lo para futuras situações sociais. Tendo por base tais considerações, a Pedagogia dos Multiletramentos apontada por Rojo (2012, p.135) sinaliza para o surgimento de novos letramentos que implicam em “multiplicidade de culturas – multiculturalismo e a multiplicidade de linguagens, multisemioses e de mídia”, nesta perspectiva observa-se que há em acordo com o conceito da Educação Não Formal, muitas semelhanças. Para Gohn (2006, p. 2) a Educação Não Formal indica um processo com várias dimensões, que vão desde a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos, a preparação para o trabalho com o desenvolvimento de habilidades e potencialidades, a aprendizagem e exercício de práticas que capacita o indivíduo a organizar-se com objetivos comunitários, a aprendizagem de conteúdos de ordem curricular, midiáticos ou informacionais que possibilitam aos indivíduos fazerem uma leitura do mundo do ponto de vista de compreensão do que se passa no entorno. Assim, a autora pensa esta forma de educar como uma proposta que objetiva trabalhar a participação cidadã nas esferas sociais, culturais, política e econômica proporcionando aos seus participantes a capacidade de leitura crítica do mundo em que se vive e de suas práticas sociais. Como podem ser observados os conceitos trazem em si preocupações de ordem comum aos dois campos e entre eles o mais acentuado é o tratamento dispensado ao sujeito cidadão de compreensão híbrida e plural, capaz de usar as TDIC, recursos e interfaces como meio para os multiletramentos que se apresentam, tendo em vista a construção de conhecimento. O desenvolvimento deste trabalho foi norteado através de algumas inquietações, são elas: quais os caminhos percorridos até os multiletramentos?; existe a necessidade da prática dos multiletramentos dentro dos ambientes educacionais?; a Educação Não Formal pode ser um campo em que os multiletramentos possam ser utilizados para que as duas correntes teóricas sejam potencializadas? Assim, é através destas questões norteadoras que o trabalho foi desenvolvido. Na primeira parte é apresentado as diferenças entre os conceitos de alfabetização, 3 ISSN: 2179‐4901 letramento e multiletramento. A alfabetização apresenta-se como a codificação e decodificação de um código, neste caso a língua portuguesa, o letramento é a influência que essa codificação e decodificação trará para os indivíduos em suas práticas sociais, e multiletramento surge a partir do momento em que vivemos em uma sociedade onde as práticas sociais são apresentadas através da multiplicidade de culturas e formas de se relacionar. Na segunda parte deste artigo é apresentado a Pedagogia dos Multiletramentos. É nessa discussão que se apresenta a necessidade em que os ambientes educacionais façam uso do multiletramento, visto que a Pedagogia dos Multiletramentos entende que existe uma diversidade linguística e cultural potencializada pelas novas formas de comunicação com o crescimento tecnológico e que é preciso experimentar, interpretar, questionar, criticar e projetar novos textos e novas leituras. No terceiro momento é apresentado a Educação Não Formal onde é constituída pelos interesses e necessidades individuais e coletivos dos que participam atuando na formação social, cultural e política. Sendo assim, objetiva trazer a emancipação dos seus participantes proporcionando possibilidades de leitura crítica do mundo para que possa alcançar uma formação cidadã. Nesse sentido, verificou-se que o ambiente de Educação Não Formal apresenta características e objetivos semelhantes ao da Pedagogia dos Multiletramentos, podendo assim ser feito esse comparativo. 2 Do letramento ao multiletramento Antes de entrar na discussão sobre multiletramento é preciso trazer alguns conceitos sobre letramento. Segundo Saito e Souza (2011), o termo letramento tem origem na palavra em língua inglesa literacy que é traduzido para o português como alfabetização, ou seja, “um conjunto de habilidades cognitivas e mecânicas de apreensão do código da escrita (aquisição de litterae), bem como as práticas sociais de leitura e escrita desenvolvidas após ou paralelamente à alfabetização” (SAITO; SOUZA, 2011, p.110). 4 ISSN: 2179‐4901 No Brasil o termo letramento só surge em meados dos anos 1980 abrangendo apenas as práticas sociais de leitura e escrita. Já o conjunto de habilidades cognitivas e mecânicas de apreensão do código da escrita era conhecido no país como alfabetização. Segundo Lourenço (2013) têm sido desenvolvidas pesquisas tentando explicar o uso do conceito de letramento, pois por muito tempo este foi entendido e comparado com alfabetização. “O conceito de letramento começou a ser usado nos meios acadêmicos como tentativa de separar os estudos sobre o “impacto social da escrita” dos estudos sobre a alfabetização. ” (KLEIMAN apud LOURENÇO, 2013, p.2) Pode-se perceber que alguns autores apontam um distanciamento entre os conceitos de letramento do de alfabetização, onde consideram o letramento como práticas sociais, que envolvem o texto no processo de leitura e escrita e alfabetização enquanto práticas de escolarização, aquisição de determinado código (DIONÍSIO, 2007, p. 211). Ou seja, um leitor alfabetizado consegue codificar e decodificar um texto, identificar palavras, na leitura e na escrita. No entanto, um leitor letrado, essa codificação e decodificação vai ter influência em suas práticas sociais. Vale salientar que na perspectiva de Paulo Freire (1991) não é possível distanciar a aquisição mecânica da leitura e escrita de suas práticas sociais, visto que acontecem de forma concomitante, onde a leitura do mundo precede a da palavra. É a aquisição do código que possibilitará a leitura crítica do que está ao seu redor e da realidade, “constitui- se como um importante instrumento de resgate da cidadania e reforça o engajamento do cidadão nos movimentos sociais que lutam pela melhoria da qualidade de vida e pela transformação social” (FREIRE, 1991, p.68). O grupo de estudo denominado Novos Estudos do Letramento (New Literacy Studies) compromete-se em estudar como os textos e suas práticas sociais de leitura e escrita estão integrados na vida das pessoas já que mudanças políticas, sociais e econômicas são constantes em nossa sociedade (DIONÍSIO, 2007, p. 212). Surge assim, a necessidade de adaptação do termo, utilizando-o no plural - letramentos. O modelo anterior é questionado, pois considera-se que o letramento sofre variações a depender do contexto cultural, social e político gerando diferentes letramentos. (LOURENÇO apud STREET, 2013, p.4). 5 ISSN: 2179‐4901 O modelo de letramento pensado por Brian Street, denominado de letramento ideológico, também considera as diversas práticas de letramentos em usos por diferentes grupos e contextos. Em contraposição ao que Street chama de letramento autônomo, definido como uma forma de letramento que não considera o contexto social e prioriza o desenvolvimento de habilidades cognitivas. Ou seja, existem para o modelo ideológico, outras agências de letramento (família, igreja, trabalho, mídias etc.), tão importantes quanto a escola, pois cada prática social utiliza um letramento específico. O modelo enfatiza a importância do processo de socialização na construção de significado por participantes e está preocupado com as instituições sociais de maneira geral, por meio das quais esse processo acontece, e não apenas as explicitamente “educacionais”. (LOURENÇO apud STREET, 2013, p.4). A multiplicidade de letramentos existe e estes se modificam no tempo e no espaço. Visto que considera o contexto do leitor como significativo para a produção de sentidos no ato de leitura e da escrita, além de ressaltar a diversidade de letramentos desenvolvidos fora e dentro de um contexto, ou seja, as leituras e escritas são heterogêneas (LOURENÇO apud STREET, 2013, p.4). A partir dos Novos Estudos de Letramentos, apenas para ressaltar aspectos terminológicos que indicam mudanças epistemológicas, o termo letramento passou a ser pluralizado, ou seja, não há apenas um letramento, mas vários tipos ou práticas de letramento, o que consequentemente leva à adjetivação do termo para especificar essas novas formas de práticas letradas, assim, passou-se a falar em letramentos críticos, letramentos acadêmicos, entre outros. (SAITO; SOUZA, 2011, p. 115). Observa-se que o termo letramento pode ou não se diferenciar da alfabetização, a depender de como a aquisição técnica e as práticas sociais de leitura e escrita estão se relacionando. Tanto a aquisição quanto as práticas estão inteiramente relacionadas às constantes mudanças econômicas, políticas e sociais fazendo com que o letramento tenha que ser adaptado para cada situação para alcançar os objetivos desejados. 6 ISSN: 2179‐4901 2.1 Multiletramento As práticas sociais de leitura e escrita tem como características a diversidade cultural e linguística, as quais não podem ser ignoradas no processo formador de pessoas conscientes social, econômica e politicamente. A partir da leitura e escrita consciente é possível problematizar o cotidiano e as relações de poder, numa tentativa de transformar as reflexões feitas sobre o mundo e as pessoas e grupos sociais em que a formação acontece. Atualmente, diante da ampliação de acesso às Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação, surgem novas possibilidades de representação da linguagem (verbal, visual, sonora, gestual), novos gêneros textuais (hipertexto), novas formas de ler e de escrever (vídeo, infográfico, podecast), as quais deram origem ao termo multiletramento (LOURENÇO, 2013, p.1). O conceito de multiletramento difere do conceito de letramentos, pois além de apontar para a multiplicidade das práticas letradas como o letramento já faz, o termo destaca dois tipos específicos de multiplicidade: a multiplicidade cultural das populações e multiplicidade semiótica dos textos pelos quais essas se comunicam. A multiplicidade de culturas vai além da relação binominal culto/inculto, popular/erudito, dando espaço ao hibridismo e às fronteiras. A multiplicidade de linguagens é evidente nos textos contemporâneos, sejam eles revistas, animes ou hipertexto. Convivem no mesmo espaço imagens estáticas e em movimento, linguagem verbal e não verbal, sons e animações variadas. (ROJO, 2012; p.13). A ampliação do acesso às tecnologias digitais com acesso à internet, redes sociais e aplicativos para plataforma móveis fez com que todos os dias e na maior parte do tempo as pessoas sejam expostas a textos de muitas linguagens e que exigem capacidades e práticas de compreensão e produção de cada uma delas (multiletramento) para fazer significar. Roxane Rojo (2012) cita Lemke (2010) mostrando que se precisa ensinar, e compreender, “é como vários letramentos e tradições culturais combinam estas modalidades semióticas diferentes para construir significados que são 7 ISSN: 2179‐4901 mais do que a soma do que cada parte poderia significar separadamente” (LEMKE apud ROJO, 2012, p.20). O termo multiletramento envolve modos de representação que variam de acordo com a cultura e o contexto, sendo mais amplos que apenas a língua. Os novos meios de comunicação criados a partir das TDIC remodelam a maneira como usamos a linguagem, sendo o significado construído de modo cada vez mais multimodal. “Cope e Kalantzis, discutem também, a necessidade de ‘negociar diferenças todos os dias, em nossas comunidades locais e em nossas vidas profissionais e comunitárias cada vez mais globalmente interconectadas’, como uma consequência do aumento da diversidade local e da conectividade global” (COPE; KALANTZIS apud SILVA, 2016, p. 12). Em qualquer dos sentidos da palavra “multiletramento” – no sentido da diversidade cultural de produção e circulação dos textos ou no sentido da diversidade de linguagens que os constituem –, os estudos são recorrentes em apontar para eles algumas características consideradas importantes: eles são interativos; mais que isso, eles são colaborativos; eles fraturam e transgridem as relações de poder estabelecidas, em especial as relações de propriedade (das máquinas, das ferramentas, das ideias, dos textos (verbais ou não)); eles são híbridos, fronteiriços, mestiços (de linguagens, modos, mídias e culturas). (ROJO, 2012, p. 22 e 23). Pode-se perceber que o multiletramento têm a dupla função de incorporar-se à realidade das pessoas envolvidas (diversidade de linguagens que os constitui), num processo de conhecimento de mundo, e em contrapartida de atuar sobre ela (diversidade cultural e de circulação dos textos), refletindo sobre as possibilidades de transformá-la, através de um processo de contínuas ressignificações. Pensar em multiletramentos é adequar-se a essas múltiplas realidades sociais, culturais, históricas em atenção às múltiplas possibilidades de linguagens, ambientes e ferramentas em cada contexto. 8 ISSN: 2179‐4901 3 Por uma Pedagogia dos Multiletramentos A primeira vez que apareceu o termo Pedagogia dos Multiletramentos foi em um manifesto resultante de um colóquio do Grupo de Nova Londres (GNL) em 1996. Um grupo de pesquisadores dos letramentos reuniram-se na cidade de Nova Londres, e por isso o nome do grupo, em Connecticut (USA), após uma semana de discussões, publicaram um manifesto em seu favor intitulado ‘A pedagogy of multiliteracies – Designing social futures’. Neste manifesto, o grupo afirma a necessidade de a escola fazer uso, por isso a utilização do termo “pedagogia”, dos novos letramentos emergentes na sociedade, em sua maioria devidos às TDIC, além de levar em conta e incluir nos currículos a grande variedade de culturas presentes já nas salas de aula e, em sua maioria, caracterizada pela intolerância na convivência com a diversidade cultural (ROJO, 2012, p.12). A Pedagogia dos Multiletramentos reconhece a diversidade linguística e cultural através da dinamicidade da comunicação e a relevância de experimentar, interpretar, questionar, criticar e projetar novos textos pertinentes culturalmente. (DIAS, ARAGÃO, ALOMBA RIBEIRO, 2016, p.106). Os pesquisadores do Grupo Nova Londres afirmaram que para a efetivação da Pedagogia dos Multiletramentos é necessário levar em consideração quatro métodos para que o processo de ensino aprendizagem seja efetivado, são eles: prática situada, instrução aberta, enquadramento crítico e a prática transformada. A prática situada é uma abordagem inicial, onde os envolvidos realizam uma imersão em práticas que fazem parte das culturas do alunado e nos gêneros e designs disponíveis para essas práticas, colocando-as em relação com outras. Para essa imersão é necessário, uma análise sistemática e consciente dessas práticas vivenciadas e desses gêneros e designs familiares ao alunado e de seus processos de produção e de recepção. Feito isso dá-se início ao enquadramento crítico que é tarefa analítica e crítica dos diferentes modos de significação e das diferentes culturas encontrados e seus valores buscando interpretar os contextos sociais e culturais de circulação e produção desses 9 ISSN: 2179‐4901 designs e enunciados. Por fim a produção de uma prática transformadora de onde é possível perceber recepção ou de produção/distribuição do alunado (ROJO, 2012, p.30). Essa nova proposta modifica a antiga forma de ver o alunado, não mais como passivos e meros recipientes, cujo papel consistia em memorizar e reproduzir o que recebiam do professor como verdade única, mas como participantes de forma ativa das mudanças que vem interferindo nos modos de comunicação e na cultura. A Pedagogia dos Multiletramentos visa “o desenvolvimento da capacidade de agência na construção de sentidos, com sensibilidade para as diferenças, mudanças e inovações, o que a faz uma pedagogia mais ‘produtiva, relevante, inovadora, criativa e capaz de transformar a vida” (COPE e KALANTZIS apud SILVA, 2016, p14). Após aplicar essa proposta por cerca de uma década Cope e Kalantzis (2015), as reformula e lançam os quatro novos fatores de processos de aprendizagem na Pedagogia dos Multiletramentos. São eles: experienciamento, conceituação, análise e aplicação. O primeiro elemento, Experienciamento (Experiencing) - denominado Prática Situada no texto seminal -, parte-se sempre do conhecido, do conhecimento pessoal, que é evidência da vida diária do aprendiz, tendo em vista que o conhecimento humano é situado e contextualizado.[...] O segundo elemento, Conceituação (Conceptualizing) - denominado Instrução Explícita, no texto seminal -, envolve definir e aplicar conceitos. [...] A Análise (Analysing), terceiro elemento - denominado Enquadramento Crítico, no texto seminal-, diz respeito à relação de causa e efeito e da razão de ser das coisas. [...] O quarto e último elemento, Aplicação (Applying) - denominado Prática Transformada, no texto seminal -, trata da aplicação “correta” do conhecimento em uma situação típica e ampla no sentido de que, criativamente, o conhecimento é aplicado de forma inovadora ou transferido para uma situação diferente. (COPE; KALANTZIS apud SILVA, 2016, p 14 e 15) Nessa perspectiva, a aprendizagem acontece na relação entre aquele que adquire o conhecimento e aquilo que se pode conhecer, em que o aprendiz descobre que pode realmente aprender e avaliar. Nesse sentido, a pedagogia é eficaz à medida que consegue a aproximação entre o aprendiz e aquilo que se pode aprender. Cope e 10 ISSN: 2179‐4901 Kalantzis definem cultura como “‘a soma total do que nós aprendemos no contexto em que nos tornamos pessoas que aprendem’ e conhecimento como ‘o processo de conectar as coisas da mente com as coisas do mundo’” (COPE; KALANTZIS apud SILVA, 2016, p 15). A decisão de mudança, de acordo com Rojo (2012), foi resultado do confronto com o movimento reacionário de grande relevância presente nos Estados Unidos e Europa Unificada denominado Back to Basics, “os autores julgaram necessário retroceder em suas propostas e substituíram esses quatro “gestos didáticos” pelos já tradicionais “experimentar, conceitualizar, analisar e aplicar” (ROJO, 2012, p.30). Vale salientar que no Brasil as práticas e estudos relacionados à Pedagogia dos Multiletramentos continuaram seguindo a proposta inicial do Grupo Nova Londres, isso por influências de práticas pedagógicas transformadoras como é o caso da proposta de Paulo Freire. Os desafios do Brasil em relação a essa pedagogia e em como implementar uma proposta assim traz à tona, segundo Rojo (2012), alguns questionamentos como o que fazer quanto à formação/remuneração/avaliação de professores; o que mudar (ou não) nos currículos e referenciais; na organização do tempo, do espaço e da divisão disciplinar escolar; na seriação; nas expectativas de aprendizagem ou descritores de “desempenho”; nos materiais e equipamentos disponíveis nas escolas e salas de aula. 4 Educação Não Formal como espaço para prática da pedagogia dos multiletramentos O multiletramento pode ser utilizado em muitos espaços educacionais, neste tópico será apresentado como um ambiente de Educação Não Formal possibilita a utilização da Pedagogia dos Multiletramentos. Não se pode esquecer que ambas tendem a capacitar os indivíduos a uma participação cidadã facilitando o aprendizado de leitura do mundo em que se vive e de suas práticas sociais. 11 ISSN: 2179‐4901 Assim como a Pedagogia dos multiletramentos, a Educação Não Formal é um campo que vem se consolidando desde as últimas décadas do século XX e a explicação para este fato aponta para as mudanças e transformações ocorridas na sociedade neste período, especialmente com a globalização. As Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), de 1996, abriu as portas para a educação não-formal ao definir a educação como “processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais” (LDBEN, 1996, p.1). Para melhor o entendimento do que é a Educação Não Formal é necessário apresentar como se diferencia da educação formal e da educação informal. Em princípios podemos caracterizar a educação formal como aquela desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente demarcados; a educação não formal é aquela que se aprende “no mundo da vida”, via os processos de compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianos; e a educação informal como aquela na qual os indivíduos aprendem durante seu processo de socialização gerada nas relações e relacionamentos intra e extrafamiliares (amigos, escola, religião, clube etc). (GOHN, 2010, p16). A Educação Não Formal não é um processo engessado, pré-fabricado, é construído através da intencionalidade a qual surge das necessidades do grupo em que está sendo trabalhado. Esse ambiente é construído por escolhas ou determinadas condicionalidades, já que o aprendizado não é espontâneo, nem algo naturalizado. “O aprendizado gerado e compartilhado na Educação Não Formal não é espontâneo porque os processos que o produz têm intencionalidades e propostas” (GOHN, 2010, p.16). Sendo assim, a prática educacional é constituída por processos voltados para os interesses e as necessidades dos que participam. Outra característica presente é que não há a necessidade de atender a espaços limitados, regulamentados por lei ou organizados segundo diretrizes nacionais. Na 12 ISSN: 2179‐4901 Educação Não Formal, “os espaços educativos localizam-se em territórios que acompanham as trajetórias de vida dos grupos e indivíduos, fora das escolas, em locais informais, locais onde há processos interativos intencionais” (GOHN, 2010, p.17). A Educação Não Formal tem dentre suas principais características a de não ser organizada por séries/idade/conteúdos, trabalha sobre aspectos subjetivos do grupo, além de atuar na formação social, cultural e política dentro um grupo. Esta última pode- se ser alcançada através da Pedagogia dos Multiletramentos que como já foi falado anteriormente tem entre seus métodos a prática situada, instrução aberta, enquadramento crítico e a prática transformada. A construção de relações sociais baseadas em princípios de igualdade e justiça social, quando apresentes num dado grupo social, fortalece o exercício da cidadania. A transmissão de informações e formação política e sociocultural é uma meta na educação não formal. Ela prepara formando e produzindo saberes nos cidadãos, educa o ser humano para a civilidade, em oposição à barbárie, ao egoísmo, ao individualismo etc. (GOHN, 2010, p.19). Este campo educacional pode desenvolver uma série de processos como resultado, dos quais vale ressaltar a consciência e organização de como agir em grupos coletivos; a construção e reconstrução de concepção(s) de mundo e sobre o mundo; a contribuição para um sentimento de identidade com uma dada comunidade; formar o indivíduo para a vida e suas adversidades; os indivíduos adquirem conhecimento com sua própria prática; os indivíduos aprendem a ler e interpretar o mundo que os cerca; e desenvolve a cultura política do grupo. Os eixos principais da Educação Não Formal são educar para a cidadania e a emancipação social dos indivíduos. Para que isso seja concretizado é necessário que exista intencionalidade. “A intencionalidade não é o único marco diferencial entre a formal e a não formal, porque existe nas duas, mas é ela que demarca um objetivo específico na educação não formal – formar para a cidadania” (GOHN, 2010, p.34). 13 ISSN: 2179‐4901 O processo político-pedagógico de aprendizagem e produção de saberes da Educação Não Formal se aproximam das práticas de multiletramentos em várias dimensões. Observe abaixo algumas propostas por Gohn (2010) tais como:  a aprendizagem de conteúdos que possibilite fazer uma leitura crítica do mundo analisando o que se passa ao seu redor;  a aprendizagem e o exercício de práticas que capacitam para a solução de problemas coletivos cotidianos, quais são os interesses da maioria que devem ser defendidos, transformando-as em práticas cidadãs e emancipatórias;  a aprendizagem pela cultura de conteúdos que possibilitem aos indivíduos fazer uma leitura de mundo do ponto de vista de compreensão do que se passa ao seu redor;  a educação desenvolvida na mídia e pela mídia, em especial as Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação onde são gerados aprendizados, valores, resistências e saberes;  formar não somente para o mercado de trabalho, mas para a vida; Da mesma forma que a Educação Não Formal, a prática socioeducativa da Pedagogia dos Multiletramentos prevê que seus participantes sejam formados para o mundo do trabalho, no contexto de uma sociedade tecnológica e plural, promovendo através das práticas de leitura e escrita o engajamento crítico necessário para que o estudante possa projetar seu futuro social e alcançar o sucesso por meio do trabalho e de sua participação na sociedade. Vale observar que a Educação Não Formal deve ser complementar à educação formal já que a não formal não tem a responsabilidade legal relativa ao ensino e aprendizagem de conteúdos sistemáticos e normativos. A Educação Não Formal busca desenvolver os campos de aprendizagem e saberes para ampliar as possibilidades de relações emancipatórias dentro das práticas sócias valorizando a cultura e o pertencimento à comunidade de seus participantes. Dentro da Educação Não Formal o processo de emancipação é importante e pode ser analisado tanto de forma individual como um processo social que abarca um 14 ISSN: 2179‐4901 conjunto de práticas, ideias e relações quer permeiam a sociedade. “A análise da emancipação remete-nos ao campo dos problemas sociais, dos conflitos, lutas, violência, assim como ao campo dos sonhos, dos desejos, da busca de uma outra sociedade possível” (GOHN, 2010, p.56). A proposta de multiletramento apresentada pelo Grupo Nova Londres também contribui para a caracterização de uma educação emancipatória e libertadora. Isso porque traz para a reflexão pensar o processo de ensino-aprendizagem onde seus participantes estão inseridos em contextos sociais, culturais e políticos permeados pelas TDIC constituído pela linguagem em suas mais diversas modalidades e usos. As práticas emancipatórias/libertadoras estão entrelaçadas na Educação Não Formal reconhecendo os indivíduos como seres humanos, visto que são voltadas à conscientização de seus participantes, que implica: [...]que ultrapassaremos a esfera espontânea de apreensão da realidade, para chegarmos a uma esfera crítica na qual a realidade se dá como objeto cognoscível e no qual o homem assume uma posição epistemológica. A conscientização é neste sentido, um teste de realidade. Quanto mais conscientização, mais se desvela a realidade, mais se penetra na essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-la. Por esta mesma razão, a conscientização não consiste em estar frente à realidade assumindo uma posição falsamente intelectual. A conscientização não pode existir fora das práxis, ou melhor, sem o ato ação-reflexão. Esta unidade dialética constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza os homens. Por isso mesmo, a conscientização é um compromisso histórico. É também consciência histórica: é inserção crítica na história, implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo. (FREIRE, 1979, p.26). Neste sentido a conscientização cria ambientes onde é desenvolvida a cidadania ativa, a qual forma os indivíduos cidadão conscientes de seus direitos e deveres, tornando-se protagonistas das suas próprias história e da história de seu tempo. A Educação Não Formal, assim como a educação formal e informal, de forma geral, deve contribuir para a criação de uma “cultura universal dos direitos humanos, 15 ISSN: 2179‐4901 fortalecimento aos direitos e liberdades fundamentais do ser humano, desenvolvimento de sua personalidade, respeito às diferenças, atitudes de tolerância, amizade, solidariedade e fraternidade com o semelhante” (GOHN, 2010, p.58). Sendo assim, ao utilizar a Pedagogia dos Multiletramentos dentro de um ambiente não formal, ou seja, a partir do momento em que é aliado o conhecimento de vida à conceitos específicos para que se consiga fazer uma leitura de mundo tendo como base na multiplicidade social, cultural, política e econômica, em um ambiente educacional que proporcione a emancipação, resultará na produção da cidadania ativa que é papel chave na Educação Não Formal 5 Considerações Finais O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma análise de como a Educação Não Formal pode ser um ambiente educacional propício para a utilização da Pedagogia dos Multiletramentos. Com a pesquisa foi possível verificar que os objetivos a serem alcançados por cada uma delas apontam para o mesmo caminho: a formação de cidadão mais ativos e conscientes do seu lugar dentro da sociedade. A Pedagogia dos Multiletramentos, no Brasil, tem como como seus pilares a prática situada, instrução aberta, enquadramento crítico e a prática transformada modificando assim, o papel do aluno nas relações de ensino/aprendizagem. Tornam-se mais ativos e participativos nas mudanças que vem intervindo nos modos de comunicação e na cultura gerados pelas Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação. Assim como a Educação Não Formal onde o aluno é peça chave para a sua realização, além da intencionalidade no resultado. Dentro desse formato educacional é alcançado a consciência e organização de se conseguir trabalhar de forma coletiva, criando possibilidade de construção e reconstrução de concepções de mundo e sobre o mundo, sem esquecer da reafirmação da sua própria identidade. Para isso, forma o 16 ISSN: 2179‐4901 indivíduo para a vida e suas adversidades, adquirem conhecimento com sua própria prática, aprendem a ler e interpretar o mundo que os cerca e desenvolvem-se enquanto cidadãos. Diante desse cenário pode-se afirmar que o ambiente educacional não formal se enquadra como propício para a utilização da Pedagogia dos Multiletramentos. É através da leitura crítica da multiplicidade social, cultural, política e econômica do mundo e da sociedade que o aluno alcançará a cidadania e consequentemente a emancipação. Referências BRASIL. Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 20 dez. 1996. Brasília CASTELLS, Manuel (2003). A Galáxia da Internet: Reflexões sobre a Internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. DIAS, Iky Anne; ARAGÃO, Rodrigo Camargo; ALOMBA RIBEIRO, Maria D’Ajuda. Diferentes caminhos para multiletramentos: localidade e temporalidade. Periódico ACTA SEMIOTICA ET LINGVISTICA, v. 19, n.1, p. 102-113, 2016. DIONÍSIO, Maria de Lourdes. Educação e os estudos atuais sobre letramento. Perspectiva, v. 25, n.01, p. 209-224, 2007. GOHN, Maria da Glória. Educação não formal e o educador social: atuação no desenvolvimento de projetos sociais. São Paulo: Cortez, 2010. GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal na pedagogia. 2006 Disponível em: socialhttp://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?pid=MSC0000000092006000100034 &script=sci_arttext D. Acesso em: 12 de outubro de 2017. FREIRE, Paulo. Conscientização – Teoria e Prática da Libertação – Uma Introdução ao Pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Cortez, 1979. _____________. Educação na cidade. São Paulo: Cortez, 1991. LOURENÇO, Daiane da Silva. Reflexões sobre contribuições da teoria dos multiletramentos em aulas de língua inglesa e as (im)possibilidades de aplicação no ensino público. Publicado no VII Encontro de Produção Científica e Tecnologia, Paraná, Outubro de 2013. 17 ISSN: 2179‐4901 SAITO, Fabiano Santos; SOUZA, Patrícia Nora de. (Multi)letramento(s) digital(is): por uma revisão de literatura crítica. Linguagens e diálogos, v. 2, n. 1, p. 109-143, 2011. SILVA, Themis Rondão Barbosa da Costa. Pedagogia dos multiletramentos: principais proposições metodológicas e pesquisas no âmbito nacional. Letras, Santa Maria, v. 26, n. 52, p. 11-23, jan./jun. 2016. ROJO, Roxane. Pedagogia dos multiletramentos: diversidade cultural e de linguagens na escola. In: ROJO, Roxane; MOURA, Eduardo (Orgs.). Multiletramentos na escola. São Paulo: Parábola Editorial, 2012, p. 11-31. 18

Use Quizgecko on...
Browser
Browser