Influência Social PDF
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Este documento fornece uma visão geral sobre a influência social, incluindo diferentes tipos de influência, como conformidade, aquiescência e obediência. São também apresentados estudos clássicos com exemplos e aplicações práticas.
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Quem é que aqui daria um choque eléctrico doloroso, potencialmente letal, a uma pessoa desconhecida e inocente? https://www.youtube.com/watch?v=7Y0KT0ajZ Bw&ab_channel=AnnemiekeFigee Influência Social Influência Social A influência social refere-se às várias formas...
Quem é que aqui daria um choque eléctrico doloroso, potencialmente letal, a uma pessoa desconhecida e inocente? https://www.youtube.com/watch?v=7Y0KT0ajZ Bw&ab_channel=AnnemiekeFigee Influência Social Influência Social A influência social refere-se às várias formas como as pessoas se influenciam umas às outras. Refere-se a mudanças no comportamento e/ou atitudes que resultam de comentários, acções, ou mera presença de outros. Quer nos apercebamos disso quer não, os outros têm uma tremenda influência na forma como pensamos e agimos. 1980: mais provável ver uma mulher fumar um charuto do que com uma tatuagem. As tatuagens eram vistas em marinheiros e prisioneiros apenas. Agora arquitectos, professores, médicos e juízes têm tatuagens. Em 2007, 40% dos americanos com menos de 40 anos tinham pelo menos uma tatuagem! A crescente popularidade das tatuagens reflecte o poder da influência social: As pessoas não acordaram subitamente para as virtudes da arte corporal; influenciaram-se umas às outras. Ainda que acreditem que esta escolha reflecte os seus gostos e valores pessoais. Assim se passa com muitos (se não todos) os nossos gostos e hábitos: Sentimos que nascem dos nossos valores e atitudes, quando na verdade resultam do gosto dos nossos pares. Tipos de Influência Social Conformidade: Mudar o nosso comportamento ou crenças em resposta a pressão explícita ou implícita (real ou imaginada) por parte de outras pessoas. Aquiescência/Anuência (Compliance): Responder favoravelmente a um pedido explícito por parte de outra pessoa. Obediência: Numa relação de poder desigual, submetermo- nos às exigências da figura de autoridade Conformismo Mimetismo Automático Muitas vezes imitamos de forma inconsciente o comportamento das outras pessoas. Não são apenas o bocejar e rir que são contagiosos, mas vários outros comportamentos também: Temos tendência para imitar a postura, maneirismos, expressões faciais e outras acções daqueles que nos rodeiam. Mimetismo Automático Chartrand e Bargh (1999): Alunos participaram em duas sessões em que, juntamente com outro pp, descreviam fotografias de revistas populares (ex.: Newsweek, Time). O outro pp era na realidade um confederado/comparsa do experimentador, e havia um confederado diferente em cada sessão. O confederado numa das sessões esfregava frequentemente o rosto, enquanto o confederado na outra sessão agitava frequentemente o pé. O comportamento do pp foi subrepticiamente filmado: Mimetismo Automático Esta tendência para imitar os outros é particularmente forte quando as pessoas têm o desejo de se afiliar com os outros em questão e quando gostamos dos outros (um dos melhores indicadores de interesse num encontro romântico). Tendemos a imitar os outros como uma maneira de tentar estabelecer as bases para interagir eficazmente com eles. E funciona: As pessoas tendem a gostar daqueles que os imitam mais do que aqueles que não, mesmo quando não estão conscientes de estar a ser imitados (Chartrand & Bargh, 1999). Para mais, as pessoas que são imitadas são mais propensas a ter mais comportamentos pró-sociais imediatamente depois, como doar dinheiro para uma boa causa, ou deixar uma gorjeta maior, para a pessoa que os imitava. O mimetismo parece ser um primeiro passo útil para uma interação harmoniosa e boa vontade. Influência Social Informativa e o Estudo de Sherif Mas às vezes, as pessoas conformam-se ao comportamento de outras pessoas de forma um pouco mais consciente, como ilustrado por Muzafer Sherif (1936). Sherif estava interessado em como os grupos influenciam o comportamento dos indivíduos ao moldar a forma como a realidade é percebida – mesmo as nossas percepções mais básicas, i.e., o que vemos com os nossos olhos! O experimento de Sherif foi construído em torno da ilusão autocinética – a sensação de que um ponto de luz parado num ambiente completamente escuro se está mover (isto ocorre porque na completa escuridão não existem outros estímulos para ajudar o espectador a discernir onde a luz está localizada). Sherif testou como as opiniões das outras pessoas influenciam as percepções do espectador sobre o movimento da luz. Influência Social Informativa e o Estudo de Sherif Pediu-se aos pps neste estudo que fizessem estimativas sobre quanto é que o ponto se "moveu" de cada vez. Primeiro os pps fizeram estas estimativas individualmente, separados dos outros pps. Depois fizeram estimativas na presença dos outros pps, dizendo em voz alta as suas estimativas. Influência Social Informativa e o Estudo de Sherif Este padrão é o resultado da influência social informativa - a nossa dependência dos comentários e acções das outras pessoas como indicador do que é correcto ou apropriado. Mais pronunciada quando não temos certeza sobre como nos devemos comportar ou o que é factualmente correto – exemplos: Nós somos mais propensos a estar de acordo com o que os outros fazem num país estrangeiro do que nosso próprio. Nós somos mais propensos a adoptar o ponto de vista dos outros sobre assuntos sobre os quais temos apenas ideias vagas, como política macro-económica, do que sobre tópicos como gostos musicais. O primeiro ano na faculdade é uma altura em que estamos atentos ao comportamento dos outros para sabermos como nos devemos comportar, e que opiniões são populares. Influência Social Normativa e o Estudo de Asch Notem que o estudo de Sherif foi sobre algo ambíguo, e portanto a influência social informativa foi forte. A incerteza do movimento da luz deixou os participantes abertos à influência dos outros. Mas e se não houvesse qualquer ambiguidade e houvesse um conflito claro entre as opiniões do indivíduo e do grupo? Entra o senhor Asch e um dos estudos mais famosos de Psicologia Social (1956) ------- alguém conhece o estudo? Influência Social Normativa e o Estudo de Asch Em grupos de 8, os pps realizaram uma tarefa perceptiva simples: determinar qual das 3 linhas à esq tem o mesmo comprimento da linha à dir. Cada pp indicou a sua resposta publicamente, em voz alta, um de cada vez, várias vezes. Super fácil. Nenhuma ambiguidade. Influência Social Normativa e o Estudo de Asch Até que… ao 3º julgamento, o pp descobria que o seu julgamento privado estava em desacordo com as opiniões expressas de todos os outros no grupo! Ele era o único participante verdadeiro no estudo; os outros 7 eram confederados instruídos por Asch para responder incorrectamente nalguns ensaios. Os confederados respondiam de forma deliberadamente incorrecta em 12 ensaios. Influência Social Normativa e o Estudo de Asch A pergunta é: Com que frequência o participante abandona o que sabe ser a resposta correcta e opta antes pelo julgamento incorrecto dado por todos os outros? Uma vez mais, notem que não havia qualquer ambiguidade, como havia no estudo de Sherif. A resposta certa era clara para todos (quando os pps fizeram esses julgamentos por si próprios num grupo de controlo, sem pressão social, quase nunca cometeram erros). Influência Social Normativa e o Estudo de Asch Resultados: ¾ dos pps mostraram conformismo com a maioria errada pelo menos uma vez! Em média, os pps mostraram conformismo em 1/3 dos ensaios críticos. Influência Social Normativa e o Estudo de Asch Estes resultados têm tanto de surpreendente como de perturbador: Nós gostamos de pensar nas pessoas, especialmente em nós, como aderindo ao que pensamos ser certo ao invés de seguir o rebanho. Além disso, é preocupante pensar que as pessoas podem abandonar o que dita a sua consciência para seguir os outros em comportamentos errados. Influência Social Normativa e o Estudo de Asch A influência social informativa não parece ser a principal fonte de pressão de conformidade aqui (na ausência de pressão social, a % de pps-controlo que acertaram ≈ 100%). A principal razão pela qual as pessoas se conformaram foi para evitar destacarem-se negativamente aos olhos do grupo. A isto chama-se influência social normativa: o desejo de evitar ser criticado ou rejeitado. As pessoas são geralmente relutantes em afastar-se das normas da sociedade, ou pelo menos das normas dos subgrupos com os quais se preocupam, porque temem as consequências sociais. Factores que influenciam a pressão para o Conformismo Que factores acham que aumentam ou diminuem a pressão para agir em conformidade com o grupo? Que características do grupo, do contexto, e da tarefa/tópico em questão influenciam a tendência para seguirmos a opinião da maioria? --- alguma ideia? Factores que influenciam o Conformismo Tamanho do grupo: Grupos maiores exercem maior influência social do que grupos menores. MAS o efeito do tamanho do grupo não é linear: Factores que influenciam o Conformismo Tamanho do grupo O significado do tamanho do grupo faz sentido, do ponto de vista de ambos os tipos de influência social: informativa e normativa. Informativa: Quanto maior o N de pessoas que expressam uma certa opinião, mais provável é que tenha mérito. Mas apenas até certo ponto: A validade de uma opinião consensual aumenta apenas se as opiniões são independentes umas das outras. E quanto mais pessoas há, menos provável é que os seus pontos de vista sejam independentes, por isso as opiniões concordantes adicionais não oferecem mais informação de valor. Factores que influenciam o Conformismo Tamanho do grupo Além disso, quanto maior o grupo, mais pessoas há para desagradar. Mas aqui, também, o impacto do tamanho do grupo apenas sobe até certo ponto. Há limites para o grau de vergonha que uma pessoa pode sentir, e a diferença entre ser visto como estranho, tolo ou irrazoável por 2 vs. 4 pessoas é psicologicamente muito mais poderosa do que a diferença entre ser visto dessa maneira por 12 vs. 14. Factores que influenciam o Conformismo Unanimidade do grupo Um efeito impressionante foi observado nos estudos de Asch quando a unanimidade do grupo era quebrada: No paradigma básico, o pp seguiu a resposta errada em 1/3 dos ensaios. Mas quando o verdadeiro pp teve um aliado – bastava apenas um outro membro do grupo desviar-se da maioria – essa taxa caiu para 5%: Factores que influenciam o Conformismo Unanimidade do grupo Este efeito ocorre porque a presença de um aliado enfraquece tanto a influência social informativa ("Talvez eu não esteja louco afinal"), como a influência social normativa ("Pelo menos, eu tenho alguém para me apoiar"). Isto sugere uma ferramenta poderosa para proteger a independência do nosso pensamento e acção: Se alguém esperar ser pressionado para se conformar e quiser permanecer fiel às suas crenças, essa pessoa deve trazer um aliado para a situação. Uma mensagem importante nos estudos de Asch é quão difícil pode ser defendermos a nossa visão sozinhos. As pessoas conseguem enfrentar a pressão de pares com visões diferentes, mas geralmente precisam de ajuda. Ser um dissidente solitário é extremamente difícil. Factores que influenciam o Conformismo Anonimato Vimos que defender uma opinião contrária a uma maioria equivocada é difícil. Mas o que acontece quando uma pessoa pode responder anonimamente – alguma ideia? Qual dos 2 tipos de influência social é eliminada pelo anonimato? O anonimato elimina a influência social normativa e, portanto, reduz substancialmente a conformidade. Quando o verdadeiro pp no paradigma de Asch podia escrever os seus julgamentos num papel em vez de dizê-los em voz alta para o grupo ouvir, a conformidade reduzia drasticamente. Quando ninguém mais está ciente do seu julgamento, ele não precisa de temer a desaprovação do grupo. Factores que influenciam o Conformismo Anonimato Isto salienta uma distinção importante entre o impacto da influência social informativa e normativa: A influência social informativa, ao orientar a forma como vemos a realidade que temos diante de nós, leva à internalização – a nossa aceitação privada da posição avançada pela maioria. Nós não nos limitamos apenas a imitar uma resposta; nós adoptamos a perspectiva do grupo e passamos a acreditar na mesma. A influência social normativa, em contraste, muitas vezes tem um maior impacto na conformidade pública do que na aceitação privada. Para evitar a reprovação, às vezes fazemos ou dizemos uma coisa, mas continuamos a acreditar noutra. Factores que influenciam o Conformismo Perícia e Estatuto Imaginem que participavam no estudo de Asch e os outros pps que estavam inexplicavelmente afirmando o que vocês pensavam ser a resposta errada eram todos antigos campeões de tiro. Seguindo a suposição de que um atirador não pode ser competente se não tiver uma visão excepcional, vocês provavelmente atribuiriam ao grupo uma autoridade considerável e acompanhariam a opinião deles. Em contraste, se o resto do grupo usasse óculos grossos, vocês seria menos propensos a levar as suas opiniões a sério. Factores que influenciam o Conformismo Perícia e Estatuto Como este exemplo ilustra, a perícia e o estatuto dos membros do grupo influenciam poderosamente a taxa de conformidade. Os dois costumam estar associados: a) concedemos maior estatuto àqueles com perícia; e b) muitas vezes assumimos (nem sempre correctamente) que aqueles com estatuto elevado são especialistas. Contudo, quando essas características podem ser dissociadas (i.e., perito mas não poderoso, ou vice-versa), a perícia funciona principalmente como influência social informativa (é provável que os especialistas estejam certos, pelo que tomamos as suas opiniões mais a sério), enquanto o estatuto funciona principalmente como influência social normativa (a reprovação por indivíduos de estatuto elevado prejudica mais do que a reprovação por pessoas de estatuto inferior). Factores que influenciam o Conformismo Cultura As pessoas de culturas interdependentes estão muito mais preocupadas com os seus relacionamentos com os outros e sobre como encaixar no contexto social do que as pessoas de culturas independentes. Portanto são mais susceptíveis tanto a influência social informativa (consideram as acções e opiniões de outros mais reveladoras) como a influência social normativa (para eles a consideração das outras pessoas é mais importante). Como tal, pessoas de culturas interdependentes tendem a mostrar mais conformismo do que as de culturas independentes. Factores que influenciam o Conformismo Cultura Exemplos: Stanley Milgram (1961) fez estudos com o paradigma de Asch na Noruega e na França. Como os noruegueses valorizam a coesão grupal e a boa educação, enquanto os franceses apreciam o debate e o confronto de ideias, os pps noruegueses mostraram maior conformismo do que os franceses. Uma análise mais recente e mais sistemática dos resultados de 133 estudos usando o paradigma de Asch em 17 países confirmou que o conformismo tende de facto a ser maior em países interdependentes (Bond & Smith, 1996). O individualismo que é valorizado por ex. nos EUA tem dado aos indivíduos nessas culturas independentes uma maior vontade de se desviar da maioria. E essa vontade de resistir à influência da maioria está a aumentar segundo dados recentes. Se bem que o desvio da norma também é um caso de influência. Factores que influenciam o Conformismo E Portugal? As culturas dos diferentes países podem ser rígidas ou relaxadas. Rígidas: Há normas fortes sobre como as pessoas se devem comportar e não toleram desvios dessas normas. Relaxadas: As normas não são tão fortes, e toleram mais desvios. As nações com culturas rígidas são mais propensas a ter governos autocráticos ou ditatoriais, a punir a dissidência, a exercer um maior controlo sobre o que pode ser dito nos meios de comunicação, a ter mais leis e maior monitorização/regulação para garantir que as leis são cumpridas. Países com culturas rígidas: Índia, Alemanha, China, Coreia do Sul, Japão, Áustria, Portugal, Grã-Bretanha, Turquia e Itália. Países mais relaxados: Grécia, Hungria, Israel, Holanda, Ucrânia, Nova Zelândia e Brasil. Factores que influenciam o Conformismo E Portugal? Gelfand e colegas (2011) entrevistaram pessoas em 33 países, perguntando quão adequado seria ter certos comportamentos em certas situações. Os comportamentos incluíam discutir, chorar, rir, cantar, “flirtar”, ler o jornal, entre vários outros comportamentos. As situações incluíam ir ao banco, médico, restaurante, funeral, biblioteca, elevador, cinema, etc. Resultados: Quanto mais rígidas as leis e as normas da nação, menos comportamentos eram vistos como adequados nestas várias situações. Portugal pratica uma cultura tendencialmente rígida (respeitinho é bonitinho!) Factores que influenciam o Conformismo E o género? Quem é mais vulnerável: homens ou mulheres? Alguma ideia?... Estudos iniciais sugeriam que a mulher é mais susceptível. Mas isto depende dos tópicos: em domínios tipicamente masculinos, as mulheres revelam conformismo, mas não tanto em domínios neutros ou tipicamente femininos (Sistrunk & McDavid, 1971). Conformismo: Sumário O conformismo pode ser uma resposta a pressões sociais implícitas ou explícitas, e pode ser o resultado de mimetismo automático, influência social informativa ou influência social normativa. O tamanho do grupo influencia a conformidade, mas parece alcançar o máximo de eficiência por volta das quatro pessoas. A unanimidade também é crucial no conformismo, e um único aliado pode ajudar um indivíduo a resistir contra o grupo. As pessoas conformam-se mais com outras pessoas com estatuto elevado ou perícia, e quando expressam as suas opiniões publicamente em vez de em privado. As pessoas de culturas interdependentes conformam-se mais do que pessoas de culturas independentes. Obediência à Autoridade Os estudos de Milgram A investigação sobre quando e porquê as pessoas obedecem às ordens de um figura de autoridade inclui dos estudos mais famosos da Psicologia Social: os estudos de Stanley Milgram. Milgram estava interessado em saber se o tipo de pressões observadas nos estudos de conformismo de Asch seriam suficientemente poderosas para levar as pessoas a fazer algo muito mais significativo do que reportar o comprimento incorrecto de uma linha. Ele perguntou-se o que aconteceria se ele pedisse aos pps para darem choques eléctricos sempre que um alegado pp que estava a realizar uma tarefa (na realidade, o confederado do experimentador) respondesse incorrectamente. Será que os pps mostrariam conformismo quando isso envolvesse ferir outro ser humano? Os estudos de Milgram Esta é uma questão interessante, mas Milgram nunca chegou a respondê-la com um estudo de conformismo ao grupo, tipo Asch. Isto porque antes disso ele precisava de obter dados de um grupo de controlo para determinar a disposição dos pps para darem choques elétricos quando não havia qualquer pressão para conformismo com um grupo de pps. E é aí que ele se deparou com um resultado surpreendente: Uma grande percentagem de pps estava disposta a fazer algo que prejudicava outra pessoa, mesmo quando não havia nenhum grupo de outros pps que ditassem a norma. Os estudos de Milgram O procedimento das experiências de Milgram: Os pps respondiam a um anúncio de jornal a recrutar pessoas para participar num estudo sobre aprendizagem. A tarefa supostamente envolvia aprender uma lista de pares associados de palavras (ex.: luva/livro, churrasqueira/detergente, bigorna/papa) Ao chegarem ao laboratório, os pps eram “aleatoriamente” seleccionados para fazerem de “professor” e havia uma outra pessoa (o confederado) selecionada para fazer de “aluno”. O trabalho do professor era administrar um choque elétrico sempre que o aluno - um homem de meia idade que estava sentado numa cadeira com o braço preso a um dispositivo de choques eléctricos (a fingir, mas os pps não sabiam) - cometesse um erro na tarefa de aprendizagem Os estudos de Milgram Os professores foram brevemente amarrados à cadeira e receberam um leve choque de 45 volts para perceberem que os choques eram reais e dolorosos. Ao 1º erro o professor dava um choque mínimo de 15 volts, aumentando depois o choque em incrementos de 15 volts a cada erro subsequente. À medida que os erros se acumulavam, era exigido aos pps que dessem choques de intensidade progressivamente maior - 255, 300, 330 volts… - até 450 volts! (Na realidade, nenhum choque elétrico foi dado ao aluno, mas lembrem-se que o pp/professor não sabia disto.) Se um pp expressava reservas ou tentava terminar o estudo, o experimentador respondia com respostas a instigá-lo a continuar: “Por favor, continue“, “A experiência exige que você continue“, “É absolutamente essencial que você continue“, “Você não tem outra escolha; você deve continuar”. Os estudos de Milgram https://www.youtube.com/watch?v=Kzd6Ew3TraA Os estudos de Milgram A grande surpresa destes estudos foi quantos participantes continuaram a obedecer às ordens do experimentador e a dar o nível máximo de choque ao confederado. Na versão de feedback remoto da experiência, na qual o aluno estava numa sala adjacente e não podia ser ouvido, excepto quando ele batia vigorosamente na parede após um choque de 300 volts, 66% dos pps continuaram o estudo e deram o choque máximo de 450 volts. Na versão de feedback de voz, os pps podiam ouvir uma série de súplicas cada vez mais desesperadas pelo aluno - inclusivé gritando que ele tinha uma condição cardíaca - até finalmente, haver apenas um silêncio sinistro. Apesar destas pistas de que o aprendiz estava em sofrimento, 62.5% dos pps deram o choque máximo (Milgram, 1965, 1974). Os estudos de Milgram Digam-me: Qual a pressão de influência social que está presente nesta situação? Os estudos de Milgram A relação com o aluno: Milgram estudou como aumentar a disposição das pessoas para resistirem à autoridade e terminarem o estudo a meio. Milgram estudou o papel da consciência que o pp tinha do sofrimento do aluno, tornando o aluno mais prominente - ou, nas suas palavras, fazendo o pp estar em “sintonia“ com o aluno. (Nos primeiros estudos os pps tentavam espontaneamente fazer o contrário - isto é, para lidar com o seu próprio desconforto “desligavam-se“ do aluno, às vezes literalmente virando-se costas para eles na cadeira). Os estudos de Milgram A relação com o aluno: Na versão de feedback remoto, o pp não conseguia ver nem ouvir o aluno (excepto o episódio da forte batida na parede). Na versão de feedback de voz, o aluno ainda não estava à vista, mas ele e seus vigorosos protestos eram claramente audíveis, e o professor estava constantemente ciente disso. Numa nova versão de proximidade, o aluno recebia os supostos choques na mesma sala onde o pp os administrava, a apenas 1.5m de distância. Finalmente, numa versão de proximidade de toque, o pp tinha que forçar a mão do aluno a tocar na placa de choque (uma folha de isolamento supostamente impedia o pp de receber o choque). Os estudos de Milgram Os estudos de Milgram À medida que a vítima se tornou cada vez mais presente e “real“, os pps achavam mais e mais difícil dar os choques e a taxa de obediência diminuiu. A lição a ser extraída desta experiência é que quanto mais distantes estamos das outras pessoas, mais fácil é causar-lhes sofrimento. Considerem as tecnologias militares que permitem que os indivíduos inflijam danos a outros a partir de uma distância enorme. O combate frequentemente já não se faz homem-a- homem. Um simples premir de um botão pode conduzir um drone para um alvo ou disparar um míssil de um silo subterrâneo a um continente de distância. O distanciamento das vítimas em tais casos torna o dano infligido abstracto, de modo que os “travões” emocionais à agressão são drasticamente enfraquecidos. Os estudos de Milgram E se fosse agora? E se fossem vocês, teriam obedecido? Na altura ninguém antecipou a obediência generalizada que Milgram encontrou. Psiquiatras previram que < 1% dos pps continuariam até darem o choque máximo – apenas uma pequena franja da população com distúrbios mentais. E na população em geral, quase ninguém acredita, mesmo depois de ouvir os resultados básicos e todas as variações experimentais, que ele ou ela iria dar níveis altos de choque. Os estudos de Milgram foram feitos no início dos anos 1960. Se fosse agora, obter-se-iam os mesmos resultados? Replicações próximas da experiência básica de Milgram foram feitas recentemente (Burger, 2009; Burger, Girgis, & Manning, 2011; Doliński et al., 2017), com resultados muito semelhantes! Os estudos de Milgram O trabalho de Milgram é referido em discussões sobre como as pessoas podem obedecer a ordens de governos malévolos e envolver-se em actos sádicos de tortura, como os observados na prisão de Abu Ghraib, ou cometer crimes horríveis contra a humanidade, como os testemunhados durante o Holocausto na Alemanha nazi, ou nos massacres no Camboja, Ruanda ou Darfur. As explicações de tais crueldades incompreensíveis variam num continuum "excepcionalista-normalista". A tese excepcionalista é que tais crimes são cometidos apenas por pessoas "excepcionais" - isto é, excepcionalmente sádicas, desesperadas ou etnocêntricas. A tese normalista defendida pela Psicologia Social, pelo contrário, é que a maioria das pessoas é capaz de tal obediência tão destrutiva, e, nas circunstâncias certas, quase qualquer pessoa cometeria tais actos (tópico da próxima aula) ----- que acham? Os estudos de Milgram Envolvimento passo-a-passo Um factor crucial que promove a obediência é que os pps nos estudos de Milgram não deram logo o choque máximo de 450 volts. Ao início, o choque foi apenas de 15 volts. Depois 30. Depois 45, 60, 75 – em progressivos passos pequenos. Uma vez que os pps enveredam por esse caminho, tornou-se difícil parar. A natureza passo-a-passo da obediência dos pps nestas experiências é um poderoso motivo pelo qual tantos pps administraram os choques grandes como fizeram. Notem que os pps de Milgram não sabiam onde o estudo iria parar. É fácil encontrar exemplos na nossa vida em que aquilo que começou com uma pequena "mentirinha" desencadeia uma cascata de eventos que exigem cada vez mais decepções. Nós só sabemos de escândalos e fraudes na sua fase final, mas provavelmente emergiram de pequenos crimes em crescendo. Os estudos de Milgram Envolvimento passo-a-passo Os paralelos entre esse elemento do procedimento de Milgram e o que aconteceu na Alemanha nazi são impressionantes: Os cidadãos alemães não foram convidados, do nada, a tolerar ou a ajudar na deportação de judeus, ciganos, homossexuais e comunistas para os campos da morte. Em vez disso, os direitos desses grupos foram gradualmente removidos. Certas práticas comerciais foram restritas, depois as restrições de viagem foram impostas, e depois a cidadania foi retirada; só mais tarde, pessoas foram carregadas em vagões e enviadas para os campos de morte. Os nazis teriam tido muito mais dificuldade em executar este plano se tivessem começado pelo último passo. Muitos teriam provavelmente desafiado a autoridade. Os estudos de Milgram: Sumário O estudo da obediência foi liderado pelas experiências de Milgram, as quais demonstraram a surpreendente apetência da maioria das pessoas para seguirem ordens nocivas dadas por uma figura de autoridade. Esta tendência para obedecer diminui, porém, quando são criadas condições de proximidade/empatia com a vítima, e aumenta com a distância da mesma. Embora os resultados de Milgram nos possam parecer surpreendentes, eles tornam-se mais compreensíveis se considerarmos o envolvimento passo-a-passo dos pps. Estes estudos sugerem uma versão normalista do crime e da brutalidade: qualquer pessoa, nas circunstâncias “certas” seria capaz de exercer violência. E isto é um exemplo da principal lição da Psicologia Social: o poder da situação (próxima aula). Os estudos de Milgram: Sumário Este trabalho demonstrou claramente a importância das variáveis situacionais no comportamento. As variáveis fundamentais que influenciaram a obediência nas experiências de Milgram foram situacionais – ex., se os professores podiam ouvir os gritos dos alunos ou não. Importante: Milgram (1974) também avaliou o papel das variáveis disposicionais, como o desenvolvimento moral e autoritarismo, mas verificou que essas variáveis não estavam fortemente relacionadas com os níveis de obediência. Ele próprio ficou espantado com isto: “A minha reação geral foi pensar quão poucos correlatos havia com (traços de personalidade e) obediência” (1974, p. 205). Os estudos de Milgram: Impacto na Psicologia Psicologia da Personalidade: Obrigou a rever teorias “internalistas” como a psicodinâmica, pelas quais os comportamentos, pensamentos e sentimentos dos indivíduos seriam totalmente determinados por traços e disposições. Começaram-se a considerar explicações situacionais, pelas quais situações fortes podem dominar o valor preditivo de variáveis de personalidade, mesmo em pessoas com boas intenções (ver estudos da prisão e do bom samaritano na próxima aula). E obrigou a repensar projectos de larga escala que na altura estavam a tentar identificar os tipos de personalidade que levariam a cometer atrocidades como aquelas cometidas na 2ª Guerra Mundial (a resposta estava na situação, não na pessoa). Nunca mais a Psicologia da Personalidade pôde ignorar o poder da situação e agora estuda o comportamento em função da interacção pessoa X situação.