Resumo de Psicopatologia Especial PDF
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Este documento apresenta um resumo da Psicopatologia Especial, explorando as diferenças entre a visão descritiva e psicanalítica deste campo da psicologia. O texto discute a relação entre os sintomas e as experiências pessoais, colocando ênfase nos conceitos de neurose e psicose.
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As distinções entre psicopatologia descritiva x psicopatologia psicanalítica. O sentido do Sintoma. […] a psiquiatria clínica pouco se preocupa com a forma de manifestação e o conteúdo do sintoma, mas que justamente nisso intervém a psicanálise, cuja primeira constatação é de que o sintoma possui u...
As distinções entre psicopatologia descritiva x psicopatologia psicanalítica. O sentido do Sintoma. […] a psiquiatria clínica pouco se preocupa com a forma de manifestação e o conteúdo do sintoma, mas que justamente nisso intervém a psicanálise, cuja primeira constatação é de que o sintoma possui um sentido e guarda relação com as vivências do enfermo (FREUD, 1917, p. 274). Psicopatologia descritiva: Relação com a área médica; Psiquiatria; CID/DSM; Corpo/biológico; Individualista; Imediatista; Ahistórico/apolitico/asocial. A psiquiatria não aplica os meios técnicos da psicanálise; ela prescinde de vincular o que quer que seja ao conteúdo da ideia delirante e, apontando para a hereditariedade, nos fornece uma etiologia bastante genérica e distante, em vez de primeiramente indicar as causas mais específicas e próximas. (FREUD, 1917, p. 272). De onde vem, então? Ideias delirantes existem com os mais variados conteúdos. Por que, no nosso caso, esse conteúdo é justamente o ciúme? Em que pessoas formam-se ideias delirantes, ou, em particular, ideias delirantes de ciúme? Sobre isso gostaríamos de ouvir o psiquiatra, que, no entanto, nos deixará na mão. Ele só investigará um único aspecto de nossos questionamentos. Vai pesquisar a história familiar dessa mulher e, talvez, apresentar a seguinte resposta: ideias delirantes formam-se naquelas pessoas em cujas famílias já se verificaram repetidas vezes perturbações psíquicas semelhantes ou de outros tipos. Em outras palavras, se essa mulher desenvolveu uma ideia delirante, foi a hereditariedade que a predispôs a tanto. (FREUD, 1917, p. 268). Psicopatologia psicanalítica (psicodinâmica): Cultura; Relações; Segundo está visão: […] a ideia delirante já não é disparatada ou incompreensível: ela se revela plena de sentido, dotada de boa motivação e se insere no contexto de uma vivência afetiva da paciente. (FREUD, 1917, p. 270-271). Sendo assim sonhos, chistes e atos falhos tem em si um sentido proveniente de uma instância inconsciente, segundo a concepção psicanalítica. Portanto, os sintomas neuróticos têm seu sentido, tal como os atos falhos e os sonhos, e, como estes, guardam também relação com a vida das pessoas que os exibem. (FREUD, 1917, p. 275). A psicanálise está para a psiquiatria assim como a histologia para a anatomia; uma estuda a forma exterior dos órgãos, ao passo que a outra se dedica ao estudo de sua constituição a partir dos tecidos e células. Não se pode conceber uma contradição entre estudos que dão continuidade um ao outro. (FREUD, 1917, p. 272-273). Na visão de Freud a psicanálise pode ser compreendida como um aprofundamento da psiquiatria, visando a compreensão dos processos mais profundos e inconscientes, que se desenvolvem na vida psíquica dos indivíduos. O diagnóstico estrutural: Neurose e Psicose. A Perda da Realidade na Neurose e na Psicose. A neurose e a psicose como estruturas clínicas: Ao longo de sua obra, Freud se debruçou nas pesquisas das denominadas "doenças nervosas" e no método clínico investigativo para propor uma teoria, com indicação de modelos das organizações psíquicas dos sujeitos, as assim chamadas estruturas psíquicas. Utilizando a referência de Dunker (2016), no vídeo referenciado a respeito, veem-se estas organizações como "[...] um modo de se fazer sujeito na linguagem com o outro [...]", por isso a relação transferencial é tão cara à Psicanálise, pois somente partindo deste prisma podemos compreender o sujeito. CHRISTIAN DUNKER. Naturalização das estruturas neurótica, psicótica e paranoica? | Christian Dunker | Falando nisso 63. 2016. Disponível em: https:// www.youtube.com/watch?v=BxWfAzWIm0Q. Acesso em: 08 set. 2024. Logo, as estruturas psíquicas funcionariam como um sistema de pensamentos subjetivos (conscientes e inconscientes) que produzem efeitos (sintomas, inibições, angústias), sendo estes que, na relação transferencial estabelecida no processo de análise, nos dão indícios da forma pela qual o sujeito opera, do ponto de vista do desejo, da angústia e do gozo, determinando as três estruturas propostas pela psicanálise: neurose, psicose e perversão. Estruturas clínicas e os seus tipos (na prova não será trabalhado o tópico perversão). Lembre-se: tais conceitos assumem um caráter didático no sentido da compreensão da complexidade dos funcionamentos psíquicos e à constituição do sujeito e, portanto, permitem ao analista desempenhar uma escuta em que o analisando possa reconhecer em si, por exemplo, padrões de repetição não resolvidos que lhes causam sofrimento na relação com o outro e, portanto, em seu processo de socialização. Neurose e psicose: Recentemente apontei, como um dos traços que distinguem a neurose da psicose, que na primeira o Eu, em sua dependência da realidade, reprime uma parte do Id (da vida instintual), enquanto na psicose o mesmo Eu, a serviço do Id, retira-se de uma parte da realidade. Para a neurose, então, o fator decisivo seria a influência preponderante da realidade, para a psicose, a influência do Id. (FREUD, 1924, p. 194). Tanto a neurose como a psicose são expressões da rebeldia do Id contra o mundo externo, de seu desprazer ou, se quiserem, de sua incapacidade de adequar-se à necessidade real, à ? Ανάγκη [necessidade]. (FREUD, 1924, p. 196). Na neurose uma porção da realidade é evitada mediante a fuga, enquanto na psicose é remodelada. Lembre-se: a neurose não nega a realidade, apenas não quer saber dela; a psicose a nega e busca substitui-la. (FREUD, 1924, p. 196). Dificilmente se duvidará que na psicose o mundo da fantasia tem o mesmo papel, que também nela constitui o armazém do qual é extraído o material ou o modelo para construir a nova realidade. Mas o novo mundo exterior fantástico da psicose pretende se pôr no lugar da realidade externa, enquanto o da neurose, tal como o jogo das crianças, apoia-se de bom grado numa porção da realidade — uma diferente daquela de que foi preciso defender-se —, dá-lhe uma importância especial e um sentido oculto, que, de maneira nem sempre correta, chamamos de simbólico. Assim, tanto para a neurose como para a psicose há a considerar não apenas a questão da perda da realidade, mas também de uma substituição da realidade. (FREUD, 1924, p. 198). […] a neurose seria o resultado de um conflito entre o Eu e seu Id, enquanto a psicose seria o análogo desfecho de uma tal perturbação nos laços entre o Eu e o mundo exterior. (FREUD, 1924, p. 159). O segundo estágio da psicose visa também compensar a perda da realidade, mas não à custa de uma restrição do Id — como, na neurose, à custa da relação com o real —, e sim por uma via mais autônoma, pela criação de uma nova realidade, que não desperte a mesma objeção que aquela abandonada. (FREUD, 1924, p. 195-196). Quanto a outras formas de psicose, as esquizofrenias, sabe-se que tendem a resultar no embotamento afetivo, isto é, na perda de todo interesse no mundo exterior. Sobre a gênese das formações delirantes, algumas análises nos ensinaram que o delírio é como um remendo colocado onde originalmente surgira uma fissura na relação do Eu com o mundo exterior. (FREUD, 1924, p. 161). Exemplo de neurose: Caso Anna O. (Neurose histérica): Indicação: Filme: Freud, além da alma (traz uma referência ao caso de Anna O.) Tal caso clínico é o caso zero da psicanálise, pois foi na discussão deste caso que Freud e Breuer constataram a eficácia no tratamento de hipnose com sugestão, pois os sintomas de conversão cessavam. Na apresentação deste caso, Breuer escreveu um episódio em que esse método fez cessar os sintomas: Ocorrera no verão um período de intenso calor e a paciente sofrera de uma sede atroz, pois, sem que pudesse precisar algum motivo, de repente achou impossível beber [...] um dia, na hipnose, discorreu sobre sua dama de companhia inglesa, a quem não amava, e então contou-me, com todos os sinais de repulsa, como fora a seu quarto e ali vira seu cãozinho, o repugnante animal, bebendo de um copo. Não dissera nada, pois queria ser gentil. Depois de energicamente dar expressão à fúria que lhe ficara retida, pediu para beber, bebeu sem dificuldade um grande volume de água e despertou da hipnose com o copo nos lábios. Com isso, a perturbação desapareceu para sempre (BREUER; FREUD, 1893-1895/2016, p. 47). Exemplo de psicose: Norman Bates de Bates Motel (série). Modelos asilar e psicossocial: […] as pessoas com transtornos mentais se percebem inseridas em uma história social marcada pela exclusão da loucura, e veem seu cotidiano e sua história de vida particular transformada pelas marcas do preconceito e da discriminação. p.325 As formas de a sociedade pensar e lidar com a loucura oscilam entre os modelos asilar e os modelos psicossociais. Modo asilar: No modo asilar, o indivíduo é visto como doente, e o tratamento ocorre por meio de fármacos. As relações institucionais são piramidais ou verticais, poucos dominam e a maioria obedece. O poder e o saber são estratificados, os usuários estão excluídos de qualquer participação que não seja de objeto inerte e mudo. As relações se estabelecem entre os loucos e os sãos, a razão e a insensatez (COSTA-ROSA, 2000). Na internação por longo tempo, a vida das pessoas com transtornos mentais passa a ser a vida do hospital, o cotidiano do indivíduo é regido pelo cotidiano no hospital. O hospital se torna a ‘casa’ da pessoa com transtorno mental, sua vida gira em torno das atividades do hospital; há o rompimento com a vida em sociedade, como se eles não existissem para o mundo fora do hospital. p. 327. Ao ser internada, a pessoa adquire um novo status social, não apenas intramuros, e compreende que, ao sair da hospitalização, sua posição social no mundo externo nunca mais será a mesma (GOFFMAN, 2003). Modo psicossocial: No modo psicossocial, a loucura é considerada um fenômeno social, o sofrimento psíquico não tem que ser removido, mas sim integrado como parte da existência da pessoa. A ênfase é dada à reinserção social e à recuperação da cidadania (COSTA-ROSA, 2000). Frente a essa dura realidade oferecida pelos hospitais psiquiátricos, a reforma psiquiátrica se organizou para propor uma nova possibilidade de pensar a loucura, de tratar e se relacionar com as pessoas com transtornos mentais. […] os CAPS se apresentam como uma substituição ao tratamento em internação hospitalar e concretizam uma nova forma de lidar com o transtorno mental. p.331. O CAPS é um lugar de referência e tratamento para pessoas que sofrem com transtornos mentais, “[...] é um serviço de atendimento de saúde mental criado para ser substitutivo às internações em hospitais psiquiátricos” (BRASIL, 2004, p. 13). Objetivo de reconstruir a pessoa e sua identidade social, estabelecendo-se condições para que se torne um membro do corpo social. p. 331 A atenção em CAPS apresenta alternativas de cuidado para as pessoas com transtornos mentais, previne internações, inclui a família no tratamento, oferece liberdade de ir e vir e facilita a criação de uma rede social, além de outras tantas diferenças em relação aos hospitais psiquiátricos. p. 332. Transtornos de Personalidade e de comportamento em adultos (transtornos específicos de personalidade). O que é personalidade? “O modo característico como uma pessoa sente, pensa, reage, se comporta e se relaciona com as outras pessoas” (Widiger, 2011). Bastos (1997b): personalidade “é o conjunto integrado de traços psíquicos, consistindo no total das características individuais, em sua relação com o meio, conjugando tendências inatas e experiências adquiridas no curso de sua existência”. A primeira tipologia de personalidade: A primeira tipologia desenvolvida na história da medicina e da psicologia, mais bem conhecida e divulgada, foi a da escola hipocrático-galênica. A medicina do médico da Grécia Antiga Hipócrates de Cós (460-370 a.C.) e de seus discípulos (chamada, então, medicina ou escola hipocrática) é essencialmente ambientalista, isto é, dieta, clima, influência dos ventos, etc., são muito considerados. Segundo a teoria dos hipocráticos, os tipos humanos básicos e o surgimento da doença ou a manutenção da saúde dependeriam intimamente também da presença equilibrada e da convivência harmônica dos quatro humores essenciais do organismo humano: o sangue, a bílis, a fleuma (ou linfa) e a atrabílis (ou bílis negra). Personalidade para Jung: A tipologia de Carl Gustav Jung (1875-1961), exposta em sua grande obra Tipos psicológicos, é uma concepção extremamente original sobre a estrutura e o funcionamento do psiquismo e da personalidade humana. As duas atitudes básicas – a extroversão e a introversão – indicam o movimento e a direção fundamental da energia psíquica (libido em Jung) na vida de cada pessoa. Na extroversão, a libido flui sem embaraço ou dificuldade em direção aos objetos externos. Os extrovertidos são pessoas que partem rápida e diretamente em direção ao mundo externo, têm suas referências e buscam suas satisfações no ambiente externo. A introversão, por sua vez, indica que a libido recua perante os objetos do mundo externo, voltando-se para seu interior; o mundo externo é ameaçador ou sem importância, as satisfações e referências provêm do próprio mundo interno. Outros elementos do psiquismo humano (pensamento, sentimento, percepção, intuição) entram na composição do tipo de personalidade que resultará ao final. Dalgalarrondo, p. 495 Personalidade para Freud: Para Freud, a personalidade se desenvolve marcada pelo modo como a criança é gratificada em termos de sua libido (compreendida como energia “vital-sexual”). A libido na criança passa por diversas fases (desenvolvimento psicossexual); ela está concentrada inicialmente no prazer oral relacionado com a amamentação. Depois, o centro do prazer e a libido se deslocam para a região anal, para a fálica, e, no adulto, estariam concentrados na atividade genital. p. 496 Assim, as fixações infantis da libido em modos pré-genitais e a tendência à regressão (a esses pontos de fixação pré-genitais) acabam por determinar tanto os diversos tipos de neuroses como o perfil de personalidade do adulto. p. 497 A personalidade do adulto forma-se pela introjeção (sobretudo inconsciente) de aspectos dos relacionamentos que se estabelecem no interior das relações familiares, sobretudo da criança pequena com seus pais e destes com ela. p. 497 Transtornos de personalidade: Segundo a CID-11 e o DSM- 5, os TPs são definidos pelas seguintes características: Geralmente começam a surgir no final da infância e adolescência e, no início do período adulto, costumam estar claramente configurados. Tendem a durar e permanecer ao longo da vida, a ser relativamente constantes no ciclo vital do indivíduo, com atenuação de alguns traços apenas na idade adulta madura e na velhice. Manifestam um conjunto amplo de comportamentos e experiências internas, assim como reações afetivas e cognitivas que são claramente desarmônicas, envolvendo vários aspectos da vida e da experiência do indivíduo, como afetividade, expressão emocional, comportamento (controle de impulsos, modo e estilo de relacionamentos interpessoais). Assim, o padrão anormal de experiências internas e comportamentos inclui muitos aspectos do psiquismo e da vida psíquica e social do indivíduo, não sendo restrito a apenas um tipo de reação ou a uma área circunscrita do psiquismo; ele não se limita a uma relação pessoal ou a uma situação específica e única. O padrão comportamental é mal-adaptativo, produz uma série de dificuldades para o indivíduo e/ou para as pessoas que com ele convivem. São condições, de modo geral, não relacionadas diretamente a lesão cerebral evidente ou a outro transtorno psiquiátrico (embora haja alterações de personalidade secundárias a lesão cerebral). Leva a diferentes graus de sofrimento (solidão, sensação de fracasso pessoal, dificuldades nos relacionamentos, vividos com amargura, dor psíquica). Em geral, contribui para pior desempenho ocupacional (no trabalho, nos estudos, etc.) e social (com familiares, amigos, colegas de trabalho ou estudo). Entretanto, tal desempenho precário não é condição obrigatória. Segundo o DSM-5, os TPs podem ser agrupados em três grandes subgrupos com semelhanças descritivas (ou seja, esse agrupamento tem valor apenas descritivo e didático): a. Padrão: esquisitos e/ou desconfiados; b. Padrão: instáveis e/ou manipuladores e/ou centro das atenções; e c. Padrão: ansiosos e/ou controlados-controladores. Complicações diagnósticas: Pessoas que preenchem critérios para um TP com muita frequência também preenchem critério para outro (ou outros). É a chamada coocorrência de diagnósticos de TP e limitação da validade discriminativa de tais categorias. Por exemplo: não é incomum encontrar quadros clínicos que preenchem critérios para TP borderline, mas também para TP histriônica, dependente e ansiosa. TPs propostos e utilizados pela CID-11 e pelo DSM-5: p. 512 Dica: antes de estudar os transtornos individualizados foque nas características de cada categoria na tabela acima (A, B e C). Categorias das TPs: Categoria A (esquisitos e/ou desconfiados): Transtorno de personalidade esquizoide (pelo menos quatro ou mais das características apresentadas a seguir): 1. Não deseja nem desfruta de relações íntimas, inclusive ser parte de uma família; 2. Tem preferência quase invariável por atividades solitárias; 3. Demonstra pouco interesse em ter experiências sexuais com outras pessoas; 4. Realiza poucas atividades que produzem prazer; 5. Não tem amigos próximos nem pessoas confidentes, a não ser familiares de primeiro grau; 6. Mostra indiferença aparente a elogios ou críticas; 7. Demonstra frieza emocional, apresenta distanciamento ou embotamento afetivo. Transtorno da personalidade paranoide (é necessário que tal perfil de personalidade se revele por meio de quatro ou mais das seguintes características): 1. Suspeitas recorrentes, sem base na realidade, de estar sendo enganado, maltratado ou explorado pelos outros. 2. O indivíduo se preocupa sem justificativas ou embasamento real e tem dúvidas sobre a lealdade ou a confiabilidade de amigos e sócios. 3. Pensa ou conclui que as informações serão usadas negativamente contra si, reluta em confiar nas outras pessoas e tem medo infundado da ação delas. 4. Tende a perceber significados ocultos humilhantes ou ameaçadores em comentários ou acontecimentos benignos ou indiferentes. 5. Guarda rancor de forma persistente (p. ex., não perdoa desprezo, insultos ou injúrias). 6. Tende a perceber ataques a sua reputação ou a seu caráter que não são percebidos pelos outros, reage com raiva e contra-ataca rapidamente. 7. Tem suspeitas recorrentes, sem justificativa, com respeito à fidelidade do cônjuge ou parceiro sexual. Lembre-se (Paranoia x paranoide): Paranoia: o indivíduo tem certeza (um delírio que gera uma substituição da realidade); Paranoide: o indivíduo desconfia. Transtorno da personalidade esquizotípica (se apresentam cinco ou mais das seguintes características): 1. Ideias de referência (com exclusão de delírios de referência), ou seja, têm a tendência a interpretar os eventos que acontecem ao seu redor, no seu local de moradia, de trabalho ou lazer, como relacionados especificamente consigo, geralmente com sentido negativo (tudo se refere à pessoa de forma negativa, pejorativa). 2. Ideias e crenças estranhas, tendendo a apresentar pensamento mágico, ideias essas que são inconsistentes com as normas subculturais (de sua família, de seu grupo religioso, de seu grupo de amigos, da escola ou trabalho). 3. Experiências perceptivas incomuns, inclusive ilusões corporais. 4. Pensamento e discurso incomuns, estranhos – por exemplo, pensamento vago, exageradamente metafórico, hiperelaborado ou estereotipado (parece tratar-se de ideias filosóficas, mas é vago, inconsistente e mesmo bastante confuso). 5. Ideação paranoide, indivíduo muito desconfiado. 6. Afetos inapropriados ou muito reduzidos. 7. Comportamento e/ou aparência física (inclusive vestimenta, adornos corporais, cabelos, etc.) muito estranhos; os pacientes parecem demasiadamente excêntricos ou muito peculiares. 8. Ausência de amigos íntimos ou confidentes além dos parentes de primeiro grau. 9. Ansiedade excessiva em situações sociais, que não diminui com a familiaridade em relação a tal situação ou é colorida com ideação paranoide. Preste atenção nas diferenças entre o TP esquizoide e o TP esquizotípica, pois estas são difíceis de diferenciar. Categoria B (instáveis e/ou manipuladores e/ou centro das atenções): Transtorno de personalidade borderline (necessárias pelo menos cinco das seguintes características para o diagnóstico)(DSM-5): 1. Esforços excessivos e desesperados para evitar abandono, real ou imaginário; 2. Relacionamentos pessoais intensos, mas muito instáveis; 3. Perturbação da identidade: dificuldades graves e instabilidade com relação à autoimagem, aos objetivos e às preferências pessoais (inclusive as de orientação sexual e de identidade de gênero); 4. Impulsividade em pelo menos duas áreas autodestrutivas (p. ex., gastos exagerados, sexo com desconhecidos, uso de substâncias, compulsão alimentar, dirigir de forma perigosa/irresponsável). Atos repetitivos de autolesão (p. ex., cortar-se propositalmente); 5. Comportamentos, gestos e atos suicidas repetitivos ou comportamentos de automutilação; 6. Instabilidade emocional intensa, decorrente de acentuada reatividade do humor (irritabilidade ou ansiedade intensas, de poucas horas, raramente de dias), disforias episódicas; 7. Sentimentos crônicos de vazio (sentimentos depressivos com a marca de sentir um vazio interno); 8. Raiva intensa e inapropriada e/ou muita dificuldade em controlá-la (brigas físicas recorrentes, irritação, raiva, explosões comportamentais); 9. De forma transitória, podem ocorrer ideias de perseguição (achar que está sendo traído, perseguido, ameaçado, e/ou sintomas ou episódios dissociativos intensos, decorrentes de estresses, de situações pessoais difíceis). Características para o diagnóstico do Transtorno de personalidade histriônica (DSM-5) são pelo menos cinco das seguintes: 1. O indivíduo sente desconforto em situações em que não é o centro das atenções. Há busca contínua de atenção e apreciação; 2. A interação com as pessoas com frequência é caracterizada por comportamento sexualmente sedutor, inadequado e provocativo; 3. indivíduo apresenta mudanças rápidas das emoções e expressão superficial delas; 4. Usa de modo reiterado a aparência física para atrair atenção para si; 5. Tem um estilo de falar, um discurso carente de detalhes e de exatidão, com um caráter impressionista, meio vago; 6. O indivíduo utiliza dramatização e autodramatização, teatralidade, expressão exagerada das emoções; 7. Há sugestionabilidade aumentada; o indivíduo é facilmente influenciado por outros ou pelas circunstâncias; 8. Considera as relações pessoais mais íntimas do que na realidade são; 1. Também pode ser notada certa infantilidade (tendência a apresentar reações infantis, regredidas, com pouca tolerância à frustração). Transtorno de personalidade antissocial (deve haver pelo menos três das seguintes características) (DSM-5): 1. Fracasso em ajustar-se às normas sociais relativas a comportamentos legais. Repetição de atos que podem constituir motivos de detenção; 2. Tendência à falsidade, a mentir repetidamente, a praticar a falsidade, falsificar nomes, documentos, trapacear para ganho pessoal ou por prazer; 3. Impulsividade ou fracasso em fazer planos para o futuro. No sentido da impulsividade e da inconstância, pode haver incapacidade de manter relacionamentos, embora não haja dificuldade em iniciá-los; 4. Irritabilidade e agressividade (envolvimento frequente em brigas, lutas e agressões verbais e físicas). Nesse sentido, também é comum haver baixa tolerância a frustrações e baixo limiar para descarga de agressão, inclusive violência; 5. Descaso pela segurança de si e dos outros; 6. Irresponsabilidade reiterada, indicada por falha em manter conduta consistente no trabalho ou em honrar obrigações financeiras (p. ex., pagar contas). Esses indivíduos apresentam irresponsabilidade e desrespeito por normas, regras e obrigações sociais; 7. Ausência de remorso, verificada pela indiferença ou racionalização em relação a ter ferido, maltratado, prejudicado gravemente ou roubado outras pessoas. Assim, verifica-se muitas vezes incapacidade de experimentar culpa e de aprender com a experiência, particularmente com a punição. Transtorno de personalidade narcisista (pelo menos cinco ou mais dos seguintes aspectos) (DSM-5): 1. O indivíduo apresenta senso grandioso (e irreal) da própria importância. Julga ter talentos especiais e espera ser reconhecido como superior sem que tenha feito algo concreto para isso; 2. É muito voltado para fantasias de grande sucesso pessoal, de poder, brilho, beleza ou de um amor ideal; 3. Acha-se excepcionalmente “especial” e “único”, acreditando que só pessoas ou instituições também excepcionalmente especiais ou únicas podem estar a sua altura; 4. Requer admiração excessiva; 5. Apresenta expectativas irracionais de tratamento especial, sentimentos de ter “direitos”, ou de que as pessoas estejam de acordo com suas expectativas; 6. Tende a ser “explorador” nas relações interpessoais, buscando vantagens sobre os outros para atingir seu fim ou sucesso pessoal; 7. Sem empatia pelos outros, reluta em reconhecer os sentimentos e as necessidades das pessoas ou em se identificar com elas em tais sentimentos e necessidades; 8. Frequentemente invejoso dos outros ou do sucesso alheio; acha sempre que os outros têm inveja dele; 9. É frequentemente arrogante nos seus comportamentos e atitudes. Categoria C (ansiosos e/ou controlados-controladores): Transtorno de personalidade obsessivo-compulsiva (necessária a presença de pelo menos quatro destas características): 1. Preocupação excessiva com detalhes, regras, listas, ordem, organização ou esquemas a ponto de o objetivo principal da atividade que realiza ser perdido; 2. Perfeccionismo que interfere na conclusão de tarefas e preocupação indevida com detalhes da vida; 3. Dedicação excessiva ao trabalho e à produtividade em detrimento de ocupar-se com amizades, lazer, relações pessoais (não explicada por dificuldades financeiras); 4. Excesso de escrúpulos e inflexibilidade em relação a assuntos de moralidade, ética ou valores (não explicado por questões religiosas ou culturais); 5. Incapacidade de jogar fora objetos usados ou sem valor, mesmo quando não têm valor sentimental; 6. O indivíduo reluta em delegar tarefas ou trabalhar com outras pessoas a menos que elas se submetam ao seu modo exato de fazer as coisas. Insistência incomum para que os outros se submetam exatamente a sua maneira de fazer as coisas; 7. Estilo mesquinho para lidar com gastos, com o dinheiro, mesmo que isso não se justifique por carência econômica; 8. Tendência a rigidez e teimosia. Transtorno de personalidade dependente (necessária a presença de pelo menos cinco das seguintes características): 1. Subordinação das próprias necessidades e desejos àqueles dos outros dos quais é dependente; 2. Dificuldades para tomar decisões cotidianas e solicitação constante de que outros (dos quais depende) tomem as decisões diárias e importantes em sua vida. Esses indivíduos pedem frequentemente reasseguramentos e conselhos dos outros; 3. Necessidade de que o(s) outro(s) assuma(m) responsabilidade na maior parte dos assuntos de sua vida; 4. Dificuldades em manifestar desacordo em decorrência do medo que têm de perder o apoio ou a aprovação; 5. Dificuldades em iniciar projetos, em fazer coisas por conta própria, por falta de confiança em si, nas suas capacidades ou julgamentos (não se trata de falta de motivação ou energia, mas de falta de autoconfiança); 6. Tais pessoas podem ir a extremos para obter apoio, aprovação e carinho dos outros, a ponto de se voluntariar para fazer coisas desagradáveis; 7. Sentimento de desamparo e desconforto significativo quando sozinho por causa de medo exagerado de ser incapaz de se cuidar; 8. Logo após o término de um relacionamento íntimo, tais pessoas buscam intensamente, com urgência, outro relacionamento para obter fonte de cuidado e apoio; 9. Preocupações e/ou medo importante de ser abandonado à própria sorte. Transtorno de personalidade evitativa (deve haver quatro ou mais das seguintes características): 1. Evitação de atividades profissionais ou estudantis que impliquem contato interpessoal significativo, pois o indivíduo tem muito medo de críticas, desaprovação ou rejeição; 2. Falta de disposição para se envolver com outras pessoas; 3. Reserva e evitação de relacionamentos íntimos, decorrentes do medo de passar vergonha ou ser ridicularizado; 4. Muita preocupação com possíveis críticas ou rejeição em situações sociais; 5. Inibição para interações, decorrente dos sentimentos de inadequação; 6. Tendência a ver a si mesmo como socialmente incapaz, sem atrativos pessoais ou inferior aos outros; 7. Relutância em assumir riscos pessoais ou em se envolver em atividades ou situações novas por medo de constrangimentos. Transtorno de personalidade ansiosa (é muito próximo do padrão de personalidade evitativa) se faz mediante a identificação das seguintes características: 1. Estado constante de tensão e apreensão; 2. Crença de ser socialmente incapaz, desinteressante ou inferior aos outros; 3. Preocupação ou medo excessivo de ser criticado ou rejeitado; 4. Restrições na vida diária devido à necessidade de segurança física ou psíquica; 5. Evitação de atividades sociais e ocupacionais que envolvam contato interpessoal significativo, principalmente por medo de críticas, desaprovação ou rejeição. Síndromes Psicóticas (quadros do espectro da esquizofrenia e outras psicoses). As síndromes psicóticas caracterizam-se por experiências como alucinações e delírios, desorganização marcante do pensamento e/ou do comportamento ou comportamento catatônico (Janzarik, 2003; APA, 2014; CID-11, 2018). Experiência intensa de estar sendo perseguido ou ameaçado (por pessoas ou forças estranhas), assim como alterações evidentes na vida pessoal, familiar e social, são frequentes nos quadros psicóticos. São condições, de modo geral, de acentuada gravidade (Schimid, 1991; Gaebel; Zielasek, 2015). Não há consenso pleno, entretanto, sobre a definição precisa de “psicose” (Nielsen et al., 2008). Ficando está aberta a interpretações segundo cada orientação: Orientação psicodinâmica: ênfase na perda de contato com a realidade e/ou a distorções muito marcantes na percepção e na relação com a realidade. O “teste de realidade”, que é a função do ego em avaliar e julgar de modo objetivo o mundo externo, estaria gravemente prejudicada na psicose (tal visão tem origem nas noções de Freud e de Bleuler de esquizofrenia). Orientação fenomenológica: formula que na psicose ocorrem alterações básicas na estrutura de experiências fundamentais, como as do espaço e do tempo. Há, então, perda de elementos normalmente compartilhados do senso comum (a chamada folk epistemology). Ocorre transformação de como o indivíduo se dirige ao mundo e às pessoas, uma mudança do vetor da intencionalidade. Orientação da psiquiatria clínica: dá ênfase à noção de psicose como presença de sintomas psicóticos (delírios, alucinações, desorganizações marcantes de pensamento e comportamento). Tais elementos clínicos são os parâmetros de identificação e diagnóstico de psicoses sugeridos pela Classificação internacional de doenças e problemas relacionados à saúde (CID- 11) e pelo Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-5). Esquizofrenia A proposta de se recortar uma entidade nosológica que incluiria formas distintas de “loucura” (paranoide, catatônica e dos jovens ou hebefrênica) foi feita pelo psiquiatra alemão Emil Kraepelin (1856-1926), em 1896, que a nomeou dementia praecox (“dementia” pela noção de que a maior parte dos pacientes teria evolução muito ruim e “praecox” pelo seu início frequente em jovens e adultos jovens). Já o psiquiatra suíço Eugen Bleuler (1857-1939) propôs, em 1911, o termo esquizofrenia, dando ênfase à desarmonia interna do funcionamento mental e à quebra radical do contato com a realidade que ele notava nesse transtorno. Os psicopatólogos do fim do século XIX e início do XX distinguiram quatro subtipos de esquizofrenia: a forma paranoide, caracterizada por alucinações e ideias delirantes, principalmente de conteúdo persecutório; a forma catatônica, marcada por alterações motoras, hipertonia, flexibilidade cerácea e alterações da vontade, como negativismo, mutismo e impulsividade; a forma hebefrênica, caracterizada por pensamento desorganizado, comportamento bizarro e afeto marcadamente pueril, infantilizado; e um subtipo dito “simples”, no qual, apesar de faltarem sintomas característicos, seria observado um lento e progressivo empobrecimento psíquico e comportamental, com negligência quanto aos cuidados de si (higiene, roupas, saúde), embotamento afetivo e distanciamento social. Entretanto, os subtipos clínicos da esquizofrenia foram abandonados pelos sistemas de classificação atuais (CID-11 e DSM-5), pois não se revelaram suficientemente úteis, pelas seguintes razões (Braff et al., 2013): não são estáveis ao longo do tempo (pacientes com frequência “mudam” de subtipo ao longo dos anos); não predizem padrão de evolução da doença; não predizem resposta a tratamentos farmacológicos ou psicossociais; são muito heterogêneos em relação às bases genéticas e neuronais da esquizofrenia; A delimitação dos subtipos têm sido cada vez menos utilizada em pesquisas. Em contraposição à definição de subtipos delimitados, tem-se dado muito mais importância à identificação de conjuntos de sintomas e comportamentos, que podem se combinar de formas muito variadas e heterogêneas, nas diversas fases da esquizofrenia, nas quais preponderariam distintas dimensões sintomatológicas. Seria, então, de interesse “estadiar” a evolução da doença observando-se a progressão e a regressão desses sintomas e dimensões sintomatológicas ao longo do tempo. Principais grupos de sintomas da esquizofrenia (Andreasen, 1995; Tandon et al., 2009; APA, 2014; CID-11, 2018): 1. Sintomas negativos Caracterizam-se pela perda de certas funções psíquicas (na esfera da vontade, do pensamento, da linguagem, etc.) e pelo empobrecimento global da vida afetiva, cognitiva e social do indivíduo. Os principais sintomas são: Distanciamento e aplainamento afetivo ou afeto embotado, em graus variáveis; perda da capacidade de se sintonizar afetivamente com as pessoas; Conjunto de alterações que resultam em retração social ou associalidade. Em decorrência de alterações nas esferas afetivas (sobretudo apatia) e volitivas (abulia e redução do “drive”, do impulso para agir socialmente), o indivíduo vai se isolando progressivamente do convívio social, havendo restrição dos interesses; Alogia ou empobrecimento da linguagem e do pensamento, observados pela diminuição da fluência verbal e pelo discurso empobrecido; Diminuição da vontade (avolição), que se expressa geralmente por diminuição da iniciativa e por hipopragmatismo, ou seja, dificuldade ou incapacidade de realizar ações, tarefas, trabalhos minimamente organizados que exijam iniciativa, motivação, organização e persistência; Anedonia, diminuição da capacidade de experimentar e sentir prazer. A anedonia na esquizofrenia é distinta daquela experimentada nas depressões. Enquanto na esquizofrenia não há evidente desconforto subjetivo com a experiência de anedonia, nos quadros depressivos ela se apresenta marcada por desconforto subjetivo, mais ou menos intenso. Em decorrência dos sintomas negativos, observa-se, em uma parte das pessoas com esquizofrenia, uma considerável negligência quanto a si mesmo, que se revela pelo descuido e desinteresse para consigo mesmo, com higiene pobre, roupas malcuidadas, descuido da aparência e/ou dos cuidados com a saúde, cabelos sujos, dentes apodrecidos, entre outros aspectos. 2. Sintomas positivos São manifestações novas, salientes, do processo esquizofrênico. São eles: Alucinações, que são consideravelmente frequentes, mas também pode haver ilusões ou pseudoalucinações. O tipo de alucinação mais frequente é a auditiva (alucinações audioverbais, ou seja, “vozes” que o paciente ouve, geralmente com conteúdos de acusação, ameaça ou pejorativos), mas também pode haver alucinações/ilusões visuais, táteis, gustativas (gosto de veneno nos alimentos) e/ou olfativas (auto-ósmicas, sentir cheiro de pus ou de algo apodrecido dentro do abdome, sentir cheiro de podre). Ideias delirantes (delírio), frequentemente de conteúdo persecutório, autorreferentes ou de influência, mas pode haver delírios com outros conteúdos ou de outra natureza. A duração, a abrangência, o grau de sistematização e a implicação de “tendência à ação” dos delírios são bem variáveis. Os delírios e as alucinações com conteúdos implausíveis, bizarros (eventos ou fatos praticamente impossíveis de ocorrer), assim como não congruentes com o humor basal do paciente, são indicadores robustos de esquizofrenia. Outras formas de distorção da realidade ou dificuldades com o teste de realidade, como a presença de ideias muito deturpadas, marcadamente bizarras, sobre a realidade, sobre os fatos do mundo, sobre a história do paciente, embora não sejam necessariamente delírios, podem estar presentes. O psicopatólogo alemão Kurt Schneider (1887-1967) propôs que alguns sintomas, que poderiam ser incluídos junto ao grupo dos sintomas positivos, os quais teriam um peso maior para o diagnóstico da esquizofrenia (Tandon; Greden, 1987; Schneider, 1992), denominados, então, “sintomas de primeira ordem”. São eles: 1. Percepção delirante. Uma percepção normal recebe instantaneamente uma significação delirante. Essa vivência delirante ocorre de modo simultâneo ao ato perceptivo, em geral de forma abrupta, maciça, como uma espécie de “revelação”. Para Schneider (1992), essa é a forma fundamental do delírio na esquizofrenia. 2. Alucinações auditivas características. São as “vozes” que acompanham as ações do paciente com observações, que fazem comentários; ocorrem na forma de fala e resposta ou vozes que comandam a ação do indivíduo. Elas transmitem ordens ao paciente ou fazem comentários sobre seus atos. 3. Eco do pensamento ou sonorização do pensamento (Gedankenlautwerden). O indivíduo escuta seus pensamentos ao pensá-los; um paciente de Schneider dizia: “são os meus pensamentos que ouço. Eles se fazem ouvir quando há silêncio”. 4. Difusão, divulgação ou publicação do pensamento. Nesse caso, o indivíduo tem a sensação de que seus pensamentos são ouvidos ou percebidos claramente pelos outros, no momento em que os pensa. Um paciente que entrevistamos dizia: “tudo o que penso é transmitido por uma espécie de rádio para todos os pontos da Terra, todos ficam imediatamente sabendo”. 5. Roubo do pensamento. Experiência na qual o indivíduo tem a sensação de que seu pensamento é inexplicavelmente extraído de sua mente, como se fosse roubado. 6. Distúrbios da vivência do eu. Vivências de influência sobre o corpo ou sobre a vida mental. Aqui, dois tipos de vivências de influência são mais significativos: Vivências de influência sobre o corpo. São experiências nas quais o paciente sente que uma força ou um ser externo age sobre seu organismo, sobre seus órgãos, emitindo raios, ondas, sinais elétricos ou eletromagnéticos, influenciando as funções corporais, tocando seus genitais, tendo relações sexuais consigo; uma bala de revólver gira dentro de meu peito ou uma força pressiona meu cérebro, ou, ainda, sou penetrada à noite pelo demônio. Vivências do “fabricado” ou do “feito” por outros (ou por forças externas) impostas ao indivíduo nos campos da sensação, do sentimento, das tendências, do impulso, da vontade ou do pensamento. Referem-se à experiência de que algo influencia de forma maciça seus sentimentos, impulsos, vontades ou pensamentos. Essas vivências têm a peculiar qualidade de serem experimentadas como algo “feito” ou “fabricado” e imposto de fora; é a vivência de uma imposição estranha – um chip de computador foi instalado em minha cabeça e comanda meus pensamentos (ou sentimentos, impulsos, vontades). Tais sintomas de primeira ordem expressam a vivência de uma considerável “fusão” do eu com o mundo, um avançar terrível do mundo público sobre o privado. 3. Sintomas de desorganização Esta síndrome tem certa correspondência ou semelhança com o subtipo classicamente denominado esquizofrenia hebefrênica, observando-se: Pensamento progressivamente desorganizado, de leve afrouxamento das associações, passando por descarrilamento do pensamento até a total desagregação e produção de um pensamento totalmente incompreensível, totalmente incoerente. Nesses casos, geralmente é observada a fragmentação da progressão lógica do discurso. Discurso que revela tangencialidade e circunstancialidade em níveis não totalmente desorganizados da linguagem/pensamento. A presença de neologismos eventualmente é incluída aqui, mas pode também ser classificada junto aos sintomas positivos. Comportamentos desorganizados e incompreensíveis, particularmente comportamentos sociais e sexuais bizarros e inadequados, observados em vestimenta, adornos, aparência e expressão geral bizarra. Afeto inadequado, marcadamente ambivalente, incongruente e em descompasso franco entre as esferas afetivas, ideativas e volitivas pode ser incluído como parte da síndrome de desorganização. Tal incongruência ou desarmonia interna foi reiteradamente pensada como um dos elementos centrais da esquizofrenia. Foi denominada por Erwin Stransky (1877-1962) de “ataxia intrapsíquica”; por Philippe Chaslin (1857-1923) de “loucura discordante”; e por Eugen Bleuler (1857-1939) de “dissociação ideoafetiva”. 4. Sintomas psicomotores/catatonia Pacientes com esquizofrenia podem apresentar lentificação e empobrecimento psicomotor com restrição do repertório da esfera gestual e motora. Alterações psicomotoras também são verificadas na forma de estereotipias de movimentos (atos, gestos, atitudes mais complexos que os tiques, repetidos de forma mecânica, sem finalidades), maneirismos (gestos complexos, repetidos, que parecem ter um objetivo e significado para o indivíduo, mas que são percebidos pelo observador como algo excessivo, excêntrico e muito bizarro) e posturas bizarras. Alguns pacientes fazem caretas (que não se sabe por que), vestem roupas e usam adornos bizarros. A síndrome catatônica ou catatonia é a manifestação psicomotora mais marcante na esquizofrenia. Na catatonia, embora os pacientes apresentem o nível de consciência preservado, podem revelar sintomas de estupor (diminuição marcante até ausência de atividade psicomotora, com retenção da consciência, mutismo e negativismo; o paciente fica no leito, parado, sem fazer nada, sem responder a solicitações, sem se alimentar e às vezes sem sair para urinar ou defecar). Também pertencem à catatonia a flexibilidade cerácea, ou catalepsia (o paciente fica na posição que o colocam, mesmo em posições dos membros contra a gravidade), a ecolalia (repetir mecanicamente palavras do interlocutor) e/ou a ecopraxia (repetir mecanicamente atos dos outros). Um grupo menor de pacientes em catatonia apresenta, alternadamente com a lentificação e o estupor, momentos de muita agitação psicomotora, às vezes com agressividade impulsiva, aparentemente imotivada (chamada de “excitação catatônica” ou “furor catatônico”). Cabe salientar que, na CID-11, a catatonia é também considerada uma síndrome psicopatológica autônoma, situada na “vizinhança” da esquizofrenia. 5. Sintomas/prejuízos cognitivos Há alterações cognitivas difusas na doença, que, na maior parte das vezes, precedem mesmo o surgimento dos sintomas psicóticos e são muito relevantes, pois afetam marcadamente a evolução funcional dos pacientes (revisão em Dantas et al., 2010). Tais alterações são muito frequentes e acometem possivelmente a maioria dos indivíduos acometidos pela doença. Elas incluem os seguintes domínios da cognição: atenção, memória episódica, memória de trabalho, velocidade de processamento e funções executivas frontais (inclusive fluência verbal). São particularmente importantes, pelas suas repercussões para a vida social e socioafetiva do indivíduo, as alterações da cognição social. Verifica-se um déficit em teoria da mente (sistema de inferências ligado à compreensão de intenções, disposições e crenças dos outros e de si mesmo). Também em relação à cognição social, observam-se dificuldades na percepção e no gerenciamento de emoções (perceber e compreender as emoções a partir de pistas faciais, tom de voz, gestos) e déficit na percepção social (compreender o contexto social, decodificar e identificar dicas sociais de acordo com o ambiente). Por fim, a cognição social pode estar prejudicada em relação ao viés ou estilo de atribuição, que é o modo como se inferem as causas dos acontecimentos referentes às outras pessoas, a si mesmo ou a fatores ambientais. Observa-se, na esquizofrenia, tendência a apresentar vieses de atribuição no sentido de atribuições negativas aos outros em vez de ao ambiente, ou atribuições mais hostis às ações e aos comportamentos dos outros do que de fato está ocorrendo (Mecca; Martins Dias; Berberian, 2016). As alterações cognitivas na doença são, atualmente, consideradas uma dimensão muito relevante desse transtorno, pois são fortes preditores de pior evolução na vida social e do trabalho. 6. Sintomas de humor Há redução da experiência e da expressão emocional em muitos pacientes (vista também como uma dimensão dos sintomas negativos). Em contraste com tal redução, os indivíduos apresentam com frequência aumento da reatividade emocional (sobretudo quando também apresentam sintomas positivos, quando expostos a muitos estímulos). Essa combinação de redução da expressão emocional com maior reatividade emocional tem sido denominada de “paradoxo emocional da esquizofrenia” (Aleman; Kahn, 2005). Pessoas com esquizofrenia apresentam taxas mais altas do que a população em geral de sintomas ansiosos e depressivos, bem como depressão clínica. Os sintomas ansiosos são dos diversos tipos: ansiedade generalizada, ataques de pânico, ansiedade/fobia social e sintomas obsessivo-compulsivos. Os sintomas de humor podem também surgir atrelados a sintomas da esquizofrenia ou a efeitos colaterais dos antipsicóticos (chamada de “disforia dos neurolépticos”). Tais sintomas podem ocorrer antes da eclosão dos sintomas positivos, nos quadros com atividade psicótica, entre os surtos, ou nos períodos após os surtos (no caso de sintomas depressivos, denomina-se “depressão pós-psicótica”). Sintomas de humor contribuem significativamente para o sofrimento e as dificuldades pessoais e sociais que a esquizofrenia implica. TRANSTORNO DELIRANTE (PARANOIA) E ESQUIZOFRENIA TARDIA (PARAFRENIA) (APA, 2014; CID-11, 2018; OPJORDSMOEN, 2014): Transtorno delirante (paranoia): Uma forma de psicose próxima à esquizofrenia, mas distinta, é o transtorno delirante, que se caracteriza pelo surgimento e pelo desenvolvimento de um delírio ou sistema delirante (vários delírios de alguma forma interligados tematicamente) com considerável preservação da personalidade, da afetividade, da cognição e do resto do psiquismo do indivíduo acometido. Não deve haver pensamento e/ou comportamento francamente desorganizado ou sintomas negativos marcantes. No passado denominado “paranoia” por Kraepelin (termo que, curiosamente, no linguajar popular, é usado como sinônimo de ideias de perseguição), esse transtorno se caracteriza por delírios bem organizados e sistematizados, às vezes com temática complexa, que permanecem como que “encistados”, “cristalizados”, em um domínio da vida e da personalidade do paciente, sem comprometer todo o resto (comprometimento que ocorre, por exemplo, na esquizofrenia). Alucinações não devem ser o elemento proeminente do quadro, mas, se ocorrerem, geralmente têm relação com o tema do delírio. Também, como alteração do reconhecimento, podem ocorrer falsas identificações de pessoas, em geral associadas ao tema do delírio. O transtorno delirante, tal como descrito nos sistemas diagnósticos atuais (CID-11 e DSM-5), é um construto heterogêneo. Poucos casos são subagudos e transitórios, com remissão completa após alguns meses, e outros evoluem para quadros mais graves de esquizofrenia. Entre esses dois extremos, há pessoas com delírios persistentes, que expressam a ideia clássica de paranoia (Opjordsmoen, 2014). Esquizofrenia tardia (parafrenia): Surgem delírios, em geral organizados e acompanhados de alucinações, mas nas quais, de forma semelhante ao transtorno delirante, há relativa preservação da personalidade, sem alterações ou com alterações mínimas da afetividade e da vontade (e quando ocorrem são relacionadas ao delírio e às alucinações). Alguns autores consideram a parafrenia uma forma tardia de esquizofrenia, que surge em geral após os 50 anos de idade (Howard; Almeida; Levy, 1994). TRANSTORNOS PSICÓTICOS AGUDOS, BREVES E TRANSITÓRIOS (PSICOSES REATIVAS E/OU PSICOSES PSICOGÊNICAS) (NUGENT ET AL., 2011; APA, 2014; CID-11, 2018): [...](pode haver alucinações e delírios, bem como discurso e comportamento desorganizados), de surgimento bem agudo (geralmente eclodem e alcançam máxima gravidade em até duas semanas). Entretanto, tais quadros, diferentemente da esquizofrenia (com curso em geral grave e deteriorante) revelam remissão relativamente rápida dos sintomas (dias ou semanas) e não implicam deterioração da vida social ou empobrecimento psíquico em forma de sintomas negativos ou perdas cognitivas (Castagnini; Berrios, 2009). Há, após o episódio psicótico, retorno completo ao nível de funcionamento anterior à eclosão dos sintomas psicóticos agudos. Uma parte (mas nem todos) desses casos surge após estressores evidentes, mais ou menos intensos, como assalto, acidente grave de trânsito ou de trabalho, morte de parentes ou amigos queridos, perder-se em uma cidade ou em uma floresta, entre outras situações. No transtorno psicótico breve, predominam, de característica, sintomas floridos, como ideias delirantes ou deliroides (em geral paranoides), alucinações visuais e/ou auditivas, muitas vezes com intensa perplexidade, certa confusão mental e turbulência emocional, e pode haver ansiedade acentuada e medos difusos. Sintomas catatônicos também podem estar presentes. Os sintomas tipicamente mudam muito, tanto em sua natureza como em sua intensidade, às vezes, de um dia para outro, ou no mesmo dia. Lembre-se: o transtorno psicótico agudo pode confundir-se com transtorno de estresse pós-traumático ou com quadros graves e prolongados de transtorno dissociativo (frequentemente denominado na tradição psicopatológica de histeria). Transtornos ou traços de personalidade do grupo B (sobretudo transtornos da personalidade borderline e histriônica) e transtorno da personalidade esquizotípica, além de traços de personalidade do tipo “psicoticismo”, podem preceder ou predispor as pessoas a apresentar transtorno psicótico agudo/breve. TRANSTORNO ESQUIZOAFETIVO (HECKERS ET AL., 2009; JAGER ET AL., 2011): Quando um grupo de pacientes não pode ser compreendido e classificado nem plenamente no campo da esquizofrenia, nem no campo de um transtorno do humor grave, mesmo aqueles com sintomas psicóticos. Ideia de uma psicose intermediária entre a esquizofrenia e as psicoses afetivas. Psicoses mescladas ou intermediárias (Lena et al., 2016). O transtorno esquizoafetivo se caracteriza pela presença de proeminentes sintomas requeridos para o diagnóstico de esquizofrenia em conjunto (no mesmo episódio, simultaneamente, ou com distância de poucos dias entre eles) com sintomas típicos de um episódio de depressão maior, de mania ou de episódio misto (para a CID-11, concomitância com duração de pelo menos um mês). Para o DSM-5, o transtorno esquizoafetivo se caracteriza pela concomitância de sintomas evidentes de esquizofrenia (critérios A) associados a sintomas suficientes para o diagnóstico de episódio depressivo maior ou episódio maníaco. Entretanto, para diferenciar o transtorno esquizoafetivo dos quadros de depressão ou mania psicótica, o DSM-5 exige que haja pelo menos duas semanas de delírios ou alucinações na ausência de episódio depressivo maior ou mania. Além disso, para o DSM-5, os episódios de depressão maior ou mania estão presentes na maior parte da duração total do transtorno. As oficinas terapêuticas: Contribuem no sentido de dar voz ao sujeito. Sendo este compreendido como cidadão em um processo que estimula: Seu papel social; Sua participação. Propaga uma mediação entre o social e o tratamento, promovendo a inclusão/reinserção do indivíduo na sociedade. São atividades em grupo que visam promover a saúde mental e a inclusão social de pessoas com transtornos psíquicos. Elas são realizadas em espaços comunitários ou unidades de Atenção Básica, com a orientação de um ou mais profissionais. Tem como foco uma maior integração social e familiar, a possibilidade de manifestação de sentimentos e/ou problemas, o desenvolvimento de habilidades corporais, a realização de atividades produtivas e o exercício coletivo da cidadania. Lembre-se: este resumo é limitado em sua composição, sendo assim, é necessária a leitura das obras indicadas pela disciplina para um aprofundamento completo na matéria. Bibliografia adicional utilizada: BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Pragmáticas e Estratégicas. Saúde Mental no SUS: os centros de atenção psicossocial. Brasília: Ministério da Saúde, 2004. BREUER, J.; FREUD, S. Estudos sobre a histeria (1893-1895). Obras Completas, v. 2. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.