Portfólio GRH 2024-25 - Gestão de Recursos Humanos - PDF

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Universidade do Algarve

2024

SÉRGIO DA BORRALHA

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gestão de recursos humanos recursos humanos portfólio gestão

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Este é um portfólio de estudo sobre Gestão de Recursos Humanos (GRH) da Universidade do Algarve. Apresenta um índice detalhado sobre diferentes temas como a evolução dos recursos humanos, análise de trabalho e competências, recrutamento, seleção, entre outras tópicos para o curso de Gestão. Abrange o período de 2024-2025.

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Página 1 de 186 SEBENTA DE ESTUDO Portfólio 2024/2025 UNIVERSIDADE DO ALGARVE Licenciatura em Gestão GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS SÉRGIO DA BORRALHA Página 2 de 186...

Página 1 de 186 SEBENTA DE ESTUDO Portfólio 2024/2025 UNIVERSIDADE DO ALGARVE Licenciatura em Gestão GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS SÉRGIO DA BORRALHA Página 2 de 186 ÍNDICE 1 - Evolução de Recursos Humanos - página 3 2 - Análise de trabalho e Competências - página 26 3 - Recrutamento- página 42 4- Seleção- pagina 59 5- Acolhimento - página 85 6- Integração e Socialização - página 99 7- Formação profissional -página 110 8- Gestão de Desempenho - página 131 9- Gestão de Carreiras- página 150 Página 3 de 186 Evolução de Recursos Humanos Introdução O tema da Gestão de Recursos Humanos tem vindo a evoluir, de acordo com (Gonçalves & Neves, 2015), tanto em termos de teoria como de aplicação. É possível então definir Gestão de Recursos Humanos como um conjunto de processos, políticas e práticas que permitem a gestão e a administração do trabalho exercido pelas pessoas que compõem a empresa (Alcalde, et al., 2017 cit. DUTRA, 2001). Este processo desdobra-se em 6 etapas: a inclusão de novos trabalhadores à empresa; a atribuição das tarefas aos funcionários; a remuneração do capital humano; a criação de condições que incentivem a permanência do colaborador na organização; o desenvolvimento das competências e habilidades dos recursos humanos internos; e a avaliação do desempenho, (Alcalde, et al., 2017 cit. Chiavenato, 1999 e Gil, 2008). Nesta perspetiva, as atividades inerentes à Gestão de Recursos Humanos possibilitam, em primeiro lugar, um acordo entre as organizações e os seus colaboradores, relativo aos objetivos a alcançar e, em segundo lugar, garantem o seu cumprimento, (Gonçalves & Neves, 2015 cit. Torrington et al., 2011, p.25). Além disso, o conceito de GRH, para Serrano (2009) ao citar Neves (2000), tem por base as teorias comportamentais e organizacionais, pelo que a sua evolução reflete naturalmente os defeitos e vantagens das teorias que o sustentam. Compreender estes aspetos torna-se então essencial para delinear as tendências futuras da GRH. Por outro lado, esta prática permite a valorização de cada trabalhador, fator fundamental à competitividade de qualquer organização, mantendo-o motivado a alcançar os objetivos organizacionais de forma mais eficiente. Isto reflete-se num aumento da produtividade, da eficiência, da lucratividade e da permanência do colaborador no cargo, (Alcalde, et al., 2017 cit.: Chiavenato, 2005: 11; Vergara, 2000; e Hunter, 2006). Para confirmar a importância da Gestão dos Recursos Humanos nas organizações, Pacheco (2009) cita Fischer (2002) para comentar que não existe nenhuma organização, independentemente da sua dimensão, que não dependa do desempenho humano para ser bem-sucedida. O mesmo autor defende que a função de RH, além de orientar os trabalhadores dentro da organização, facilita a adaptação a mudanças externas e internas que possam vir a surgir. Garcia (2021/2022) acrescenta o papel que este departamento tem na promoção de relações interpessoais saudáveis entre os Página 4 de 186 colaboradores, contribuindo, através do trabalho em equipa, para o crescimento da empresa. Além disso, Garcia (2021/2022), citando Gómez-Mejía (2008), refere ainda que as preocupações com assuntos relacionados com a GRH são cada vez maiores, o que resulta das rápidas mudanças que caracterizam a atualidade tanto ao nível do ambiente externo como dos processos internos da organização e dos indivíduos. Posto isto, o presente trabalho pretende reunir um conjunto de informações e dados históricas sobre a evolução e desenvolvimento das práticas de GRH, desde a sua origem até aos dias de hoje. Assim, este estudo, à semelhança de Alcalde, et al. (2017), teve como principal objetivo realçar a importância da gestão de recursos humanos nas organizações, apresentando através de teses, dissertações, artigos científicos e livros voltados à gestão de pessoas. Desta forma, esta pesquisa assume grande importância, uma vez que permite investigar e compreender as características marcantes de cada fase da evolução das políticas e práticas da GRH, tanto no mundo como em Portugal. A observação às insuficiências e virtudes de cada período, permite encaminhar e prenunciar as tendências futuras para esta área. Evolução da Gestão de Recursos Humanos O tema da Gestão de Recursos Humanos (GRH) tem sido alvo de esforços de teorização e análise crítica, motivados por duas razões principais. A primeira, de natureza teórica, visa conceptualizar a diversidade de práticas de GRH e a sua relação com a competitividade, destacando o fator humano como uma vantagem competitiva central para as organizações. A segunda, de caráter prático, relaciona-se com a necessidade de controlar os efeitos dessas práticas, influenciadas pela estratégia de negócio e pela cultura organizacional, que têm moldado o conceito de GRH nas últimas décadas, (Neves, 2007). A evolução da GRH é transversal aos diferentes continentes e países, embora se verifique um certo desfasamento temporal na sua ocorrência, que tem progressivamente vindo a diminuir em virtude da globalização e expansão dos sistemas de informação e tecnologia. Desta forma, (Gonçalves & Neves, 2015) salientam ainda que o desfasamento que persiste atualmente, resulta de fatores de contexto, como a produtividade e a competitividade. No entanto, de acordo com Erthal (2015) citando Dessler (2003), a gestão dos recursos humanos, bem como os processos de avaliação, seleção e recrutamento de pessoal tiveram origem nos Estados Unidos, expandindo-se em seguida para outros países. O mesmo autor, usando Chiavenato (2009) como referência, sublinha que no decorrer do século XX, as mudanças nas Página 5 de 186 funções de Recursos Humanos passaram por três eras: a era da industrialização clássica (1900 a 1950); a era da industrialização neoclássica (1950 a 1990) e a era da informação (1990 até aos dias de hoje). A necessidade de “contabilizar” os registos dos trabalhadores, as faltas e os atrasos fez surgir, no século XIX, o Departamento de Recursos Humanos. Os “Chefes de pessoal”, naquela época, eram conhecidos pela sua inflexibilidade e frieza, principalmente na hora de demitir funcionários. Ao ser comunicado que deveria ir ao Departamento de Pessoal, o trabalhador já imaginava que seria demitido, (Estork & Viscaino, 2007). As grandes organizações foram as responsáveis pelas primeiras mudanças, iniciando os estudos e pesquisas em psicologia organizacional e sociologia no trabalho, Estork & Viscaino (2007), o que evidencia as preocupações com a capacitação dos seus funcionários, objetivando torná-los um diferencial competitivo para a empresa diante do mercado em que atua. (Pacheco, 2009). No início do século XX, as relações laborais e os movimentos sindicais tiveram forte influência nos conteúdos de investigação, ao nível da gestão de recursos humanos, nas designações da atividade e nas características das próprias práticas de gestão, (Gonçalves & Neves, 2015). Historicamente, até à década de 1960, o movimento sindical e a legislação social tiveram um impacto significativo na GRH. Contudo, no final do século XX, os fatores predominantes passaram a ser a competição global e as estratégias empresariais. Adicionalmente, a década de 1990 trouxe a internacionalização dos negócios como um novo elemento estruturante para a evolução conceptual e prática da GRH. Assim, tanto a estratégia de negócio quanto a cultura organizacional continuam a desempenhar papéis determinantes na formulação e desenvolvimento deste conceito, (Neves, 2007). Brandão & Parente (1998), referem a dificuldade em delimitar cronologicamente os períodos da evolução da função de Gestão de RH. Assim, diferentes autores identificam fases distintas, apesar de, em geral, as características associadas a cada uma delas serem semelhantes. Cinco Fases de evolução da Gestão de RH 1ª Fase (até 1960) - Administração de Pessoal Entre o final do século XIX e os anos 1960, a administração de pessoal, conforme Serrano (2009) ao citar Gilbert (1999), era dominada por uma “gestão previsional dos efetivos”, que Página 6 de 186 consistia no planeamento das necessidades de recursos humanos nas organizações. Esse modelo estava alinhado com a abordagem clássica da organização, influenciada pelas lógicas tayloristas e fordistas. Antes da era industrial, a produção dependia exclusivamente do trabalho manual, o que limitava a capacidade de resposta às necessidades crescentes da sociedade. Por volta de 1550, surgiram as primeiras manufaturas, marcando um novo passo na evolução do trabalho e expondo problemas relacionados à gestão de pessoal, como a organização, formação e controlo da produção. Com a invenção da máquina a vapor, iniciou-se um processo de mecanização que deu origem às fábricas, agrupando trabalhadores em escalas maiores, (Alis, et al., 2009). Nesta época, de acordo com Cairo (2020) ao citar Castillo (2006), a mão de obra era abundante, mas pouco capacitada. A Revolução Industrial, que começou na Inglaterra e se espalhou pela Europa e América do Norte no século XIX, transformou profundamente o trabalho. O aumento da produção e a redução de custos trouxeram mudanças significativas, incluindo a desumanização de certas tarefas que passaram a ser repetitivas, exigindo menos qualificações, e realizadas em condições insalubres, (Alis, et al., 2009). Nesta época, de acordo com Alis, et al. (2009), os empregadores começaram a reconhecer os impactos sociais da industrialização e a necessidade de oferecer assistência aos trabalhadores, criando os primeiros serviços de pessoal. Surgem então as figuras do “secretariado do bem-estar", encarregues de auxiliar os trabalhadores com questões sociais e laborais, bem como controlar e gerir conflitos nas fábricas, estabelecendo um primeiro passo na formalização do que hoje conhecemos como Gestão de Recursos Humanos. Com o crescimento das indústrias, no final do século XIX, a contratação de mão--de-obra não especializada tornou-se comum, e os métodos de trabalho ainda eram bastante rudimentares. Em 1880, Alis, et al. (2009) refere que Frederic W. Taylor, engenheiro siderúrgico, revolucionou a gestão de pessoal com as suas experiências na Companhia das Siderurgias de Midvale, nos Estados Unidos. Taylor desenvolveu a “organização científica” do trabalho, defendendo que este deveria ser planeado e otimizado com base em estudos de tempos e movimentos, o que permitiu uma maior especialização das tarefas e um aumento significativo na produtividade. Com o desenvolvimento das ideias do taylorismo e o início da industrialização moderna, os antigos “secretariados do bem-estar" evoluíram para os primeiros “serviços de pessoal”, Alis, et al. Página 7 de 186 (2009) citando Shurden & Sherman Jr (1980). O ano de 1912 é mencionado pelo mesmo autor como o ponto de partida formal para o surgimento desses serviços, sendo as suas principais funções a manutenção de boas relações com os sindicatos, a defesa dos direitos dos trabalhadores, a adaptação dos empregados aos avanços tecnológicos, a gestão de processos como a avaliação, remuneração e comunicação interna e, como acrescenta Serrano (2009), questões disciplinares, mantendo-se focados em assegurar a conformidade com as regras internas e a legislação. Deste modo, era comum que os departamentos de pessoal incluíssem ex-militares e juristas, o que refletia uma necessidade de controle e estabilidade num ambiente de trabalho cada vez mais desafiador, (Serrano, 2009 cit. Bilhim 2004: 38), caracterizados pela sua frieza e inflexibilidade, acrescenta Erthal (2015) ao citar Marras (2011). No entanto, salienta Alis, et al. (2009), o papel desempenhado por estes serviços não tinha grande destaque na época, embora estivessem destinados a evoluir até atingir um papel mais estratégico nas organizações do presente. Entre 1920 e 1950, segundo Alis, et al. (2009), o conceito de eficiência dominava o ambiente empresarial, impulsionado pelo crescimento do marketing e pela exigência dos consumidores. Neste contexto, a produção em massa focava-se em manter a produtividade máxima, desconsiderando muitas vezes o bem-estar dos trabalhadores. A Grande Depressão de 1929 levou a uma nova abordagem para as atividades de Gestão de Recursos Humanos, (Alis, et al., 2009). O Estado, que antes mantinha uma posição de não- intervencionismo, passou a intervir ativamente para assegurar o bem-estar dos trabalhadores. Essa intervenção levou a uma ampliação das responsabilidades dos serviços de pessoal, que passaram a incluir o desenvolvimento de políticas de seleção e formação, especialmente em resposta à crescente participação feminina no mercado de trabalho durante a II Guerra Mundial. Relativamente à formação, esta era essencialmente desenvolvida em centros de aprendizagem, permitindo combater a falta de mão de obra adequada à execução da tarefa, (Serrano, 2009). No início da década de 1930, Alis, et al. (2009), destaca o estudo, pioneiro nas oficinas de Hawthorne, da Western Electric, conduzido pelo psicólogo americano Elton Mayo, investigando a influência das condições de trabalho na produtividade dos funcionários. Os resultados destas experiências introduziram a “Teoria das Relações Humanas”, desafiando a visão taylorista que enfatizava a eficiência e o interesse individual. O “efeito Hawthorne”, identificado por Mayo, sugeria que o aumento da produtividade estava mais associado à atenção dada às condições humanas e sociais dos trabalhadores do que às melhorias nas condições físicas do trabalho. Desta Página 8 de 186 forma, de acordo com Serrano (2009), citando Besseyre des Horts (1987: 150), os aspetos da gestão de pessoal passaram a ser frequentemente negociados em contratos com as entidades sociais. Durante as décadas de 1940 e 1950, verificou-se um avanço significativo na sindicalização dos trabalhadores, o que levou os especialistas em relações coletivas de trabalho a assumirem um papel importante nos Serviços de Pessoal, (Alis, et al., 2009). Este período foi marcado pelo conceito de “relações industriais” (RI), que descrevia os fenômenos associados à sindicalização. Após 1945, Alis, et al. (2009) menciona Green Miner e Miner (1973) e Igalens (1999) para justificar a evolução dos Serviços de Pessoal com recurso a diversos fatores, como a crescente complexidade das indústrias, a melhoria das condições de trabalho, a especialização das funções, a gestão organizacional, o desenvolvimento da legislação social, a atuação dos sindicatos e os avanços tecnológicos. Alis, et al. (2009) refere ainda que o trabalho de E. Mayo foi continuado por investigadores como Maslow e Herzberg, que deram origem à escola dos “relacionistas” após 1950. Esta escola influenciou os Serviços de Recursos Humanos (SRH), que passaram a focar-se mais nas motivações e necessidades dos trabalhadores, na saúde psicológica, na comunicação e na participação. Houve uma rápida expansão dos benefícios sociais, incluindo programas de bem-estar, planos de reforma e férias, o que, de acordo com Serrano (2009) ao citar Besseyre des Horts (1987: 150), visava equilibrar as necessidades da organização com o bem-estar dos funcionários, promovendo um ambiente de trabalho produtivo e colaborativo, contribuindo positivamente na produtividade da empresa. Quanto ao perfil dos profissionais de recursos humanos, Serrano (2009), aludindo Bilhim (2004: 39), e Erthal (2015), mencionado Marras (2011), sublinham ainda que as empresas passam a valorizar candidatos com formação em ciências sociais, como sociologia e psicologia, investindo numa compreensão mais aprofundada do comportamento humano no ambiente de trabalho. Apesar de todas estas alterações na organização do trabalho, ainda havia muitos aspetos assentes no modelo taylorista, atuando ainda de uma forma generalizada na administração, onde as questões de pessoal eram geridas pelas chefias com base em regulamentos, imposição da disciplina e da experiência profissional, (Serrano, 2009 cit. Sainsaulieu, 1997: 66). Esta abordagem da gestão de pessoal é uma das principais críticas que reside na desconexão do processo de decisão estratégica, pois a função não é considerada essencial para a Página 9 de 186 competitividade da empresa, (Brandão & Parente, 1998). Assim, o pessoal é visto apenas como um custo a ser minimizado, criando uma incompatibilidade entre os objetivos económicos e sociais da empresa. Na gestão em geral, acrescenta Alis, et al. (2009), as práticas de “gestão de empresas” de Peter Drucker tornaram-se populares na América do Norte e na Europa nas décadas de 1950 e 1960, com conceitos como a gestão por objetivos (GPO), ainda relevantes nos dias de hoje. 2ª Fase (1960-1980) Gestão de Pessoal Entre as décadas de 1960 e 1980, enfrenta-se um novo desafio: a transição da administração de pessoal para um novo paradigma de gestão de recursos humanos, a gestão de pessoal, baseado numa lógica qualitativa, (Serrano, 2009). A expansão desta função, como refere Alis, et al. (2009), pode ser atribuída a vários fatores, como o aumento da legislação governamental baseada nos dados fornecidos pelas organizações, a experimentação de novas técnicas de GRH e o desenvolvimento das ciências do comportamento. Durante esta fase destacaram-se, segundo Serrano (2009), as preocupações humanistas, a valorização dos agentes socais dentro da empresa e o foco na motivação dos colaboradores. Para Brandão e Parente (1998), a contestação à organização científica do trabalho (modelo de gestão desenvolvido por Frederick W. Taylor), desempenhou um papel significativo na aproximação dos agentes sociais, como sindicatos e associações profissionais da empresa, devido a vários fatores, nomeadamente à alteração estrutural da mão de obra, os níveis de escolaridade e a transformação dos valores. Por isso ficou claro que era necessário pensar de forma mais ampla e humanizada. É neste contexto da gestão de pessoal que são estabelecidas as direções de Pessoal e se inicia uma era de profissionalização, Alis, et al. (2009). Os profissionais da função passam a ter o reconhecimento de gestores, equiparando-se aos outros quadros da empresa, e a receber formação específica para assumir responsabilidades cada vez mais complexas. Estes profissionais, idealmente portadores de formação em psicologia, devem apoiar na conjugação de necessidades individuais e organizacionais (Serrano, 2009 cit. Bilhim, 2004). Desta forma, visava-se aumentar a produtividade da empresa, minimizar os custos e garantir que a equipa estivesse mais motivada, evidenciando que os trabalhadores não são apenas recursos produtivos, mas seres humanos que precisam de Página 10 de 186 reconhecimento, respeito e um ambiente do trabalho que os inspire, (Borralha, 2024). Como resultado, os técnicos de Relações Industriais (RI) perderam parte da sua influência para os técnicos de RH, (Alis, et al., 2009). Para alcançar o sucesso da empresa, recorreu-se a práticas de formação, participação e comunicação, promovendo assim a rotação de tarefas, (Serrano, 2009 cit. Besseyre des Horst, 1987 e Freire, 1993). Essa visão faz-nos entender que uma organização é como um corpo, onde todos os órgãos e tecidos precisam de trabalhar juntos para que tudo funcione bem, (Borralha, 2024 cit. Fischer, 2002). Surge então a ideia de que os trabalhadores são capazes de contribuir positivamente na organização do trabalho e no funcionamento da organização. Nesse contexto, enfatiza-se a importância de políticas centradas na formação dos chefes de pessoal e a criação de espaços de participação dos trabalhadores nas decisões e nas comunicações informais, (Serrano, 2009 cit. Sainsaulieu, 1997:6). A nível de práticas organizacionais, de acordo com Serrano (2009) ao citar Gilbert (1999), são valorizadas a gestão de carreiras, a formação continua para adultos e o aconselhamento ao pessoal. Nesse contexto a gestão previsional de carreiras consiste na procura antecipada dos indivíduos adequados aos empregos disponíveis, tendo como principais funções a avaliação do potencial dos colaboradores e a criação de organogramas de substituição. Ocorreram ainda, menciona Alis, et al. (2009), várias mudanças, nomeadamente ao nível da gestão por objetivos (GPO), do planeamento do tempo de trabalho, da maior intervenção governamental, da reestruturação do trabalho, da abordagem sistémica, do desenvolvimento da gestão e da influência do ambiente externo. “É desta forma que o termo de gestão de pessoal é gradualmente abandonado para dar lugar ao termo GRH”, uma vez que a última atribui um lugar importante à gestão cultural e às dimensões psicossociológicas da organização, (Alis, et al. (2009) cit. Legge, 1989). 3ª Fase (1980-1990) Gestão de Recursos Humanos Na década de 1980, o conceito de cultura ganhou destaque para explicar diversos fenômenos, abrangendo valores individuais, conhecimentos profissionais e esquemas culturais de grupo dentro das organizações, segundo Alis, et al. (2009). A cultura permitiu que o lado humano se Página 11 de 186 tornasse mais relevante do que a estrutura. Assim, a gestão de pessoal (GP), focada em aspetos técnicos, foi gradualmente substituída pela Gestão de Recursos Humanos (GRH) e as empresas, como refere Carvalheiro (2011), criaram pela primeira vez os seus próprios órgãos de RH. O mundo de negócios enfrentou então um novo desafio, as adaptações às alterações produzidas no ambiente das empresas, especificamente a globalização dos mercados, que estava a transformar a maneira como as empresas operavam, (Borralha, 2024). Nesse contexto, o principal desafio da gestão de recursos humanos foi adaptar-se às diversas mudanças, incluindo a evolução dos mercados a novas expetativas dos trabalhadores, a complexidade crescente dos processos de gestão e o surgimento de novas formas de trabalho não padronizadas, transitando as relações coletivas para uma abordagem mais individualista (Serrano, 2009 cit. Caetano e Tavares, 1999: 38-39). Essa mudança fez com que as empresas tivessem que ser mais eficientes e competitivas para se destacarem dos concorrentes, (Borralha, 2024). Com a abordagem da gestão de recursos humanos, a função do pessoal passa a ser “gestão previsional dos empregos” e desenvolve novas práticas, como a animação de grupos de trabalho, a formação contínua, a requalificação profissional e a gestão de mobilidades (Serrano, 2009 cit. Sainsaulieu,1993 e Gilbert,1999). Alis, et al. (2009), acrescenta que os novos profissionais de GRH adotam geralmente uma abordagem participativa, alinhando-se melhor com as preocupações da Direção-Geral. A GRH tem visto, por isso, o seu papel evoluir, Alis, et al. (2009) citando Haines e Arcand (1986), incorporando conceitos como planeamento estratégico, qualidade de vida no trabalho, parceria, flexibilidade e cultura organizacional. Para consolidar a sua legitimidade, a função de RH tem se destacado pela inovação, tanto em nível estratégico quanto organizacional. Isso inclui gerir o fator humano como um recurso estratégico da empresa, através de novas formas de organização, gestão do tempo de trabalho, políticas de igualdade, sistemas retributivos flexíveis e novos processos de desenvolvimento de competências, (Alis, et al., 2009 e Duarte, Gomes, Sanches, & Sousa, 2012). De acordo com Alis, et al. (2009), a tecnologia aplicada à GRH é um meio estratégico para superar a concorrência, sendo utilizada principalmente para a contratação de recursos humanos e processamento de vencimentos. Isso permite que os responsáveis de RH realizem tarefas mais estratégicas. No entanto, os gestores de RH precisam reajustar as suas funções dentro da organização para se adaptarem a essas mudanças. Página 12 de 186 É de salientar também que diferentes autores, aponta Serrano (2009), definem a GRH segundo perspetivas distintas, que se opõem à tradicional gestão de pessoal: De acordo com Caetano e Tavares (1999), citados por Serrano (2009), a gestão do pessoal caracteriza-se por uma abordagem essencialmente administrativa e operacional, centrada na execução de tarefas e no cumprimento de normas. A sua principal preocupação é garantir que os processos sejam executados de forma eficiente conforme as regulamentações estabelecidas, com uma visão mais focada na estabilidade e na conformidade organizacional. A gestão de recursos humanos diferencia-se por colocar enfase na gestão da cultura organizacional, em vez de se limitar a regras e procedimentos, destacando a importância dos recursos humanos como um fator chave para a vantagem competitiva da empresa e promovendo uma maior ligação e compromisso dos colaboradores com a organização. Assim, a GRH é vista como uma “tarefa de gestão estratégica mais central do que a GP”, dado que os recursos humanos são encarados pelos gestores como sendo um recurso que a organização tem de valorizar. O autor Sainsaulieu (1997), mencionado por Serrano (2009), refere que a gestão de recursos humanos é uma abordagem mais estratégica e abrangente, que ultrapassa a simples gestão administrativa. A GRH procura desenvolver e envolver os colaboradores, de forma a promover um ambiente de trabalho mais dinâmico e motivador, onde se valoriza a formação contínua, a liderança colaborativa e o desenvolvimento das competências dos trabalhadores. Ou seja, o “importante é desenvolver o potencial humano para benefício da organização e dos colaboradores”, (Borralha, 2024). Nesta perspetiva os dois conceitos distinguem-se fundamentalmente pelos sistemas de valores que defendem. A gestão de pessoal foca-se no controlo da força de trabalho e a gestão de recursos humanos assenta na autonomia dos colaboradores. Os autores Hiltrop e Sparrow (1994), referidos por Neves (2007), destacam que a diferença fundamental entre a Gestão de Pessoal (GP) e a Gestão de Recursos Humanos (GRH) está na forma como cada abordagem vê os indivíduos dentro das organizações. Na gestão de pessoal, prevalece a ideia de que os recursos humanos eram um custo, visão dominante até 1970. A partir da década de 1980, emergiu uma nova perspetiva, na qual os recursos humanos são citados como um investimento valioso para as empresas, sendo um acréscimo de competitividade nos negócios. Assim os Gestores de Recursos Humanos passam a ser Página 13 de 186 encarados como um fator estratégico, capaz de fazer a diferença em termos de vantagem competitiva. Em síntese, de acordo com Serrano (2009), o autor Neves (2000) refere que a GRH reflete uma evolução, na qual os conceitos de administração, custos, formação e negociação coletiva foram progressivamente substituídos por abordagens como gestão, investimento, desenvolvimento, negociação individual e trabalho em equipa. Essa transformação traduz a perda de relevância dos fatores competitivos tradicionais e a crescente importância dos recursos humanos enquanto fator estratégico dentro da organização. 4ª Fase (1990 a 2012) - Gestão Estratégica Nos anos de 1990, a visão contemporânea da função de recursos humanos começa a ganhar forma, ficando este período marcado por desafios tecnológicos, económicos, sociais e político- legais que exigem uma resposta abrangente das empresas, (Serrano, 2009). Para enfrentar estas mudanças, as organizações passam a mobilizar e investir em todos os seus recursos, incluindo os recursos humanos. A área responsável por esta função, que adquire o estatuto de uma função estratégica de primeira importância, assume como missão o desenvolvimento das pessoas, que agora são consideradas um recurso necessário para a organização, (Brandão & Parente, 1998 e Serrano, 2009). Para Serrano (2009), citando (Gilbert, 1999), a gestão estratégica distancia-se da visão quantitativa e coletiva da anterior abordagem, ao introduzir uma perspetiva mais qualitativa e focada no indivíduo. Este processo de individualização privilegia a “gestão previsional das competências", tornando o conceito de competência um elemento central. Assim as empresas passam a preocupar-se mais com o conteúdo e a qualidade das funções desempenhadas A transformação da realidade socioeconómica nos anos 1990 introduziu novos desafios e lógicas que impulsionaram a modernização das práticas de Gestão de Recursos Humanos (GRH) em organizações mais descentralizadas, Serrano (2009). De forma resumida essas lógicas são: · Personalização: Ajustar as práticas de GRH às necessidades individuais dos trabalhadores e às exigências da organização. · Adaptação: Garantir flexibilidade para responder às mudanças no ambiente externo e interno. Página 14 de 186 · Mobilização: Promover o envolvimento e a motivação dos trabalhadores através de uma liderança ativa e de apoio adequado. · Partilha: Dividir responsabilidades de GRH entre todas as chefias, incentivando a colaboração. · Antecipação: Planeamento estratégico para enfrentar incertezas e prever as necessidades futuras. De acordo com os autores Peretti (1997) e Brandão & Parente (1998), esses princípios refletem um modelo de GRH mais descentralizado, participativo e orientado para o futuro. Estas orientações surgem como resposta às pressões do ambiente externo em que as empresas operam, exigindo uma reação estratégica para assegurar a sua sobrevivência no mercado. Nestas condições a função de recursos humanos está sujeita às leis de mercado, assumindo um papel estratégico nas decisões fundamentais da política empresarial (Serrano, 2009 cit. Peretti,1998: 60). De modo geral, pode dizer-se que o conceito de gestão estratégica de RH alinha as políticas de GRH com a estratégia corporativa, os valores da empresa, as competências organizacionais e os processos de negócio que criam valor para a organização, (Serrano, 2009). Esta abordagem exige uma força de trabalho altamente comprometida, flexível nos papeis que assume e qualificada. Para atingir estes objetivos, é essencial focar em áreas chave como a seleção, a socialização, a formação e o desenvolvimento de sistemas de recompensas (Carvalheiro, 2011 cit. Tavares et al., 2000). De acordo com Serrano (2009), tendo por base Ulrich (1996), as políticas de gestão estratégica de recursos humanos (GERH) desenvolvem-se segundo dois eixos: um estratégico (a longo prazo) e outro operacional (a curto prazo). A partir da combinação desses eixos, definem-se quatro objetivos principais para a GERH: “a gestão estratégica dos recursos humanos, a gestão da transformação e da mudança, a gestão das infraestruturas organizacionais e a gestão das contribuições dos colaboradores”. Atualmente, existe um consenso entre investigadores e profissionais sobre a importância estratégica da função de Recursos Humanos. Para o autor Bouchez (2005), citado por Serrano (2009), a função de RH deve contribuir para o crescimento sustentado e a performance global da organização. Página 15 de 186 Por outro lado, a análise da dimensão estratégica e simbólica do fator humano tem impulsionado o desenvolvimento da teoria da Gestão de Recursos Humanos (GRH), (Serrano, 2009 cit. Neves, 2000). Este avanço é motivado por razões teóricas e práticas. Do ponto de vista teórico, procura-se compreender a diversidade das práticas de GRH e a sua relação com a competitividade, considerando o fator humano como uma vantagem. Já do ponto de vista prático, existe a necessidade de controlar os efeitos dessas práticas, onde a cultura organizacional e a estratégia de negócios desempenham um papel determinante, condicionando desta forma a evolução do conceito de GRH. O conceito de Gestão Estratégica de Recursos Humanos (GERH) resulta, assim, dos progressos registados na função a partir das influências teóricas e do pensamento renovado da gestão e da sociologia da gestão, que introduzem a ideia de que a obtenção de vantagens competitivas só é possível através das pessoas (Serrano, 2009 cit. Bilhim, 2004). 5ª Fase (a partir de 2012) - Gestão de RH 4.0 A quarta revolução industrial, denominada de Indústria 4.0, caracteriza-se por diversos avanços tecnológicos, que possibilitam a integração dos agentes humanos, linhas de produção e processos além das fronteiras da organização para formar uma nova cadeia de valor, (Silva, 2022). Esta revolução vem exigir novas competências aos trabalhadores. Assim, as novas tecnologias substituem os trabalhadores nas suas funções e tarefas rotineiras. As organizações passam então a procurar funcionários que demonstrem maior criatividade e possuam maior nível de formação, Silva (2022) cit. Lee et al. (2014), ou requalificar os seus atuais colaboradores para que estes sejam capazes de responder às exigências da nova indústria e saber lidar com as novas tendências tecnológicas, (Silva, 2022 cit. Manyika et al., 2015). A Indústria 4.0, conforme o autor Kegermann et al. (2013), citado por Araújo, et al. (2024), refere-se à automação e ao compartilhamento de dados em tecnologias de fabricação, apresentada inicialmente na feira de Hannover em 2011, na Alemanha. Para o autor Mazali (2018), segundo Araújo, et al. (2024), este conceito representa uma nova dinâmica entre sociedade e indústria, transformando as relações entre colaboradores, organizações, tecnologias e sistemas de produção e consumo. Página 16 de 186 O autor Hofmann & Rusch (2017) refere que, de acordo com a interpretação de Silva (2019/2020), a nova Indústria tem provocado discussões e preocupações sobre o futuro, especialmente no que toca à relação homem-máquina. A revolução tecnológica trouxe a potencialidade de transformar a maneira como os produtos são desenhados, fabricados, automatizados, entregues e pagos, o que implica mudanças significativas nos processos produtivos e comerciais. Ainda de acordo com Silva (2019/2020), a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), em 2016, considerava a Indústria 4.0 como a quarta revolução industrial, caracterizada pelo controle da produção por sensores e dispositivos conectados à internet, unindo o mundo real e virtual. Além disso, esta Indústria apoia-se em vários pilares tecnológicos que, ao serem integrados aos processos produtivos, permitem alcançar um padrão de qualidade mais elevado, (Silva, 2019/2020 cit. Estevez, 2016). São exemplos desses pilares, a Big data e Analytics, a robótica, a realidade aumentada e a cibersegurança. Como destacam Stachová et al. (2019), referidos por Silva (2019/2020), e Silva (2022), a Indústria 4.0 não só melhora o desempenho organizacional, como também incentiva o desenvolvimento e a integração dos empregados. Isso garante que os colaboradores acompanhem a evolução tecnológica e mantenham a competitividade das empresas no mercado. Este contexto salienta a importância dos recursos humanos na adaptação e formação de talentos alinhados com as exigências dessa nova era. Assim, na era da informação, os recursos humanos são encarados como seres inteligentes, repletos de conhecimentos e habilidades, o que os torna no ativo mais importante das organizações, (Erthal, 2015 cit. Chiavenato 2007). O fator diferenciador que permite aumentar a competitividade das empresas, passa, em parte, a depender de cada colaborador e do desenvolvimento do seu potencial, Cairo (2020), pelo que os gastos com a formação destas pessoas são encarados como um investimento, (Barracho, 2014). Com isto, os colaboradores transformaram-se em parceiros das organizações, sendo que atualmente as mudanças observadas abrangem todos os trabalhadores, independentemente do seu nível hierárquico, (Barracho, 2014). Gestão de Recursos Humanos em Portugal Os autores Gonçalves & Neves (2015), destacam o desfasamento temporal existente na evolução dos movimentos e processos de GRH entre as diferentes partes do mundo. Por exemplo, Página 17 de 186 as transformações ao nível das práticas de GRH que se verificaram no início do século XX nos Estados Unidos da América só surgiram em Portugal cerca de 50 anos depois. Este desfasamento é mais evidente nas primeiras fases, enquanto as últimas encontram-se temporalmente mais alinhadas com as práticas de GRH aplicadas noutros países. Peretti (1997), justifica ainda este forte desfasamento no desenvolvimento sociolaboral em Portugal com base no periodo de ditadura Salazarista que o pais viveu a partir de 1933, no qual os interesses superiores da Nação se sobrepunham aos interesses individuais dos trabalhadores. Com a revolução industrial, no fim do século XIX, de acordo com Gomes, et al. (2010), surgem as grandes instalações fabris, onde operavam milhares de trabalhadores em condições degradantes. Salários baixos, acidentes de trabalho frequentes, excessiva carga horária, trabalho infantil generalizado e a aplicação de castigos corporais, multas salariais ou despedimentos imediatos, extensivos a toda a familia, eram caracteristicas marcantes deste periodo, em que não existiam quaisquer sistemas de proteção do trabalhador ou de segurança social. À semelhança de outros paises, o aumento da competitividade empresarial assumiu grande relevância na evolução das práticas da GRH, (Neves, 2007). O autor acrescenta que os dados referentes a esta evolução são relativamente excassos, mas resultam do grande contributo da Associação Portuguesa de Gestão de Pessoas (APG), que promove anualmente, desde 1967, debates e seminários que refletem as tendências na evolução na gestão do pessoal. Assim, tanto Neves (2007) como Gonçalves & Neves (2015), defendem que a análise aos temas abordados nestes encontros anuais de reflexão promovidos pela APG, evidencia tendências na evolução da designação e conteúdos da função de Gestão de Recursos Humanos e a influência dos temas político-sociais na diversificação das temáticas discutidas em cada encontro. Com base nestas tendências, para Gonçalves & Neves (2015), é possivel delimitar 4 períodos de tempo distintos da evolução das práticas e do conceito de Gestão de Recursos Humanos em Portugal, sendo já visível o início de uma 5º fase desta evolução. Deste modo, as fases por eles delimitadas são as seguintes, cujas caraterísticas veremos adiante: 1ª Fase: 1967 até ao fim da década de 1970 2ª Fase: década de 1980 3ª Fase: final da década de 1980 até à metade da década de 1990 4º Fase: segunda metade da década de 1990 até 2010 Página 18 de 186 1ª Fase A primeira fase estendeu-se desde o início dos encontros nacionais (1967) até ao final da década de 1970 e centra-se essencialmente na temática da gestão do pessoal. Os temas discutidos tanto se relacionavam com a função e o trabalhador que a executa como com os problemas político- sociais resultantes do período da revolução de abril, nomeadamente a luta entre classes. Nesta altura, o perfil da função de atividades relacionadas com a GRH estava muito associado a práticas de natureza jurídico-administrativas, (Gonçalves & Neves, 2015 e Neves, 2007). De acordo com Brandão e Parente (1998: 36), existiram dois momentos marcantes no período de pós-revolução de abril de 1974, no que respeita a questões laborais. Num primeiro momento, verificou-se uma forte conflitualidade social, notável nas diversas contestações sociais realizadas contra o poder patronal, que não se mostrava aberto ao diálogo social. Já numa segunda instância, assistiu-se a uma contratualização das relações laborais, permitindo a criação de serviços de pessoal, que asseguravam o cumprimento das obrigações legais e convencionais estabelecidas, nomeadamente em relação a salário mínimo, contratação a prazo e a gestão das carreiras. 2ª Fase Numa segunda fase, ocorrida durante a década de 1980, a expressão Gestão de Recursos Humanos como forma de designar os assuntos de pessoal nas organizações ganha importância. É também um período onde se abordam várias questões sobre a modernização e competitividade das empresas, que se acentuaram aquando da integração europeia de Portugal. As organizações passam, além da função económica, a preocupar--se com a função social, (Gonçalves & Neves, 2015 e Neves, 2007). Assim, a Gestão de Recursos Humanos, cujo perfil está fortemente relacionado com as Ciências Sociais e Humanas, resulta “da planificação de efetivos e análise das funções e dos sistemas de trabalho, da afetação de pessoas aos postos de trabalho, da higiene e segurança no trabalho, da gestão de incentivos, da avaliação do desempenho (...)”, (Gonçalves & Neves, 2015). No entanto, Brandão e Parente (1998: 36), distinguem a execução desta função nas pequenas e médias empresas em Portugal, da realidade nas grandes empresas e multinacionais. No primeiro caso, observa-se a falta de autonomia por parte dos serviços de pessoal, estando estes inseridos nas funções de gestão administrativa, financeira ou até de produção. Nas grandes empresas, a Gestão de Pessoal foca-se nas preocupações com a motivação e satisfação dos recursos humanos, ignorando algumas questões relativas ao conteúdo e natureza do trabalho. Página 19 de 186 Os mesmos autores, identificam ainda a existência de duas tendências da GRH nas empresas portuguesas. Por um lado, algumas empresas transferem tarefas da GRH, como a avaliação do desempenho, a aplicação de repercussões disciplinares, a contratação de novos trabalhadores e a promoção por mérito, para as chefias diretas e intermédias, dispensando as grandes estruturas de centralização da GRH. Já as tarefas “de processamento de salários, de formalização de processos contratuais, de despedimentos e de promoções automáticas são asseguradas pelos serviços administrativos”, (Brandão & Parente, 1998). Por outro lado, algumas empresas portuguesas optam pela subcontratação de serviços que exerçam a função tanto na vertente técnica de recrutamento, seleção, formação e avaliação do desempenho, como na vertente administrativa, (Brandão & Parente, 1998). No entanto, este comportamento, verificado tanto em empresas nacionais como multinacionais, aplica-se mais aos quadros superiores da organização, pois os trabalhadores operacionais continuam a ser geridos numa ótica administrativa ou, por vezes, de gestão de pessoal. Nesta década, onde os índices de sinistralidade laboral eram elevados, (Brandão & Parente, 1998 cit. Martins, 1995), vivenciou-se ainda uma intensificação da crise económica, que levou a um retrocesso, dado que se extinguiram ou substituíram estruturas de pessoal por organismos administrativos que apenas processam salários. Por sua vez, a crise de emprego originou processos de despedimento dos trabalhadores em excesso (Brandão e Parente, 1998: 36). Com o seu estudo, Brandão & Parente (1998), concluem que a forte intervenção do estado nas funções de pessoal nas empresas portuguesas tem um papel importante na defesa das condições de emprego dos trabalhadores, no entanto, condiciona os avanços no desenvolvimento da gestão de recursos humanos. 3ª Fase Com início no final da década de 1980, este período conjuga a utilização tanto da designação de GRH como da designação de gestão de pessoal. Nesta altura, como referem Gonçalves & Neves (2015) e (Neves, 2007), as preocupações debatidas nos encontros anuais de reflexão promovidos pela APG centravam-se no desenvolvimento de competências e na formação do potencial humano, no desemprego e na formação profissional. Para o desempenho da função, torna-se relevante a capacidade de definir e gerir sistemas de formação. Em paralelo, a adoção de processos de inovação tecnológica e organizacional, conduziu a elaboração de um estudo, que, de acordo com Serrano (2009), permitiu a Moniz (1989) verificar Página 20 de 186 que a preocupação das empresas com a inovação tecnológica fazia prevalecer as “novas tecnologias materiais” face às questões sociais inerentes à organização do trabalho. Outra conclusão que o seu estudo permitiu observar foi a identificação das prioridades das empresas, sendo elas a produtividade, a melhoria tecnológica, o crescimento equilibrado e só por último a melhoria das condições de trabalho. Por outro lado, Serrano (2009) citando Ferreira (1991), aponta os modelos autocráticos e burocráticos de organização do trabalho, como sendo os principais motivos que “impedem a participação no processo de decisão, de implementação, controlo e avaliação das formas de trabalho”. Deste modo, “a estrutura hierárquica de autoridade” apresenta uma configuração piramidal e excessivamente formalizada (Serrano, 2009 cit. Ferreira, 1991: 165). O mesmo autor, aponta ainda como causa, além da persistência dos princípios tayloristas de organização do trabalho, o “desleixo que é dado aos recursos humanos, enquanto fator estratégico de competitividade e concorrência empresarial”. Outro estudo relevante nesta época foi, segundo Serrano (2009), o de Ilona Kovács sobre as formas de organização do trabalho em empresas nacionais. Este estudo levou a mesma a concluir que as empresas procuram “flexibilidade na sua organização do trabalho”, sobretudo através de práticas como a rotação de tarefas e grupos polivalentes, de modo a aumentar a produtividade e a qualidade dos seus serviços, melhor aproveitar as potencialidades de cada trabalhador, reduzir o número de postos do trabalho, reduzir a inatividade e os tempos mortos, entre outros, (Kovács, 1994: 24-25). 4ª Fase Na segunda metade da década de 1990, dá-se início à 4ª fase, focada na gestão das competências e do conhecimento, bem como no esforço dos Recursos Humanos para promover a competitividade e a excelência, (Gonçalves & Neves, 2015). Durante este período, de acordo com Gonçalves & Neves (2015), acredita-se que o fator humano é o principal responsável pela diferença competitiva, pelo que as pessoas e o seu bem-estar são colocadas no centro das preocupações da organização. Face a este contexto, o perfil da função de Gestão de Recursos Humanos passa a interligar-se com a formação académica em psicologia e em GRH. Assim, à gestão de técnicas e administrativa dos RH, junta-se a procura por aptidões estratégicas e de desenvolvimento organizacional e a capacidade para gerir competências e fomentar o conhecimento dentro da empresa, (Gonçalves & Neves, 2015). Página 21 de 186 O facto de a realidade empresarial portuguesa ser essencialmente composta por micro, pequenas e médias empresas (MPME) e a investigação sobre GRH se debruçar sobretudo sobre as grandes organizações, reforça Serrano (2009) ao citar Lopes (2005), contribui para que nas MPME a GRH seja vista como uma tarefa subsidiária da gestão, ou seja, não se encontra integrada na estratégia empresarial. Também Peretti (1997) realça as diferenças existentes na função de RH entre as pequenas e as médias empresas, sendo uma delas o facto de, nas pequenas empresas, as decisões de GRH se concentrarem no dirigente da empresa, enquanto nas médias estas decisões mais técnicas são delegadas a terceiros com alguma especialização na área. Segundo Serrano (2009) referindo Lopes (2005), com base num estudo realizado pela universidade de warwick, admite-se ainda a existência de “um grave deficit de empreendedorismo próprio (...) e de baixo estímulo ao intra-empreendedorismo dos trabalhadores”, o que resulta no baixo nível geral de qualificações e de contratações de quadros técnicos nas áreas da ciência e das tecnologias, características marcantes da cultura de gestão portuguesa. Algumas outras conclusões relevantes sobre o contexto laboral de Portugal durante este período, apontadas por Lopes (2005), citado por Serrano (2009), em função do exposto no relatório da OCDE de 2004 sobre Portugal, podem ser mencionadas: os sistemas de ensino não são capazes de formar os empresários e gestores portugueses ao encontro das necessidades das empresas; a cultura de gestão portuguesa evidencia a falta de talento e de ambição; e a dificuldade em promover as marcas nacionais no mercado internacional e em obter economias de escala. É então, para Serrano (2009) mencionando Lopes (2005: 18), inevitável que as organizações nacionais, por motivos culturais, apresentam uma “relutância natural” em acompanhar as transformações havidas em todos os países desenvolvidos nos domínios da flexibilidade organizacional Desta forma, a falta de flexibilidade nas práticas da gestão de recursos humanos pode não só as tornar inadequadas como dificultar a implementação de uma estratégia de GRH evolutiva, sugerindo-se uma modernização organizacional e uma reorganização dos processos de trabalho em geral e da gestão de recursos humanos em particular das empresas portuguesas, (Serrano, 2009 cit. Lopes, 2005). Página 22 de 186 A GRH em Portugal hoje em dia Nos últimos anos, observam-se indícios de uma nova fase, contudo ainda é bastante difícil definir as suas características. Surgem ideias de mudança e de alteração de práticas e valores organizacionais, o que, em conjunto com a globalização, o desenvolvimento tecnológico, a multiculturalidade e o atual estado da economia, permite prever futuras evoluções quanto à gestão de pessoas, ao perfil do funcionário de Gestão de Recursos Humanos e às temáticas da GRH, (Gonçalves & Neves, 2015). Conclusão Vários autores, como Brandão & Parente (1998), referem a dificuldade em delimitar cronologicamente os períodos da evolução da função de Gestão de RH, bem como os conceitos, políticas e práticas de gestão especificas a eles associados. Desta forma, diferentes autores identificam fases distintas, apesar de, em geral, as características associadas a cada uma delas serem semelhantes. Por exemplo, autores como Brandão & Parente (1998), Peretti (1997) e Erthal (2015) salientam a existência de 3 eras distintas, enquanto Serrano (2009) e Barracho (2014) apresentam 4 periodos. Por outro lado, Estork & Viscaino (2007) reconhecem 5 fases e Alis et al. (2009) refere 6 momentos. Apesar dessas variações, é possível observar que as diferentes fases identificadas por diversos autores acabam por se complementar quando analisadas em termos de períodos ou anos. Assim, mesmo que haja divergências no número de fases, a evolução histórica da GRH pode ser compreendida de forma mais holística ao considerar as características e mudanças ao longo do tempo. Em suma, de acordo com Serrano (2009) citando Beznosiuk (1991), até aos anos 1960, a gestão das pessoas era essencialmente de caráter administrativo, com a função sendo desempenhada por especialistas que aplicavam técnicas específicas para resolver os problemas quotidianos da empresa. Entre 1960 e 1980, houve uma transição para uma fase de gestão onde se privilegiavam políticas de cariz humano e social, com uma visão de médio prazo na evolução da organização. A partir dessa altura, a função de RH entra numa fase de desenvolvimento, procurando conciliar as opções económicas, a procura pelo lucro e a evolução dos recursos humanos para responder aos desafios do contexto atual. Por sua vez, o antigo Departamento de Pessoal, ao longo dos anos, passou a ser caracterizado numa perspetiva mais estratégica, em que os profissionais precisavam compreender o Página 23 de 186 negócio, bem como resolver problemas ligados à motivação, relacionamento, valorização, respeito e qualidade de vida, aumentando, assim, o valor da empresa, (Erthal, 2015). Com o avanço tecnológico e o efeito da globalização, as empresas iniciaram a procura por inovações que garantam qualidade nas tarefas executadas e melhorem o posicionamento na competitividade empresarial. Desta forma, acreditar na capacidade individual de cada interveniente no processo de melhoramento da organização, bem como em meios de desenvolvimento, aproveitamento e identificação, são chaves essenciais para o sucesso de uma empresa (Alcalde, et al. 2017 cit. SOVIENSKI, STIGAR, 2008). Nos últimos anos, presenciaram-se inúmeras mudanças: as pessoas ganharam liberdade para ir além das tarefas que lhes são atribuídas e os gestores de Recursos Humanos assumiram um papel mais ativo no planeamento estratégico das empresas, não se limitando às funções de recrutamento e seleção de novos colaboradores. Em Portugal, verifica-se que a evolução da GRH acompanhou as tendências dos restantes países desenvolvidos, embora com um significativo desfasamento temporal, (Gonçalves & Neves, 2015). Apesar deste atraso, para o qual muito contribuiu, segundo Peretti (1997), o periodo de ditadura Salazarista que Portugal experienciou, hoje em dia a GRH nas empresas nacionais tende a acompanhar cada vez mais os desenvolvimentos nesta área que ocorrem no resto do mundo. Contudo, ao falamos em Recursos Humanos, há que relembrar que todas as pessoas possuem necessidades especificas, cuja satisfação, ou não, é fundamental para a sua realização pessoal, (Carvalheiro, 2011). Conclui-se então que a gestão de RH, primeiramente vista como uma fonte de custos, ganhou grande importância ao longo das últimas décadas, ocupando atualmente uma posição estratégica nas organizações. Assim, os profissionais de RH assumiram um papel mais participativo nas tomadas de decisões, nas ações e investimentos. Nos dias de hoje, os profissionais nesta área devem possuir diversas capacidades, ser autónomos, e não se focarem apenas nas atividades burocráticas, (Estork & Viscaino, 2007). Página 24 de 186 Referências bibliográficas Alcalde, E. d., Brasil, Â. d., Silva, J. T., Sousa, M. L., & Souza, M. H. (2017). A importância na Gestão dos Recursos Humanos nas organizações. Revista Conexão Eletrónica, 14(1), pp. 1-8. Obtido em 24 de novembro de 2024 Alis, D., Bayad, M., Blondin, L., Chavalier, F., Fabi, B., & Peretti, J.-M. (2009). Gestão dos Recursos Humanos. Lisboa, Portugal: Instituto Piaget. Araújo, K. d., Fernandes, P. A., Mattos, A. C., Muraoka, S. M., & Sousa, S. E. (2024). Indústria 4.0: Transformação do RH tradicional para o RH 4.0. Revista Cientifica UniAtenas, 17(1), pp. 7-23. Obtido em 27 de novembro de 2024 Barracho, C. J. (2014). OS RECURSOS HUMANOS E OS DESAFIOS DA ACTUAL GESTÃO, Num Contexto Global em Constante Mudança. Lisboa: Universidade Lusiada. Borralha, S. (2024). Sebenta de Estudo. 3-17. Obtido em 14 de novembro de 2024 Brandão, A. M., & Parente, C. (1998). Configurações da função Pessoal. As especificidades do caso. 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Além de valorizar qualificações e aptidões, a importância dada à aprendizagem, ao conhecimento e às competências profissionais aumentou, tornando-se fatores chave para o desempenho (Almeida, 2015. Os contextos laborais atuais e as exigências do trabalho mostram a necessidade de criar conhecimento e desenvolver novas competências, tanto em trabalhos mais exigentes quanto nos menos exigentes. Os sistemas e processos de análise do trabalho ajudam a entender as atividades laborais e as tarefas, contribuindo para a qualidade da gestão de recursos humanos (Almeida, 2015. Mais do que descrever o trabalho para definir tarefas, é essencial identificar as exigências e tendências do trabalho, além das qualificações e aspetos físicos. É preciso identificar as competências críticas para alcançar altos padrões de desempenho (Almeida, 2015. Neste trabalho, vamos focar-nos nas competências e na análise das funções no contexto dos recursos humanos. 1.- Competências 1.1.- Diferentes perspetivas De acordo com Ceitil (2010), as competências apresentam diversas perspetivas que influenciam as práticas de recursos humanos. As principais perspetivas são: as competências como atribuições, as competências como qualificações, as competências como traços ou características pessoais e as competências como comportamentos ou ações. Nas duas primeiras perspetivas, as competências são consideradas atributos e fenómenos extra-pessoais, na terceira perspetiva são definidas como capacidades e consideradas como características intrapessoais. Já na quarta perspetiva, as competências são definidas como resultado de desempenho e consideradas como elementos interpessoais. As competências como atribuições Ceitil (2010) utilizou a definição de “atribuições” que, segundo o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, publicado pela Academia das Ciências de Lisboa (2001), são “funções, competências, poderes ou prerrogativas inerentes a um cargo ou a uma tarefa”. Esta perspetiva observa as competências por uma visão mais tradicional, isto é, pela forma como estas são )​ ​ ​ )​ ​ )​ Página 27 de 186 utilizadas no contexto institucional. Assim, as competências são vistas como um elemento que os responsáveis de determinado cargo devem possuir para o seu exercício, mesmo que não sejam usadas. Estas não estão ligadas às características pessoais nem ao desempenho do indivíduo na função. Ceitil (2010) afirma ainda que esta perspetiva é utilizada na gestão de recursos humanos para adaptar sistemas tradicionais de descrição e qualificação de funções onde estas acabam por representar as responsabilidades e conhecimentos necessários para determinada função. As competências como qualificações Nesta perspetiva, Ceitil (2010) explica que as competências são vistas como conjunto de conhecimentos, adquiridos por meios certificados, ou seja, uma licenciatura ou uma formação profissional. Deste modo, tal como as competências como atribuições, as competências como qualificações são um elemento extra-pessoal pois o indivíduo que as possui precisa que estas lhe sejam atribuídas por terceiros. Tal como na perspetiva anterior, esta também não apresenta uma garantia do bom desempenho do indivíduo responsável, ou seja, mesmo que alguém possua uma licenciatura, isto não significa que terão obrigatoriamente um bom desempenho na sua função pois o método pois as provas realizadas para a sua obtenção, devido ao seu carácter circunstancial, não permitem uma avaliação que garanta que o indivíduo tenha, de facto, essas competências para a realização de todas as atividades para um cargo na área que foi certificado. As competências como características pessoais Segundo Ceitil (2010), esta perspetiva é a mais conhecida e difundida, sendo por isso também a mais aceite e aplicada em sistemas de gestão, avaliação e desenvolvimento de competências. Esta perspetiva afirma que as competências como características pessoais levam o indivíduo com o bom perfil para a função a agir de forma diferente do que seria esperado quando confrontado com uma situação real. Esta perspetiva tem um carácter intrapessoal, uma vez que o indivíduo é afetado por um agente externo que irá ditar como irá reagir a determinada situação. Ceitil (2010) refere ainda que é necessário observar como o indivíduo se comporta na resolução de um problema, devendo analisar e perceber a perspetiva que tomam na análise do mesmo. Página 28 de 186 As competências como comportamento Nesta perspetiva, Ceitil (2010) refere que, as competências são vistas como o comportamento em si, isto é pessoa possuir as capacidades para, de facto, ter um bom desempenho na sua função. Deste modo, esta perspetiva indica que as competências devem ser os traços de um indivíduo que tornem favorável o seu bom desempenho da função, podendo ser também consideradas características indispensáveis ao perfil da função. Estas competências por serem mensuráveis através da prática em contextos reais, permitem avaliar um indivíduo que, por exemplo, tenha determinadas características favoráveis ao bom desempenho mas ao ser exposto ao contexto real, não o evidenciar. 1.2.- Competências transversais e específicas Ramos e Bento (2010) apresentam várias definições, ao longo do tempo, de diversos autores, sobre o que são as competências. É referido que para LeBoyer (1997) as competências são o conjunto de comportamentos que uma pessoa, ou organização, possui que a leva a se destacar, positivamente, dos outros. Para Gilbert e Parlier (1992), as competências são “heurísticas, estratégicas e inventivas”, ou seja, estas garantem ao indivíduo uma capacidade de se adaptar a diversas situações buscando solucioná-las de forma inovadora. Ramos e Bento (2010) referem ainda a evolução do conceito de competências ao longo da sua história: “David McClelland – Os bons desempenhos não estão associados a maiores ou menores níveis do QI. O que prediz o sucesso são caracterís cas pessoais – 1º conceito de competências. Richard Boyatzis – as competências são como caracterís cas pessoais rela vamente estáveis directamente relacionadas com o sucesso no desempenho da função. Daniel Goleman – “As regras de trabalho estão a mudar, estamos a ser avaliados por uma nova medida, não só pela nossa inteligência, o nosso exper se, mas também pela forma como nos conhecemos a nós próprios e nos relacionamos com os outros” – inteligência emocional.” (RAMOS, E., BENTO, S., 2010, P.107) Desta forma, o conceito de competências começa numa perspetiva mais intrapessoal acabando por adotar uma perspetiva mais interpessoal com o passar dos anos. Ramos e Bento (2010) apresentam a existência de dois tipos de competências: as competências transversais (soft skills) e as competências específicas (hard skills). ti ti ti ti Página 29 de 186 Competências transversais Ramos e Bento (2010) explicam que estas competências tem um carácter de transversalidade e transferibilidade. Isto é, não existem apenas num, ou no, contexto profissional e permitem que sejam utilizadas num contexto diferente do que o de quando foram adquiridas. Por exemplo, a comunicação é uma competência transversal pois esta não só é utilizada em contexto profissional, como fora dele. Competências específicas Ramos e Bento (2010) explicam ainda a definição de competências específicas. Estas, tal como o nome indica, são específicas de uma profissão, possuindo também um perfil hierárquico. Por exemplo, uma formação profissional numa determinada área é uma competência específica. 1.3.- Metodologia De acordo com Ceitil e Custódio (2010), a criação de um projeto voltado para gestão de competências visa permitir que uma empresa consiga organizar os seus “instrumentos técnicos e metodológicos para gerir as suas políticas, estratégias e instrumentos de gestão de recursos humanos” tendo em conta as competências que consideram ser essenciais para o futuro da empresa. Ceitil e Custódio (2010) apresentam uma metodologia possível para a gestão de competências. Esta metodologia é dividida em 5 fases, podendo cada uma ser adaptada ao contexto específico de cada organização. Fase 1 – Identificação das competências chave Segundo Ceitil e Custódio (2010), esta fase passa pela identificação das competências chave através das informações do plano estratégico da organização. Estas competências deverão estar alinhadas ao plano estratégico de forma a permitir o desenvolvimento futuro da empresa. Terão também de ser não só específicas mas também transversais, ou seja, as competências específicas para cada função e as competências que devem estar presentes em todos os elementos da organização. Este conjunto de competências dará origem ao portfólio de competências críticas da empresa. Fase 2 – Descrição do portfólio de competências chave Página 30 de 186 Nesta fase, Ceitil e Custódio (2010), explicam que esta deverá existir uma definição e descrição das competências chave estabelecidas pela instituição na fase 1. A definição e descrição de cada competência deverá ser sintética, de forma a mostrar com clareza os comportamentos a seguir, e precisa, evitando adjetivos, de forma a evitar dúvidas de interpretação. Ceitil e Custódio (2010) referem ainda as entrevistas como instrumento utilizado nesta fase. Aqui surgirá um manual que contém todas as competências, específicas e transversais, tal como as suas definições e indicadores comportamentais, que a instituição tenha considerado essenciais para o seu desenvolvimento futuro. Fase 3 – Avaliação das competências Nesta fase, Ceitil e Custódio (2010) explicam que deverá haver uma avaliação das competências já existentes na instituição, de forma a perceber a diferença entre as competências existentes e o que foi definido que seria o ideal. Ceitil e Custódio (2010) mencionam também que esta avaliação deverá ser efetuada com a criação de assessement centres, avaliando assim individualmente todas as pessoas dentro da organização através de teste de personalidade, resultado obtido nas entrevistas e provas no contexto da organização. Fase 4 – Definição dos planos de ação e desenvolvimento de competências Depois de ser apurado a diferença entre as competências existentes e as que foram definidas como ideal, Ceitil e Custódio (2010), deverá ser encontrada a razão desta diferença, esta poderá ter uma origem organizacional ou pessoal. De acordo com Ceitil e Custódio (2010), se a origem desta falha for organizacional deverá ser montando um plano para que possa ser resolvida, este plano é implementado em toda a empresa devendo melhorar, por exemplo, a cultura da organização ou a comunicação. Se estivermos perante uma falha a nível pessoal, deverá ser estruturado um plano individual que irá atuar diretamente sobre as competências em falta nos indivíduos. Ceitil e Custódio (2010) mencionam ainda que esta análise deverá ser então fundida num plano com todas as medidas, o plano de desenvolvimento de competências, que deverá ser calendarizado e cumprido da forma mais eficiente. Página 31 de 186 Fase 5 – Avaliação do desenvolvimento de competências Esta fase, segundo Ceitil e Custódio (2010), deverá ocorrer algum tempo depois da implementação do plano de desenvolvimento de competências, de forma a avaliar a sua eficácia, esta avaliação será efetuada com o método utilizado na fase 3. 1.4.- Identificação e avaliação de competências De acordo com Silva (2010), a identificação das competências pode ser dividida em duas partes, as competências da organização e as competências a nível das funções. A nível da organização, esta identificação é feita através da reflexão estratégica, permitindo perceber a relação entre os pontos fortes e fracos e as tendências do meio e também os seus fatores críticos de sucesso que os diferenciam das outras empresas. A nível das funções deverá ser utilizado o manual de competências, criado na fase 2 da metodologia, pelo qual poderá ser possível identificar estas competências. Silva (2010) acredita ainda que, com a consolidação do modelo de gestão de competências passará a ser centrado nos comportamentos e ações que visam o sucesso da empresa, ao invés da atual centralidade na função. Para Silva (2010), a avaliação destas competências pode ser feita de 3 formas: Entrevista de avaliação de competências Nesta técnica Silva (2010), explícita que estas entrevistas deverão ter questões sistemáticas, relacionadas com o contexto da função, objetivas e subjetivas. O entrevistador deverá obter informações descrições comportamentais rigorosas de forma a classificar as competências essenciais para a função a desempenhar. Assim poderão ser minimizadas as disparidades consequentes das diferentes variáveis que afetam esta técnica. Testes psicométricos e inventários Silva (2010) refere o uso testes psicométricos e inventários como técnica de avaliação de competências. A nível dos Inventários, Silva (2010), explica que estes devem ser questionários de competências genéricas no contexto organizacional. Estes permitem uma avaliação da auto- perceção do indivíduo que poderá ser mais tarde comparada com os resultados das avaliações feitas pela organização. Assessment centre Página 32 de 186 Silva (2010) explica que esta técnica através da criação uma situação hipotética no contexto da função visa observar e avaliar o desempenho dos avaliados. Silva (2010) menciona ainda que esta parte do princípio de que este comportamento, embora não garantido, é um bom indicador do comportamento futuro do indivíduo perante a mesma situação. 2.- Análise do Trabalho A análise de funções, segundo Sekiou et al. (2009) é um procedimento que utiliza um método específico para recolher sistematicamente dados concretos sobre uma função durante um determinado período. Isto permite criar um perfil detalhado da função, incluindo a sua descrição e especificação. Segundo os mesmos autores, a análise de funções permite ainda facilitar as relações de trabalho entre empregadores, representantes sindicais e os trabalhadores. Desta forma, pode-se afirmar que a análise de funções é um procedimento comum em todas as empresas, embora varie em termos de extensão, precisão, custos e nível de organização (Cunha et al., 2010) A análise de funções pode ser vista como a espinha dorsal da Gestão de Recursos Humanos, pois diversas atividades de GRH estão interligadas à mesma (Cunha et al., 2010), sendo as principais segundo Sousa et al. (2006) as seguintes: Recrutamento e seleção: fornece detalhes sobre a natureza da função, ajudando a direcionar as atividades de recrutamento e seleção. Formação: oferece informações sobre as tarefas a serem realizadas e as competências necessárias, orientando o desenvolvimento dos programas de formação. Avaliação de desempenho: a análise de funções é essencial para esta prática, pois é necessário considerar o conteúdo das funções desempenhadas pelo avaliado. Além disso, é a partir dessa análise que surgem os critérios individuais de desempenho. Remunerações: fornece dados relevantes para avaliar o valor intrínseco da função na organização e compará-la com funções semelhantes no mercado de trabalho, auxiliando na determinação do sistema de compensações. Tendo ainda, de acordo com Sekiou et al. (2009), relação com outras atividades da GRH, tais como, planeamento, avaliação de funções, gestão do tempo, gestão de carreiras, psicologia industrial, relações de trabalho, saúde e segurança, gestão do absentismo e rotatividade. Página 33 de 186 2.1.- Questões fundamentais É importante referir que uma função, de acordo com Cunha et al. (2010) é composta por um conjunto de tarefas com um ou mais objetivos que definem um posto de trabalho. Os mesmos autores referem ainda que, uma tarefa, por sua vez, é constituída por um conjunto de operações ou elementos que são realizados numa área funcional específica, visando alcançar um objetivo determinado. Segundo Sekiou et al. (2009), podemos resumir em quatro as questões principais que a análise de funções deve abordar. 1. O que é que faz o colaborador? Tem como objetivo saber quais as tarefas específicas do cargo do colaborador, e o tempo que demora a realizá-las. 2. De que maneira o colaborador realiza o seu trabalho? Descrevem-se os meios utilizados para realizar o trabalho, incluindo métodos, máquinas, etc. Esta questão também aborda os ritmos a serem seguidos, tal como as normas e procedimentos. Além disso, também considera as atividades intelectuais envolvidas no trabalho, como cálculos. 3. Porque é que o faz? Esta questão ajuda a identificar claramente os objetivos a serem alcançados através das atividades necessárias para realizar o trabalho. Também permite observar a conexão entre as tarefas específicas dos colaboradores e as relações que ligam essas tarefas à atividade geral em questão. 4. O que é que implica o seu trabalho? O objetivo é traduzir o nível de dificuldade das tarefas. Esta questão auxilia na determinação do perfil necessário para o cargo, incluindo os conhecimentos, habilidades e competências específicas exigidas para a execução de determinadas tarefas. As respostas a estas questões, segundo os mesmos autores, são utilizadas para criar um plano de análise dos postos de trabalho, identificando os dados necessários, classificando a informação disponível e selecionando uma estratégia para a recolha da informação desejada. Página 34 de 186 2.2.- Métodos De acordo com Sekiou et al. (2009) a recolha de dados relativos à função a analisar pode efetuar-se a partir de vários métodos. Os autores destacam os métodos mais utilizados e as vantagens e desvantagens de cada um. Questionário Este método consiste em pedir ao colaborador que preencha um questionário sobre os principais aspetos do seu trabalho e as condições em que é realizado. As perguntas podem ser abertas, permitindo respostas detalhadas, ou fechadas, onde o colaborador ou o seu superior direto, fornece informações específicas sobre diversos aspetos do trabalho. As vantagens deste método são: o Economiza tempo e custos o Obtém uma grande quantidade de informação o Existe uma livre expressão do titular do cargo o Causa o mínimo de stress o Questiona o número máximo de pessoas o Facilita a análise de resultados No entanto, os autores também enunciam alguns inconvenientes: o Dificuldade na colaboração do titular do cargo o Possibilidade de interpretação tendenciosa das perguntas o Ausência de comunicação interpessoal o Diminuição de objetividade o Dificuldade na elaboração do questionário o Falta de espontaneidade Entrevista Neste método, o analista entrevista o colaborador e o seu superior hierárquico direto sobre o trabalho, focando-se exclusivamente no que é executado em concreto. Página 35 de 186 As vantagens de utilizar este método são as seguintes: o Facilita a comunicação interpessoal o Não existe um limite de questões a colocar o Complementa outros métodos o É uma técnica dinâmica, motivadora e que incentiva a colaboração e participação o Normaliza o vocabulário e a terminologia o Aplicável a atividades intelectuais, psicológicas e outras o Recolhe o máximo de dados possíveis No entanto, este método também tem desvantagens: o Possibilidade de subavaliação ou sobreavaliação pelo colaborador o Requer um grande investimento de tempo e dinheiro o Pode reduzir a objetividade o Interrompe o trabalho do colaborador o Pode gerar dados por vezes irrelevantes o Pode causar stress ao colaborador o Necessita de analistas bem formados e experientes Observação Como o próprio nome indica, o método de observação consiste em observar discretamente o trabalho tal como ele é realizado, durante um período específico. O ideal é descrever todas as fases do trabalho com base num ciclo completo de tarefas do colaborador, observando também as condições de trabalho e os riscos envolvidos. A observação pode ser feita por uma pessoa ou através de gravação em vídeo. Tal como os métodos anteriores, o método da observação tem vantagens e desvantagens. As vantagens são: o Registo direto e objetivo de todos os movimentos necessários para cada tarefa e do tempo de execução o Utilização de um equipamento eletrónico simples Página 36 de 186 o Técnica útil para o trabalho manual e cargos com ciclos de trabalho curtos o Obtenção do máximo de informações reais e concretas As desvantagens são as seguintes: o Pode causar stress ao titular desconfiado o Não é adequado para tarefas complexas ou ciclos de trabalho longos o Dificuldade em obter toda a informação desejada o Técnica dispendiosa o Requer observadores bem formados e experientes Diário Este método permite ao colaborador registar e descrever livremente as principais tarefas por si realizadas de forma diária, semanal e/ou mensal. Para este registo, segundo Sousa et al. (2006), o analista fornece ao colaborador uma série de itens que devem ser preenchidos. Os autores (Sousa et al., 2006) enunciam ainda as vantagens e desvantagens deste método. Como vantagens temos um retrato mais fiel da natureza do trabalho; a informação recolhida serve como suporte para outros métodos e o tempo de recolha de informação pelo analista é menor. Quanto à desvantagem temos que este método pode ser sujeito a subjetividade. Os mesmos autores (Sousa et al., 2006) acrescentam ainda um método. Método misto Este método consiste na junção de vários métodos (no mínimo dois) com o objetivo de potenciar as vantagens e eliminar as desvantagens. De acordo com Sekiou et al. (2009) existem ainda outros métodos de recolha de dados, como a composição pessoal, os incidentes críticos e a conferência técnica, contudo estes não são tão frequentemente usados. Independentemente do método escolhido, Sousa et al. (2006) refere que é importante considerar os objetivos a alcançar, o tempo disponível, quem será responsável pela análise e a descrição das funções. Sekiou et al. (2009) referem ainda a importância de ter em consideração os recursos financeiros disponíveis, pois embora a análise efetuada por analistas seja de melhor qualidade, também tem um custo mais elevado. Por isso, as PME preferem que os superiores diretos ou os próprios colaboradores descrevam as suas tarefas. Página 37 de 186 2.3.- Dados necessários Segundo Sekiou et al. (2009), quando se faz uma análise de funções pela primeira vez, a informação inicial pode vir de listas de vencimentos, de um organigrama, de uma descrição feita com os trabalhadores, ou da combinação dessas três fontes. No entanto, se já houve uma análise anterior, a informação preliminar pode ser retirada dos processos já existentes. Qualquer documento relacionado ao trabalho pode ser usado para obter mais informações, descrever novos cargos ou melhorar as descrições já feitas. Os mesmos autores referem ainda que a informação a ser recolhida sobre as tarefas pode ser apresentada sob duas formas: qualitativa, que consiste na descrição verbal e narrativa, focada no conteúdo da função e nas condições de trabalho, ou quantitativa, que consiste em informação quantificável sobre o cargo, adequada para análise estatística e usada para classificar funções e eliminar analogias. Assim, de acordo com estes autores (Sekiou et al., 2009) é importante recolher-se informação sobre: As características das funções, a partir de duas abordagens possíveis, a abordagem concentrada na tarefa ou a abordagem centrada no comportamento; Os instrumentos utilizados; O ambiente de trabalho; O desempenho esperado. Sousa et al. em 2006, menciona ainda a importância de também recolher informação sobre os requisitos humanos. 2.4.- Análise e redação das funções Segundo o mesmo, (Sousa et al., 2006) após a recolha dos dados, estes devem ser analisados e transformados em descrições e especificações de funções. Depois de redigidos, os documentos precisam ser revistos por uma amostra representativa de colaboradores e chefias. Só então se procede à redação definitiva da análise de funções. A descrição das funções é um documento escrito que detalha as funções e as condições de trabalho. Inicialmente, era uma lista rígida de tarefas, mas hoje é um documento orientador devido à necessidade de polivalência e constantes mudanças (Sousa et al., 2006). Página 38 de 186 Existem várias formas de descrever funções, que devem ser adequadas à dimensão e complexidade da organização. Independentemente da forma escolhida, as principais características e qualidades de uma descrição de funções são semelhantes (Sousa et al., 2006). Assim, de acordo com os autores (Sousa et al., 2006) uma descrição de funções é constituída pelos seguintes elementos: Identificação A identificação pode variar em extensão, conforme os objetivos e necessidades da organização. Ela pode incluir o nome, localização geográfica e código do cargo, o departamento, o nome da pessoa que elaborou a descrição, o nome do supervisor que a aprovou e a data. Organograma Este deve ser desenhado mesmo que existam algumas diferenças com o organograma oficial. Descrição Sumária Deve-se descrever brevemente o conteúdo da função, explicando a sua finalidade e o que a distingue de outras funções. Tarefas Trata-se da descrição detalhada das tarefas incluindo tanto as tarefas principais quanto as secundárias, organizadas por ordem de importância ou conforme o ciclo de produção (Sekiou et al., 2009). Também são especificadas as tarefas ocasionais. Para cada função, deve-se indicar o que deve ser feito (tarefa) e como deve ser feito (técnica). Às vezes, é mencionado o tempo dedicado a cada tarefa e o departamento responsável. (Sekiou et al., 2009). Especificações Consiste numa lista dos diversos conhecimentos, habilidades e experiências que uma pessoa precisa ter para desempenhar determinada função. Condições de exercício Esta secção detalha as condições associadas à função em análise, incluindo fatores como exposição a temperaturas extremas, ruído, entre outros. Página 39 de 186 2.5.- Divulgação Os autores Sekiou et al. (2009) referem que a descrição da função ajuda o titular a entender as suas responsabilidades. Cada pessoa deve ter a descrição das suas próprias tarefas. Embora nem todos na organização tenham acesso a todas as descrições de funções, essa informação é essencial para o desenvolvimento de carreira, pois permite conhecer o conteúdo de cada posto, especialmente quando se pretende avançar na carreira. 2.6.- Perfil de função Conforme referido por Sekiou et al. (2009), o perfil de funções utiliza as capacidades pessoais identificadas através de indicações precisas e essenciais presentes no conteúdo da análise de funções. Este conteúdo descreve os requisitos necessários para desempenhar adequadamente a função, incluindo aptidões, conhecimentos, formação e qualidades desejadas no candidato. Um perfil de função ajuda a entender melhor o emprego e a planear recursos humanos, ajustando as atividades às perspetivas de evolução do emprego (Almeida, 2015). A mesma autora refere ainda que, um perfil de função facilita a adoção de estratégias proativas na gestão de recursos humanos, como recrutamento, seleção, formação e planeamento de carreiras. De acordo com Sekiou et al. (2009), as exigências do perfil de função são: Identificação da função: A identificação inclui dados organizacionais, como o título do cargo, o nome do empregador, as horas de trabalho, o sindicato (se houver), a remuneração, a data de elaboração da especificação, além dos nomes do autor e da pessoa que aprovou, entre outros. Fatores: estes fatores são os requisitos próprios do trabalho. 2.7.- Da análise à avaliação de funções Os autores (Sekiou et al., 2009) referem que a definição do perfil de uma função é a última etapa da análise de funções e complementa a descrição de funções. Pode ser incluída na avaliação de funções, estabelecendo a correspondência entre a descrição e os requisitos exigidos, sendo assim, de certo modo, o elo entre a análise e a avaliação de funções. O perfil de funções também pode ser usado no recrutamento e seleção de recursos humanos. Página 40 de 186 2.8.- Avaliação de funções A avaliação de funções é uma atividade da Gestão de Recursos Humanos que envolve analisar e comparar os requisitos das diferentes funções dentro de uma organização, com o objetivo de determinar, de forma lógica, a importância relativa de cada função e estabelecer uma hierarquia entre elas. (Sekiou et al., 2009) Para avaliar as suas funções, as empresas recorreram a um determinado número de técnicas, estas dividem-se em três categorias: globais, analíticas e outras. (Sekiou et al., 2009) Assim, de acordo com os autores (Sekiou et al., 2009), dentro das técnicas globais temos a técnica por ordenação, e a técnica por classificação, sendo a última a extensão da primeira. Ambas as técnicas são bastante subjetivas. Já nas técnicas analíticas, existe a técnica por pontos, que é a técnica mais utilizada especialmente nas empresas de grande dimensão, e a técnica por comparação de fatores, cuja complexidade de aplicação prática contribui para a preferência da técnica por pontos. Assim, a análise do trabalho e a construção de perfis profissionais fornecem uma base sólida para caracterizar funções e planear proativamente as atividades organizacionais, garantindo uma gestão mais eficaz dos recursos humanos e antecipando as necessidades futuras da força de trabalho. (Almeida, 2015) Conclusão Em suma, a análise do trabalho e a construção de perfis de funções fornecem uma base sólida para caracterizar funções e planear proativamente as atividades organizacionais, garantindo uma gestão mais eficaz dos recursos humanos e antecipando as necessidades futuras da força de trabalho. (Almeida, 2015). A análise de funções é ainda um fator essencial na gestão de Recursos Humanos, servindo de base para várias atividades da área (Cunha et al., 2010. A gestão por competências destaca a seleção de colaboradores e o planeamento estratégico como razão de uma maior produtividade, melhoria da motivação no ambiente de trabalho, maior competitividade, equipas comprometidas e uma conquistar um maior destaque no mercado (Ramos e Bento, 2010). ​ )​ Página 41 de 186 Referências bibliográ cas Cei l, M. (2010). Gestão e Desenvolvimento de Competências (1ª ed.). Lisboa: Sílabo. Cunha M., R. A.-C. (2010). Manual de Gestão de Pessoas e do Capital Humano (2ª ed.). Lisboa: Edições Sílabo, Lda. F, A. (2015). Gestão de Recursos Humanos para Gestores (1ª ed.). Lisboa: Editora RH, Lda. Sekiou, B. F. (2009). Gestão dos Recursos Humanos. Lisboa: Ins tuto Piaget. Sousa M., G. J. (2006). Gestão de Recursos Humanos (7ª ed.). LIDEL - Edições Técnica. ti fi ti Página 42 de 186 Recrutamento Introdução O recrutamento é uma das primeiras áreas no processo dos recursos humanos, este tema acaba por ser um dos principais processos ao relacionar-se com os vários níveis dos recursos humanos. O objetivo deste trabalho é apresentar quão vasto os conhecimentos dos recursos humanos são na área do recrutamento, seguido da análise do cargo para o recrutamento. Neste trabalho nós vamos falar da definição do recrutamento, os diferentes tipos de recrutamento onde recorremos às 3 diferentes origens de recursos humanos: Interno, Externo e Misto e apresentarmos vantagens e desvantagens com base em conhecimentos bibliográficos e conceitos atuais. A nível Interno identificamos 4 tipos de recrutamento dentro da empresa: 2 tipos associados também à evolução de carreira e os outros 2 desenvolvidos com a atualidade. A nível Externo apresentaremos várias formas de recrutar pessoal fora de empresa e vantagens e desvantagens deste tipo de recrutamento. No Misto explicaremos este conceito para o qual só apresenta vantagens ao recorrer a ambos os recursos internos e externos. Também abordaremos tópicos mais específicos de forma mais breve e suas vantagens: Recrutamento eletrônico, IA no recrutamento, gamificação e employer branding. Tópicos que se têm desenvolvido ao longo destes anos. E conseguirmos desenvolver a nossa capacidade de investigação, de estudo e divulgação da matéria da disciplina, e a possibilidade de explorar mais os temas na cadeira dos recursos humanos. 1. Conceito de recrutamento e objetivos 1.1. O que é o recrutamento? Segundo Chiavenato (2014) este define o recrutamento como um conjunto de atividades, técnicas e procedimentos que têm como objetivo atrair candidatos qualificados para ocupar cargos na organização. Este processo consiste na divulgação de oportunidades de emprego, funcionando como um sistema de comunicação através do qual a empresa apresenta ao mercado de recursos humanos Página 43 de 186 as vagas disponíveis. O principal objetivo é atrair candidatos com as competências certas para preencher essas funções e contribuir para o sucesso da organização Para Paulo Victor (2022), recrutamento é um conjunto de estratégias, técnicas e procedimentos que têm como objetivo atrair candidatos com o perfil exigido pelos postos de trabalho a ocupar dentro da organização. Segundo Paulo Victor (2022), os objetivos do recrutamento são: atrai

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