Tese_ André Parada (1) PDF - Análise Comparativa de Contágio Financeiro

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Universidade de Aveiro

2024

André Filipe Chousa São Marcos Parada

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Contágio Financeiro Finanças Crise Financeira Global Economia

Summary

Esta tese apresenta uma análise comparativa do contágio financeiro e da interdependência entre os dez maiores mercados mundiais durante a crise financeira global e a pandemia de COVID-19. A pesquisa utiliza dados de janeiro de 2005 a dezembro de 2023 e metodologia de Forbes e Rigobon (2002).

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Universidade de Aveiro Ano 2024 André Filipe Chousa Contágio Financeiro e Interdependência: Uma São Marcos Parada Análise Comparativa aos Mercados Globais durante a Crise Financeira Global e a Pandemia de COVID-19...

Universidade de Aveiro Ano 2024 André Filipe Chousa Contágio Financeiro e Interdependência: Uma São Marcos Parada Análise Comparativa aos Mercados Globais durante a Crise Financeira Global e a Pandemia de COVID-19 1 Universidade de Aveiro Ano 2024 André Filipe Chousa Contágio Financeiro e Interdependência: Uma São Marcos Parada Análise Comparativa aos Mercados Globais durante a Crise Financeira Global e a Pandemia de COVID-19 Dissertação apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Finanças, realizada sob a orientação científica do Professor Doutor César Faustino da Silva Bastos, Professor Adjunto do Instituto Superior de Contabilidade e Administração da Universidade de Aveiro. 2 Dedico este trabalho à minha família e amigos por todo o apoio que me deram, em especial aos meus irmãos, Tiago e Sofia. 3 o júri presidente Professor Especialista Amândio Antunes prof essor adjunto da Universidade de Aveiro vogais Professor. Doutor César Faustino da Silva Bastos prof essor adjunto da Universidade de Aveiro Prof. Doutor xx prof essor xx da Universidade de Aveiro 4 agradecimentos Agradeço aos meus familiares e amigos, pelo apoio durante todo o percurso. Ao meu orientador Professor César Faustino da Silva Bastos, pela disponibilidade, compreensão e dedicação, essenciais à elaboração desta dissertação. 5 palavras-chave Contágio Financeiro, Interdependência, Diversificação, Crise financeira global, COVID-19 resumo Com a crescente integração financeira a nível global, surge a questão da eficácia da diversificação geográfica na mitigação de riscos. Este trabalho estuda o contágio financeiro e a interdependência entre os dez maiores mercados mundiais (em termos do produto interno bruto), durante os períodos de janeiro de 2005 a dezembro de 2023, com foco na crise financeira global e na crise provocada pela COVID-19. Utilizando coeficientes de correlação ajustados através da metodologia de Forbes e Rigobon (2002) analisamos a existência de contágio nos períodos em causa. Os resultados indicam que, durante a crise financeira global, houve um aumento significativo das correlações entre os mercados, embora, após o ajuste, apenas a Alemanha, França e Canadá apresentaram contágio. No período da COVID-19, seis países (Alemanha, Índia, Reino Unido, Rússia, Canadá e Itália) apresentaram contágio tanto nos coeficientes ajustados quanto nos não ajustados. A ausência de contágio em países como a China e o Japão reflete particularidades económicas e políticas que os isolam parcialmente dos choques externos. Em contrapartida, a forte ligação comercial e financeira de países como o Canadá e a Alemanha com os EUA explicam a maior suscetibilidade ao contágio. Os dados obtidos sugerem que, apesar do aumento da interdependência global, a diversificação geográfica continua a ser uma estratégia importante para mitigar riscos, especialmente em períodos de maior volatilidade. Este estudo contribui para a compreensão da propagação do contágio e interdependência financeira, fornecendo contributos valiosos para temáticas como a gestão de riscos em portfólios globais e para a formulação de estratégias de diversificação. 6 keywords Financial Contagion, interdependence, Diversification, Global financial crisis, COVID-19 abstract With the increasing financial integration at a global level, the question arises regarding the effectiveness of geographical diversification in mitigating risks. This study examines financial contagion and interdependence among the ten largest world markets (in terms of gross domestic product) during the periods from January 2005 to December 2023, focusing on the global financial crisis and the crisis caused by COVID-19. Using correlation coefficients adjusted through the methodology of Forbes and Rigobon (2002), we analyzed the occurrence of contagion during thosse periods. The results indicate that during the global financial crisis, there was a significant increase in correlations between the markets, although, after adjustment, only Germany, France, and Canada exhibited contagion. In the COVID-19 period, six countries (Germany, India, United Kingdom, Russia, Canada, and Italy) showed contagion in both adjusted and unadjusted coefficients. The absence of contagion in countries such as China and Japan reflects economic and political particularities that partially isolate them from external shocks. On the other hand, the strong commercial and financial ties of countries like Canada and Germany with the USA explain their greater susceptibility to contagion. The data obtained suggest that despite the increase in global interdependence, geographical diversification remains an important strategy for mitigating risks, especially in periods of higher volatility. This study contributes to the understanding of contagion propagation and financial interdependence, providing valuable insights for themes such as global portfolio risk management and the formulation of diversification strategies. 7 Índice 1. Introdução............................................................................................................................................................ 4 2. Revisão de literatura........................................................................................................................................... 7 2.1 Contágio Financeiro........................................................................................................................................ 8 2.2. Índices...........................................................................................................................................................12 2.3. Diversificação Doméstica e Internacional..................................................................................................14 2.3.1. Mercados emergentes...........................................................................................................................17 2.4. Correlação....................................................................................................................................................18 2.5. Estudos que envolvem a correlação e o contágio financeiro....................................................................19 3. Metodologia........................................................................................................................................................23 3.1. Períodos em estudo......................................................................................................................................23 3.1.1. Crise financeira global..........................................................................................................................23 3.1.2. COVID 19.............................................................................................................................................25 3.2. Metodologias utilizadas para estudar o contágio financeiro.....................................................................27 3.3. Metodologia Utilizada.................................................................................................................................31 3.4. Dados............................................................................................................................................................35 4. Descrição e Análise de dados...........................................................................................................................40 5. Considerações finais..........................................................................................................................................51 5.1. Limitações e sugestões futuras....................................................................................................................51 5.2. Conclusões...................................................................................................................................................52 6. Bibliografia.........................................................................................................................................................55 7. Apêndices............................................................................................................................................................61 Apêndice 1 – Preços de cada índice com periocidade semanal por país.........................................................61 Apêndice 1.1. Período pré-crise financeira global........................................................................................61 Apêndice 1.2. Período crise financeira global...............................................................................................62 Apêndice 1.3. Período pré-crise COVID-19.................................................................................................63 Apêndice 1.4. Período Crise COVID-19.......................................................................................................64 Apêndice 2 – Retornos semanais por mercado e por período..........................................................................65 Apêndice 2.1. Período pré-crise financeira global........................................................................................65 Apêndice 2.2. Período crise financeira global..............................................................................................66 Apêndice 2.3. Período pré-crise COVID-19.................................................................................................67 Apêndice 2.4. Período crise COVID-19........................................................................................................68 1 Lista de figuras Figura 1: Transmissão do contágio financeiro......................................................................................................12 Figura 2: Timeline dos acontecimentos durante a crise financeira global...........................................................25 Figura 3: Revisão literária de datas usadas para definição do período da crise do COVID-19.........................37 Lista de tabelas Tabela 1: PIB dos países da amostra e descrição das variáveis...........................................................................35 Tabela 2: Estatísticas descritivas dos vários períodos..........................................................................................41 Tabela 3: Coeficientes de correlações de Pearson entre os vários países no período completo.......................43 Tabela 4: Coeficientes de correlações de Pearson entre os vários países no período da crise financeira global..................................................................................................................................................................................43 Tabela 5: Coeficientes de correlações de Pearson entre os vários países no período da crise COVID-19.......44 Tabela 6: Coeficientes de Correlação ajustados - Crise Financeira Global.........................................................45 Tabela 7: Coeficientes de Correlação não ajustados - Crise Financeira Global..................................................45 Tabela 8: Coeficientes de Correlação não ajustados - Crise COVID-19.............................................................46 Tabela 9: Coeficientes de Correlação ajustados - Crise COVID-19....................................................................46 2 Lista de Siglas ALE - Alemanha ARCH - Autoregressive Conditional Heteroskedasticity BRIC - Acrónimo para Brasil, Rússia, Índia, China BRIICKS - Acrónimo para Brasil, Rússia, Índia, Indonésia, China, Coreia do Sul e África do Sul CAN - Canadá CAPM - Capital Asset Price Model CHI - China COVID-19 - Doença coronavírus SARS-CoV-2 DCC - EGARCH - Dynamic Conditional Correlation Exponential Generalized Autoregressive Conditional Heteroskedasticity DCC - GARCH – Dynamic Conditional Correlation Generalized Autoregressive Conditional Heteroskedasticity EUA - Estados Unidos da América FED - Reserva Federal dos Estados Unidos da América FRA - França G7 - Alemanha, Canadá, Estados Unidos da América, França, Itália, Japão e Reino Unido GARCH - Generalized Autoregressive Conditional Heteroskedasticity GIPSI - Acrónimo para Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Itália IND - Índia ITA - Itália JAP - Japão PELTROs - Pandemic Emergency Longer-Term Refinancing Operations (operações de emergência pandémica de refinanciamento de longo prazo PIB - Produto Interno Bruto RUN - Reino Unido RUS - Rússia TLTRO III - Targeted Longer-Term Refinancing Operations III (Operações de refinanciamento de prazo alargado direcionadas III) 3 1. Introdução Com a evolução da economia de muitos países a efetuar-se desejavelmente a uma taxa de inflação sustentável, que o Banco Central Europeu considera ter o valor máximo de 2% (Banco Central Europeu, 2021), o cidadão adquire o incentivo para realizar investimentos financeiros, de modo a que as suas poupanças ganhem valor e pelo menos acompanhem a inflação. Assim criou-se a necessidade da utilização de instrumentos financeiros capazes de, simultaneamente, satisfazerem as necessidades de financiamento dos agentes económicos e os interesses dos aforradores/investidores num enquadramento em que a taxas de rendibilidade elevadas estão associadas a níveis elevados de risco. Estes instrumentos são transacionados nos mercados financeiros, pelo que o seu preço flutua frequentemente. Na conjuntura atual, é notório um processo contínuo de globalização nos mercados financeiros, embora se reconheça que esse grau de interligação já foi mais intenso em períodos anteriores (Posta, 2022). Apesar disto, os movimentos de capitais internacionais continuam a ocorrer, oferecendo oportunidades significativas para a diversificação de investimentos. A diversificação é realizada com o objetivo primordial de dispersar e minimizar o risco, para uma dada taxa de rentabilidade da carteira de investimentos (Markowitz, 1952). Esta é influenciada, entre outros, pelo panorama macroeconómico em que os países se encontram pelo que a diversificação por diferentes áreas geográficas, permitiria ao investidor reduzir a sua exposição a riscos específicos de um país ou região e aumentar a sua exposição a diferentes ciclos económicos e políticas monetárias (French e Poterba, 1991). No entanto, com a crescente interdependência e integração económica a nível global, podemos deparar-nos com mercados cada vez mais correlacionados, resultando em riscos sistemáticos. Por isto, julgamos pertinente averiguar até que ponto a diversificação geográfica é eficaz para acrescentar valor a uma carteira. A interdependência é uma dependência entre países que existe num período estável e que não aumenta significativamente em momentos de crise. Nos casos em que esta dependência 4 aumenta significativamente no período de crise, estamos na presença de contágio (Forbes e Rigobon, 2002). Neste trabalho pretende-se estudar o contágio e a interdependência entre os mercados de ações de Bolsas de Valores dos dez maiores países do mundo em termos do PIB (Produto Interno Bruto), no período de janeiro de 2005 a dezembro de 2023, focando-nos nos períodos da crise financeira global e da crise provocada pela COVID-19. Nestes dois eventos ocorreram, entre outros, quedas significativas nos preços dos instrumentos financeiros pelo que é importante analisar a eventual propagação do contágio entre mercados, de modo, a que em crises futuras se possa realizar uma melhor previsão dos danos esperados. Para tal, utilizamos retornos dos índices financeiros de ações correspondentes aos mercados em causa: Standard & Poor’s 500 (S&P) (Estados Unidos da América), Shanghai Stock Exchange (SSE Composite Index) (China), Nikkei heikin kabuka 225 (Nikkei) (Japão), Deutscher Aktien Index 30 (DAX 30) (Alemanha), India Stock Exchange (Nifty 50) (India), Financial Times Stock Exchange 100 (FTSE 100) (Reino Unido), Cotation Assistée en Continu 40 (CAC 40) (França), MOEX Russia (IMOEX) (Rússia), S&P/TSX Composite Index (SPTSX) (Canadá) e Milano Indice di Borsa (FTSE MIB) (Itália). Para analisar os efeitos de contágio e interdependência, calculam-se os coeficientes de correlação entre os retornos e, em seguida aplica-se a metodologia desenvolvida por Forbes e Rigobon (2002) através da atualização dos coeficientes de correlação (retirando o viés provocado pela heteroscedasticidade), e da transformação dos coeficientes não ajustados em ajustados. De seguida, testa-se o contágio entre os países da amostra, averiguando se um aumento de correlação entre um período pré-crise e o período de crise representa contágio ou apenas interdependência. O trabalho encontra-se estruturado em 5 partes. O capítulo 1 é a introdução, o capítulo 2 é a revisão de literatura relativa ao contágio financeiro, à interdependência, à diversificação e aos eventos em estudo (Crise financeira Global e COVID-19). No capítulo 3 descrevemos metodologias utlizadas em estudos na área e a metodologia que vamos utilizar que consiste 5 na atualização dos coeficientes de correlação e a posterior transformação em variáveis Z de Fisher para serem testadas. No capítulo 4 descrevemos e discutimos os resultados da análise descritiva dos dados e do modelo de Forbes e Rigobon (2002). Por fim, o capítulo 5 representa a conclusão. 6 2. Revisão de literatura As finanças tradicionais e as finanças comportamentais constituem duas importantes óticas para explicar a movimentação dos preços dos instrumentos financeiros. As Finanças tradicionais têm ligação ao termo “eficiência do mercado”, que no mercado financeiro foi definido por Fama (1965) da seguinte forma: Um mercado "eficiente" é definido como um mercado onde há um grande número de investidores racionais que buscam a maximização os lucros, competindo ativamente e em que cada um tenta prever os valores futuros de mercado de títulos individuais, e onde informações importantes e atuais estão quase totalmente disponíveis para todos os participantes. (Fama, 1965, p.56) Um mercado "eficiente" pode, então, ser caracterizado por um mercado onde existe uma interação muito ativa entre agentes considerados racionais que buscam a maximização do lucro, tentando obtê-la através da previsão dos movimentos futuros dos preços de mercado das ações com base em informação disponível e acessível a todos os participantes no mercado. O corolário daquela hipótese é que os preços de mercado das ações refletem toda a informação disponível, pelo que são preço justos. Retira-se, então, que num mercado eficiente, a competição entre investidores será o impulsionador que fará com que novas informações sejam de imediato incorporadas nos preços atuais das ações. A esta teoria está, também, associada a teoria moderna do portfólio e o modelo Capital Asset Price Model (CAPM). Ambos envolvem o conceito de risco e retorno, sendo que a primeira acabou por ser revolucionária, pois criou as bases para os seguintes estudos nesta área. Foi desenvolvida por Markowitz, que sugere que um ativo possui o seu próprio nível de risco e de retorno e que a quantificação destes permite ao investidor construir uma carteira ou portfólio que maximizará o retorno para um certo nível de risco ou minimizará o risco para uma dada rendibilidade (Markowitz, 1952). Markowitz usou como base ideias já estabelecidas na área da diversificação e mostrou como é que a correlação entre diferentes ações incluídas numa mesma carteira poderia ajudar a construir a carteira (Abdelmalak, 2017). 7 As teorias tradicionais consideram que os investidores se comportam de um modo racional, ou seja, utilizam toda a informação disponível para criar expectativas acerca dos movimentos futuros do mercado. Os mercados devem, também, comportar-se segundo o mesmo princípio, resultando num cenário eficiente e que, no longo prazo, se traduzirá num equilíbrio (Fama, 1965). As finanças comportamentais colocam em causa esta racionalidade do investidor e do mercado, atribuindo um enorme peso à psicologia dos investidores como forma de explicar os movimentos do mercado (Sirisha et al., 2024). Nas últimas décadas foi surgindo uma quantidade imensa de literatura focada no estudo da psicologia dos investidores, criando-se padrões que permitiram identificar os erros sistemáticos que surgem no momento de investir. Aqui incluem-se os temas da heurística, framing, emoções e impacto no mercado (Baker e Nofsinger, 2010). As emoções humanas assumem, também, um papel indispensável, dado que a volatilidade do mercado pode muito facilmente interiorizar-se em alguém e fazer o investidor tomar decisões que não vão de acordo com o seu plano. A incerteza associada ao processo de investir e a dificuldade em prever a evolução futura dos preços desencadeiam diferentes estados emocionais o que cria certas vulnerabilidades no investidor (Dierks e Tiggelbeck, 2021). Ambas estas teorias (tradicional e comportamental) oferecem contributos valiosos na compreensão de como a evolução dos preços ocorre e como os mesmos são impactados e o motivo de o serem em momentos de crise, o que serve como base para a introdução do tema do contágio financeiro. 2.1 Contágio Financeiro O contágio financeiro é uma temática que tem sido muito debatida e estudada nas comunidades financeiras e académicas, dado os efeitos que as diferentes crises têm tido na economia global. O contágio não tem uma definição exata. Rigobon (2002) descreve que mesmo dentro do seio económico, os diversos agentes não têm uma resposta clara para este tema, “Encontrar 8 dois economistas que concordam com uma definição para contágio é quase impossível” (Rigobon, 2002, p. 5). Existem diversas definições possíveis, dado que o contágio pode-se criar devido a várias causas. Hamao et al. (1990) descreve o contágio como a propagação do excesso de volatilidade de países em crise para os restantes. Dornbusch et al. (2000) define o contágio como tendo por base o efeito das correlações no momento de um choque no mercado. Para os autores “Contágio é definido como um aumento significativo nas ligações entre mercados após um choque num país (ou grupo de países), medido pela forma como os preços dos ativos ou fluxos financeiros evoluem entre mercados em comparação a períodos estáveis.” (Dornbusch et al., 2000, p. 178). Também expuseram que todos os países estão ligados por meio do comércio e ou de trocas financeiras, pelo que são influenciados pelo contágio. Lin et al. (1994) definem contágio como a propagação da intensidade e das oscilações dos preços de ativos financeiros de um país para outros sem que existam fatores económicos fundamentais que o previssem, atribuindo a causa à irracionalidade dos investidores. As definições apresentadas incluem-se em dois grandes grupos: o shift contagion e o contágio puro. O shift contagion preconiza que se existir uma mudança na força da propagação dos choques entre o período de pré-crise e o período de crise no mercado, então existe contágio (Rigobon, 2002). O contágio puro define que a transmissão de choques não é sinónimo de contágio, pois os países realizam entre si trocas financeiras, económicas e de informação que naturalmente originam a transmissão de choques. No entanto, quando esta transmissão de choques ocorre em excesso tendo em conta o que seriam as transmissões base, então o contágio está presente (Rigobon, 2002). A literatura descreve que a identificação da existência de contágio é fundamental, mas também é necessário examinar a forma como o contágio é causado e transmitido para outros mercados. Mohti (2019) fornece vários exemplos de situações em que as crises se propagaram rapidamente do seu país de origem para outros países: 9 O contágio financeiro tem sido discutido há muito tempo na literatura financeira após os efeitos alargados de várias crises, como o crash do mercado de ações dos EUA em 1987, a crise mexicana de 1994, a crise asiática de 1997, a crise russa de 1998, a crise financeira do subprime nos EUA em 2008/2009, ou a crise da dívida da zona do euro em 2011. Cada uma dessas crises afetou não só o mercado de ações do país de origem da crise, mas também os países vizinhos e distantes. (Mothy, 2019, p. 5) Verificamos que o contágio não se foca apenas numa área geográfica do globo. As crises financeiras podem rapidamente adquirir uma natureza global, principalmente nos mercados atuais e a sua origem pode, muitas vezes, partir de uma vertente especulativa, também denominada por “bolhas”. A crise financeira global, originada nos Estados Unidos da América, teve o seu início com o crash da bolha especulativa que se tinha formado no mercado imobiliário, que fez com que o valor das casas subisse para preços irracionais tendo em conta o rendimento das famílias (Baily et al., 2008). A globalização e a integração financeira têm um papel predominante neste tema, pois o mundo funciona cada vez mais num ciclo único e os países encontram-se numa corrente de convergência em termos políticos e económicos (Lopez et al., 2021). Neste contexto, Zhanyun (2018) mostrou que países com sistemas financeiros e governação semelhantes aos países com uma crise financeira ficam mais expostos a choques especulativos e a outflows de capital. Em parte, isto mostra um dos motivos pelos quais o contágio tem facilidade para se propagar. As causas do contágio podem ser explicadas de diversas formas, no entanto, existem dois grandes grupos de teorias. Um deles associa o contágio aos canais fundamentais da economia (trocas comerciais, políticas monetárias e choques comuns) e defende que dado que a economia global está cada vez mais interconectada com as trocas de bens, serviços e capital, o aparecimento de uma crise num país rapidamente torna-se uma fonte de perigo para os restantes, levando a co-movimentos e à interdependência. Sachs et al. (1996) no seu estudo, focou-se em três fundamentos: um aumento significativo da taxa de câmbio real, a fragilidade no sistema bancário e baixas reservas internacionais (em relação à base 10 monetária). Utilizaram dados de 20 países em desenvolvimento entre 1994 e 1995 e concluíram, que a usar apenas estas três variáveis já conseguiam explicar a origem de crises nos países em estudo. As mudanças abruptas nas taxas de juro, nos preços de commodities e nas taxas de câmbio, geram instabilidades económicas, que acabam por ser transversais a outros países. Países que estão mais ligados em termos de trocas comerciais acabam por ter graus mais elevados de interdependência e, por isso, vão sofrer maior impacto com estas mudanças. Dornbusch et al. (2000) destacam, como causas fundamentais de choques, as trocas comerciais e financeiras e as desvalorizações da moeda provocadas com o intuito de tornar os países mais competitivos nos mercados internacionais. O segundo grupo de teorias defende que a causa do contágio e transmissão se deve a anomalias dos mercados e ao comportamento dos investidores. Glick e Rose (1999) dão um exemplo de como o surgimento de uma crise num país, pode originar a transmissão deste desequilíbrio para outros: A visão alternativa é que uma desvalorização, na presença de rigidez nominal, dá a um país um impulso temporário na sua competitividade. Os seus concorrentes comerciais estão então em desvantagem competitiva; aqueles mais prejudicados pela desvalorização provavelmente serão atacados em seguida. [...] Dessa forma, uma crise cambial que atinge um país (por qualquer motivo) pode esperar-se que se espalhe para os seus parceiros comerciais. (Glick e Rose, 1999, p. 606) Dornbusch et al. (2000) descreve que neste cenário a origem da crise não pode ser imputada a nenhum tipo de fator macroeconómico, mas apenas, ao comportamento dos investidores: Sob esta definição, o contágio surge quando um movimento conjunto ocorre, mesmo quando não há choques globais e a interdependência e os fundamentos não são fatores. Uma crise num país pode, por exemplo, levar os investidores a retirar os seus investimentos de muitos mercados sem levar em conta as diferenças nos fundamentos 11 económicos. Este tipo de contágio é frequentemente dito ser causado por fenómenos "irracionais", como pânicos financeiros, o efeito manada (herding), a perda de confiança e o aumento da aversão ao risco. (Dornbusch et al., 2000, p. 179) A figura 1 (seguinte) resume estas duas linhas de pensamento. Figura 1: Transmissão do contágio financeiro Fonte: Autoria Própria Com o uso do termo contágio surge, também, o conceito da interdependência, surgindo, por isso, a necessidade de os distinguir. Para Forbes e Rigobon (2002) o contágio traduz-se no aumento significativo do co- movimento entre vários mercados na presença de um choque. Se este co-movimento não tiver um aumento significativo após o choque, então, mostra apenas que existe uma ligação forte entre as várias economias e, por isso, deve ser tratado como interdependência. Davidson (2020) define interdependência como uma dependência entre países que não aumenta significativamente em momentos de crise. Os canais fundamentais podem levar a um aumento da interdependência e esta é uma condição prévia, mas não suficiente para o contágio (Rigobon, 2002). 2.2. Índices Para absorver e descrever o comportamento do mercado destacam-se os ativos financeiros que representam índices. Um índice financeiro tem um valor numérico associado que é baseado em inputs como o preço de diversos ativos de uma certa área do mercado e a variação daquele índice (número) é usada para medir e acompanhar o desempenho de um mercado (Chen, 2024). Existe uma variedade imensa de índices a nível mundial, sendo que alguns dos mais conhecidos são o Dow Jones Industrial Average, o Standard & Poor's 500 e o FTSE 100, que seguem o desempenho das 30 maiores e influentes empresas dos Estados 12 Unidos da América, o desempenho das 500 maiores empresas do mesmo país e o desempenho das 100 maiores empresas cotadas na London Stock Exchange, respetivamente. Os índices assumem-se como uma ferramenta importante, pois permitem aos investidores e analistas seguir as tendências dos mercados financeiros (Chen, 2024). O valor de um índice de ações é representativo da performance de um grupo de ações em específico, que são escolhidas e têm uma ponderação que pode variar consoante o critério utilizado para o cálculo do valor. Estes critérios são, normalmente, derivados da capitalização bolsista, do volume de ações transacionadas ou do setor em que a empresa se enquadra. A criação dos primeiros índices de ações, como referido anteriormente, remonta a finais do século XIX com a criação do Dow Jones Average em 1884, do Dow Jones Industrial Average em 1896 e pela criação, em 1923, do primeiro índice ponderado pela capitalização pela S&P. Desde aí, surgiram milhares de índices, que refletem setores e indústrias específicas, regiões geográficas, fatores associados aos títulos como a liquidez, o valor e o crescimento. Também surgiram índices focados em outro tipo de ativos, como índices de commodities e índices de renda fixa. Com este aumento da oferta surgiu a comparação entre gestão ativa e passiva. A primeira caracteriza-se pela existência de gestores que fazem a seleção dos ativos do portfólio, de maneira a tentar obter retornos superiores ao índice de referência. A segunda foca-se, apenas, em tentar acompanhar os retornos de um índice de referência, ou mesmo a ser uma cópia do mesmo. Com estas duas opções em mente, surgiu o argumento de que portfólios com gestão ativa apresentavam retornos maiores. No entanto, diversos autores estudaram este confronto entre gestão ativa e passiva, concluindo que em grande parte dos casos a gestão passiva mostra-se mais lucrativa no longo prazo do que a gestão ativa (Sushko e Turner, 2018; Millo et al., 2023). 13 Um índice tem ligação com a diversificação doméstica, pois ao representar diversas empresas dentro do mesmo mercado, inclui este efeito de diversificação. Em seguida, vou entrar mais a fundo no tema da diversificação. 2.3. Diversificação Doméstica e Internacional A diversificação doméstica, no contexto de investimentos, refere-se à estratégia de investir em diferentes ativos dentro do mesmo país. Dentro do mercado de um país, existe toda uma diversidade de ações, cujas empresas correspondentes pertencem a diferentes indústrias, ao dispor do investidor, o que pode criar benefícios, apesar de que a diversificação doméstica depende fortemente da correlação existente entre as ações (Sarwar, 2022). Sarwar (2022) analisou o mercado norte-americano (EUA) entre 2007 e 2018, usando regressões de modo a perceber como os riscos do mercado se associavam às correlações das ações, tendo verificado que existia uma forte tendência das ações terem um aumento na correlação em períodos de crise, o que acabava por diminuir o efeito da diversificação do portfólio dentro do mesmo país. Manter o investimento restringido a um só país tem certas vantagens, tal como, a ausência do risco associado à flutuação de taxas de câmbio (Bodie et al., 2014). Outro risco do qual o investidor se liberta é da incerteza associada às políticas e legislação inerentes a cada país que podem, muitas vezes, afetar a forma como o mercado se movimenta. As finanças comportamentais atribuem à diversificação doméstica um certo papel maligno quando esta é utilizada em excesso, definindo esta problemática como home-country bias. Este conceito foi, inicialmente, apresentado por French e Poterba (1991), que descrevem os investidores como seres com uma maior apetência para possuir ativos domésticos em relação a ativos estrangeiros. Esta linha de pensamento levou a estudos na área das finanças comportamentais que provaram que existe uma elevada tendência para a existência de portfólios com um grande peso alocado ao mercado doméstico, mesmo quando este assume um pequeno papel tendo em conta a magnitude do mercado financeiro no seu todo (Österman e Bourghardt, 2021). 14 A diversificação internacional é um conceito crucial na gestão de carteira de investimentos. Com a crescente globalização e integração dos mercados financeiros e com a quebra de muitas barreiras ao investimento no estrangeiro, a diversificação de portfólios a nível global tornou-se uma tendência em alta por parte dos investidores (Österman e Bourghardt, 2021). A diversificação internacional é feita com alguns objetivos em mente. Ajuda a reduzir o risco da carteira, uma vez que os mercados financeiros em diferentes países podem-se comportar de maneira diferente em resposta a eventos económicos e políticos, abre a possibilidade de aproveitamento de oportunidades globais e não de apenas um mercado e pode ajudar a proteger o portfólio contra a desvalorização da moeda doméstica em que é feita o investimento (Österman e Bourghardt, 2021). No entanto, apenas é benéfica para os investidores quando a correlação entre o mercado doméstico e os mercados estrangeiros é baixa, pois só nestes casos é que realmente está a ocorrer a diversificação. Este diferencial de correlação deve-se, principalmente aos ciclos económicos diferentes em que os países se encontram, há existência de políticas nacionais muito díspares e ao facto dos países possuírem uma elevada concentração em certos setores industriais devido a fatores internos, como os recursos naturais acessíveis no país, o que pode originar variações nos retornos específicas àquele país (Kumar, 2011). Levy e Sarnat (1970) analisaram os retornos potenciais derivados da diversificação internacional, no período entre 1951 e 1967, tendo incluído na análise 28 países. Criaram seis portfólios tendo em conta o tipo de país, sendo que o portfólio A possuía a população dos 28 países, o portfólio B dezasseis países com rendimento elevado, o portfólio C, 11 países europeus ocidentais, portfólio D com cinco países com mercados comuns, portfólio E com 9 países em desenvolvimento e, por fim, um portfólio F apenas com os Estados Unidos da América. Com isto e a partir do cálculo das fronteiras eficientes, deparou-se com a conclusão de que o portfólio A era o que poderia dar o maior retorno potencial para um menor nível de risco. Além disto, retirou-se que países com uma alta correlação com os Estados Unidos, neste caso o Canadá, ficariam de fora do portfólio ótimo, dado que o retorno esperado era mais baixo do que o dos Estados Unidos e possuía maior risco, algo que vai de encontro ao defendido por Kumar (2011). 15 A ideia de que o investimento em países estrangeiros ajuda na diversificação do portfólio foi, também, apoiada por Grubel (1968), que demonstrou que a diversificação internacional permitia aos investidores alcançarem uma relação risco/retorno mais favorável, pois ao combinarem ativos de diferentes países, reduziam o risco total dos seus portf ólios sem comprometer os retornos. Provou isto, usando como base a teoria moderna do portfolio, tendo construído portfolios ótimos e traçado as fronteiras eficientes. O estudo incluía 11 países (EUA, Canadá, Reino Unido, Alemanha Oeste, França, Itália, Bélgica, Países Baixos, Japão, Austrália e África do Sul) e foi realizado entre janeiro de 1959 e dezembro de 1966. Apesar de ser um estudo com décadas, criou as bases para trabalhos subsequentes sobre os benefícios da diversificação internacional. No entanto, a integração financeira que tem ocorrido nas últimas décadas tem levado ao questionamento dos benefícios efetivos decorrentes do processo de diversificação. As causas do aumento da correlação são evidentes. Como mencionado anteriormente, o aumento da globalização e da integração dos mercados financeiros é uma realidade, o que origina cada vez mais que eventos económicos e financeiros de um país tenham um impacto significativo nos mercados de outros países, o denominado contágio financeiro. Christoffersen et al. (2012) estudaram os mercados internacionais a partir de uma amostra constituída por 16 países desenvolvidos e 19 países emergentes, aplicando um modelo de cópula (ferramenta usada para construir uma distribuição multivariada para um conjunto de ativos a partir de qualquer escolha de distribuições marginais para cada ativo individual) para capturar dependências de curto e longo prazo e assimetrias entre os países. Evidenciou que as correlações aumentavam tanto em países desenvolvidos como em emergentes, salientado, no entanto que as dependências entre os países desenvolvidos foram superiores no período entre 1989 e 2009. Concluiu que os benefícios da diversificação internacional em países desenvolvidos têm vindo a reduzir dado o aumento da correlação e dependência entre os mesmos. Quanto aos mercados emergentes, ainda existem benefícios significativos, principalmente em momentos em que os mercados mundiais se encontram numa tendência de descida. 16 Os mercados emergentes têm-se tornado, então, alvo de investimentos mais elevados, pois os seus ciclos económicos estão mais afastados dos mercados desenvolvidos, o que oferece vantagens no momento da diversificação. 2.3.1. Mercados emergentes Os mercados emergentes diferenciam-se dos mercados desenvolvidos no nível de industrialização em que se encontram, sendo que os mercados emergentes englobam os países em que o processo de industrialização ainda se encontra em desenvolvimento. Se pretendermos fazer a diferenciação de uma forma mais complexa, podemos seguir as metodologias usadas por empresas de benchmarking como a MSCI e a FTSE Russell que usam como critério predominante o PIB per Capita, aliando este ponto a outros critérios referentes ao tamanho e liquidez de ações cotadas e ao ambiente regulamentar próprio de cada país tendo em conta o investimento estrangeiro (Bekaert et al., 2023). Nas últimas décadas, os mercados emergentes têm aumentado os seus níveis de integração com os mercados desenvolvidos devido às evoluções macroeconómicas e ao fenómeno da liberalização financeira, que consiste no movimento de capitais em torno do globo dada a eliminação de restrições e barreiras ao fluxo entre países (Bekaert et al., 2023). Hadhri e Ftiti (2019) estudaram os benefícios de se investir em mercados emergentes focando-se nos valores da skewness destes mercados, tendo detetado que alguns dos mercados apresentavam uma skewness realizada positiva enquanto que outros apresentavam valores negativos para este parâmetro. Aplicaram estratégias de diversificação baseadas na skewness e obtiveram que investimentos nos mercados emergentes tendiam a ser superiores do que nos mercados desenvolvidos, especialmente em momentos de crise. Para o investidor, um mercado emergente oferece a oportunidade de um crescimento mais rápido do que o de um mercado desenvolvido. O prémio no retorno esperado vem, no entanto, acompanhado por um aumento do nível de risco, derivado da volatilidade política e da moeda que, muitas vezes, estes países possuem, Bekaert et al. (2023). Os riscos políticos não são exclusivos aos mercados emergentes, mas as práticas de expropriações, nacionalizações e de conflitos internos têm maior hipótese de serem relevantes nestes países. Os riscos da moeda também não são exclusivos aos mercados 17 emergentes, mas são baixos nos países desenvolvidos, pois são mercados mais correlacionados, tal como as suas moedas (Errunza, 1983). Este autor defende que no caso de portfólios diversificados e com um horizonte de investimento de longo prazo, o risco da moeda não deverá ser, no entanto, um entrave ao investimento em mercados emergentes. Para perceber se os mercados se encontram interligados, sejam desenvolvidos ou emergentes, a literatura faz uso da correlação (estatística) entre duas variáveis. 2.4. Correlação Para medir a correlação entre duas variáveis X e Y, existe um diverso número de coeficientes que se podem aplicar, destacando-se o coeficiente de correlação de Kendall, o coeficiente de correlação de Spearman e o coeficiente de cointegração. No entanto, os estudos empíricos e a prática dos mercados financeiros parecem usar com bastante mais frequência o coeficiente de correlação de Pearson (Corsetti et al., 2001; Ang e Chen, 2002; Zhang, 2024), que é dado pela seguinte fórmula: 𝑐𝑜𝑣(𝑋, 𝑌) 𝜌 (𝑋, 𝑌) = (1) 𝜎(𝑋)𝜎(𝑌) onde 𝜌 (𝑋, 𝑌) representa o coeficiente de correlação entre as variáveis X e Y, 𝑐𝑜𝑣 (𝑋, 𝑌) a covariância entre as duas variáveis e 𝜎(𝑋) e 𝜎(𝑌) o desvio padrão da variável X e Y, respetivamente. O conceito de correlação pode ser facilmente explicado. O valor da correlação pode variar entre -1 e 1. Um coeficiente de correlação entre a cotação das ações X e Y com valor 1, significa que existe uma correlação perfeita entre os ativos (pelo que quando a cotação da ação X aumenta (diminui) 10%, a cotação da ação Y também aumenta (diminuiu) 10%. Um coeficiente de correlação de valor -1 mostra que os ativos se movem em sentidos completamente contrários, ou seja, quando a cotação da ação X aumenta (diminui) 10%, a cotação da ação Y diminuiu (aumenta) 10%. Uma correlação menor que 1 originará menor risco, dado que a menor correlação cria diversificação. Este cenário será benéfico para os investidores (Albanese et al. 2013). 18 Seguindo a lógica, um coeficiente de correlação de 0 entre a cotação (rendibilidade) das ações que constituem a carteira, permitiria, então, a máxima diversificação. No entanto, esta afirmação encontra-se incorreta, pois o aumento da diversificação e a consequente diminuição do risco possuem um limite. O risco pode ser dividido em duas componentes: o risco específico, risco que tem associado elementos que afetam diretamente um setor e ou uma ação específica e o risco sistemático, que afeta a economia como um todo e como tal todas as empresas e ações, sendo independente das características individuais de cada ação ou setor (Melver, 2023) e, por isso enquanto o primeiro pode ser eliminado na totalidade, o segundo não (Perold, 2004). A correlação tem, no entanto, um fator negativamente associado, que é a imprevisibilidade da evolução da cotação das ações e do respetivo retorno. Ligando à temática das finanças tradicionais e comportamentais, Burgin e Meissner (2016) referem que durante a crise financeira global, se verificou que os portfólios, que segundo a teoria moderna do portfolio teriam risco baixo, subitamente tiveram aumentos significativos nas correlações e ficaram expostos a perdas significativas. Isto pode dever-se ao ser humano nem sempre ser racional, sendo muitas vezes conduzidos pelas suas emoções, o que pode levar à tomada de decisões com vieses associados e que, por consequente, pode causar alterações não esperadas nas correlações (Baker e Nofsinger, 2010). A literatura evidencia que a correlação está ligada ao conceito de diversificação. Uma elevada correlação entre ativos é sinónimo de baixa diversificação, e uma correlação baixa equivale a uma maior diversificação. A diversificação pode ser realizada domesticamente ou internacionalmente, como discutido anteriormente. 2.5. Estudos que envolvem a correlação e o contágio financeiro Ahmad et al. (2013) estudaram o contágio financeiro, fazendo a distinção entre os períodos de estabilidade e o período da crise financeira europeia definido entre outubro de 2009 e janeiro de 2012. Usou os retornos diários dos índices de ações representativos dos países GIPSI (Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Itália), os Estados Unidos da América, o Reino Unido e o Japão e os, denominados pelo autor de BRIICKS (Brasil, Rússia, Índia, Indonésia, China, Coreia do Sul e África do Sul). Para tal, utilizou o modelo Dynamic Conditional Correlation-Generalized Autoregressive Conditional Heteroskedastic (DCC-GARCH) 19 multivariado, para analisar os padrões existentes nas correlações dinâmicas ao longo do tempo na amostra que selecionou. Utilizou os preços de fecho diários dos BRIICKS, do período atrás descrito, sendo que os restantes países assumiram o papel de fator global , ou seja, economias que foram considerados influenciadoras a nível global, na equação de regressão definida pelo autor. Através das correlações condicionais obtidas através do modelo DCC-GARCH, obteve uma variação significativa das correlações entre o período pré-crise e o período da crise europeia. Também evidenciou, que existia contágio entre os GIPSI e os BRIICKS, sendo que Irlanda, Itália e Espanha demonstraram ser os mais contagiosos para os mercados dos BRIICKS. Além disso, concluiu que Brasil, Índia, Rússia, China e África do Sul foram fortemente impactados pelo choque contagioso durante o período de crise. Nguyen et al. (2022) estudaram o contágio financeiro entre os Estados Unidos da América, Japão, China e alguns países asiáticos (Índia, Indonésia, Coreia do Sul, Malásia, Paquistão, Filipinas, Taiwan, Tailândia e Vietname) durante a Crise Financeira Global e a pandemia de COVID-19. Para tal, utilizou o modelo DCC-EGARCH, uma extensão do GARCH, de modo a captar as assimetrias da volatilidade em relação a choques positivos e negativos. Foram usados os retornos diários dos índices dos mercados de ações de cada país no período compreendido entre 2005 e 2021, para estimar as correlações dinâmicas ao longo do tempo e os choques de volatilidade. Com a aplicação do modelo estatístico, obtiveram que a correlação entre o mercado norte- americano e o japonês com os países asiáticos era bastante alta durante todo o período do estudo, indicando a existência de interdependência entre estes mercados. Ficou saliente, também, o contágio com início nos Estados Unidos e que, rapidamente, contaminou os outros mercados durante a crise financeira global. Durante a pandemia, este contágio derivado dos Estados Unidos, apenas atingiu quatro dos países asiáticos. Ao utilizar o Japão e a China como países origem do contágio, este já mostrou um comportamento diferente, tendo-se propagado para oito dos países. Muzindutsi et al. (2022) estudaram o impacto da Crise Financeira Global e da pandemia de COVID-19 no contágio nos mercados financeiros entre mercados desenvolvidos e emergentes. Foi utilizado um modelo DCC-GARCH para testar os efeitos de contágio 20 usando retornos semanais de índices de três países desenvolvidos (o S&P 500 (EUA), FTSE- 100 (Reino Unido), ASX 200 (Austrália)) e de três países emergentes (IBOVESPA (Brasil), BSE SENSEX (Índia) e BVM IPC (México)) entre 05/07/2002 e 11/06/2021. Os autores definiram como hipótese nula o coeficiente de correlação condicional ser igual no período antes e durante a crise (ausência de contágio) e como hipótese alternativa ser diferente. A principal conclusão foi que a existência de uma crise num mercado vai ter repercussões nos mercados conectados. Também se verificou, que o contágio se revela mais agressivamente nos países emergentes durante os períodos de crise, e que na generalidade, os mercados sofreram mais com a pandemia do que com a crise financeira global. Hwang et al. (2010) analisaram os efeitos do contágio da crise financeira global originada nos Estados Unidos da América, no mercado internacional. Para tal, utilizaram o modelo DCC-GARCH e compararam os resultados obtidos com o período da crise asiática, tendo aplicado o mesmo em 38 países. Concluíram que durante o período de crise, o contágio aconteceu tanto nos mercados emergentes como nos mercados desenvolvidos, e que no início da crise existiu contágio e que gradualmente, durante o período restante da crise, existiu uma transição para o comportamento de herding. Concluíram, também, que o contágio foi mais severo do que aconteceu durante a crise asiática. Por fim, verificaram que notícias relacionadas com ratings do crédito soberano impactaram fortemente o mercado, existindo alterações nas correlações na presença tanto de notícias positivas como negativas. Celık (2012) através da utilização do modelo DCC-GARCH testa a existência do contágio financeiro nos mercados cambiais entre países emergentes e países desenvolvidos durante a crise do subprime nos EUA. A amostra inclui as moedas da Austrália, Brasil, Canadá, China, Dinamarca, Índia, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Noruega, Singapura, África do Sul, Coreia do Sul, Suécia, Suíça, Taiwan, Tailândia e Turquia. Concluiu que o contágio financeiro ocorreu, revelando que as economias emergentes são mais afetadas pelo efeito de contágio do que os países desenvolvidos. Também evidenciou, que os mercados emergentes além de serem os mais afetados, são os mais suscetíveis ao contágio, o que vai de acordo com o esperado, pois são países com mais instabilidade associada. 21 Wang et al. (2017) utilizou um método estatístico multiescala para estudar o contágio financeiro entre os EUA e os outros seis países do G7 (Alemanha, Canadá, França, Itália, Japão e Reino Unido) e os países BRIC (Brasil, Rússia, India e China) durante a crise financeira global. Para tal, utilizaram os preços de fecho diários na moeda local dos índices de ações daqueles países entre janeiro de 2002 e dezembro de 2009, e definiram o período de crise entre julho de 2007 e dezembro de 2009. No período de crise descrevem que as correlações aumentaram em todos os países da amostra. Através de uma metodologia que tinha por base um estudo feito por Fry et al. (2010) obtiveram que existiu contágio em todos os países do G7, exceto o Japão e, no caso, dos BRIC, o Brasil e a China também não acusaram. Em seguida, investigaram o comportamento do contágio através de diferentes escalas de tempo. Relataram que alguns países da amostra (Canadá, Alemanha, Itália, França, India e Reino Unido) apresentavam contágio em todas as escalas de tempo enquanto que para a Rússia, o Japão, a China e o Brasil, o contágio é mais variável e dependente da escala de tempo utilizada, sendo que em alguns casos apenas se verificam relações de interdependência. Para a definição de contágio e interdependência seguiram os conceitos de Forbes e Rigobon (2002). Para finalizar, concluíram que o contágio depende não só do país que é usado como recetor, mas também da escala de tempo utilizada. A revisão da literatura evidencia a complexidade do fenómeno do contágio financeiro, com resultados que variam conforme o período estudado, os países analisados e as metodologias aplicadas. Este cenário heterogéneo justifica a necessidade de aprofundar o estudo. A utilização de modelos econométricos alternativos e a definição de contágio e interdependência podem influenciar os resultados, indicando a necessidade de uma análise consistente e comparativa. A inclusão de crises mais recentes, como a pandemia de COVID-19, proporciona contributos adicionais sobre como novos tipos de choques influenciam a dinâmica do contágio. Explorar estas variáveis permitirá uma compreensão mais abrangente do tema, fornecendo bases sólidas para estudos posteriores comparativos e que usem como base a crise em causa. De seguida vamos descrever o estudo empírico que realizámos, começando por analisar os períodos que irão ser utilizados. 22 3. Metodologia O objetivo deste estudo é verificar a existência de contágio ou interdependência em dois períodos específicos, a crise financeira global e a crise provocada pela COVID-19. Estas duas crises tiveram origens completamente dispares. A primeira, como o nome sugere, teve uma origem financeira enquanto a segunda foi originada numa crise de saúde publica a nível mundial. Este capítulo encontra-se subdividido em quatro categorias. Na subseção 3.1. vão ser analisados os períodos em estudo, sendo descrito a origem das crises e os principais impactos. Na subseção 3.2. são analisadas as metodologias mais usadas em estudos na área, de modo a perceber-se qual seria a melhor metodologia a aplicar no nosso cenário. Na subseção 3.3. é descrita a metodologia que vai ser, efetivamente, utilizada e, por fim, na subseção 3.4. são detalhados os dados que vão ser utilizados e definidos os períodos que vão ser adotados como períodos em que existia estabilidade no mercado e períodos em que se sentem os efeitos das crises. 3.1. Períodos em estudo Como referido anteriormente, os dois períodos em que nos vamos focar são a Crise financeira global e a crise do COVID-19, sendo que, por isso, em seguida, vai ser apresentada uma pequena síntese dos dois momentos. 3.1.1. Crise financeira global A Crise Financeira Global, também conhecida por crise do subprime, teve o seu início nos Estados Unidos da América. A designação subprime é aplicada a empréstimos feitos a mutuários que revelam um risco superior ao normal, dado possuírem pontuações de crédito baixas e rendimentos relativamente baixos. Alguns destes empréstimos eram colocados em pools, sendo comprados por investidores com apetência para o risco (Baily et al., 2008). Quando as taxas de juro associadas a estes empréstimos começaram a subir, o número de mutuários a entrar em incumprimento começou a aumentar. Estas pools revelaram ter um risco associado muito superior ao esperado, o que originou retornos muito longe das expectativas, traduzindo-se em perdas muito elevadas e que levaram à falência muitos bancos de investimento (Baily et al., 2008; Brunnermeir, 2009; Olbryś e Majewska, 2017). 23 Os primeiros sinais de fragilidade na economia começaram a sentir-se em 2007, com uma redução na liquidez e com a falência das primeiras instituições financeiras (destacam-se a New Century Financial Corporation, a American Home Mortgage Investment Corporation e a Northern Rock). Salienta-se que transmissão da crise por meio de canais financeiros e bancários foi muito rápida e substancial (Baily et al., 2008). A Reserva Federal dos Estados Unidos da América (FED) reduziu as taxas de juro e injetou dinheiro nos mercados com o objetivo de dar alguma estabilidade no período de turbulência. No entanto, as fissuras que se abriram economia eram impossíveis de fechar, tendo ficado definidos como os momentos mais marcantes: a abertura de uma linha de crédito por parte da FED ao JP Morgan Chase para este adquirir o quinto maior banco de investimentos dos EUA (o Bear Stearns); o anúncio da falência a 15 de Setembro de 2008, do quarto maior banco de investimento norte-americano (Lehman Brothers) no que foi considerado o pico da crise financeira; a queda verificada no dia seguinte na cotação das ações da American International Group, uma das maiores seguradoras dos EUA, em cerca de 60% e o anúncio da FED de um pacote de 85 mil milhões de dólares para resgatar a seguradora (Brunnermeir, 2009; Olbryś e Majewska, 2017). De acordo com Bekaert et al. (2011), embora a crise tenha tido a sua origem nos EUA, rapidamente se transmitiu não só a nível interno a outros setores da economia, mas também, a nível externo, para outras economias, quer desenvolvidas quer emergentes, criando choques ainda maiores em alguns países comparativamente com os EUA. Na Europa, o caos também estava instalado, existindo várias instituições financeiras a necessitar de intervenções e resgates (Fortis e o Dexia foram intervencionados numa operação que envolveu o governo belga, francês, luxemburguês e holandês e o Hypo Real Estate pelo governo Alemão) (Fassin e Gosselin, 2011; Pereira e Wamens, 2012). As consequências da crise foram nefastas e acentuaram as disparidades e os efeitos na solidez dos diferentes países, especialmente das economias mais frágeis, como as de Portugal, Itália, Espanha, Irlanda e Grécia (Afonso e Verdial, 2020). A nível global, a grande maioria dos bancos centrais reduziram as taxas de juro de forma a tentar combater as quebras nas economias. 24 Entre 2008 e 2009, a economia nos EUA contraiu e a taxa de desemprego disparou para os 9.3%. O S&P 500 atingiu um pico em outubro de 2007 com o valor de 1576.09 pontos e a março de 2009 apresentava o valor de 666.79 pontos, uma queda de cerca de 58%. A timeline descrita na Figura 2, baseada nos estudos de Baily et al. (2008), Brunnermeir (2009) e Olbryś e Majewska (2017) descreve os principais acontecimentos. Figura 2: Timeline dos acontecimentos durante a crise financeira global Fonte: Autoria Própria A crise propagou-se a uma velocidade muito rápida, criando danos estruturais em vários setores da economia. As principais causas da mesma foram: a insuficiente supervisão e regulamentação financeira e bancária; as taxas de juro baixas nos empréstimos hipotecários e nos empréstimos de curto prazo que aliados à especulação levaram a abusos tanto da parte dos devedores como dos credores; e à sobrevalorização dos imóveis que originou um sentimento de que a valorização nunca iria abrandar (Olbryś e Majewska, 2017; Afonso e Verdial, 2020). 3.1.2. COVID 19 A crise causada devido à propagação do vírus COVID-19 será o segundo período que iremos analisar. A forte dispersão do vírus a nível global e as doenças que rapidamente originou, colocaram o mundo num estado de alerta sem precedentes nas últimas décadas, e criou impactos massivos nas economias a nível global (Zhang et al., 2020). 25 As doenças derivadas do vírus SARS-CoV-2 tiveram início em Wuhan, na China, em dezembro de 2019 e rapidamente se propagaram, tendo sido declarada a crise pandémica em março de 2020, devido à sua rápida capacidade de transmissão (Poursadeqiyan et al., 2020; Shereen et al., 2020). De acordo com dados do John Hopkins Coronavírus Resource Center, atualizados pela última vez a 3 de outubro de 2023, existiram 676.609.955 casos, dos quais 6.881.955 resultaram em mortes. Com a disseminação das vacinas, foram aplicadas 13.338.833.198 doses. A grandeza destes números mostra-nos o impacto a nível social que a pandemia provocou. A nível financeiro, Baker et al. (2020) afirma que nenhum surto pandémico atingiu o mercado da maneira que a pandemia derivada da COVID-19 fez, mostrando que os níveis de volatilidade atingiram picos superiores aos originados pela crise financeira global e comparáveis aos originados pela black monday em 1987 e pelo great crash em 1929. Mostrou, também, que a volatilidade teve uma descida rápida após o pico, mas manteve-se em níveis superiores ao pré-pandemia. O Dow Jones Industrial Average, um dos maiores índices do mundo, caiu 26% em apenas 4 dias e o S&P 500 que a 19 de fevereiro apresentava um valor de 3.393,52 pontos, a 23 de março estava a valer 2.191,96 pontos. Nos Estados Unidos da América o produto interno Bruto teve uma queda de 4.8% no primeiro trimestre de 2020 e a taxa de desemprego teve um pico acima dos 20% (Mazur et al. 2021). A dimensão que a COVID-19 assumiu, obrigou os vários governos a tomar medidas para não só tentar conter a pandemia, mas também, não deixar a economia afundar. Nos EUA, os estímulos fiscais aplicados devido à COVID-19 atingiram níveis sem precedentes, ultrapassando os estímulos aplicados durante a crise financeira global. O congresso dos EUA apenas entre março de 2020 e 2021, aplicou seis pacotes de estímulos e alívios fiscais, com um custo superior a 5 biliões de dólares americanos (Walmsley et al., 2022). Além disso, logo em março de 2020 a reserva federal baixou em 150 pontos base a taxa dos fundos federais, colocando as mesmas entre 0% e 0.25%, de modo a baixar o custo dos empréstimos para as famílias e para as empresas. Entraram em vigor, também, programas de compra de dívida por parte da FED, para dar estabilidade ao mercado e ajudar na eficácia de transmissão da política monetária (Clarida et al., 2021). 26 A União Europeia aprovou um plano de recuperação no valor de 750 mil milhões, e um orçamento plurianual de 1.074,3 mil milhões entre 2021 e 2027, para suportar investimentos, a resiliência e a transição verde (Conselho Europeu, 2020). O Banco Central Europeu assumiu aqui, também, um papel essencial, tendo colocado em prática vários programas, dos quais se destacam, o PEPP (Pandemic emergency purchase programme) com um envelope financeiro de 1.850 mil milhões de euros. Alterou, também, a estrutura e custos associados a operações de refinanciamento de liquidez de longo prazo, de modo a aumentar o acesso à liquidez por parte dos bancos, tendo para tal, reduzido as taxas de juro e ampliado o leque de garantias elegíveis para Operações de refinanciamento de prazo alargado direcionadas III (TLTRO III) e introduzindo operações de emergência pandêmica de refinanciamento de longo prazo (PELTROs) (Rahmouni-Rousseau, 2021). 3.2. Metodologias utilizadas para estudar o contágio financeiro Para o estudo do contágio e interdependência é usual a utilização do modelo Autoregressive Conditional Heteroskedasticity (ARCH) que foi introduzido por Engle (1982) e que sugere que a variância dos resíduos num momento t, está dependente dos quadrados dos erros em períodos anteriores. Quando as variâncias dos termos de erro não são iguais e ou os erros previstos ou estimados são maiores para alguns pontos ou intervalos dos dados do que para outros, são ditos sofrer de heteroscedasticidade (Engle, 2001). Na presença de heteroscedasticidade, os coeficientes de regressão para uma regressão de mínimos quadrados mostram-se sem vieses, mas os erros e os intervalos de confiança estimados pelos procedimentos convencionais serão muito limitados, o que pode originar uma sensação de precisão que não se mostra verdadeira (Engle, 2001). O modelo ARCH é útil nesta situação, pois incorpora a heteroscedasticidade, tratando-a como uma variância a ser modelada, já que fornece ou calcula uma estimativa para a variância de cada termo de erros, que leva a que as deficiências dos mínimos quadrados sejam corrigidas (Engle, 2001), tornando-se muito útil nas séries de dados financeiras, pois com a correção efetuada torna os resultados mais fiáveis. 27 O modelo é usado para modelar a volatilidade em séries temporais financeiras, o que significa que tenta capturar como a volatilidade dos preços dos ativos muda ao longo do tempo. No entanto, pode requerer uma quantidade elevada dados históricos (longos períodos de lag) para capturar completamente como os retornos passados afetam a volatilidade atual. Isso é problemático porque, em finanças, a volatilidade pode mudar rapidamente e os efeitos de eventos passados podem-se dissipar ou mudar ao longo do tempo. Portanto, se o modelo ARCH não considerar adequadamente todos os dados históricos relevantes, pode subestimar ou superestimar a volatilidade atual, o que pode levar a previsões imprecisas ou inadequadas sobre a volatilidade futura. Ao colocar no modelo a volatilidade que já incorpora o lag, adquire-se o potencial para incorporar os retornos históricos. Este processo leva-nos ao modelo GARCH. Bollerslev (1986) introduziu esta nova extensão, denominado, então, GARCH (Generalized Autoregressive Conditional Heteroskedastic), que permite adotar uma estrutura de desfasamento mais flexível. O modelo GARCH inclui uma componente autorregressiva que captura a dependência da volatilidade atual em relação aos erros quadrados, representando, por isso, a persistência dos choques de volatilidade ao longo do tempo; A Heteroscedasticidade Condicional é capturada pela variância condicional, que muda ao longo do tempo com base nos dados passados. O “generalized” advém do modelo ser mais flexível do que o ARCH, dado incluir um termo de desfasamento para as duas componentes, autorregressiva e da variância condicional. Esta técnica ganhou popularidade, dado o seu poder para capturar as alterações das variâncias de dados financeiros. A variância deste modelo não é constante e utiliza a volatilidade condicional, definida como volatilidade num determinado período, condicionada a períodos anteriores. Quando o GARCH é aplicado a apenas uma série temporal denomina-se por GARCH univariável. Contudo quando o ARCH e o GARCH são univariáveis, não permitem descrever as relações entre várias variáveis, revelando, por isso, falhas na estimação nos excessos de volatilidade em diferentes mercados. É aqui que entra o GARCH multivariável, 28 que além de mostrar a fonte e a intensidade da transmissão dos choques entre diferentes variáveis, permite, também, mostrar os efeitos dos choques cruzados e da transmissão de volatilidade entre variáveis (Zhong e Liu, 2021). O modelo GARCH mais usado é o GARCH (1,1), sendo que o primeiro número representa os lags autorregressivos ou termos ARCH que aparecem na equação, e o segundo número representa quantos lags da média móvel são especificados. Existem diversos modelos baseados no GARCH Multivariável, sendo um dos mais utilizados o DCC-GARCH (Dynamic Conditional Correlation - GARCH). Este modelo foi proposto por Engle (2002) e permite analisar a interdependência entre vários mercados, através da estimação de correlações condicionais que variam com o tempo. O modelo DCC-GARCH é estimado em duas fases. Na primeira são criados modelos GARCH univariados para cada série residual e, na segunda, os resíduos, transformados pelo desvio padrão estimado durante a primeira etapa, são usados para estimar os parâmetros da correlação dinâmica Distingue-se dos restantes modelos porque analisa as correlações condicionais dinâmicas ao longo do tempo, o que permite visualizar mudanças no comportamento dos investidores em relação a choques. Assim, torna-se possível estudar o efeito contágio em períodos de crise (Chiang et al., 2007; Syllignakis e Kouretas, 2011). Como os coeficientes de correlação dos resíduos padronizados são medidos, leva-se diretamente em consideração a heteroscedasticidade (Chiang et al., 2007). Dado o ajuste contínuo da volatilidade, o viés provocado pela mesma é eliminado (Le e Tran, 2021), o que faz então com que o DCC- GARCH se transforme num modelo superior para medir a correlação (Cho e Parhizgari, 2008). O modelo DCC-GARCH é definido da seguinte forma: 29 1 𝑋𝑡 = 𝜇𝑡 + 𝐻𝑡2 𝜀𝑡 𝐻𝑡 = 𝐷𝑡 𝑅𝑡 𝐷𝑡 − 1 − 1 (2) 𝑅𝑡 = (𝑑𝑖𝑎𝑔 (𝑄𝑡 )) 2 𝑄𝑡 (𝑑𝑖𝑎𝑔 (𝑄𝑡 ) ) 2 { 𝐷𝑡 = 𝑑𝑖𝑎𝑔( √ℎ11,𝑡 , √ℎ22,𝑡 , … , √ℎ𝑁𝑁,𝑡 Onde 𝑋𝑡 = (𝑋1𝑡 , 𝑋2𝑡 ,... , 𝑋𝑁𝑡) é o vetor de observações passadas, 𝐻𝑡 é a variância condicional multivariada, 𝜇𝑡 = (𝜇1𝑡 , 𝜇2𝑡 ,... , 𝜇𝑁𝑡) é o vetor de retornos condicionais, 𝜀𝑡 = (𝜀1𝑡, 𝜀2𝑡,..., 𝜀𝑁𝑡) é o vetor de resíduos padronizados, 𝑅𝑡 é uma matriz de correlações dinâmicas simétricas N × N, 𝐷𝑡 é uma matriz diagonal de desvios padrão condicionais para as séries de retornos, obtidas a partir da estimação de um modelo GARCH com √hii,t na diagonal i onde 𝑖 = 1,2,... , 𝑁. As especificações do DCC são as seguintes: 𝑄𝑡 = (1 − 𝜓 − 𝜁)𝑄̅ − 𝜁𝑄𝑡−1 + 𝜓𝛿𝑖,𝑡−1 𝛿𝑗 ,𝑡−1 (3) 𝑅𝑡 = 𝑄𝑡∗−1 𝑄𝑡 𝑄𝑡∗−1 Onde: (𝑄𝑡) = [𝑞𝑖𝑗,𝑡 ] traduz-se em (𝑁 × 𝑁) matriz de covariância variável no tempo de resíduos δ padronizados (𝛿𝑖𝑡 = √hit ) it 𝑄̅são as correlações incondicionais de 𝛿𝑖,𝑡𝛿𝑗,𝑡 e 𝜓 e ζ são parâmetros escalares não-negativos que satisfazem 𝜓 + 𝜁 < 1. 𝑄𝑡 ∗= [𝑞 ∗𝑖𝑖,𝑡 ]=√𝑞𝑖𝑖,𝑡 é uma matriz diagonal com raiz quadrada da posição diagonal i. Para um par de mercados i e j, a sua correlação condicional no tempo t pode ser definida por: (1 − 𝜓 − 𝜁 )𝑞̅𝑖𝑗 + 𝜓𝛿𝑖 ,𝑡−1 + 𝜁𝑞𝑖𝑗,𝑡−1 𝑝𝑖𝑗 ,𝑡 = (4) [ (1 − 𝜓 − 𝜁 )𝑞̅𝑖𝑗 + 𝜓𝛿 2 𝑖,𝑡−1 + 𝜁𝑞𝑖𝑗,𝑡−1 ] 1/2 [( 1 − 𝜓 − 𝜁 ) 𝑞 ̅𝑖𝑗 + 𝜓𝛿 2𝑗,𝑡−1 + 𝜁𝑞𝑖𝑗,𝑡−1 ]1/2 30 Onde 𝑞𝑖𝑗 é o elemento na linha i e coluna j da matriz 𝑄𝑡. Os parâmetros são estimados usando o método de máxima verossimilhança quase-quadrática (QMLE) apresentado por Bollerslev et al. (1992). Com a suposição gaussiana em mente, a log-verossimilhança dos estimadores é: 1 𝐿(𝜗) = − 2 ∑𝑇𝑡=1[𝑛𝑙𝑜𝑔 (2𝜋) + 𝑙𝑜𝑔| 𝐷𝑡 |2 + 𝜀𝑡′ 𝐷𝑡−1 𝐷𝑡−1 𝜀𝑡 ] + (𝑙𝑜𝑔 |𝑅𝑡 | + 𝛿𝑡′ 𝑅𝑡−1 𝛿𝑡 − 𝛿𝑡′ 𝛿𝑡 ) (5) Onde: 𝑛 é o número de equações, 𝑇 é o número de observações, 𝜗 é o vetor de parâmetros a serem estimados. Este modelo adequar-se-ia bem para o estudo em causa, no entanto, existem falácias que poderiam criar vieses graves para a dimensão da amostra que vai ser utilizada no nosso estudo. Ng e Lam (2006) definem que para amostras inferiores a 700, podem ser obtidas soluções adicionais erróneas com a aplicação da estatística que forma o modelo. Hwang e Pereira (2004) referem que as condições de não-negatividade definidas por Bollerslev et al. (1992) criam restrições em amostras pequenas, principalmente, no caso do GARCH (1,1), que originam erros de convergência dos dados, que se traduzem em vieses positivos nas estimativas ARCH e GARCH. Concluem, então, que para resultados com veracidade seriam necessárias pelo menos 500 amostras em modelos GARCH (1,1). 3.3. Metodologia Utilizada No estudo que nos propomos realizar, as amostras de cada período atingiram no máximo 156 observações devido à periocidade dos retornos usada (semanal) e ao período de análise definido como período estável e período de crise, pelo que as condições para seguir um modelo GARCH não estão reunidas. Decidiu-se, então, seguir a metodologia definida por Forbes e Rigobon (2002) que referem que a heteroscedasticidade é o maior problema no estudo das correlações entre períodos. 31 Referem ainda que em muitos destes estudos são usados coeficientes de correlação não ajustados e, por isso, sujeitos a um viés provocado pela heterocedasticidade, que é mais intenso, em períodos de maior volatilidade, como aqueles que vão ser analisados neste estudo. Para provarem este pressuposto, apresentam o coeficiente de correlação de Pearson (equação 6) e mostram que a correlação estimada entre as duas variáveis X e Y, estará dependente da variável X e que, por isso, se a variância de X aumentar, o coeficiente irá aumentar também, mesmo que a correlação real entre X e Y não se altere. Forbes e Rigobon (2002) resumem o conceito numa frase: “Estimativas do coeficiente de correlação simples sofrem de viés e são condicionais à variância de x” (Forbes e Rigobon, 2002, p.2233) 𝜎𝑥𝑦 𝜎𝑥 𝜌(𝑥, 𝑦) = =𝛽 (6) 𝜎𝑥 𝜎𝑦 𝜎𝑦 Para quantificar este viés os autores utilizam a seguinte fórmula: 1+𝛿 𝜌∗ = 𝜌√ (7) 1 + 𝛿𝜌2 Onde: 𝜌 ∗ é o coeficiente de correlação não ajustado (condicional); 𝜌 é o coeficiente de correlação ajustado (não condicional); 𝛿 é o aumento relativo na variância de 𝑥, definido da seguinte forma: ℎ 𝜎𝑥𝑥 (8) 𝛿= 𝑙 −1 𝜎𝑥𝑥 Esta fórmula mede o aumento da variância entre o período estável e o período de crise, no país de origem do contágio. Um aumento do coeficiente de correlação não ajustado (fórmula 7) vai estar, então, dependente de um aumento da variável 𝛿. Uma vez que os mercados apresentam naturalmente maiores níveis de volatilidade em períodos de crise, o coeficiente de correlação condicional apresentaria níveis de correlação 32 superiores e tendenciosos derivados da heteroscedasticidade, o que nos poderia levar erradamente a aceitar que estaríamos na presença de contágio, como sugerem os autores: “Em outras palavras, a heterocedasticidade nos retornos de mercado pode causar uma estimativa tendenciosa para cima dos coeficientes de correlação entre mercados após uma crise” (Forbes e Rigobon, 2002, p.2233). Sem o ajuste deste viés um aumento do coeficiente não ajustado entre dois períodos não significaria necessariamente um aumento no coeficiente ajustado no mesmo espaço de tempo. Executa-se, então, um ajustamento na fórmula apresentada anteriormente (equação 7), de modo a ajustá-la para combater o viés. Através da simples manipulação da equação (7), os autores apresentam a equação 9, que vai permitir calcular o coeficiente de correlação ajustado (não condicional): 𝜌∗ 𝜌= (9) √1 + 𝛿[1 − 𝜌∗ 2 ] Com a metodologia definida, vamos precisar de desenvolver os conceitos de contágio e interdependência descritos anteriormente e especificar aquele que vamos adotar. Nos últimos anos têm surgido na literatura novas definições de contágio e novas maneiras de o testar como o método de cópulas (Wen et al., 2012; Yuan et al., 2022; Benkraiem et al., 2022) e novas abordagens que usam como base vetores autorregressivos (Agosto et al., 2020; Giudici et al., 2020). No entanto, neste estudo vamo-nos focar no conceito, também introduzido por Forbes e Rigobon (2002), aplicando-o em dois períodos temporais distintos e fazendo um tratamento diferenciado aos dados (que será apresentado no próximo capítulo), que vai consistir em retirar os fatores decorrentes de mudanças de câmbio através da atualização dos preços dos diferentes índices para uma mesma moeda, neste caso, o dólar americano e, após a obtenção dos retornos de cada índice, calcular retornos logarítmicos, suavizando as variâncias e aproximando-as de distribuições normais. Segundo Forbes e Rigobon (2002), o contágio (conforme descrito anteriormente), baseia-se num fundamento simples: se a correlação aumentar durante um período de crise comparado 33 com um período pré-crise, (também denominado período estável), então estaremos na presença de aumento da transmissão de choques entre mercados. No entanto, os autores acrescentam que este aumento não pode ser interpretado imediatamente como contágio. Se os mercados já tiverem historicamente uma correlação alta, então, o aumento da correlação após um choque pode não significar obrigatoriamente a presença de contágio, mas sim de interdependência entre os países num período de maior volatilidade. Nesta sequência, ir-se-á testar a seguinte hipótese: 𝐻0 : 𝜌𝑐 ≤ 𝜌𝑒 → 𝑁ã𝑜 𝑒𝑥𝑖𝑠𝑡𝑒 𝑐𝑜𝑛𝑡á𝑔𝑖𝑜 { (10) 𝐻1 : 𝜌𝑐 > 𝜌𝑒 → 𝐶𝑜𝑛𝑡á𝑔𝑖𝑜 𝜌𝑐 : Coeficiente de correlação ajustado do período de crise 𝜌𝑒 : Coeficiente de correlação ajustado do período estável A H0 é a hipótese nula que a verificar-se sugere que não existiu contágio. A H1 é a hipótese alternativa e mostra que o contágio efetivamente existiu. Para o teste, utilizar-se-ão as transformações Z de Fisher, que são sugeridas quando se deseja comparar diretamente correlações entre dois períodos, aproximando os coeficientes de uma distribuição normal e tornando a comparação mais apropriada (Corsetti et al., 2005; Gelos et al., 2000). O teste de hipóteses passará a ser o seguinte: 𝐻0 : 𝜌𝑐 ≤ 𝜌𝑒 ⟹ 𝐻0 : 𝑍𝑐 ≤ 𝑍𝑒 (11) { 𝐻1 : 𝜌𝑐 > 𝜌𝑒 ⟹ 𝐻1 : 𝑍𝑐 > 𝑍𝑒 Os valores críticos para o teste Z de Fisher em 1%, 5% e 10% são 2.33, 1.65 e 1.28, respetivamente. Qualquer resultado do teste superior aos valores críticos indica contágio. Qualquer resultado menor ou igual a esses valores críticos indica um fenómeno diferente e, por isso, não se considera contágio. 34 3.4. Dados Neste estudo vamos utilizar os dados dos 10 países com as maiores economias a nível mundial, tendo por base, o PIB, (segundo dados do World Bank atualizados ao ano de 2022) e os respetivos índices bolsistas descritos na tabela 1. Tabela 1: PIB dos países da amostra e descrição das variáveis Milhões de dólares Fonte: Adaptado de World Bank (2024) Temos uma amostra constituída por sete países desenvolvidos (Estados Unidos da América, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Canadá e Itália) e três emergentes (China, India e Rússia). Para a realização do estudo vai ser necessário a utilização de índices bolsistas em representação de cada um dos países escolhidos. Seguindo a ordem decrescente em termos do PIB temos, então, o Standard & Poor’s 500 (S&P), Shanghai Stock Exchange (SSE Composite Index), Nikkei heikin kabuka 225 (Nikkei), Deutscher Aktien Index 30 (DAX 30), India Stock Exchange (Nifty 50), Financial Times Stock Exchange 100 (FTSE 100), Cotation Assistée en Continu 40 (CAC 40), MOEX Russia (IMOEX), S&P/TSX Composite Index (SPTSX), Milano Indice di Borsa (FTSE MIB). Estes países tiveram em 2022 tiveram um PIB combinado de 67.430.424,50 milhões de dólares, segundo dados do World Bank (2024), atualizados ao ano de 2022, sendo que os EUA contribuíram com, aproximadamente, 38% deste valor pelo que se revelam a maior economia do mundo. Como tal, será o país considerado como fonte de contágio, pois 35 choques no mesmo, terão mais propensão a expandirem-se para outras economias, como demonstrado nos trabalhos de Celık (2012), Le e Tran (2021) e Gunay e Can (2022). O período de análise está compreendido entre janeiro de 2005 e dezembro de 2023. Deste modo, a amostra irá englobar duas grandes crises a nível global, a crise financeira global e a crise pandémica originada pelo vírus SARS-CoV-2, também denominado, COVID-19, e às quais vão ser dadas destaque na análise. Para a definição do início e do fim dos períodos de crises efetuou-se uma revisão de literatura. O primeiro período é representado pela crise financeira global, que teve o seu pico na falência do banco de investimentos, Lehman Brothers, em setembro de 2008 (Hagen et al., 2010). Olbryś e Majewska (2017) no seu estudo focado no aumento das correlações entre mercados durante a crise financeira global, definiram como o período de crise, o espaço temporal compreendido entre dezembro de 2007 e fevereiro de 2009. Hagen et al. (2010) analisaram os spreads de obrigações governamentais em mercados denominados em dólares americanos e em euros antes e durante a crise. Definiram como período de agitação o compreendido entre agosto de 2007 e agosto de 2008, e o período de crise entre setembro de 2008 e maio de 2009. Celık (2012) e Nguyen et al. (2022) usam como período de crise as datas de julho de 2007 a agosto de 2009 e setembro de 2007 a dezembro de 2009, respetivamente. A turbulência nos mercados financeiros iniciou-se ainda em 2007 e, por isso, alguns autores (Baily et al., 2008; Hagen et al., 2010; Olbryś e Majewska, 2017) assumem que esse é o ano que deve ser considerado como o inicial. Neste estudo, seguimos Ahmad et al. (2013) que usou como período da crise as datas de janeiro de 2008 a dezembro de 2009. 36 O segundo período é representado pela disseminação do coronavírus (COVID-19) a partir de Wuhan na China em dezembro de 2019, e pela declaração do estado de pandemia pela Organização Mundial de Saúde ocorrido a 11 de março de 2020. Esta rapidamente se propagou causando danos brutais em vários mercados financeiros a nível global (e tambám na economia real) (Zhu et al., 2020). Para a definição do período abrangido pela crise COVID-19, também se efetuou uma revisão da literatura que está sintetizada na figura 3. Constata-se que a data de início é muito semelhante para todos os autores, e que existem discrepâncias para a data de fim. Figura 3: Revisão literária de datas usadas para definição do período da crise do COVID-19 2019 2020 2021 2022 Autores Metodologia utilizada 11 12 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 01 02 03 04 05 06 07 08 Nguyen et al. (2022) DCC-EGARCH Muzindutsi et al. (2022) DCC-GARCH Yuan et al. (2022) Copula-EVT Benkraiem et al. (2022) Copula Kang et al. (2024) Regressões Multifractal detrended Raza et al. (2024) fluctuation analysis Regressão Quantílica em Painel e Mínimos Ullah et al. (2023) Quadrados Generalizados Estimados em Painel Fonte: Autoria Própria 37 Neste estudo usamos como o período de crise da COVID-19 o compreendido entre janeiro de 2020 e dezembro de 2021. A data de início segue o que foi realizado por Nguyen et al. (2022), Muzindutsi et al. (2022) e Ullah et al. (2023). A data final como se observou na figura 3 atrai maior divergência. Kang et al. (2024), Muzindutsi et al. (2022) e Ullah et al. (2023) marcam-na ainda no ano de 2020. No entanto, Benkraiem et al. (2022) e Nguyen et al. (2022) definem-na já em junho e julho de 2021, respetivamente. Yuan et al. (2022) e Raza et al. (2024) colocam a data final no decorrer do ano de 2022. Verifica-se uma certa abertura, então, para a escolha da data. Decidi, por isso, colocar o limite do período no final de 2021, dado a maioria das economias a nível global já se encontrarem totalmente abertas, o número de vacinas distribuídas ser muito considerável e já existir um regresso à normalidade em muitos países. O horizonte temporal da amostra engloba um período de 19 anos (2005 a 2023) que é mais extenso do que o usado em estudos sobre testes de contágio. Julgamos que isto permitirá i) obter evidências mais sustentadas no efeito tempo, pois englobará duas crises muito impactantes a nível financeiro, económico e social; ii) visualizar as dinâmicas existentes entre as correlações e ajudar a perceber o impacto das crises na diversificação dos portfólios, pois níveis de contágio muito elevados reduzem o valor e o efeito da diversificação. Estas duas crises foram usadas como os principais marcos para os objetivos do nosso estudo e para a subdivisão da amostra nos quatro subperíodos seguintes: Período antes da crise financeira global: janeiro de 2005 a dezembro de 2007; Período de crise financeira global: janeiro de 2008 a dezembro de 2009; Período antes da crise pandémica: janeiro de 2017 a dezembro de 2019; Período de crise pandémica: janeiro de 2020 até dezembro de 2021. Usamos os preços de fecho dos índices com uma periodicidade semanal, extraídos do site Yahoo finance (apêndice 1), para evitar o ruído excessivo na amostra e os vieses específicos a cada mercado (que podem surgir com o uso dos retornos diários) e a perda de dados que 38 pode ocorrer com o uso de periodicidades superiores (Syllignakis e Kouretas, 2011; Changqing et al., 2015). Os índices da amostra estão denominados em moeda local, pelo que foram convertidos para dólares americanos, dado que é a moeda de reserva mais utilizada globalmente e em transações internacionais. Deste modo, segundo Chen et al. (2002) evitaremos a volatilidade causada por fenómenos monetários, como mudanças nas taxas de inflação esperadas e atuais. A conversão efetuou-se através do produto do preço de fecho semanal de cada índice pelo preço de fecho semanal da respetiva taxa de câmbio entre o dólar americano e a moeda local do índice utilizado. De seguida calculamos os retornos semanais, com base no método logarítmico, traduzido na seguinte fórmula: 𝑃𝑆 𝑅𝑆 = ln ( ) (12) 𝑃𝑆−1 𝑅𝑆 : Rendibilidade Semanal 𝑃𝑆 : Preço de fecho semanal 𝑃𝑆−1 : Preço de fecho da semana anterior Numa primeira análise calcularam-se as estatísticas descritivas dos dados relativas aos retornos obtidos (apêndice 2), através do software de análise R. Posteriormente apliquei o modelo desenvolvido por Forbes e Rigobon (2002). 39 4. Descrição e Análise de dados A primeira análise que vamos fazer é às estatísticas descritivas dos retornos semanais dos índices em análise, nomeadamente à média, aos mínimos e máximos, ao desvio padrão, à skewness e à curtose. A média permite criar uma tendência dos dados, e visto que os mesmos têm um máximo e um mínimo é importante destacá-los. Os retornos individuais têm variações em relação à média, e o desvio padrão permite verificar a volatilidade associada aos mesmos (Vetter, 2017). A distribuição de dados tem uma dispersão específica e a sua assimetria é dada pela skewness, que nos evidencia se os dados tendem para valores mais altos ou mais baixos (Kim, 2013). A Curtose, mede as caudas da distribuição, sendo que uma curtose alta indica caudas compridas, o que mostra que eventos extremos são mais propensos a ocorrer (Kim, 2013). O teste estatístico de Jarque-Bera permite analisar se a skewness e a curtose dos dados seguem uma distribuição normal (Thadewald e Büning, 2007). Na tabela 2 encontram-se as estatísticas descritivas para os 4 períodos definidos e para um período adicional, após a última crise em estudo. 40 EUA CHI JAP ALE IND RUN FRA RUS CAN ITA Periodo Pré-Crise Média 0.0011 0.0102 0.0014 0.0046 0.0080 0.0021 0.0030 0.0087 0.0041 0.0020 Máximo 0.0348 0.1336 0.0634 0.0578 0.0947 0.0486 0.0578 0.1150 0.0445 0.0461 Crise Financeira Minimo -0.0502 -0.0774 -0.0878 -0.0696 -0.1275 -0.0737 -0.0684 -0.1651 -0.0733 -0.0611 Global Desvio Padrão 0.0159 0.0353 0.0225 0.0234 0.0331 0.0198 0.0225 0.0388 0.0234 0.0199 Skweness -0.6371 0.1249 -0.3420 -0.5654 -0.6360 -0.5470 -0.4641 -1.0072 -0.8144 -0.4265 2005-2007 Curtose 0.6089 0.8389 1.2498 0.8209 1.3679 1.2150 0.6278 3.2938 0.3521 0.3105 Jarques Bera 13.553(0.001) 5.546(0.062) 14.168(0.001) 13.399(0.001) 23.912(0) 18.407(0) 8.668(0.01) 100.94(0) 18.597(0) 5.634(0.06) EUA CHI JAP ALE IND RUN FRA RUS CAN ITA Fonte: Autoria Própria Periodo Crise Média -0.0023 -0.0041 -0.0017 -0.0028 -0.0035 -0.0035 -0.0034 -0.0051 -0.0020 -0.0048 Máximo 0.1136 0.1371 0.0776 0.1551 0.1905 0.1561 0.1328 0.3586 0.1559 0.1288 Crise Financeira Minimo -0.2008 -0.1460 -0.2382 -0.2719 -0.1927 -0.2754 -0.2790 -0.2865 -0.2629 -0.2721 Global Desvio Padrão 0.0424 0.0519 0.0417 0.0579 0.0592 0.0546 0.0554 0.0882 0.0595 0.0597 Skweness -0.7231 -0.0481 -1.6200 -0.9097 -0.2091 -1.0609 -1.0735 0.0612 -0.9233 -1.0805 2008-2009 Curtose 4.0011 0.2278

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