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This document appears to be a study guide or textbook on civil law, focusing on the concept of persons. It includes an index and outlines of various topics within civil law.

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PESSOAS NO CÓDIGO CIVIL ÍNDICE 1. PERSONALIDADE JURÍDICA, CAPACIDADE E LEGITIMAÇÃO....................................5 Personalidade Jurídica...................................................................................

PESSOAS NO CÓDIGO CIVIL ÍNDICE 1. PERSONALIDADE JURÍDICA, CAPACIDADE E LEGITIMAÇÃO....................................5 Personalidade Jurídica....................................................................................................................................................... 5 Capacidade Civil Plena....................................................................................................................................................... 5 Legitimação x Legitimidade.............................................................................................................................................6 2. SUJEITOS............................................................................................................................... 7 Previsão normativa................................................................................................................................................................7 3. INÍCIO DA PERSONALIDADE.............................................................................................8 Nascimento e as Teorias da Personalidade do Nascituro....................................................................................8 Teoria Natalista.......................................................................................................................................................................8 Teoria da Personalidade Condicional............................................................................................................................ 9 Teoria Concepcionista......................................................................................................................................................... 9 4. INCAPACIDADE ABSOLUTA E RELATIVA.....................................................................10 Introdução.............................................................................................................................................................................. 10 Tipos de Incapacidade Civil............................................................................................................................................ 10 Incapacidade Absoluta...................................................................................................................................................... 11 Incapacidade Relativa........................................................................................................................................................12 5. INCAPACIDADE: INDÍGENAS, REPRESENTAÇÃO E ASSISTÊNCIA.........................13 Indígenas................................................................................................................................................................................ 13 Poder Familiar....................................................................................................................................................................... 15 Tutela........................................................................................................................................................................................ 15 Curatela................................................................................................................................................................................... 16 Sistema de Proteção......................................................................................................................................................... 16 6. CESSAÇÃO DA INCAPACIDADE.....................................................................................18 Regra Geral............................................................................................................................................................................18 Emancipação........................................................................................................................................................................18 7. FIM DA PERSONALIDADE: MORTE REAL E COMORIÊNCIA...................................... 20 Morte Real............................................................................................................................................................................. 20 Comoriência......................................................................................................................................................................... 20 8. FIM DA PERSONALIDADE: MORTE CIVIL E MORTE PRESUMIDA............................ 22 Morte Civil...............................................................................................................................................................................22 Morte presumida com declaração de ausência....................................................................................................22 Curadoria................................................................................................................................................................................23 Sucessão provisória...........................................................................................................................................................23 Sucessão definitiva............................................................................................................................................................24 9. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PESSOA NATURAL: NOME.................................................. 25 Proteção Legal.....................................................................................................................................................................25 Alteração de Nome.............................................................................................................................................................26 10. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PESSOA NATURAL: ESTADOS E ATOS DE REGISTRO CIVIL......................................................................................................................................... 29 Estado da Pessoa Natural...............................................................................................................................................29 Estado Civil ou Familiar.....................................................................................................................................................29 Atos de Registro Civil........................................................................................................................................................ 30 11. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PESSOA NATURAL: DOMICÍLIO........................................ 32 Elementos do Domicílio....................................................................................................................................................32 Múltiplos Domicílios e Domicílio Profissional...........................................................................................................32 Domicílio das Pessoas Jurídicas..................................................................................................................................33 Outros tipos de Domicílio.................................................................................................................................................33 Mudança de Domicílio...................................................................................................................................................... 34 12. PESSOAS JURÍDICAS: CONCEITUAÇÃO E CONSTITUIÇÃO.................................. 35 Conceito de Pessoa Jurídica.........................................................................................................................................35 Teorias da Pessoa Jurídica.............................................................................................................................................35 Requisitos para a Formação da Pessoa Jurídica..................................................................................................36 13. PESSOAS JURÍDICAS: CLASSIFICAÇÃO.................................................................. 38 Grupos Despersonalizados............................................................................................................................................ 38 Sociedades Irregulares ou de Fato............................................................................................................................. 38 Pessoas Jurídicas de Direito Privado........................................................................................................................ 38 Associação.............................................................................................................................................................................39 Sociedade...............................................................................................................................................................................39 Fundação.............................................................................................................................................................................. 40 Organizações religiosas................................................................................................................................................... 40 Partidos Políticos................................................................................................................................................................ 40 Empresas Individuais de Responsabilidade Limitada e Sociedades Limitadas Unipessoais.......... 40 14. PESSOAS JURÍDICAS: DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.42 15. PESSOAS JURÍDICAS: EXTINÇÃO..............................................................................44 1. Personalidade Jurídica, Capacidade e Legitimação Personalidade Jurídica Iniciando o estudo sobre pessoas no código civil, faz-se importante abordar o significado de personalidade jurídica e a maneira como este termo é regulado pelo ordenamento jurídico brasileiro. A personalidade jurídica é a soma de caracteres corpóreos e incorpóreos que formam a pessoa natural ou jurídica, configurando-se como um atributo intrínseco ou essencial. Ela é um conceito atrelado à ideia de relações jurídicas existenciais, ou seja, define o que é ou o que não é pessoa. Os animais, por exemplo, não são dotados de personalidade jurídica, mas são considerados bens móveis. Falta à eles esse atributo intrínseco, essa aptidão genérica de ser titular de direitos e deveres. Toda a questão de personalidade deve ser regulada pela lei do país de domicílio da pessoa, segundo a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB): Art. 7º A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família. Capacidade Civil Plena A Capacidade é um conceito que, por muitas vezes, é confundido com a personalidade. Entretanto, existe diferença entre esses dois conceitos! A Capacidade é a projeção da personalidade de determinada pessoa, que pode ser quantificada para definir a aptidão para titularizar direitos, assumir deveres, praticar atos e celebrar negócios jurídicos. Veja, neste novo conceito não há um critério existencial, mas sim uma “medida jurídica” de como a existência da pessoa interage com o universo de direitos e deveres. Existem dois tipos de Capacidade: Capacidade de Direito ou de Gozo: É a ideia mais básica de capacidade, inerente à personalida- de e referente à possibilidade de adquirir direitos e deveres. Presente no art. 1º do CC/02; Capacidade de Fato: Trata-se da possibilidade de exercer os atos da vida civil, configurando-se como um critério para a validade de determinados atos ou negócios jurídicos. Portanto, diz-se que a Capacidade Civil Plena é a junção da Capacidade de Direito com a Capacidade de Fato. Como veremos mais à frente no curso, uma pessoa que possui apenas 5 a capacidade de direito é considerada absolutamente incapaz, já que a sua “medida” de capacidade se restringe ao que é intrínseco à toda pessoa, não alcança os atos da vida civil. Capacidade Civil Plena = Capacidade de Direito + Capacidade de Fato Legitimação x Legitimidade Relacionando-se à capacidade, temos o conceito de legitimação, que é a condição especial para a celebração de determinado ato ou negócio jurídico. Trata-se de uma certa limitação à capacidade que ocorre em situações específicas, onde é necessário o “aval” de outra pessoa para que a vontade inicialmente manifestada seja exercida. Um exemplo de legitimação é a outorga uxória ou marital. Ela é a autorização do cônjuge ao seu respectivo par para realizar um determinado negócio jurídico, como a alienação bens imóveis ou outra medida que cause ônus real em relação a eles. Já a Legitimidade é um conceito que se relaciona com o Direito Processual Civil, onde possui legitimidade aquele que está apto a integrar determinada relação processual (é uma condição da ação). 6 2. Sujeitos Previsão normativa Agora trataremos dos sujeitos da personalidade, elencados no Código Civil: Art. 1º Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil. No caso do ordenamento brasileiro, a existência de personalidade jurídica já pressupõe a capacidade de direito ou de gozo. Portanto, toda pessoa é sujeito da personalidade e alvo de determinada norma (a todo direito deve corresponder um sujeito). OBJETOS DO DIREITO Como mencionado na aula anterior, determinados objetos do direito não são dotados de personalidade e não se incluem como sujeitos. Exemplos: animais, seres inanimados e entidades místicas e metafísicas. AVANÇOS LEGISLATIVOS Vale destacar que o Código Civil e a legislação pertinente passou a adotar o termo “pessoa” ao invés de “homem” em seus dispositivos, refletindo a isonomia constitucional entre gêneros. Por ser um termo mais receptivo e inclusivo, respeita e valoriza o direito à dignidade da pessoa humana, previsto na CF/88. De maneira resumida, essas alterações representam um avanço por acompanhar a sociedade e firmar a ideia de que todos são pertencentes à humanidade em sua mais pura essência - a de ser humano. Importante enfatizar também que os deveres atribuídos aos sujeitos dotados de personalidade não se constituem unicamente de obrigações, mas também se inserem como deveres não obrigacionais. Um exemplo disso é o conjunto de deveres do matrimônio. 7 3. Início da Personalidade Nascimento e as Teorias da Personalidade do Nascituro O artigo 2º do Código Civil prevê não somente que a personalidade começa com o nascimento, mas também que a lei resguardará os direitos do nascituro. Nesse sentido, o nascimento é definido como o momento em que a criança é separada do corpo da mãe, considerando-se o nascimento com vida a partir do primeiro momento em que o bebê tenha respirado. Art. 2 - A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. A partir disso, a discussão a respeito de se o feto aparentemente natimorto (nascido morto) respirou em algum momento pode ter grande relevância para sucessões em que o pai, casado em regime de separação total de bens e de pais vivos, faleceu durante a gestação. Isso se deve ao fato de que, se o feto respirara, mesmo que por alguns instantes, considera-se que ele herdou todos os bens do pai que, por sua vez, com a sua morte passaram integralmente à sua herdeira, sua mãe. Caso contrário, o feto nunca chegou a herdar bem algum e os bens do pai passam integralmente aos seus avós paternos. A outra parte do artigo supracitado tem também grande relevância para as discussões a respeito do nascituro, uma vez que a lei põe seus direitos “a salvo”, dada a suposta iminência da aquisição da personalidade deste. Para definir precisamente atualmente contamos com três grandes teorias que explicam essa situação: as teorias natalista, da personalidade condicional e concepcionista. Teoria Natalista A teoria natalista é a mais aceita pela doutrina tradicional e afirma que a personalidade só começa com o nascimento e, portanto, antes dele não há personalidade, como é o caso do nascituro. Apesar disso, tendo nascido com vida, todos os seus direitos retroagem ao momento de sua concepção. Esta teoria tem como base uma interpretação literal e dita simplista do artigo 2º do Código Civil, uma vez que ao não tratar o nascituro como pessoa acaba tratando-o como coisa. Além disso, essa teoria ignorar todo o sistema de proteção aos direitos do nascituro contido no Código, que se assemelha ao tratamento dado a qualquer pessoa. 8 Teoria da Personalidade Condicional A Teoria da Personalidade Condicional compreende que o nascituro é uma pessoa em potencial, cujos direitos existem apenas em condição suspensiva, ou seja, tem seus direitos garantidos desde que ocorra o nascimento com vida, sem o qual estes direitos não tem eficácia. Entretanto, esta teoria por sua vez também é alvo de críticas, uma vez que conduz ao entendimento de que o nascituro não tem direitos efetivamente falando, apenas a expectativa deles. Outro ponto importante é que consiste num erro chamar o efeito suspensivo dos direitos do nascituro de condição, uma vez que no direito brasileiro toda condição é voluntária, ou seja, jamais é determinada por lei. Teoria Concepcionista Esta consiste numa doutrina moderna que afirma que o nascituro tem personalidade integral desde sua concepção. Esta posição, assim como as outras, tem sido alvo de fortes críticas, uma vez que, mesmo que seja admissível assegurar-lhe alguns direitos, parece forçoso dizer que o nascituro é pessoa. Ademais, outros também afirmam que apesar de ser possível ser “meio” capaz, não é possível ser “meio pessoa” e que existe apenas uma categoria restrita de direitos que dependem do nascimento com vida para se efetivarem: o direitos patrimoniais maternais. Desta feita, apenas alguns poucos direitos do nascituro se efetivariam caso este houvesse: o direito a um nascimento com vida e a uma gestação saudável. Apesar disso, atualmente a corrente a favor da garantia dos direitos do nascituro tem crescido: hoje há farta jurisprudência a respeito, ao passo as grávidas cada vez mais tem acesso ao requerimento de alimentos gravídicos. Por outro lado, um olhar mais atento ao artigo 2º do Código Civil contesta a visão concepcionista, uma vez que o legislador fala claramente de expectativa de direitos, e não de direitos efetivados do nascituro, mesmo que o ECA e a Constituição dê fundamento à pretensão de defender o direito à vida dos nascituros e boas condições de gestação. 9 4. Incapacidade Absoluta e Relativa Introdução A incapacidade é a ausência da capacidade de fato ou de exercício. Todos têm personalidade, mas nem todos são capazes para a prática dos atos da vida civil. Lembre-se! Capacidade é a regra; incapacidade é a exceção. E, por ser excepcional, a Lei prevê taxativamente as hipóteses de incapacidade, geralmente para proteger aquele que não tem discernimento, maturidade ou alguma doença que as tornam vulnerável para a efetivação de seus direitos na esfera civil. Por exemplo, as crianças. Elas não possuem maturidade ou discernimento para a prática dos atos da vida civil, de modo que a Lei lhes fornece proteção através a representação. Tipos de Incapacidade Civil Existem dois tipos de incapacidade civil: a) incapacidade absoluta, na qual o sujeito necessita de estar Representado por pessoa com a capacidade civil plena, e b) incapacidade relativa, que impõem estar o sujeito de direitos Assistido por pessoa com capacidade civil plena. As hipóteses de incapacidade civil absoluta estão dispostas no artigo 3°, enquanto que a incapacidade civil relativa consta no artigo 4°, todos do CC. Atenção! Em 06 de julho de 2015, foi sancionada a Lei n° 13.146/2015, o Estatuto da Pessoa com Deficiência - EPD. Com publicação no dia 07 de julho, a vigência da Lei se deu a partir de janeiro de 2016. O EPD consolida ideais invocados na Convenção de Nova York, tratado internacional de direitos humanos do qual o Brasil é signatário e que operou efeitos no sistema jurídico pátrio com os efeitos de Emenda Constitucional, nos termos do artigo 5°, inciso parágrafo 3º, da CRFB. Em suma, a lei foi editada para fins de inclusão social e efetivação de direitos humanos. As alterações mais substanciais da Lei Nova, no âmbito do Código Civil, deram-se na Teoria das Incapacidades e no Direito de Família. Sobre o tema em estudo, vejamos as mudanças. 10 Redação anterior ao EPD Redação Posterior ao EPD Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I - os menores de dezesseis anos; Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer II - os que, por enfermidade ou deficiência pessoalmente os atos da vida civil os menores de mental, não tiverem o necessário 16 (dezesseis) anos. discernimento para a prática desses atos; III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. Art. 4º. São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: Art. 4º. São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o II - os ébrios habituais e os viciados em tóxicos; discernimento reduzido; III - aqueles que, por causa transitória ou III - os excepcionais, sem desenvolvimento permanente, não puderem exprimir sua vontade; mental completo; IV - os pródigos. IV - os pródigos. Paragrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial. Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial. Incapacidade Absoluta Incapacidade absoluta é a impossibilidade de se realizar, pessoal e diretamente, os atos da vida civil. As práticas desses atos sem representação implicam a nulidade de pleno direito dos atos, independente de comprovação de prejuízo para o incapaz. Isso porque o prejuízo é presumido. Somente são incapazes absolutamente para a prática dos atos da vida civil os menores de 16 anos, determinados menores impúberes, que devem ser representados pelos genitores ou representante legal. A razão de ser da previsão legal é que o legislador entende que, devido a tenra idade, a pessoa ainda não atingiu o necessário discernimento para distinguir o que é permitido ou proibido na ordem privada, ou o que é inofensivo e o que é prejudicial para si própria. 11 Perceba que a antiga previsão do inciso II do artigo 3° (“os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses ato”) deixa de existir na ordem jurídica. A dignidade-vulnerabilidade dá lugar à dignidade-liberdade, e todo e qualquer deficiente mental é capaz para a prática dos atos da vida civil. Ressalta-se, no entanto, a previsão no EPD de algumas modalidades de auxílio ao deficiente, como a Tomada de Decisão Apoiada. Incapacidade Relativa Na incapacidade relativa, por sua vez, as pessoas praticam os atos da vida civil pessoalmente, porém, na companhia de alguém que lhes presta Assistência. A ausência do assistente gera a anulabilidade dos atos praticados pelo relativamente incapaz. Isto é, eles se convalidam se ninguém arguir a validade do negócio. As hipóteses de incapacidade relativa são: a) Menores de 18 anos e maiores de 16; b) Os ébrios habituais e os viciados em tóxicos, ou seja, alcoólatras e toxicômanos; (Destaque para a revogação, através do EPD, da previsão do deficiente mental que tenha discernimento reduzido.) c) Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade. (Trata-se da antiga causa de incapacidade absoluta. Por exemplo, o surdo-mudo que não puder se expressar, o idoso portador de Alzheimer, ou uma pessoa em coma.) d) Os pródigos, sujeitos que dissipam seus bens e patrimônios de forma desordenada e desregrada. (Nesse caso, o curador ficará adstrito aos atos que possam comprometer o patrimônio do interditado, como emprestar dinheiro, transigir, dar quitação, alienação e aquisição de bens, hipotecar e, até mesmo, agir em juízo. Exemplo típico é o viciado em jogatinas.) De modo geral, é importante afirmar que a incapacidade relativa se aplica, sim, aos maiores de Idade. Ocorre que, como a capacidade é a regra, presumida até que se prove o contrário, a incapacidade relativa deve ser decretada pelo juiz. Nessa hipótese, o Juiz nomeará um curador para o relativamente incapaz, delimitando os limites da curatela. Para este caso, embora o EPD tenha previsto uma simples demanda em que é nomeado um curador, o Novo CPC está estruturado na ação de interdição (artigos 747 a 758, do CPC), de modo que se mantém a possibilidade jurídica da Interdição do relativamente incapaz. 12 5. Incapacidade: Indígenas, representação e assistência Indígenas CRÍTICA AO TEMA A Capacidade Civil dos indígenas é regulada em legislação especial, assim como previsto no Código Civil: Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial. Essa limitação é alvo de muitas críticas da doutrina e de instituições e pessoas ligadas à defesa dos direitos dos indígenas. Isso porque a regra de incapacidade é aplicada simplesmente com base em uma diferença cultural, diferenciando-se da ideia central de limitação da capacidade. Os indígenas, segundo os críticos dessa questão, não deveriam ser considerados incapazes, mas apenas culturalmente diferenciados, divergentes do que é considerado um padrão. Portanto, o que é levantado é o debate sobre até que ponto essa diferença cultural interfere realmente na possibilidade de compreensão e expressão da vontade para os atos da vida civil. Tendo essa crítica em mente, passamos para a análise da legislação especial. ANÁLISE DO ESTATUTO DO ÍNDIO Estatuto do Índio - Lei 6.001/73 Art. 1º [...] Parágrafo único. Aos índios e às comunidades indígenas se estende a proteção das leis do País, nos mesmos termos em que se aplicam aos demais brasileiros, resguardados os usos, costumes e tradições indígenas, bem como as condições peculiares reconhecidas nesta Lei. Já no 1º artigo, é possível identificar o objetivo do estatuto de fornecer proteção normativa aos indígenas e preservar seus costumes e tradições. Portanto, a ideia é conseguir criar um ambiente harmônico entre os usos e costumes indígenas e o modo de vida contemporâneo. O dever de proteção é direcionado à União, aos estados e aos municípios de acordo com sua respectiva competência. Dentro do estatuto, existe uma classificação dos indígenas que 13 serve para diferenciar o regime jurídico aplicável à cada um deles e o nível de proteção do Estado a ser fornecida. As classificações do art. 4º são: Indígenas isolados: totalmente alheios ao modo de vida contemporâneo; Indígenas em vias de integração: passando por um processo de integração ao modo de vida contemporâneo; Indígenas integrados: inseridos no modo de vida contemporâneo, considerados perfeitamente aptos a exercer seus direitos na sociedade. Com base nessa classificação, o estatuto impõe o regime tutelar aos indígenas ainda não integrados à comunhão nacional. Neste regime, são aplicáveis os princípios e normas da tutela de direito comum, ou seja, aquela prevista no código civil (a partir do art. 1.728): Art. 7º [...] § 1º Ao regime tutelar estabelecido nesta Lei aplicam-se no que couber, os princípios e normas da tutela de direito comum, independendo, todavia, o exercício da tutela da especialização de bens imóveis em hipoteca legal, bem como da prestação de caução real ou fidejussória. Seguindo a ideia de proteção ao Indígena, o estatuto prevê a nulidade de atos praticados com os sujeitos não integrados, quando inexiste assistência do órgão ou autoridade competente. Vale ressaltar aqui que existe uma excludente, uma exceção: quando o indígena demonstra conhecer o ato e estar consciente do que está realizando, não se aplica a regra de nulidade. Para que o indígena deixe o regime tutelar previsto no estatuto, são exigidos alguns requisitos, previstos no art. 9º: Art. 9º Qualquer índio poderá requerer ao Juiz competente a sua liberação do regime tutelar previsto nesta Lei, investindo-se na plenitude da capacidade civil, desde que preencha os requisitos seguintes: I - idade mínima de 21 anos; II - conhecimento da língua portuguesa; III - habilitação para o exercício de atividade útil, na comunhão nacional; IV - razoável compreensão dos usos e costumes da comunhão nacional. Parágrafo único. O Juiz decidirá após instrução sumária, ouvidos o órgão de assistência ao índio e o Ministério Público, transcrita a sentença concessiva no registro civil. 14 Conseguindo comprovar o cumprimento dos requisitos, o indígena recebe uma declaração formal que o classifica na condição de integrado e apto à celebrar os atos da vida civil. Essa declaração deve ser homologada judicialmente e inscrita no registro civil. Por fim, existe a possibilidade de emancipação por ato do Presidente da República: Art. 11. Mediante decreto do Presidente da República, poderá ser declarada a emancipação da comunidade indígena e de seus membros, quanto ao regime tutelar estabelecido em lei, desde que requerida pela maioria dos membros do grupo e comprovada, em inquérito realizado pelo órgão federal competente, a sua plena integração na comunhão nacional. Parágrafo único. Para os efeitos do disposto neste artigo, exigir-se-á o preenchimento, pelos requerentes, dos requisitos estabelecidos no artigo 9º. COMO SUPRIR A INCAPACIDADE? A Lei prevê as hipóteses de incapacidade absoluta e relativa, mas também fornece mecanismos jurídicos para supri-la. São eles: o poder familiar, a curatela e a tutela. Poder Familiar O poder familiar é o poder exercido pelos pais em relação aos filhos, dentro dos ideais de família democrática, regime de colaboração familiar, de relações baseadas e de afeto principalmente. O instituto é regulado pelos artigos 1.630 e seguintes do Código Civil. Lembre-se de que o poder familiar é exercido pelo pai e pela mãe, juntos ou isoladamente, a não ser quando não haja tais figuras, ou haja duas figuras maternas, duas paternas enfim. Os limites do poder familiar estão dispostos no artigo 1.634, do CC, dentre eles: dirigir a criação e educação dos filhos; conceder ou negar consentimento para casamento e viagem ao exterior; administração de bens, e, nesse caso, os genitores terão usufruto, com exceção das causas previstas no artigo 1.693, do CC. Tudo isto enquanto o menor não for totalmente capaz. Tutela A tutela é um munus público, uma atribuição imposta pelo Estado para atender a interesses públicos e sociais. Nos termos do artigo 1.728, do Código Civil, os filhos serão postos em tutela quando: a) ocorrer o falecimento dos pais ou eles forem julgados ausentes; b) em casos de perda do poder familiar do pai ou da mãe, por castigos imoderados ou outro motivo. 15 Mas tutela não se confunde com representação ou assistência. A tutela é genérica e serve para a administração geral dos interesses da criança ou do adolescente. Já a representação busca atender aos interesses dos menores de 16 anos, e a assistência, dos maiores de 16 e menores de 18 anos. Os poderes dos tutores em relação aos tutelados são menores do que o poder exercido no Poder Familiar. E, ainda que os poderes sejam mais restritos, são divididos naqueles que não precisam da inspeção judicial (artigo 1.740) e aqueles que estão submetidos a supervisão do juiz (artigo 1.741). De modo geral, o primeiro diz respeito aos interesses sociais e educacionais do menor, como direção e educação, providências necessárias defesa dos interesses; enquanto que, no segundo, predominam-se os interesses patrimoniais do tutelado. Curatela A curatela é instituto de direito assistencial para a defesa dos interesses de maiores incapazes. Tendo em vista que a capacidade é a regra, a curatela depende de declaração de incapacidade relativa do pretenso curatelado pelo Juiz competente, com a delegação do munus ao interessado. No mais, à curatela aplicam-se as regras da tutela, com uma exceção: a interdição do pródigo somente restringe os atos que se refiram à administração e disposição de bens. Sistema de Proteção O código, com intuito de proteger aqueles que não têm o discernimento para a prática segura dos atos da vida civil, estabeleceu formas de proteção. Daí surgiram a Representação, a Assistência e outras formas de proteção espalhadas pelo ordenamento. REPRESENTAÇÃO É o instituto inerente aos absolutamente incapazes. Na representação, o incapaz não pratica o ato pessoalmente, de modo que a prática de um ato por um incapaz, que não seja feito por seu representante, caracteriza o ato como nulo de pleno direito, independente da comprovação do prejuízo. A inexigibilidade da comprovação do prejuízo se dá pelo fato do prejuízo ser presumido pela lei. A nulidade, por sua vez, pode ser alegada por qualquer interessado ou reconhecida de ofício pelo Juiz. Será questionada por ação declaratória, sem prazo estipulado por lei, isto é, imprescritivelmente, com efeitos ex tunc (retroativos da data em que foi reconhecida a nulidade, até a data em que foi praticado). Logo, o ato praticado por pessoa absolutamente incapaz cuja nulidade não tenha sido arguida não importa em convalidação. 16 ASSISTÊNCIA É instituto de proteção aos relativamente incapazes que praticam o ato pessoalmente, mas acompanhado por seu assistente. A ausência do assistente na prática do ato importa em anulabilidade. A anulabilidade, diferente da nulidade, somente pode ser alegada pela pessoa prejudicada pelo ato jurídico, e nunca será reconhecida de ofício. O vício é arguido por meio de ação desconstitutiva, em prazo estipulado por Lei, sob pena de convalidação, resultando em sentença com efeito ex nunc (efeitos que operam do reconhecimento da anulabilidade para o futuro). Atenção! O menor de 18 e maior de 16 anos que ocultou dolosamente a sua idade ou declarou-se plenamente capaz quando da contração de uma obrigação não poderá invocar a incapacidade relativa à sua idade para eximir-se da obrigação (artigo 180, do CC). Outras formas de proteção a) Atuação do MP: nos termos do artigo 178, inciso II, do CPC, o MP será intimado para, no prazo de 30 dias, intervir em todas as ações que envolvam interesse de incapaz. b) Inocorrência de prescrição: a prescrição não corre contra os absolutamente incapazes, nos termos do artigo 198, do CC. c) Exigência de autorização do guardião para mútuo: para que o mútuo (grosso modo, empréstimo) seja celebrado junto a pessoa menor, exige-se a autorização daquele sob cuja guarda estiver, nos termos do artigo 588, do CC, sob pena de não poder ser reavido. A hipótese aplica-se somente aos menores de 18 anos, sejam eles absolutamente ou relativamente incapazes. d) Impossibilidade de cobrar ou reaver dívida de jogo: segundo o artigo 814, do CC, “as dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento, mas não se pode recobrar a quantia, que voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por dolo ou se o perdente é menor ou interdito”. e) Impossibilidade de reclamar o que foi pago por ação anulada: o artigo 181 do CC é expresso ao afirmar que ninguém poderá reclamar o que pagou por obrigação anulada, salvo se comprovar que a importância reverteu-se em proveito do incapaz. 17 6. Cessação da Incapacidade Regra Geral A incapacidade, em regra, cessa-se aos 18 anos completos, nos termos do artigo 5º, do CC. Ausentes quaisquer hipóteses do artigo 4º, o menor que atinge a maioridade completa obtém a capacidade civil plena. No entanto, a lei prevê casos em que, mesmo ainda menor, a pessoa passa a ser plenamente capaz para os atos da vida civil. Trata-se do instituto da emancipação. Atenção! Embora a lei não trate expressamente dos casos de incapacidade relativa que não decorrem da verificação da idade, é evidente que a incapacidade permanecerá enquanto a sua causa não cessar. Exemplo: superado o vício em tóxicos ou álcool; desaparecimento da causa transitória que impedia a pessoa de exprimir sua vontade. Emancipação A emancipação é o ato jurídico que antecipa os efeitos da maioridade civil e da capacidade civil plena. O menor que tem entre 16 e 18 anos pode adquirir a capacidade plena antes da maioridade civil. Em regra, a emancipação é definitiva, irretratável e irrevogável, salvo por sentença que desconstitua o ato por vício de vontade (erro ou dolo). A Lei dispõe sobre três espécies de emancipação: a) Emancipação voluntária: é aquela concedida pelos pais, ou um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independente de homologação judicial (artigo 5º, parágrafo único, inciso I, primeira parte, do CC). A emancipação voluntária ficará registrada no Cartório de Registro de Pessoas, em razão da imposição legal pela formalidade do ato. b) Emancipação judicial: é aquela concedida pelo Juiz, a pedido do adolescente relativamente incapaz, ouvido o tutor e o MP. c) Emancipação legal: são hipóteses que ocorrem de pleno direito, por imposição legal. Nestas hipóteses, a lei considera que determinado acontecimento na vida do relativamente incapaz demonstra o discernimento dele para a prática dos atos da vida civil São elas: 18 I) o casamento; II) conquista de emprego público efetivo, não bastando o temporário; III) colação de grau em curso superior, e IV) pela conquista da independência econômica, sejam por relação de emprego ou por estabelecimento civil ou comercial (empresário). Embora autoexplicativas, algumas ressalvas devem ser feitas. As hipóteses de emancipação legal independem de contrato público ou de homologação judicial, bastando a ocorrência do fato. Ocorre que algumas delas dificilmente operam-se na prática. A emancipação legal por exercício de emprego público efetivo, como a própria letra da lei impõe, afasta as hipóteses de serviços temporários ou cargos comissionados. No entanto, a maioria dos editais de concursos públicos exigem que o candidato tenha 18 anos completos. A emancipação legal por colação de grau em curso superior reconhecido também dificilmente se opera. Isso porque, em regra, a pessoa precisa ter completado o ensino médio e cursado todos os anos da faculdade, e ainda ser menor de 18 anos. Para os fins da emancipação legal por economia própria, basta que o relativamente incapaz perceba um salário mínimo. 19 7. Fim da Personalidade: Morte Real e Comoriência Morte Real O fim da personalidade da pessoa natural se dá pela morte, nos termos do artigo 6°, primeira parte, do Código Civil, o qual expressa “a existência da pessoa natural termina com a morte”. Em regra, com o fim da personalidade jurídica, o falecido deixa de ser sujeito de direitos e deveres. Existem direitos que excepcionalmente perduram após a morte, diante da possibilidade de os lesados indiretos pleitearem indenização por lesão à honra ou imagem do de cujus, bem como os direitos autorais. A legislação exige a morte real da pessoa, que se dá com a morte cerebral (ou morte encefálica), constatada com a parada das atividades cerebrais da pessoa. Este é o entendimento extraído do artigo 3°, da Lei n° 9.434/1997. Para tanto, é necessário laudo médico constatando a morte encefálica, visando à elaboração do atestado de óbito no Cartório de Registro de Pessoas Naturais. A ausência do Atestado de Óbito impede que haja qualquer sepultamento, nos termos do artigo 77 da Lei de Registros Públicos. Com a extinção da personalidade, inúmeros reflexos jurídicos são percebidos. Vejamos alguns deles. a) Dissolução do vínculo conjugal e do regime de bens; b) Extinção do poder familiar e do direito a receber e dever de prestar alimentos; c) Extinção de obrigações personalíssimas, que são aquelas que somente podem ser cumpridas pelo devedor da obrigação; d) Extinção da punibilidade na esfera penal; Acontece que a morte encefálica somente pode ser atestada quando há prova material, isto é, o corpo da pessoa, objeto do laudo médico. Comoriência O Código Civil, em seu artigo 8°, trata da Comoriência. A definição de comoriência consta do caput do artigo. Vejamos. Art. 8° Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos. 20 Por mesma ocasião da morte, entende-se que ela deve ter ocorrido precisamente no mesmo espaço temporal, não necessariamente no mesmo local. Exemplo: em um acidente automobilístico, A e B falecem. Um policial constata, no entanto, que A sobreviveu alguns segundos a mais que B. Nessa hipótese, não havendo laudo pericial que confirme tal hipótese, A e B serão considerados comorientes. Tal instituto importa ao direito no que se diz respeito a casos em que os indivíduos mortos são ligados por vínculos sucessórios. Casos em que a ordem do falecimento faria a diferença para fins de herança. A importância de Laudo Médico, ou outra prova efetiva e precisa que seja capaz de atestar com certeza que um viveu a mais que outro, se dá pelo fato de que há presunção relativa (iuris tantum) da comoriência. A jurisprudência é uníssona no sentido de que, mantida dúvida ou não sendo precisa a prova, presume-se a comoriência. 21 8. Fim da Personalidade: Morte Civil e Morte Presumida Morte Civil Antigamente, existia o instituto da Morte Civil, que acontece quando uma pessoa continua realmente viva, mas, para fins legais, é tratada como “coisa”, inapta a ter direitos e deveres, em razão de algum ato previsto e estipulado em lei. No ordenamento pátrio, não se admite a Morte Civil. Embora para o direito Brasileiro somente seja aceita a morte real ou presumida, existem alguns resquícios da ideia de Morte Civil. Por exemplo, os artigos 1.814 e seguintes do CC, que, ao tratar da exclusão da herança da indignidade, considera o herdeiro indigno como morto no momento da abertura da sucessão. Para todos os demais efeitos jurídicos, no entanto, ele permanece com os caracteres da personalidade jurídica intactos. Morte presumida com declaração de ausência A outra hipótese de morte presumida decorre do desaparecimento da pessoa natural sem deixar o corpo presente. A ausência se dá nas hipóteses de inexistência ou incerteza de morte, desde que a pessoa esteja em local incerto e não sabido, não havendo indícios das razões do desaparecimento. Trata-se presunção relativa, aceitando-se prova em contrário, a depender de decisão judicial declaratória de ausência (ação judicial declaratória). A ação, no entanto, precisa cumprir os requisitos dos artigos 22 e 23, sendo que o principal objetivo da declaração de ausência é a curadoria e divisão de bens. Assim, são necessários: a) constância de bens; b) que o ausente não tenha deixado representante ou procurador a quem caiba a administração dos bens, ou tenha deixado mandatário que não queira ou não possa exercer ou continuar o mandato ou ainda que tenha poderes insuficientes, e c) que haja requerimento de interessado ou do MP. Fases da declaração de ausência A declaração de ausência divide-se em três principais fases: a) Curadoria (artigos 22 a 25); b) Sucessão Provisória (artigos 26 a 36), e 22 c) Sucessão Definitiva (artigos 37 a 39). Curadoria Tendo o ausente deixado bens, após provocação do interessado ou do MP (e não havendo prova em contrário), o juiz declarará a ausência da pessoa e nomeará curador para administrar os bens do declarado ausente. Atenção! O ausente não é incapaz, embora haja um curador para tutelar seus interesses. Trata-se de inovação legislativa trazida pelo Código Civil de 2002, já que o ausente era tratado como absolutamente incapaz pelo CC/1916. Quem pode ser curador do ausente? Será o cônjuge do ausente, preferencialmente, desde que não esteja separado judicialmente ou de fato por mais de 2 anos antes da declaração de ausência. Não havendo cônjuge, serão os pais ou os descendentes do ausente, nesta ordem, sendo que os mais próximos precedem os mais remotos. E, por fim, não havendo qualquer destes, o juiz nomeará outra pessoa à sua escolha. O juiz também arrecadará os bens do ausente e publicará editais, onde permanecerão pelo prazo de um ano. Sucessão provisória Decorrido um ano da arrecadação de bens e da correspondente nomeação de curador, se deixado representante ou mandatário, decorridos três anos, poderá ser aberta sucessão provisória mediante pedido formulado pelos interessados ou, na ausência destes, pelo MP. Quem são os interessados? A resposta está no artigo 27, do CC: Art. 27. Para o efeito previsto no artigo anterior, somente se consideram interessados: I - o cônjuge não separado judicialmente; II - os herdeiros presumidos, legítimos ou testamentários; III - os que tiverem sobre os bens do ausente direito dependente de sua morte; IV - os credores de obrigações vencidas e não pagas. Sabe-se que a ausência conta com presunção somente relativa e que é possível que o ausente retorne ou que se encontrem provas de que ele esteja vivo. Não por outro motivo (com exceção dos descendentes, ascendentes e cônjuge), demais herdeiros precisam oferecer garantia equivalente ao quinhão de que tem direito. 23 Nessa fase, pode acontecer de o ausente retornar ou ser-lhe provada a existência, oportunidade em que cessarão todas as vantagens conferidas aos sucessores, sendo estes obrigados a tomar as medidas assecuratórias até a entrega do bem. Sucessão definitiva Provado o falecimento do ausente ou se dele não mais se tiver notícias, decorridos 10 anos da sucessão provisória, abrir-se-á a sucessão definitiva. Atenção para o fato de que, se o ausente contar com mais de 80 anos, o prazo entre a sucessão provisória e definitiva cai para 05 anos. Caso o ausente regresse, nesse tempo, reclamará os bens existentes e no estado em que se acharem, os sub-rogados em seus lugares ou o preço que os herdeiros houverem recebido pelos bens depois daquele tempo. Morte presumida sem declaração de ausência. Quando não for encontrado corpo do falecido para ser periciado, faz-se necessária a Justificação Judicial para se declarar a morte presumida sem declaração de ausência. As hipóteses de morte presumida sem declaração de ausência constam do artigo 7°, do CC e no artigo 88, da Lei de Registros Públicos. Art. 7º Pode ser declarada a morte presumida, sem decretação de ausência: I - se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida; II - se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra. Atenção! A declaração de morte presumida sem declaração de ausência somente pode ser requerida após esgotadas todas as buscas e averiguações. Curiosidade! A Lei n° 9.140/95 reconhece como falecidas as pessoas desaparecidas em razão de participação ou acusação de participação em atividades políticas no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979 (ditadura militar). 24 9. Individualização da Pessoa Natural: Nome Proteção Legal O nome é um aspecto da personalidade protegido em todos os seus elementos, quais sejam: Prenome: O primeiro nome de cada pessoa. Ex: Cárita, Roberto, Mariana, Ederson. Sobrenome, nome, apelido, patronímico ou nome de família: Refere-se às nomenclaturas adquiridas por meio de filiação familiar, advindas de ascendentes ou cônjuges. Ex: Carizzi, Andrade, Cestari, Rodrigues. Partícula: Conexão ou junção entre dois outros elementos presentes no nome. Ex: da, dos, de. Agnome: Indicativo de relação com outro membro da família. Ex: Júnior, Filho, Neto. ALCUNHA NOTÓRIA OU HIPOCORÍSTICO Aqui, vale observar que existe também o “apelido” em sentido informal ou moderno, que refere-se à uma maneira tanto íntima como popular para se direcionar à pessoa. O nome técnico adequado para o “apelido” é alcunha ou cognome. Nesse caso, existe proteção legal para o hipocorístico: alcunha notória ou pública que acaba por identificar o sujeito na sociedade de maneira mais efetiva ou certa do que o seu próprio nome. Tal proteção está fundada no art. 58 da Lei de Registros Públicos (6.015/73) e na ideia de que o hipocorístico elenca materialmente um elemento do nome, sendo abarcado pela tutela do Código Civil. Art. 17. O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória. Observe que a proteção ao nome se dá com uma preocupação especial à exposição pública pessoa, por isso a alcunha notória está incluída, já que pode ser utilizada para a difamação do sujeito. PROPAGANDA COMERCIAL No entendimento doutrinário majoritário, a simples utilização indevida do nome já transgride a regra contida neste artigo. O art. 18 amplia a proteção enfatizando a vedação ao uso do nome alheio em propaganda comercial: Art. 18. Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial. 25 Neste sentido, ainda, vale citar o Enunciado 278 da IV Jornada de Direito Civil, que aborda as situações em que, sem autorização da pessoa, um “sósia” é utilizado para propagandas : A publicidade que divulgar, sem autorização, qualidades inerentes a determinada pessoa, ainda que sem mencionar seu nome, mas sendo capaz de identificá-la, constitui violação a direito da personalidade. PSEUDÔNIMO Está sob proteção legal também o pseudônimo, que é um nome fictício utilizado por determinados autores que não desejam se identificar em suas obras artísticas, literárias ou científicas. Exemplo: Lemony Snicket, pseudônimo do escritor Daniel Handler. Neste aspecto entra também a alcunha quando utilizada como nome artístico, voltado especificamente para a exposição ao público. Exemplo: Xuxa. Como mencionado anteriormente, é no art. 58 da Lei de Registros Públicos que está regulada a adoção do nome artístico: Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicos notórios. Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em razão de fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime, por determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o Ministério Público. Alteração de Nome Apesar de se tratar de algo intríseco à pessoa e tutelado pelo ordenamento jurídico, o nome pode ser alterado. A Lei nº 14.382/22 trouxe alterações significativas para a Lei de Registros Públicos, facilitando e simplificando a alteração do nome: Art. 56. A pessoa registrada poderá, após ter atingido a maioridade civil, requerer pessoalmente e imotivadamente a alteração de seu prenome, independentemente de decisão judicial, e a alteração será averbada e publicada em meio eletrônico. (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022) §1º A alteração imotivada de prenome poderá ser feita na via extrajudicial apenas 1 (uma) vez, e sua desconstituição dependerá de sentença judicial. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022) §2º A averbação de alteração de prenome conterá, obrigatoriamente, o prenome anterior, os números de documento de identidade, de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, de passaporte e de título de eleitor do registrado, dados esses que deverão constar expressamente de todas as certidões solicitadas. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022) 26 §3º Finalizado o procedimento de alteração no assento, o ofício de registro civil de pessoas naturais no qual se processou a alteração, a expensas do requerente, comunicará o ato oficialmente aos órgãos expedidores do documento de identidade, do CPF e do passaporte, bem como ao Tribunal Superior Eleitoral, preferencialmente por meio eletrônico. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022) §4º Se suspeitar de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade ou simulação quanto à real intenção da pessoa requerente, o oficial de registro civil fundamentadamente recusará a retificação. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022) Assim, atualmente é possível a alteração do nome após os 18 anos, sem prazo decadencial de 1 ano. Ela será feita de forma extrajudicial e imotivada. Importante dizer que essa modificação só poderá ser realizada uma vez. Se for necessário alterar novamente, ou houver arrependimento, deve-se ingressar com ação judicial (§1º). A averbação deve conter o prenome anterior, RG, CPF, passaporte e título de eleitor do requerente (§2º). O próprio Registro Civil comunicará os órgãos que expedem os documentos de identificação, de preferência por meio eletrônico, e às custas do requerente (§3º). Se o oficial, fundamentadamente, suspeitar de fraude, má-fé, falsidade, simulação ou vício de vontade, recusará realizar a alteração (§4º). Veja a diferença entre as disposições antes e depois da Lei nº 14.382/22: Antes da Lei nº 14.382/22 Após a Lei nº 14.382/22 Possível a alteração do prenome entre 18 Possível a alteração do nome ou prenome após e 19 anos os 18 anos, sem prazo decadencial De forma extrajudicial e imotivada. Se após o prazo, apenas motivadamente e por De forma extrajudicial e imotivada, apenas 1 vez. pedido judicial (Art.57, LRP). Art. 57. A alteração posterior de sobrenomes poderá ser requerida pessoalmente perante o oficial de registro civil, com a apresentação de certidões e de documentos necessários, e será averbada nos assentos de nascimento e casamento, independentemente de autorização judicial, a fim de: (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022) I - inclusão de sobrenomes familiares; (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022) II - inclusão ou exclusão de sobrenome do cônjuge, na constância do casamento; (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022) III - exclusão de sobrenome do ex-cônjuge, após a dissolução da sociedade conjugal, por qualquer de suas causas; (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022) 27 IV - inclusão e exclusão de sobrenomes em razão de alteração das relações de filiação, inclusive para os descendentes, cônjuge ou companheiro da pessoa que teve seu estado alterado. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022) §1º Poderá, também, ser averbado, nos mesmos termos, o nome abreviado, usado como firma comercial registrada ou em qualquer atividade profissional. (Incluído pela Lei nº 6.216, de 1975). §2º Os conviventes em união estável devidamente registrada no registro civil de pessoas naturais poderão requerer a inclusão de sobrenome de seu companheiro, a qualquer tempo, bem como alterar seus sobrenomes nas mesmas hipóteses previstas para as pessoas casadas. (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022) §3º (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022) §3º-A O retorno ao nome de solteiro ou de solteira do companheiro ou da companheira será realizado por meio da averbação da extinção de união estável em seu registro. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022) §4º (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022) §5º (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022) §6º (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022) §7º Quando a alteração de nome for concedida em razão de fundada coação ou ameaça decorrente de colaboração com a apuração de crime, o juiz competente determinará que haja a averbação no registro de origem de menção da existência de sentença concessiva da alteração, sem a averbação do nome alterado, que somente poderá ser procedida mediante determinação posterior, que levará em consideração a cessação da coação ou ameaça que deu causa à alteração. (Incluído pela Lei nº 9.807, de 1999) §8º O enteado ou a enteada, se houver motivo justificável, poderá requerer ao oficial de registro civil que, nos registros de nascimento e de casamento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus sobrenomes de família. (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022). O art.57 da LRP também sofreu alterações com a Lei nº 14.382/22. A alteração do sobrenome passou a ser possível se requerida pessoalmente, acompanhada das certidões e outros documentos necessários. Ela será averbada nos registros de nascimento e casamento, independentemente de autorização judicial. As hipóteses de exclusão/inclusão de sobrenome estão nos incisos do mesmo artigo. Ponto relevante é o trazido pelo art.57, §8º que decorre da Lei Clodovil. Antes das modificações da Lei nº 14.382/22, para inserir o sobrenome da madrasta/padrasto no registro de nascimento, era necessário requerer ao juiz e ter motivo ponderável. A nova redação admite o requerimento no próprio registro civil, para inclusão nos registros de nascimento e casamento, havendo motivo justificável. 28 10. Individualização da Pessoa Natural: Estados e Atos de Registro Civil Estado da Pessoa Natural O estado da pessoa natural pode ser analisado de diferentes perspectivas, a depender do que se busca entender ou fazer em um caso concreto. ESTADO POLÍTICO Refere-se a situação quanto à relação do sujeito com a nação, podendo ser classificado como nacional (nato ou naturalizado) ou estrangeiro. ESTADO PROFISSIONAL Refere-se a existência de atuação econômica da pessoa natural no exercício de diferentes atividades. Portanto, a pessoa pode ser empregada, desempregada, trabalhadora autônoma, servidora, etc. ESTADO INDIVIDUAL Refere-se aos aspectos e peculiaridades do indivíduo, como idade, estado psíquico, saúde e imagem. ESTADO FAMILIAR Refere-se a situação da pessoa no âmbito de constituição de uma família. Também conhecido como “Estado Civil”, será abordado com maiores detalhes a seguir. Estado Civil ou Familiar Dentro do espectro de análise do estado familiar da pessoa, existem as seguintes possibilidades: Solteiro Casado Viúvo Divorciado Separado Juridicamente Após o casamento, a pessoa não volta a ser solteira, mas assume um dos demais estados civis apresentados. As pessoas em união estável (companheiros ou coniventes) não possuem um estado civil próprio, apesar de configurarem um instituo familiar reconhecido constitucionalmente e pela jurisprudência do STF. 29 AÇÕES DE ESTADO Dentro desse tema, existem ações que são voltadas especificamente para a alteração do estado civil das pessoas ou o reconhecimento de determinado estado. Geralmente o objetivo é evidenciar um certo estado civil para produzir os seus efeitos legais. Exemplo: o divórcio altera o estado civil de “casado” para “divorciado” e pode levar à partilha de bens. São exemplos de ações de estado: Divórcio Nulidade de casamento Investigação de paternidade Negatória de paternidade Ação de alimentos Atos de Registro Civil Alguns atos relacionados à pessoa devem ser registrados publicamente para produzir adequadamente seus efeitos. A importância aqui está em garantir que os direitos e deveres sejam devidamente observados. Por exemplo, para que a personalidade seja devidamente atribuída à pessoa é necessário que ela tenha sido registrada como nascida. Ela já tem a personalidade desde o nascimento com vida, mas tal nascimento deve ser registrado para dar maior efetividade a esse ato. Art. 9º Serão registrados em registro público: I - os nascimentos, casamentos e óbitos; II - a emancipação por outorga dos pais ou por sentença do juiz; III - a interdição por incapacidade absoluta ou relativa; IV - a sentença declaratória de ausência e de morte presumida. AVERBAÇÃO Para determinados atos, faz-se necessária a averbação (uma espécie de adição) aos registros públicos, para que tenham efetividade. Um divórcio, por exemplo, não possui certidão própria, mas a sentença que decreta o divórcio é averbada na certidão de casamento, dando efetividade à mudança de estado civil. 30 Art. 10. Far-se-á averbação em registro público: I - das sentenças que decretarem a nulidade ou anulação do casamento, o divórcio, a separação judicial e o restabelecimento da sociedade conjugal; II - dos atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação; REGISTROS DE BRASILEIROS NO EXTERIOR Existe também a previsão da possibilidade de registro de atos para brasileiros que se encontram em outros países, evitando um cerceamento de direitos em função da localização do sujeito. Art. 18. Tratando-se de brasileiros, são competentes as autoridades consulares brasileiras para lhes celebrar o casamento e os mais atos de Registro Civil e de tabelionato, inclusive o registro de nascimento e de óbito dos filhos de brasileiro ou brasileira nascido no país da sede do Consulado. § 1º As autoridades consulares brasileiras também poderão celebrar a separação consensual e o divórcio consensual de brasileiros, não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, devendo constar da respectiva escritura pública as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento. § 2º É indispensável a assistência de advogado, devidamente constituído, que se dará mediante a subscrição de petição, juntamente com ambas as partes, ou com apenas uma delas, caso a outra constitua advogado próprio, não se fazendo necessário que a assinatura do advogado conste da escritura pública. 31 11. Individualização da Pessoa Natural: Domicílio Elementos do Domicílio O Código Civil (art. 70) define o domicílio como o lugar onde a pessoa estabelece a sua residência com ânimo definitivo. Deste conceito é possível extrair dois elementos principais do domicílio: Elemento Objetivo: estabelecimento da pessoa, local físico em que ela reside. Elemento Subjetivo: ânimo ou vontade de permanência. O conceito de domicílio possui uma relevância jurídica maior, visto que é utilizado como critério para muitos institutos no Direito (citação, foro, lei aplicável, etc.). Portanto, podemos dizer que o domicílio é o lugar onde a pessoa pode ser encontrada para efeitos jurídicos. A residência é simplesmente o local físico onde a pessoa reside, vive com habitualidade. É comum que a residência da pessoa seja o seu domicílio, mas não é uma situação necessária. Exemplo: o local de trabalho é domicílio para determinadas relações jurídicas, mesmo que a pessoa não resida neste lugar. DOMICÍLIO X HABITAÇÃO OU MORADIA Importante diferenciar o domicílio da pessoa da sua habitação ou moradia. Este último conceito se refere ao local onde a pessoa é encontrada, de modo eventual, não correspondendo sempre à sua residência ou domicílio. Logo, pode se referir à um local em que a pessoa permanece por alguns dias a trabalho eventualmente. Múltiplos Domicílios e Domicílio Profissional No art. 71 do Código, temos a previsão da multiplicidade de domicílios: Art. 71. Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer delas. O domicílio profissional é o local onde a pessoa exerce sua profissão constantemente, com habitualidade: 32 Art. 72. É também domicílio da pessoa natural, quanto às relações concernentes à profissão, o lugar onde esta é exercida. Parágrafo único. Se a pessoa exercitar profissão em lugares diversos, cada um deles constituirá domicílio para as relações que lhe corresponderem. PESSOA SEM RESIDÊNCIA HABITUAL Art. 73. Ter-se-á por domicílio da pessoa natural, que não tenha residência habitual, o lugar onde for encontrada. Domicílio das Pessoas Jurídicas Quanto aos entes federativos: Art. 75. Quanto às pessoas jurídicas, o domicílio é: I - da União, o Distrito Federal; II - dos Estados e Territórios, as respectivas capitais; III - do Município, o lugar onde funcione a administração municipal; No que tange às demais pessoas jurídicas: IV - das demais pessoas jurídicas, o lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações, ou onde elegerem domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos. §1º Tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos nele praticados. §2º Se a administração, ou diretoria, tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica, no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no Brasil, a que ela corresponder. Outros tipos de Domicílio DOMICÍLIO NECESSÁRIO Art. 76. Têm domicílio necessário o incapaz, o servidor público, o militar, o marítimo e o preso. Parágrafo único. O domicílio do incapaz é o do seu representante ou assistente; o do servidor público, o lugar em que exercer permanentemente suas funções; o do militar, onde servir, e, sendo da Marinha ou da Aeronáutica, a sede do comando a que se encontrar imediatamente subordinado; o do marítimo, onde o navio estiver matriculado; e o do preso, o lugar em que cumprir a sentença. 33 DOMICÍLIO DIPLOMÁTICO Art. 77. O agente diplomático do Brasil, que, citado no estrangeiro, alegar extraterritorialidade sem designar onde tem, no país, o seu domicílio, poderá ser demandado no Distrito Federal ou no último ponto do território brasileiro onde o teve. DOMICÍLIO CONTRATUAL OU CONVENCIONAL Art. 78. Nos contratos escritos, poderão os contratantes especificar domicílio onde se exercitem e cumpram os direitos e obrigações deles resultantes. Mudança de Domicílio Art. 74. Muda-se o domicílio, transferindo a residência, com a intenção manifesta de o mudar. Parágrafo único. A prova da intenção resultará do que declarar a pessoa às municipalidades dos lugares, que deixa, e para onde vai, ou, se tais declarações não fizer, da própria mudança, com as circunstâncias que a acompanharem. 34 12. Pessoas Jurídicas: Conceituação e Constituição Conceito de Pessoa Jurídica A pessoa jurídica aparece no direito como uma forma de dar personalidade a grupos de pessoas que se unem em torno de uma atividade e têm um objetivo em comum e, principalmente, para distinguir a personalidade do grupo daquela dos seus integrantes. Isso é importante para diferenciar o patrimônio da pessoa jurídica e de seus integrantes, o que será relevante, por exemplo, caso os bens da pessoa jurídica sejam penhorados pois, via de regra, os bens dos seus integrantes não podem ser penhorados para a quitação de dívida da pessoa jurídica. Teorias da Pessoa Jurídica Existem diversas teorias a respeito da pessoa jurídica, desde aquelas que negam sua existência (teorias negativistas) como aquelas, em maior número, que a afirmam (teorias afirmativas). As segundas, por sua vez, se dividem em teorias da ficção e teorias da realidade. A respeito das teorias da ficção, existem a teorias da ficção legal e a teoria da ficção doutrinária. A primeira foi criada por Savigny e diz que uma pessoa jurídica, em tese, não poderia ser sujeito em uma relação jurídica, uma vez que não pode ser titular de direitos e deveres. Para tanto, a legislação teria criado uma ficção para que a pessoa jurídica pudesse sê-lo para fins patrimoniais, transformando-a em algo palpável para o ordenamento jurídico. A outra teoria da ficção, a teoria da ficção doutrinária, trata-se de uma variação da teoria anterior, uma vez que atribui à doutrina o papel de criação da pessoa jurídica, diferentemente da outra que o faz à legislação. Desse modo, a pessoa jurídica não seria um dado da realidade, pois existiria somente na imaginação dos doutrinadores e na inteligência dos juristas. Por outro lado, as chamadas teorias da realidade defendem que as pessoas jurídicas existem de fato, ou seja, não são uma mera criação intelectual dos juristas ou da legislação a fim de resolver problemas, elas têm existência própria e atuam no mundo jurídico como a pessoa natural. Neste ramo se encontram a teoria da realidade objetiva, a teoria da realidade orgânica e a teoria da realidade técnica. A teoria da realidade objetiva ou orgânica prevê que a existência da pessoa jurídica tem fundamento sociológico, o que quer dizer que a pessoa jurídica nasce a partir da vontade, pública ou privada, que é capaz de dar origem a um ser com vida própria que se distingue de seus integrantes e, portanto, torna-se um verdadeiro sujeito de direitos e deveres. Esta teoria, no entanto, apresenta problemas, uma vez que ela não chega a detalhar como se dá o fundamento para um grupo social adquirir personalidade jurídica e se tornar um sujeito de direitos e deveres. A segunda teoria é a chamada teoria da realidade jurídica. Ela enuncia que o fundamento da existência da pessoa jurídica está nas relações sociais que existem entre os integrantes dela, as quais têm vistas a um fim comum que é uma atividade socialmente útil. Assim como a 35 anterior, esta teoria também recebe críticas, já que ela não explica como se justifica as pessoas jurídicas sem finalidade de prestar um serviço ou como se constitui uma organização cujo surgimento se dá essencialmente pela vontade de seu fundador, como é o caso da fundação. Por fim, a teoria da realidade técnica diz que a existência e a personalidade das pessoas jurídicas é meramente convencional, ou seja, a legislação institui assim porque o Estado e a sociedade perceberam que a separação entre indivíduo e a organização de que participa era a melhor forma de organizar muitas instituições. Entretanto, mesmo sendo considerada a teoria mais precisa atualmente a respeito do assunto, o que a levou a ser adotada inclusive pelo Código Civil brasileiro, ela é criticada por não buscar um fundamento material para existência da pessoa jurídica, satisfazendo-se com categorias técnicas e fundamentos positivistas para explicar o fenômeno. Requisitos para a Formação da Pessoa Jurídica Formalmente, considera-se que existem uma série de requisitos para poder criar uma pessoa jurídica. São eles a existência de várias pessoas ou bens, além de uma finalidade específica (elementos materiais) e um ato constitutivo acompanhado do registro no órgão competente. VONTADE HUMANA CRIADORA Para a constituição de uma pessoa jurídica, um requisito básico e essencial é que existam pessoas naturais interessadas na fundação de uma instituição a fim de atingir um objetivo comum (affectio societatis). ATO CONSTITUTIVO DEVIDAMENTE REGISTRADO O ato constitutivo pode ser de três naturezas: o estatuto (associações), o contrato social (sociedades) e a escritura pública ou testamento (fundações). Este ato constitutivo, entretanto, não pode ser considerado como o nascimento da pessoa jurídica, uma vez que a ela só pode ser atribuída personalidade jurídica com o seu devido registro, sem o qual não passará de uma sociedade não personificada. O art. 46 do CC determina que, do registro, deve contar a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver; o nome, a individualização dos fundadores ou instituidores e dos diretores; o modo por que se administra e representa, ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente; se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração, e de que modo; se os membros respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais; as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, neste caso. Para ter validade, o ato constitutivo deve observar estritamente os requisitos de validade para o negócio jurídico estabelecidos no artigo 104 do Código Civil. Esta pode se dar de forma pública ou particular, exceto no caso das fundações em que o artigo 62 do Código estabelece que sejam feitas por escritura pública ou testamento. Algumas pessoas jurídicas também precisam de autorização do governo para poderem ser estabelecidas, como é o caso das empresas estrangeiras. 36 O registro do ato constitutivo é o que dá início à existência legal da pessoa jurídica e precisa ser efetuado no órgão competente. Enquanto as sociedades empresárias são registradas na junta comercial da cidade em que têm sede, o restante das pessoas jurídicas de direito privado devem ser registradas no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas (CC, art. 1.150 e Lei n. 6.015/73, art. 114), salvo as sociedades simples de advogados, que devem ser registradas na OAB. Sendo assim, no âmbito das pessoas jurídicas, o registro não tem natureza meramente probatória, e sim tem grande importância constitutiva, uma vez que dá início à proteção aos direitos da personalidade da pessoa jurídica, assim como dá validade aos atos jurídicos por ela realizada. LICITUDE DE SEU OBJETIVO Para ter validade, o objetivo da pessoa jurídica que conste no ato constitutivo precisa ser lícito, possível e determinado. Esse objetivo pode ser variado como, por exemplo, o lucro, no caso das sociedades comerciais e civis; já as fundações podem ter fins religiosos, morais, culturais ou de assistência (CC, art. 62, parágrafo único) ou outros desde que sem caráter lucrativo; e por fim as associações de fins não econômicos (art. 53), têm objetivos de cunho cultural, educacional, esportivo, religioso, filantrópico, recreativo, moral, entre outros. 37 13. Pessoas Jurídicas: Classificação Grupos Despersonalizados Existem grupos de pessoas que trabalham conjuntamente para um objetivo em comum mas não constituem uma pessoa jurídica, apesar de muitas vezes ser dotado do direito de ser representado processualmente. Isto se dá com conjuntos de bens ou direitos que podem ser entendidos como uma unidade e que a lei prescreve que são capazes processualmente e tem legitimidade para serem parte em uma relação jurídica. Nesta condição se encontram a massa falida pelo síndico, a herança jacente e vacante, o espólio, a sociedade irregular e o condomínio, de acordo com o Código de Processo Civil. Apesar disso, a jurisprudência aceita que consórcios e os vários tipos de fundos que existem atualmente no mercado financeiro sejam representados pelos seus administradores como pessoas jurídicas despersonalizadas. Sociedades Irregulares ou de Fato As sociedades que não tiverem seu contrato social devidamente registrado não tem personalidade jurídica e são consideradas sociedades irregulares ou de fato. Entretanto, o Código Civil prevê algumas regras para esse tipo de sociedade. Art. 986 - Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade, exceto por ações em organização, pelo disposto neste Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem compatíveis, as normas da sociedade simples. Essa regra também se aplica às associações que já realizavam atividades sem fins lucrativos mas não tem existência legal. Em questões de patrimônio, o patrimônio dos sócios e da sociedades confundem-se na sociedade irregular, como se vê no disposto pelo artigo 990: Art. 990 - Todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, excluído do benefício de ordem, previsto no art. 1.024, aquele que contratou pela sociedade. Pessoas Jurídicas de Direito Privado O artigo 44 do Código Civil prevê a existência de 6 tipos de pessoas jurídicas de direito privado: a associação, a sociedade, a fundação, a organização religiosa, o partido político e as empresas individuais de responsabilidade limitada 38 Associação São pessoas jurídicas de direito privado que não possuem fins econômicos (CC, art. 53). Assim sendo, inexiste entre os associados, a princípio, a intenção de dividir excedentes ou lucros. Cuidado! Isso não significa que não podem auferir renda, significa apenas que, quanto ao seu objeto principal, não visam ao lucro. A diferença fundamental entre este tipo de pessoa jurídica e a sociedade é em relação aos fins lucrativos. Enquanto a associação se caracteriza por não tê-los a sociedade geralmente tem como objetivo justamente o lucro. Entretanto, isso não quer dizer que a realização de atividades econômicas com o objetivo da expansão da associação a descaracterize como tal, nem tampouco o faria se fossem cobradas taxas de contribuição do associado, o que torna o enunciado do artigo 53 inadequado e impróprio ao dizer “não tiverem fins econômicos”, uma vez que é autorizado que estas realizem atividades econômicas. Desta feita, o que lhes é vedado é que tenham fins lucrativos e dividam seus ganhos entre os associados. As associações têm como destinação os fins assistenciais, desportivos, culturais, etc. Sociedade É constituída através de um contrato social ou de sociedade, que consiste no comum acordo entre duas ou mais pessoas em contribuir com bens ou serviços para a realização de atividades econômicas e dividir os resultados disso. Este tipo de pessoa jurídica pode ser dividido entre sociedade simples ou empresarial. Sociedade Simples: não exercem atividade tipicamente empresarial, são profissionais que se unem para realizar uma determinada atividade, mesmo que cada um faça sua parte independente do outro, com um fim econômico ou lucrativo, tal como dentistas ou advogados. Sociedade Empresária: também tem fins lucrativos, assim como a sociedade simples, mas ela deve ter por objeto relações próprias de empresário, nos termos do artigo 966, ou seja, quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. 39 Fundação Trata-se de um conjunto de bens destinados por um documento para uma finalidade específica de interesse público de uma maneira estável e permanente, ou seja, trata-se de uma reunião patrimonial e não de pessoas. Existem fundações de administração pública e privada, as quais são reguladas pelos artigos 62 a 69 do Código Civil Seus elementos são os seus bens e o fim para que foi instituída. Versa o artigo 62 do Código que o fim da fundação deve necessariamente ser um dos listados no artigo, visando evitar a proliferação de fundações inúteis ou de motivação fútil e que os recursos destinados a ela sejam melhor usados. Ainda, existe para a fundação, assim como para a associação que sua finalidade não seja lucrativa, o que não inviabiliza que ela realize atividade econômica para seu próprio crescimento. Vale destacar ainda que outro elemento distintivo da fundação em relação às outras pessoas jurídicas é que seu registro efetivo está sujeito à aprovação do ministério público, o que dificulta também a instituição de fundações inúteis ou que não tenham recursos suficientes para atender ao fim a que se propõem. Assim sendo, caso a fundação não tenha recursos suficientes para fazê-lo, o Código prevê que eles sejam destinados a outra fundação com finalidade igual ou semelhante. Organizações religiosas Nada mais são do que as igrejas ou entidades destinadas exclusivamente a tratar de religião, crença e fé, não possuindo fins lucrativos. Importante destacarmos a imunidade fiscal que lhes é legalmente garantida, motivo pelo qual não pagam impostos. Partidos Políticos No seu objetivo disposto no artigo 1º da Lei 9.096 de 19 de setembro de 1995, os partidos políticos destinam-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal. Empresas Individuais de Responsabilidade Limitada e Sociedades Limitadas Unipessoais As chamadas EIRELIs foram incluídas no ano de 2011 e são empresas individuais de responsabilidade limitada. Trata-se de uma pessoa jurídica constituída por um único titular, com responsabilidade limitada, logo, não haverá responsabilização do constituinte em caso de dívidas contraídas pela empresa. Em decorrência das modificações trazidas pela Lei de Liberdade Econômica (Lei n. 13.874/19), que permitiu a criação de sociedades unipessoais, a EIRELI perdeu sua relevância, visto que os requisitos para constituir esse tipo de sociedade eram mais complexos. 40 Diante disso, a Lei n. 14.195/2021, simplificou a situação e automaticamente transformou todas as EIRELIs ainda existentes em sociedades limitadas unipessoais, conforme seu art. 41 dispõe: Art. 41. As empresas individuais de responsabilidade limitada existentes na data da entrada em vigor desta Lei serão transformadas em sociedades limitadas unipessoais independentemente de qualquer alteração em seu ato constitutivo. Parágrafo único. Ato do Drei disciplinará a transformação referida neste artigo. Afinal, o art.44, VI do Código Civil que previa a EIRELI foi revogado pela Lei nº 14.382/22. 41 14. Pessoas Jurídicas: Desconsideração da Personalidade Jurídica Falamos sobre a distinção entre a pessoa jurídica e seus membros, vez que essa possui sua própria existência, não se confundindo com quem a criou, dando-se origem, aqui, à blindagem patrimonial. Entretanto, o artigo 50 do Código Civil dispõe que: Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. § 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. § 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. § 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. § 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. § 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica. Nessa ótica, temos que o Código Civil adotou a teoria da desconsideração da personalidade jurídica nos casos em que houver (i) desvio de finalidade; ou (ii) confusão patrimonial. O desvio de finalidade é a adoção de artifícios através da pessoa jurídica para lesar credores (atrasar pagamentos, evitar obrigações, impedir execuções) ou praticar atos ilícitos (fraudes, estelionato, lavagem de dinheiro, etc.). Nestas situações, o sócio obtém vantagem de diferentes formas: ele pode evitar que uma dívida sua seja cobrada pelo credor, pode ocultar determinado patrimônio individual ou até mesmo prosseguir com a execução de um crime econômico, utilizando os cofres da pessoa jurídica para movimentar valores ilegais. A confusão patrimonial é a mistura inadequada do patrimônio dos sócios e da pessoa jurídica. Pode-se constatar a confusão patrimonial quando valores injustificáveis são movimentados 42 entre a pessoa jurídica e a pessoa física ou quando as obrigações de uma são cumpridas pela outra. Vale dizer que não é qualquer transferência de valores que configura confusão patrimonial, mas apenas aqueles de valores proporcionalmente significantes. Observados o desvio de finalidade ou a confusão patrimonial, poderá o juiz desconsiderar a personalidade jurídica para que sejam reparados os atos ligados causados por aqueles que se utilizaram indevidamente da pessoa jurídica para obtenção de vantagens injustas ou ilícitas. Portanto, é a presença do desvio de finalidade ou a confusão patrimonial somada à obtenção de vantagem direta ou indireta que permite a desconsideração da personalidade jurídica. Uma vez desconsiderada a personificação outrora dada, ficará ela afastada temporariamente até que o juiz decida. Assim, o que antes era distinto deixa de ser, e os sócios responderão pelos atos praticados, ou seja, confundir-se-á o patrimônio pessoal do sócio com o patrimônio da pessoa jurídica da qual faz parte. 43 15. Pessoas Jurídicas: Extinção A extinção da pessoa jurídica significa dizer que ela chegou ao seu fim. O artigo 1.033 do Código Civil tratou de elencar diversas hipóteses de dissolução da sociedade. Vejamos: Art. 1.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: I - o vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado; II - o consenso unânime dos sócios; III - a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado; IV - (Revogado pela Lei nº 14.195, de 2021) V - a extinção, na forma da lei, de autorização para funcionar. Parágrafo único. (Revogado pela Lei nº 14.195, de 2021) Extinta a pessoa jurídica, haverá a desvinculação das unidades de seus membros e materiais que fundavam sua existência. Existe ainda a extinção por determinação judicial, a requerimento de qualquer dos sócios, quando for esgotado o fim social, conforme artigo 1.034 do Código Civil. O artigo 69 do Código Civil especifica os casos em que serão dissolvidas as fundações. Aqui, existindo uma finalidade ilícita, impossível, ou decorrido o prazo de sua existência, o Ministério Público, ou qualquer outro interessado, poderá promover a extinção da fundação, incorporando seu patrimônio, observado o ato constitutivo ou estatuto, a outra fundação designada pelo juiz que possua fim igual ou semelhante. Com relação à associação, o artigo 61 do mesmo código diz que, previsto em seu estatuto, seus bens serão destinados a entidades igualmente de fins não lucrativos. Não havendo tal previsão, os bens irão para estabelecimento municipal, estadual ou federal de fins semelhantes. Mas e se não houver, no Município, Estado ou Distrito Federal em que a associação tinha sede, outro ente sem fins lucrativos? Neste caso, os bens remanescentes deverão ser devolvidos à Fazenda do Estado, do Distrito Federal ou da União. (artigo 62, § 2º, do CPC). 44 Atenção! Devemos saber que a extinção da pessoa jurídica não se opera de modo ins- tantâneo. Ora, havendo bens de seu patrimônio e dívidas a resgatar, ou seja, ativos e passivos, continuará a pessoa jurídica em fase de liquidação, respeitada a publicação necessária. Finalizada a liquidação, será promovido o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica. 45 Pessoas no Código Civil

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