Psicologia Clínica - 2023/2024 PDF

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ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa

2024

Raquel Espadinha

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psicologia clínica teoria psicológica psicologia intervenção

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Este documento é um resumo de Psicologia Clínica, abrangendo temas como intervenção, avaliação e modelos teóricos. Fornece uma visão geral sobre a sua definição, métodos, aplicações e ética. Inclui detalhes de intervenção em diferentes fases da vida.

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– Raquel Espadinha Raquel Espadinha 2023/2024 2 Raquel Espadinha 2023/2024 Índice O que é a Psicologia Clínica?..................................................................

– Raquel Espadinha Raquel Espadinha 2023/2024 2 Raquel Espadinha 2023/2024 Índice O que é a Psicologia Clínica?....................................................................................... 5 A intervenção “Clássica” em psicologia clínica.............................................................. 6 Psicologia Clínica: onde recorrer.................................................................................. 6 Das origens à constituição da Psicologia Clínica.......................................................... 7 Como se forma, atualmente, um psicólogo clinico?................................................... 9 A consolidação da Psicologia Clínica na sociedade.................................................. 9 Para quê um psicólogo clínico e qual é a sua importância?.................................... 11 Psicologia Clínica, Psicopatologia e Psiquiatria – Quem é quem?.............................. 11 Definição Operatória de Psicologia Clínica................................................................. 12 Ato Psicológico........................................................................................................ 12 Psicologia Clínica, Psicopatologia e Psiquiatria.......................................................... 13 Modelos Teóricos da Psicologia Clínica...................................................................... 13 Quadros Teóricos e Modelos Concetuais................................................................ 13 Quadro Teórico Psicanalítico ou Psicanálise........................................................ 14 Quadro Teórico Cognitivo-Comportamental......................................................... 18 Quadro Teórico Sistémico.................................................................................... 24 Quadro Teórico Humanista/Fenomenológico Existencial..................................... 27 Síntese dos Modelos Teóricos em Psicologia Clínica........................................ 32 A prática baseada na evidência.................................................................................. 34 O Método Clínico........................................................................................................ 35 Avaliação Psicológica.............................................................................................. 35 Estudos de Caso..................................................................................................... 47 Competências do Psicólogo Clínico............................................................................ 47 Avaliação................................................................................................................ 47 Comunicação de resultados: destinatários, objetivos e formatos............................. 47 Formulação de Casos Clínicos................................................................................ 48 Intervenção psicológica/psicoterapêutica................................................................ 49 Intervenção em diferentes populações ao longo do ciclo da vida................................ 49 Infância e Adolescência........................................................................................... 49 A intervenção no bebé............................................................................................. 50 O que faz um casal decidir ter filhos?...................................................................... 51 Intervenção com o bebé.......................................................................................... 52 Intervenção na infância........................................................................................... 53 Intervenção na Adolescência................................................................................... 54 Intervenção na Adultícia.......................................................................................... 55 Intervenção no Envelhecimento.............................................................................. 55 3 Raquel Espadinha 2023/2024 Modelos de Consulta.................................................................................................. 55 Intervenção Psicológica Individual........................................................................... 55 Consulta da Criança............................................................................................ 56 Consulta do Adolescente..................................................................................... 56 Consulta do Adulto............................................................................................... 58 Ética e Código Deontológico....................................................................................... 60 Ética em Psicologia................................................................................................. 60 Código Deontológico da Ordem dos psicólogos portugueses.................................. 61 Ética e Deontologia em Psicologia Clínica.............................................................. 62 4 Raquel Espadinha 2023/2024 O que é a Psicologia Clínica? A Psicologia Clínica é um campo complexo, dividido em áreas específicas, num movimento contínuo de iniciativas que nascem da investigação focada na prática. O campo da Psicologia Clínica integra investigação científica, teoria, avaliação e intervenção para entender, prever e aliviar as problemáticas, as incapacidades e o mal- estar psicológico, bem como, promover a adaptação humana e o desenvolvimento pessoal. A Psicologia Clínica concentra-se nos aspetos cognitivos, emocionais, biológicos, sociais e comportamentais do funcionamento humano ao longo da vida, em diferentes culturas e em todos os níveis socioeconómicos (American Psychological Association). A Psicologia Clínica é um campo complexo, dividido em áreas específicas, num movimento contínuo de iniciativas que nascem da investigação focada na prática. O campo da Psicologia Clínica integra investigação científica, teoria, avaliação e intervenção para entender, prever e aliviar as problemáticas, as incapacidades e o mal- estar psicológico, bem como, promover a adaptação humana e o desenvolvimento pessoal. A Psicologia Clínica concentra-se nos aspetos cognitivos, emocionais, biológicos, sociais e comportamentais do funcionamento humano ao longo da vida, em diferentes culturas e em todos os níveis socioeconómicos (American Psychological Association). Em suma: Ramo da Psicologia no qual se aplicam princípios, métodos e procedimentos que visam melhorar dificuldades de adaptação, incapacidade ou mal-estar emocional em populações diversificadas, em que o foco é o interesse superior do paciente. 5 Raquel Espadinha 2023/2024 A intervenção “Clássica” em psicologia clínica Em psicologia clínica a comunicação/diálogo é fundamental e a intervenção do psicólogo clínico pode seguir dois métodos: Avaliação Psicológica: este método está presente em todas as consultas e consiste num método específico de recolha de informação que recorre a entrevista clínica, observação e/ou testes, com vista à compreensão e diagnóstico do paciente, de modo a ser possível elaborar um delineamento de uma intervenção adequada às suas necessidades. Psicoterapia de apoio (Counseling): traduzido à letra, counseling significa aconselhamento, no entanto, não é isso que o psicólogo faz. A psicoterapia de apoio é um processo que visa restabelecer o equilíbrio psicológico do paciente, recorrendo a meios psicológicos e assente no conhecimento da ciência psicológica. Aqui o foco está na relação psicólogo/paciente. Este método é eficaz em situações de crise em relação a um problema específico. Psicologia Clínica: onde recorrer Podemos recorrer à psicologia clínica nos sistemas de saúde, de educação ou em contextos profissionais. Sistema de Saúde Setor Público: Hospitais Especializados; Hospitais Gerais; Centros de Saúde. Setor Privado: Clínicas; Consultórios; Hospitais. Setor Semipúblico: Institutos particulares de solidariedade social. Sistema de Educação Escolas: ensino regular, formação profissional, universidade. Contextos Profissionais Empresas e outras entidades empregadoras, ordens profissionais e outras organizações profissionais (seguros, acordos, serviços). A Psicologia Clínica em Portugal Em 1962, as Congregações Religiosas criaram, em Lisboa, o Instituto de Ciências Psicopedagógicas, que me 1964, foi denominado por Instituto Superior de Psicologia Aplicada. Este instituto foi a primeira escola de psicologia em Portugal. Até meados da década de setenta, altura em que foram inauguradas as Faculdades de Psicologia e Ciências da Educação das Universidades de Lisboa, Porto e Coimbra, os programas de intervenção em Psicologia Clínica eram basicamente conduzidos pelos poucos psicólogos diplomados pelo ISPA, por alguns outros que regressavam com formações realizadas no estrangeiro e também por alguns licenciados em filosofia com especialização em Psicologia. Na década de 70, inauguram-se em Lisboa, Porto e Coimbra as três Faculdades de Psicologia e de Ciências da Educação, nas quais se viria a formar a segunda geração de psicólogos em Portugal. Surge, logo de seguida, na Universidade do Minho a quinta escola de referência para o ensino de Psicologia em Portugal. No decorrer da década de 80, multiplicam-se os cursos de Psicologia em inúmeras escolas privadas do país. Este início da Psicologia Clínica em Portugal, feita sobretudo à custa de docentes universitários não psicólogos e de psicólogos das mais diversas 6 Raquel Espadinha 2023/2024 proveniências e formações, justifica as diferenças sensíveis de currículos académicos de escola para escola. A Ordem dos Psicólogos Portugueses foi criada pela Lei n.º 57/2008, de 4 de setembro, que aprovou igualmente os seus Estatutos, tendo entrado em funcionamento normal em 12 de abril de 2010, depois de um período de instalação, e da eleição dos seus órgãos. Das origens à constituição da Psicologia Clínica Sendo os fenómenos psíquicos tão antigos como a história da Humanidade, e desde que o ser humano se perceciona como um ser capaz de pensar e refletir, é possível identificar claras tentativas do mesmo para encontrar diversas explicações para aqueles. A psicologia tem como definição geral e transversal ser uma procura do entendimento e a explicação dos fenómenos psíquicos, sendo uma questão já bastante antiga. No passado, este ato de compreender os fenómenos psicológicos do ser humano estava ligado a cultos de magia ou adivinhação e à religião. Mais tarde, antes de se constituir como ciência autónoma que é hoje, esteve igualmente ligada à Filosofia, ligação esta que demorou anos a romper. Em primeiro lugar, foi particularmente difícil à Psicologia identificar e isolar o seu objeto de estudo, que atualmente sabe-se que é o ser humano, diferenciando-o do objeto de estudo da Filosofia; em segundo lugar, porque o corpo teórico da Filosofia esteve durante muito tempo relacionado com aquilo que ainda hoje se considera conhecimento cientificamente válido, o qual é também aspiração da ciência psicológica. Relativamente ao seu objeto de estudo, a problemática relacionava-se com a distinção clara entre o sujeito e o objeto na construção do saber psicológico, isto porque "é sempre uma pessoa pensando acerca do pensamento humano quem vai procurar compreender o psiquismo que está na origem desse mesmo pensamento”. Esta especificidade da ciência psicológica, e a consequente tentativa de a superar, acabou por ser determinante para o desenvolvimento de todo o trabalho de um dos mais conhecidos precursores da Psicologia enquanto ciência: Wilhelm Wundt, visto por muitos como sendo o pai da Psicologia. Foi em 1879 que Wundt fundou o primeiro laboratório de psicologia experimental na Universidade de Leipzig, na Alemanha, e em que a psicologia se começou a afirmar como ciência. Wundt colocou o seu foco nas características observáveis do seu objeto de estudo: a pessoa. A partir daqui vão começando a surgir outros departamentos de Psicologia nas universidades de toda a Europa e dos Estados Unidos da América (EUA), altamente influenciados pelas características particulares dos seus países de origem. Na Alemanha, com Wundt, Ebbinghaus e Kraepelin, a Psicologia orienta-se num caminho essencialmente experimental. Em França, surge aquela que virá a tornar-se uma das mais influentes escolas de Psicologia, em torno dos pensamentos do médico neurologista Jean-Martin Charcot, cujas investigações sobre o inconsciente vieram sustentar as posteriores teorias de Sigmund Freud. Já nos EUA, a linha orientadora é mais teórica e filosófica, não se assistindo a um corte tão significativo e rápido com os métodos de obtenção de conhecimento herdados de uma altura em que a Psicologia e a Filosofia não se tinham ainda separado. Atender a esta diversidade é particularmente importante quando o objetivo é o entendimento da Psicologia enquanto ciência, uma vez que é precisamente esta 7 Raquel Espadinha 2023/2024 diversidade que ainda hoje pauta o desenvolvimento teórico e prático da ciência psicológica. Uma diversidade que, à partida, poderia ser um motor importante e interessante do seu desenvolvimento, mas que, na maior parte das vezes, desemboca numa das suas maiores fragilidades. De facto, "uma das grandes fragilidades da [P]sicologia reside na coexistência de demasiadas interpretações díspares acerca das mesmas realidades, inúmeras vezes dispersas e incongruentes, as quais sem confluírem para explicações articuladas tendem a desconhecer-se ou a menosprezar- se mutuamente, na ausência de um fio condutor no sentido da integração ou sequer da articulação recíproca". Ligthner Witmer que trabalhou com Wundt em Leipzig, propôs pela primeira vez uma nova denominação para a psicologia: a psicologia clínica, de modo a diferenciá-la da psicologia experimental. Esta denominação surgiu no decorrer de um trabalho que o mesmo desenvolveu numa clínica universitária na Pensilvânia, fundada em 1896, que tinha como foco a intervenção em crianças com deficiências cognitivas e físicas. Além disto, Witmer foi também responsável pela fundação da primeira revista de Psicologia Clínica, em 1907, a “The Psychological Clinical”. É ainda pela mão de Witmer que chega à Associação Americana de Psicologia (American Psychological Association - APA), então criada em 1892 (APA, 2019), a apresentação de uma nova área de aplicação prática da Psicologia - a Psicologia Clínica, centrada no uso do método clínico para a sua realização. Apesar desta iniciativa, só em 1919, e depois de algumas tensões entre psicólogos no seio da APA, é finalmente aberta uma secção clínica, descrevendo-se a função desses psicólogos como o estudo de casos individuais, a contribuição para o diagnóstico e a realização de avaliações e de terapias individuais e de grupo. Assim, por força do seu nascimento em estreita relação com a Psiquiatria e em virtude da adoção do método clínico, a Psicologia Clínica ficou qualificada no senso comum como a Psicologia destinada às pessoas com perturbação mental, confundindo-se com uma Psicologia da Patologia. O facto de o contexto profissional dos primeiros psicólogos clínicos ter sido o hospital psiquiátrico conotou a Psicologia Clínica como "uma [P]sicologia ao serviço da [P]siquiatria e da [P]sicopatologia". Embora o reconhecimento pela APA tenha conferido legitimidade à Psicologia Clínica, o desenvolvimento do seu conteúdo, tanto teórico como prático, deveu-se muito à pcorrência das duas grandes Guerras Mundiais, principalmente ao rescaldo da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Nomes Importantes para a Psicologia Clínica: Pierre Janet: utilizava muitas vezes o termo psicologia clínica, baseado na ideia de uma psicologia médica trabalhada pelos filósofos para ser posta ao serviço dos médicos. Criticou o excesso de racionalidade e procurou estudar a subjetividade do sujeito com recurso a uma reflexão psicológica sobre os factos. Lightner Witmer: trabalhou com Wundt. Propôs a psicologia clínica como nova disciplina e criou a primeira clínica de psicologia centrada no tratamento de crianças com doença mental. Freud: em 1869 criou o primeiro laboratório de psicologia experimental na Alemanha e preocupava-se com as características observáveis. Formação, investigação e prática clínica O ano de 1947 marca uma viragem decisiva no reconhecimento da Psicologia Clínica. Nesse ano, visando a análise dos programas de formação e investigação em Psicologia 8 Raquel Espadinha 2023/2024 Clínica, uma secção da APA apresenta uma série de recomendações importantes para o ensino e a prática desta ciência. Refere a necessidade da realização de 1 ano de estágio, a elaboração e a implementação de cursos de Psicologia Geral e de Psicologia Dinâmica do Comportamento, bem como a definição de métodos de diagnóstico, investigação e terapia. Esta consciencialização da necessidade de se criar um programa de estudo orientado para a aplicação clínica da ciência psicológica foi, sem margem para dúvidas, um passo determinante para a sua operacionalização, tanto enquanto ciência como enquanto profissão ao serviço dos seus clientes. Dois anos depois, em 1949, na Conferência de Boulder, no Colorado (EUA), é proposto para o psicólogo clínico o modelo do Scientist-Practitioner ("Cientista-Profissional", em português), um modelo científico-profissional assente nas recomendações básicas do Comité de Shakow. Como se forma, atualmente, um psicólogo clínico? David Shakow foi um dos mais influentes psicólogos clínicos e havia proposto um plano de formação para os psicólogos que visava a superação da segmentação, para ele evidente, entre a ciência (teoria) e a prática. De entre as suas mais importantes recomendações, salientam-se as seguintes: Os psicólogos clínicos devem receber primeiro uma formação como psicólogos (ou seja, como cientistas) e só depois como profissionais práticos; A formação dos psicólogos clínicos deve ser tão rigorosa como a dos psicólogos não clínicos e, por esse motivo, deve assentar num programa de formação de abranja 4 anos, com 1 ano de prática num estágio supervisionado; A formação clínica deve centrar-se em três aspetos fundamentais - o diagnóstico, a investigação e o tratamento -, com cursos complementares de Psicologia Geral, psicodinâmica, técnicas de diagnóstico e métodos de investigação e de terapia. Nessa conferência foi oficialmente aceite a proposta de Shakow e criado, no interior da APA, o Educational and Training Board, visando a aprovação e a publicação da lista de programas de formação em Psicologia Clínica e dos internatos reconhecidos por aquela entidade. O conjunto de todas estas recomendações foi designado por Modelo de Boulder e considerado como o modelo de formação a seguir durante os cerca de 25 anos seguintes. Embora controverso - como é, aliás, a maioria dos temas em Psicologia -, não é muito difícil observarmos ainda hoje alguns traços desta proposta nos programas de formação existentes na área. A consolidação da Psicologia Clínica na sociedade A consolidação da Psicologia Clínica na sociedade é um processo complexo que envolve uma série de fatores históricos, sociais e científicos. A Psicologia Clínica é um ramo da psicologia que se dedica ao estudo, diagnóstico e tratamento de distúrbios mentais e emocionais. A sua consolidação na sociedade ao longo do tempo pode ser entendida através de algumas etapas e desenvolvimentos importantes: ✓ Evolução Histórica: A Psicologia Clínica teve as suas raízes nos primeiros trabalhos de psicólogos como Sigmund Freud, Carl Jung e B.F. Skinner, que contribuíram para o desenvolvimento de teorias e técnicas terapêuticas. 9 Raquel Espadinha 2023/2024 A psicanálise, por exemplo, foi uma abordagem inicialmente dominante na Psicologia Clínica, mas com o tempo, outras abordagens, como a terapia cognitivo-comportamental (TCC), a psicologia humanista e outras, foram-se desenvolvendo. ✓ Institucionalização da Psicologia Clínica: A criação de organizações profissionais, regulamentação e a formação académica em Psicologia Clínica contribuíram para a sua aceitação e reconhecimento na sociedade. A consolidação também está associada à formação de órgãos de regulamentação e ética que estabelecem padrões para a prática clínica. ✓ Demanda Social por Saúde Mental: O aumento da consciencialização sobre saúde mental e a compreensão da importância do bem-estar emocional contribuíram para a procura por serviços de Psicologia Clínica. A sociedade contemporânea, muitas vezes, enfrenta desafios que podem levar a questões de saúde mental, como stresse, ansiedade e depressão, impulsionando a procura por profissionais de Psicologia Clínica ✓ Integração com Outras Áreas da Saúde: A colaboração interdisciplinar entre profissionais da saúde, incluindo psicólogos clínicos, psiquiatras, assistentes sociais e outros, tornou-se essencial para abordar questões de saúde mental de forma abrangente. ✓ Pesquisa e Evidências Empíricas: A Psicologia Clínica moderna é impulsionada por pesquisas científicas e evidências empíricas que fundamentam práticas e intervenções. A abordagem baseada em evidências ajuda a validar a eficácia de diferentes formas de terapia e contribui para a consolidação da Psicologia Clínica como uma disciplina científica. ✓ Desestigmatização da Saúde Mental: A luta contra o estigma relacionado à saúde mental tem sido um fator significativo na consolidação da Psicologia Clínica, encorajando as pessoas a procurar ajuda sem medo de julgamento social. A consolidação da Psicologia Clínica na sociedade é um processo dinâmico, e as práticas e abordagens continuam a evoluir para atender às necessidades em constante mudança da população. A integração crescente da psicologia clínica em diferentes setores da sociedade reflete a compreensão da importância da saúde mental no bem-estar global. 10 Raquel Espadinha 2023/2024 Para quê um psicólogo clínico e qual é a sua importância? Um Psicólogo Clínico é um profissional de saúde formado em psicologia e com especialização na área da Psicologia Clínica, treinado para utilizar modelos psicológicos, cientificamente validados, cujo trabalho que desenvolve se centra na intervenção/ajuda a pessoa a lidar com problemas psicológicos e dificuldades adversas, problemas de vida, na promoção do seu autoconhecimento, entre outras questões, não esquecendo que não atua só na patologia, mas também tem um papel no desenvolvimento normativo. O papel do Psicólogo centra-se na orientação da pessoa na resolução das suas dificuldades de vida e em ajudá-la a encontrar as suas próprias respostas, facilitando a autorreflexão e o desenvolvimento pessoal. Psicologia Clínica, Psicopatologia e Psiquiatria – Quem é quem? A Psicologia Clínica estuda o normal e o patológico, sendo um modelo psicológico, que é um modelo contextual onde a intervenção e a tomada de decisão são guiadas pelas características de personalidade, fatores ambientais, sociais, culturais, diagnósticos, sistémicos, desenvolvimentistas, e etc. A Psicopatologias estuda o que é patológico e é um modelo médico, onde a intervenção e a tomada de decisões clínicas são determinadas pelo diagnóstico. Neste sentido, é importante esclarecer as diferenças entre um psicólogo clinico, um psicoterapeuta e um psiquiatra. Psicólogo Clínico Licenciatura em Psicologia + Mestrado à escolha; Membro efetivo OPP (especialidades); Habilitado para fazer avaliação psicológica e psicoterapia de apoio; É importante fazer e ter supervisão (discussão com colegas dos casos que o profissional tem e que considera mais desafiantes ou que lhe causa mais duvidas, de modo a obter mais interpretações para os mesmos, de modo a ajudá-lo a acompanhar da melhor forma possível os seus pacientes); Deve fazer psicoterapia pessoal; Trata do sofrimento emocional ligado a uma qualquer situação de crise. Psicoterapeuta Psicólogo, psiquiatra ou outro profissional; Tem de ser creditado por uma sociedade ou associação científica especifica (e.g., SPP, SPTF, SPPB); Faz psicoterapia específica: Psicanálise, Terapia Familiar e de Casal, Psicoterapia Breve, Terapia Cognitivo-Comportamental; Está associado ao acompanhamento de situações/patologias especificas (crescimento/ transformação/ desenvolvimento pessoal). Psiquiatra Médico especialista em Psiquiatria; Aplica um tratamento psicofarmacológico; 11 Raquel Espadinha 2023/2024 Atua em situações de doença mental grave/aguda. Definição Operatória de Psicologia Clínica Embora a sua definição possa parecer clara, a sua operacionalização nem sempre seguiu a mesma linha de clarividência, como, aliás, muitos outros aspetos na área. Esta situação deve-se, sobretudo, a duas condições: a forte herança das regras de conduta da Medicina e a existência de diversos e diferentes modelos teóricos na Psicologia. Relativamente à primeira condição, na realidade o termo "clínico" provém da tradição médica, na qual kliné (do grego) se referia a "cama" (leito) e se constituía como um conjunto de artes médicas realizadas junto ao leito do doente. A orientação para a observação do cliente sem recurso a aparelhos de laboratório seria aqui um marco muito significativo desta conceção da Medicina e algo fortemente preservado pela Psicologia Clínica, que valoriza significativamente a observação do cliente como forma de realizar uma avaliação, um diagnóstico e uma intervenção critica é centrada na individualidade daquele cliente. Ato Psicológico 12 Raquel Espadinha 2023/2024 Psicologia Clínica, Psicopatologia e Psiquiatria Psicologia Clínica (estudo tanto do normal como do patológico) ≠ Psicopatologia (estudo do que é patológico). Modelos Teóricos da Psicologia Clínica É difícil estabelecer uma definição única para o método clínico, uma vez que diferentes contextos requerem diferentes métodos de avaliação e intervenção. Deste modo, foram criados os modelos teóricos que são teorias psicológicas científicas que permitem uma adaptação do psicólogo ao contexto e pessoa com quem está a trabalhar, facilitando a tomada de decisões clínicas. Quadros Teóricos e Modelos Concetuais Descrição de um processo, através de fórmulas que apenas consideram as propriedades essenciais. Em psicologia existem 4 quadros de referência clássicos que sob a forma de teorias, hipóteses ou modelos, sustentam a sua prática, são eles: ✓ Quadro Teórico Psicanalítico; ✓ Quadro Teórico Cognitivo-Comportamental; ✓ Quadro Teórico Sistémico; ✓ Quadro Teórico Fenomenológico-Existencial/Humanista. A adoção de uma perspetiva integradora por parte dos psicólogos clínicos tem sido uma postura cada vez mais largamente adotada, permitindo à ciência evoluir sob diferentes prismas, com contributos e focos distintos. A nossa perspetiva enquanto autores é a de que é importante encontrar uma identidade profissional que dê sentido à nossa atuação, enquanto psicólogos, que nos permita construir um conjunto de saberes, técnicas e competências integradas numa visão coerente do ser humano, pois só dessa forma poderá ser possível intervir com sucesso junto do mesmo. Olhar, procurar entender, refletir sobre as técnicas e os procedimentos de modelos que, não sendo os nossos, existem e desenvolvem trabalho científico é determinante para encontrar sentido na escolha do modelo que nos vai servir o pensamento, e, quem sabe, integrar novos conhecimentos, repensar práticas ou, até mesmo, às vezes, mudar de direção. O conhecimento científico constrói-se a partir da dúvida e da interrogação, da procura pelas respostas a perguntas que se criam para avançar em direção a novas 13 Raquel Espadinha 2023/2024 realidades, e isso, a nosso ver, deve ser também uma preocupação muito clara e evidente do psicólogo clínico enquanto prática crítica e construtiva do seu saber. Quadro Teórico Psicanalítico ou Psicanálise Pioneiro: Sigmund Freud. Outros autores: Sigmund Freud; René Spitz; Erik Erikson. Objeto de estudo: Determinantes inconscientes do psiquismo. Método de estudo: Método psicanalítico. Segundo Sigmund Freud, a psicanálise (teoria psicanalítica) é um procedimento usado na investigação de processos mentais quase inacessíveis por qualquer outro modo. Este método constitui uma ideia que a consciência não constitui senão uma infinita parte da vida psíquica, cujo centro deve ser procurado no inconsciente. Freud queria encontrar uma forma de realizar esse processo de forma consciente, ou seja, através da interpretação de sonhos. Acabou por desenvolver o conceito de inconsciente e também da psicossexual por estádios: oral, anal, fálica, latência e genital. Desenvolveu também a importância dos mecanismos de defesa: deslocamento (ser agressivo com os filhos e não no trabalho), treinamento reativo (filho que odeia o pai, mas demonstra muita preocupação com ele), negação (uma pessoa que acha que as pessoas não gostam delas: negação psicótica), projeção (ilude uma pessoa), racionalização (oculta sentimentos e pensamentos) e repressão (bloqueio de desejos, pensamentos que atinge a consciência). Freud descreveu a patologia como sendo um traumatismo grave no decurso do desenvolvimento do individuo. Suposições básicas Determinismo - O comportamento humano é determinado e depende fundamentalmente de fatores intrapsíquicos como impulsos, desejos, motivos e conflitos internos. Na psicanálise clássica, mas não em outras escolas psicanalíticas, os determinantes biológicos (impulsos sexuais e agressivos) são enfatizados. Ênfase no papel do conflito - Isto é considerado básico no desenvolvimento de sintomas neuróticos. Normalmente considera-se que os impulsos internos procuram manifestar-se e obter gratificação contra proibições e limites socioculturais. Os sintomas neuróticos são vistos como compromissos para tentar resolver esse conflito. Na perspetiva psicanalítica clássica, considera-se que o conflito não resolvido entre o id (necessidades instintivas) e um superego super punitivo e inibidor (valores e normas sociais transmitidos pelos pais) é a causa fundamental dos distúrbios psicológicos. Este conflito é exacerbado por defeitos do ego – a terceira estrutura psicológica – que impedem o desenvolvimento de defesas adequadas que permitiriam uma redução da tensão. As 3 partes principais da mente humana, segundo Freud são: o id, o superego e o ego. O id é a estrutura mais antiga, contém todos os instintos básicos (sexuais e agressivos) sem socialização, é fonte de energia psíquica, é basicamente inconsciente e é regido pelo princípio do prazer. O superego surge através da internalização de normas e valores sociais apresentados pelos pais e outras figuras de referência, é parcialmente 14 Raquel Espadinha 2023/2024 inconsciente e é responsável por monitorar e punir as atividades do id. O ego está localizado entre as outras duas estruturas e é responsável por regular a interação entre elas, para que as necessidades básicas possam ser satisfeitas sem violar as normas existentes. O self é basicamente consciente, é governado pelo princípio da realidade e suas funções incluem também perceção, aprendizagem e autorregulação. Segundo Freud, o conflito surge da disputa entre a necessidade de satisfazer impulsos básicos (sexuais, agressivos) e as defesas desenvolvidas para inibir a expressão consciente desses impulsos. Os sintomas são uma tentativa de solução, uma forma falhada de resolver estes conflitos através do estabelecimento de um compromisso entre os dois tipos de forças. Os sintomas constituem uma expressão simbólica do conflito e implicam uma satisfação parcial dos instintos; Porém, o superego atua contra essa gratificação, o que aumenta o desconforto e o sofrimento. Por exemplo, a evitação agorafóbica de uma mulher pode ser concebida como o compromisso entre o desejo de seduzir os homens e a defesa contra esse desejo. Importância da história do desenvolvimento - Ressalta-se que o comportamento humano é significativamente determinado pela história de desenvolvimento da pessoa. Muitos conflitos básicos surgem na primeira infância. A satisfação ou frustração nestes períodos dos impulsos e necessidades básicas da criança nas suas relações com os pais ou outras figuras importantes (por exemplo, irmãos, professores) e a eficácia na resolução dos problemas. Os conflitos que surgem determinam o funcionamento da pessoa em fases posteriores da vida. Daí a importância dada às experiências históricas em comparação com o aqui e agora. No entanto, certas escolas também enfatizam o papel das experiências presentes. Determinismo múltiplo - A ocorrência de uma ação ou pensamento depende da influência de múltiplos fatores diferentes que operam simultaneamente, embora possam variar no grau em que contribuem para explicar o fenómeno analisado. Por exemplo, a arrumação obsessiva e a mesquinhez são o produto de vários fatores: um treino muito rigoroso para ir à casa de banho, a preocupação dos pais com a sujidade e o prazer da criança em reter fezes. Ênfase em processos inconscientes - Muitos dos determinantes do comportamento são inconscientes. O material inconsciente é diferente do consciente e também é organizado e processado de forma diferente (não segue lógica, mistura passado e presente). Freud distinguiu três níveis de consciência: inconsciente, pré-consciente e consciente. O inconsciente inclui todo aquele material não acessível à pessoa em estado normal de vigília. Os processos regidos pelos princípios do inconsciente (falta de lógica, mistura de passado e presente) são chamados de primários para distingui-los dos secundários que são ordenados e conscientes. O pré-consciente inclui aqueles materiais inconscientes que às vezes atravessam temporariamente a barreira do inconsciente. Por exemplo, quando você tem a sensação de lembrar de algo chato ou preocupante. O consciente é a parte racional da pessoa, identifica-se consigo mesmo e é responsável pela relação com o mundo exterior. O comportamento tem significado - Nenhuma ação ou pensamento é puramente casual, mas o resultado significativo de variáveis e processos específicos (desejos, fantasias, impulsos, mecanismos de defesa). Portanto, considera-se que o comportamento comunica algo sobre seus determinantes, e tal comunicação é frequentemente considerada metafórica ou simbólica. Daí a importância dada aos sonhos, aos lapsos de língua, às piadas, aos comportamentos não-verbais e ao significado simbólico dos sintomas neuróticos. 15 Raquel Espadinha 2023/2024 Importância dos mecanismos de defesa - Os conflitos psicológicos produzem ansiedade que a pessoa tenta reduzir através de mecanismos de defesa. São processos psicológicos automáticos, geralmente inconscientes, que protegem a pessoa da ansiedade e da consciência de stresses internos ou externos. Alguns deles são: ✓ Role - Um sentimento ou resposta a um objeto é transferido para outro objeto menos ameaçador. Por exemplo, ser agressivo com os seus filhos em vez de com seus chefes no trabalho; ✓ Treinamento reativo - Expressão de pensamentos, sentimentos ou comportamentos opostos ao que a pessoa realmente tem, que são inaceitáveis e geralmente reprimidos. Por exemplo, um filho que odeia o pai, mas demonstra preocupação exagerada por ele e carinho transbordante; ✓ Negação - Não querer reconhecer algum espeto doloroso da realidade externa ou da experiência subjetiva que seria aparente para os outros. Por exemplo, uma pessoa que não quer reconhecer que seu parceiro ainda está com ela por interesse, não por amor. Falamos de negação psicótica quando há uma grande deterioração no teste da realidade; ✓ Projeção - Atribuição falsa de sentimentos, impulsos ou pensamentos inaceitáveis a outra pessoa. Seria o caso de não gostar de alguém, mas pensar que é essa pessoa quem quer nos fazer mal; ✓ Racionalização - Ocultação das verdadeiras motivações dos pensamentos, ações ou sentimentos através do desenvolvimento de explicações tranquilizadoras, mas incorretas. Por exemplo, criticar severamente o comportamento de uma pessoa que você odeia e dizer que isso é para o bem dela; ✓ Repressão - Bloqueio inconsciente de desejos, pensamentos ou experiências ameaçadoras para impedi-los de atingir a consciência. O componente afetivo pode permanecer consciente, separado das ideias associadas. A repressão não deve ser confundida com a supressão, uma tentativa consciente de não pensar em problemas, desejos, sentimentos ou experiências perturbadoras (por exemplo, usando distração). Elementos Fundamentais ✓ É necessário descobrir e compreender os acontecimentos inconscientes e traumáticos do desenvolvimento - com a ajuda dos métodos de associação livre, entrevista, esclarecimento e confronto -, para que possam ser elaborados pelos processos racionais e conscientes do ego, e isso pode reduzir e gerir adequadamente as forças instintivas. A maturação psicológica é assim facilitada. Tornar o inconsciente consciente é um processo gradual que ocorre ao longo de muitas sessões, algumas com mais carga emocional do que outras. ✓ A interpretação do material que surge durante a consulta e a análise e interpretação da transferência e sua resolução são o principal caminho para que o paciente alcance a compreensão (insight) da origem e natureza dos seus problemas. Uma interpretação é uma comunicação ao cliente que visa tornar consciente o significado inconsciente do comportamento do paciente, normalmente manifestado através de associação livre, sonhos, resistência e transferência. A transferência refere-se ao fato de o paciente reproduzir em sua relação com o terapeuta aspetos cruciais de sua experiência com figuras importantes de sua própria história, de modo que conflitos e experiências de desenvolvimento significativas reaparecem na consulta. 16 Raquel Espadinha 2023/2024 ✓ A relação de transferência permite, portanto, o desenvolvimento da compreensão, que não é apenas cognitiva, mas implica também expressão e descarga emocional. Sem esse componente emocional a verdadeira compreensão não ocorre, limita-se a um puro exercício intelectual. Por outro lado, dada a reação não punitiva do terapeuta às reações transferenciais do paciente, a transferência também proporciona um ambiente educativo que favorece o amadurecimento psicológico. ✓ Muitos assumem que a verdadeira compreensão dos próprios conflitos intrapsíquicos é suficiente para o desaparecimento dos sintomas e a mudança do comportamento manifestado. No entanto, outros pensam que embora a compreensão seja necessária, pode não ser suficiente; é também necessária uma ação direta para mudar o comportamento externo. Foi o que Freud afirmou quando disse que para tratar uma fobia era necessário compreendê-la, mas também incentivar o paciente a abandonar seus comportamentos de evitação. ✓ Os pacientes resistem ao método terapêutico, ou seja, utilizam uma variedade de meios diretos e indiretos para se protegerem da ansiedade e do conflito associados à terapia analítica. Portanto, é importante identificar, analisar e interpretar essas resistências para que a relação transferencial ocorra e possa ser analisada e resolvida. A técnica psicanalítica é caracterizada por: Dar ênfase ao papel do eu: Isso funciona em muitos aspetos, independentemente dos instintos e do conflito intrapsíquico; também é responsável por atividades fundamentais: memória, perceção, controle de impulsos, relacionamento interpessoal, formação de identidade. Dar ênfase nas experiências psicossociais (e não apenas psicossexuais) do desenvolvimento dos dois primeiros anos na determinação da personalidade). Aplicar a terapia a populações clínicas diferentes dos adultos neuróticos vistos por Freud: crianças, psicóticos, transtornos de personalidade. Adicionalmente, extensão a situações não clínicas: ensino, empresas, instituições. Dar ênfase em fatores interpessoais: O desenvolvimento psicológico é considerado o resultado da interação entre variáveis pessoais e experiências interpessoais. Dar ênfase na natureza da organização da personalidade e não em conflitos dinâmicos específicos: Como consequência da ênfase no self e das tentativas de tratar transtornos de personalidade, as formulações da psicopatologia concentram-se nos defeitos da estrutura psíquica, e não nos conflitos internos. Técnicas utilizadas no modelo psicanalítico ✓ Associação livre: falar livre e espontaneamente com o psicólogo sobre o quer que seja que venha à ideia; ✓ Interpretação do material inconsciente (sonhos, atos falhados); ✓ Mecanismos de Defesa (recalcamento, deslocamento, negação); ✓ Transferência: direcionar os sentimentos sobre alguém familiar para o psicólogo e contratransferência: sentimentos do psicólogo com impacto na relação terapêutica. Características da psicoterapia psicodinâmica 17 Raquel Espadinha 2023/2024 Os imperativos práticos (aumento da procura de cuidados) têm levado à procura de um tratamento menos regressivo e intenso, adequado para quem não necessita de tratamento profunda reestruturação de sua personalidade ou que não querem ou são incapazes de tolerar o tempo e as demandas emocionais da psicanálise prolongada. O tratamento tem uma duração mais curta (geralmente 16-30 sessões) e a frequência das sessões também é reduzida para 1-2 por semana, em vez de 4-5. O terapeuta é mais ativo e diretivo e incentiva o desenvolvimento de uma boa relação terapêutica. Além disso, o sofá não é utilizado e as sessões são presenciais. Há menos ênfase na descoberta e interpretação de material histórico e uma maior concentração em aspetos atuais e na resolução de problemas específicos derivados de conflitos básicos não resolvidos, embora relativamente autónomos deles. Enfatiza-se a solução de áreas problemáticas ou mais desequilibradas da personalidade em vez da reestruturação global da personalidade. São levados em consideração os aspetos relacionados aos problemas atuais. Procura apoiar as defesas úteis do cliente, promover a adaptação da pessoa e melhorar as relações interpessoais. O leque de intervenções utilizadas é ampliado. Além da interpretação, são utilizadas intervenções educativas e de apoio (conselhos, instruções, informações, apoio emocional, afirmação ou desenvolvimento de habilidades). Pode ser utilizada terapia de grupo, familiar ou de casal, bem como medicação ocasional. O próprio formato da terapia torna a transferência menos intensa e regressiva. A ênfase é colocada na relação presente entre paciente e terapeuta, sem que seja necessário voltar ao passado. O psicólogo que se identifique com o modelo psicanalítico, apesar da sua complexidade e diversidade teórica, tem como premissas fundamentais: Que os fatores intrapsíquicos que o individuo desconhece resultam em sintomas comportamentais indesejáveis para o paciente; A identificação destes conflitos e a sua adequada interpretação resultam numa alteração dos sintomas e comportamentos desagradáveis; A relação terapêutica, influenciada por fenómenos como o da transferência, é o principal instrumento de trabalho; Tendencialmente, na sua abordagem clínica, este psicólogo não intervém diretamente, dando conselhos ou apontando caminhos, deve ser antes um participante neutro pois o que pretende é aprofundar o autoconhecimento do paciente tornando-o mais capaz de tomar as suas próprias decisões e de transformar o seu sofrimento psíquico. Quadro Teórico Cognitivo-Comportamental Principais autores: Pavlov, Watson, Skinner, Aaron Beck, Albert Ellis. Objeto de estudo: Efeitos do ambiente no comportamento observável de seres humanos e animais. Método de estudo: Método experimental. 18 Raquel Espadinha 2023/2024 Características - Pressupõe-se que a maior parte dos comportamentos considerados inadequados são adquiridos, mantidos e alterados de acordo com os mesmos princípios que regulam os comportamentos considerados adequados. Ambos são principalmente, embora não exclusivamente, uma consequência da história de aprendizagem. (A aprendizagem é concebida num sentido amplo e inclui condicionamento clássico e operante, modelagem, transmissão de informações e os processos cognitivos envolvidos). Nem todos os comportamentos inadequados resultam basicamente da aprendizagem. As perturbações psicóticas, o autismo, a perturbação maníaco- depressiva e o atraso mental tendem a ser considerados como tendo importantes determinantes orgânicos, embora os fatores ambientais também desempenhem um papel. Essas alterações não podem ser “curadas” por terapia comportamental ou cognitivo-comportamental (TCC doravante se referirá a ambas as terapias), mas pode ajudar as pessoas afetadas dentro de certos limites; Embora os fatores genéticos e orgânicos recebam menos destaque, eles não são ignorados. A sua influência é vista como uma limitação estrutural sobre quais fatores de aprendizagem operam na determinação do comportamento, bem como uma predisposição para certas formas de reação que interagem com as experiências de aprendizagem. - Considera-se que a maioria dos comportamentos inadequados (e também os adequados) podem ser modificados através da aplicação de princípios psicológicos, especialmente os de aprendizagem. Isso não significa que em todos os casos possam ser modificados na medida desejada, pelo menos com as técnicas atualmente disponíveis na TCC. Em alguns pacientes com certos transtornos (por exemplo, ansiedade, depressão unipolar não psicótica, dependência de substâncias) pode ser apropriado combinar a TCC com terapia farmacológica. Em outros transtornos (por exemplo, esquizofrenia crônica, transtorno bipolar, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade), o tratamento combinado é claramente o mais eficaz e sem medicação, os efeitos da TCC seriam nulos ou leves; Finalmente, existem distúrbios (por exemplo, depressão psicótica) para os quais não há documentação sobre a utilidade da TCC e para quem a farmacoterapia parece ser o tratamento de escolha, pelo menos como intervenção principal. - As formulações teóricas e os procedimentos de avaliação e intervenção são avaliados empiricamente, ou seja, a sua adequação ou eficácia é avaliada através de uma metodologia científica (experimental quando possível). Do lado do tratamento, a maioria dos procedimentos utilizados na TCC tem uma base empírica relativamente sólida, embora a evidência para outros (por exemplo, interrupção do pensamento, algumas técnicas de condicionamento encoberto) ainda seja fraca, sempre, é claro, em referência a problemas específicos e outros aspetos como as características dos clientes. Não se pode falar da eficácia de um procedimento em geral; A própria prática clínica fornece ideias para refinar e melhorar procedimentos avaliados empiricamente; essas ideias também são testadas. Por outro lado, durante a prática clínica as decisões devem ser tomadas em relação a aspetos 19 Raquel Espadinha 2023/2024 que não foram investigados ou não foram suficientemente investigados; nestes casos, deve-se confiar na própria experiência ou na de terceiros; Embora a TCC se caracterize pela utilização de uma metodologia científica no estudo e mudança do comportamento humano, muitas investigações apresentam deficiências metodológicas importantes; por exemplo, desenhos inadequados, confusão entre terapeutas e tratamentos, intervenções comparadas não igualmente credíveis, avaliadores e/ou terapeutas não cegos às hipóteses de investigação, falta de controlo da integridade das intervenções e análises estatísticas inadequadas. - A avaliação em TCC (avaliação comportamental) visa especificar claramente os comportamentos problemáticos (excesso ou defeito) do cliente e as variáveis (antecedentes e consequências pessoais e ambientais, característicos pessoais estáveis) que os regulam. Comportamento é entendido como qualquer atividade motora, cognitiva, autônoma ou emocional que seja especificável e mensurável (não precisa ser publicamente observável). No entanto, existem diferenças entre os terapeutas comportamentais neste ponto. Alguns pensam que as cognições desempenham um papel importante quer como problemas (obsessões, autocrítica persistente) quer como fatores explicativos de comportamentos problemáticos. Em contraste, aqueles que trabalham dentro da abordagem de análise do comportamento aplicada normalmente concentram-se no comportamento manifesto e nos determinantes ambientais, em vez de nos fenómenos interno; Comportamento é entendido como qualquer atividade motora, cognitiva, autônoma ou emocional que seja especificável e mensurável (não precisa ser publicamente observável). No entanto, existem diferenças entre os terapeutas comportamentais neste ponto. Alguns pensam que as cognições desempenham um papel importante quer como problemas (obsessões, autocrítica persistente) quer como fatores explicativos de comportamentos problemáticos. Em contraste, aqueles que trabalham dentro da abordagem de análise do comportamento aplicada normalmente concentram-se no comportamento manifesto e nos determinantes ambientais, em vez de nos fenómenos interno; - Na avaliação comportamental, são enfatizados os determinantes atuais dos comportamentos problemáticos, embora os determinantes históricos não sejam esquecidos. Acredita-se que informações sobre o passado de uma pessoa (o que não significa uma exploração detalhada da sua infância) podem permitir uma melhor compreensão de seus problemas atuais e podem oferecer pistas sobre os fatores atuais que controlam o comportamento da pessoa. No entanto, também se leva em conta que as condições que mantêm o comportamento atual podem ser bastante diferentes daquelas que deram origem ao comportamento. Por exemplo, os ataques de pânico podem surgir facilitados por eventos stressantes e depois mantidos pelo medo de sua recorrência. Por outro lado, o passado não pode ser reconstruído com a objetividade necessária e nada pode ser feito sobre os determinantes passados de um comportamento; só se pode agir sobre os determinantes atuais; Compreender a etiologia de um problema psicológico pode ser útil, mas não é essencial para produzir mudanças comportamentais (embora seja essencial 20 Raquel Espadinha 2023/2024 para a prevenção). Por outro lado, o sucesso na mudança de um comportamento problemático não mostra que a explicação sobre a sua génese esteja correta. - Com base na avaliação realizada, é elaborado um programa de intervenção que tem em conta o problema ou problemas específicos apresentados, as variáveis que os controlam e as características de cada cliente (idade, nível cultural, motivação, expectativas) e do seu ambiente. Existem muitas técnicas de TCC que podem ser combinadas e variadas de múltiplas maneiras para desenvolver diferentes programas de intervenção. Portanto, não existem, em princípio, intervenções padrão para problemas padrões. No entanto, a investigação utiliza frequentemente desenhos entre grupos com intervenções pré-determinadas e não individualizadas. Também não é incomum na prática clínica que muitas decisões de intervenção sejam baseadas em modelos nomotéticos do problema, e não em análises funcionais ideográficas (Haynes e O'Brien, 1990). - A avaliação é um processo contínuo que continua ao longo da intervenção e no qual são analisados os resultados parciais obtidos e as novas informações que o cliente possa fornecer (incluindo novos problemas que possam ser comunicados). Dependerá desta análise que: Ações corretivas sejam adotadas quando a intervenção não for realizada conforme planeado; A intervenção é modificada se não for considerada adequada; Se são ou não reconsiderados os objetivos a atingir e a avaliação inicial dos problemas do cliente. A avaliação não termina com a cessação da intervenção, mas também é realizada após um determinado período após a sua conclusão (acompanhamento) para verificar se os resultados alcançados são mantidos. O facto de a avaliação dos progressos ocorrer continuamente ao longo da intervenção levou, por vezes, a que não fosse realizada uma avaliação final mais exaustiva do problema. No entanto, isso é altamente recomendado. Por outro lado, na prática clínica os acompanhamentos são realizados com pouca regularidade devido a questões de tempo por parte do terapeuta. - As técnicas de TCC são derivadas dos princípios teóricos e descobertas empíricas de psicologia científica ou, pelo menos, são congruentes com eles. Esta última nuance é muito importante por dois motivos: muitas técnicas têm precursores históricos remotos e recentes, embora, sim, em geral sejam menos matizadas e aperfeiçoadas; muitas técnicas devem mais à experiência clínica do que aos modelos teóricos e descobertas experimentais da psicologia. O terapeuta comportamental utiliza conhecimento científico relevante combinado com experiências pessoais e informações que não foram derivadas da psicologia científica. Neste sentido, a prática clínica e a vida quotidiana ensinam formas de resolver problemas por vezes muito mais engenhosas do que as desenvolvidas nos centros de investigação. No entanto, esses formulários precisarão ser testados. - A intervenção visa prevenir, eliminar ou reduzir comportamentos inadequados e ensinar ou promover comportamentos adequados tendo em conta as variáveis que controlam esses comportamentos. Muitos autores acrescentaram ainda que a intervenção não se centra nas (supostas) causas subjacentes. Agora, depende do que se entende por “causas subjacentes”. Se com isso queremos dizer impulsos reprimidos, conflitos 21 Raquel Espadinha 2023/2024 inconscientes e outras variáveis inferidas com pouca ou nenhuma ancoragem empírica, então a TCC não aborda as causas subjacentes. Agora, se as causas subjacentes são entendidas como as variáveis atuais que regulam o comportamento, sejam estas variáveis ambientais ou pessoais (desde que, neste caso, estejam ancoradas em variáveis antecedentes e consequentes objetivamente observáveis), então a TCC tem de levar em conta as causas subjacentes. (No entanto, os seguidores da análise do comportamento aplicada tendem a evitar fenômenos internos, cognitivos ou biológicos); Assim, a intervenção não se centra apenas nos comportamentos problemáticos, mas também nos fatores atuais que regulam esses comportamentos. Uma intervenção que não altere as principais variáveis controladoras de um comportamento provavelmente será ineficaz. Por exemplo, se uma pessoa bebe excessivamente para controlar a sua ansiedade social e simplesmente eliminamos o comportamento de beber através de terapia aversiva, é muito provável que o comportamento problemático reapareça ou que a pessoa recorra a outras drogas ou limite os seus contactos sociais. Da mesma forma, a insônia pode ser causada pelo medo do escuro e/ou dos ladrões; geralmente, pouco será alcançado tratando diretamente a insônia por meio do relaxamento se os medos não forem eliminados por outros métodos. - Os objetivos da intervenção são mutuamente acordados entre o terapeuta e cliente (e/ou seus tutores ou responsáveis). Embora, em geral, os objetivos devam ser acordados com o cliente, é aconselhável fazer algumas qualificações. Objetivos muito assustadores não têm de ser mencionados no início e outros objetivos não têm de ser operacionalizados com o paciente. Por exemplo, podemos compartilhar com o cliente o objetivo de elevar o humor, mas não que isso será determinado pela pontuação inferior a X em determinado questionário; As metas não consistem em declarações vagas e gerais, mas são claramente definidas e especificadas. No caso da depressão, os objetivos possíveis seriam aumentar as relações sociais e as atividades prazerosas e reduzir significativamente o choro e a pontuação num teste de depressão. Existem metas ou objetivos finais a atingir que passam por uma série de sub objetivos também claramente especificados. - Geralmente, a intervenção é realizada, mais cedo ou mais tarde, no ambiente natural onde ocorrem os comportamentos problemáticos ou não ocorrem os comportamentos de interesse. A intervenção pode ser aplicada no ambiente natural desde o início; Por exemplo, o terapeuta entra no ambiente do cliente, os paraprofissionais (professores, familiares, amigos, colegas, parceiros, assistentes em instituições) e/ou técnicas de autodireção. Por outro lado, a intervenção no ambiente natural pode ser precedida ou simultânea com uma intervenção em ambientes mais restritos (consulta, hospital, instituição). - Os efeitos da intervenção são avaliados através de múltiplas modalidades de resposta mensurável (motora, cognitiva, autónoma, emocional) – com particular ênfase no comportamento manifesto (a menos que outro tipo de comportamento seja o foco de interesse) – e de múltiplos métodos e fontes de informações (entrevista, questionários, autorregistro, observadores, pessoas próximas, registos mecânicos). Enfatiza-se o significado clínico da alteração e sua generalização e manutenção. 22 Raquel Espadinha 2023/2024 Os resultados da intervenção são avaliados em termos da mudança inicial seguida, da sua generalização para situações relevantes da vida real e da sua manutenção ao longo do tempo. (O tratamento inclui estratégias adequadas para promover esta generalização e manutenção.) Além disso, procura avaliar se as mudanças alcançadas com a intervenção são clínicas ou socialmente significativas. Ou seja, não basta conseguir mudanças nos comportamentos problemáticos, mas essas mudanças devem ser de tal magnitude que representem uma resolução ou pelo menos uma melhoria substancial dos problemas para os quais a intervenção foi aplicada - TCC envolve a colaboração e participação ativa do cliente nos processos de avaliação e intervenção. Isto implica por parte do cliente: Participar na discussão e posterior acordo sobre a forma de conceptualizar os seus problemas, sobre os objetivos a atingir e sobre os métodos de intervenção a seguir; Cooperar consistentemente no processo de avaliação contínua (pense, por exemplo, em autogravações) e nas atividades de tratamento, seja durante a sessão ou fora dela; Variáveis como idade, desenvolvimento intelectual, locus de controlo e gravidade dos problemas, entre outras, determinam se um cliente desempenha um papel mais ou menos ativo nos processos de avaliação e intervenção e que outras pessoas (pais, professores, outros responsáveis) têm um papel mais ou menos proeminente nestes processos. - Considera-se que uma relação positiva e de confiança entre terapeuta e paciente é uma condição importante, embora não suficiente, para o bom andamento da intervenção e para alcançar a mudança comportamental. Vários estudos que compararam a forma de trabalho de terapeutas de diferentes orientações não encontraram diferenças entre o tipo de relacionamento que estabelecem com os seus clientes (Keijsers, Schaap e Hoodguin, 2000). Os terapeutas comportamentais estabelecem uma relação empática e cordial com seus clientes. A importância de um bom relacionamento entre terapeuta e cliente fica evidente se considerarmos que sem ele é muito duvidoso que o cliente colabore e participe ativamente nos processos de avaliação e intervenção, o que é uma das características da TCC; Naturalmente, a importância da relação entre terapeuta e cliente estende-se também à relação do terapeuta com aqueles com quem interage no contexto da intervenção; Por exemplo, os responsáveis pelo cliente quando este é menor ou sofre de algum tipo de incapacidade. Abordagens principais dentro dos modelos comportamentais e cognitivo- comportamentais ✓ Análise comportamental aplicada (Skinner); ✓ Abordagem neocomportamental mediacional (Wolpe); ✓ Abordagem cognitivo-comportamental (Beck, Ellis, Meichenbaum); ✓ Teoria sociocognitiva (Bandura) Estas abordagens, apesar das suas diferenças, não estão necessariamente em oposição entre si e não constituem grupos fechados. Muitos terapeutas comportamentais não podem ser classificados simples e exclusivamente em nenhum deles. 23 Raquel Espadinha 2023/2024 Um movimento denominado contextualismo – ou análise clínica comportamental – se desenvolveu a partir da análise comportamental aplicada, que difere do primeiro em alguns aspetos. A diferença fundamental está no desenvolvimento terapêutico, no qual o comportamento verbal assume grande papel. Dentro do contextualíssimo, podemos distinguir a terapia de aceitação e compromisso de Hayes, a psicoterapia analítica funcional de Kohlenberg e Tsai, a terapia comportamental dialética de Linehan e a terapia integrativa de casais de Jacobson (Vázquez, 2004). Essas terapias têm sido chamadas de terceira geração de terapia comportamental (a primeira seria a terapia comportamental e a segunda seria a terapia cognitivo-comportamental), que dá fundamental importância ao contexto em que o comportamento ocorre e às funções desse comportamento. sua forma ou topografia. Assim, por exemplo, seria mais importante considerar a função dos pensamentos do que o seu conteúdo. Atitude e Técnica ✓ Condicionamento operante: as mudanças das condições do ambiente podem alterar os comportamentos; ✓ Identificação e correção de padrões de pensamento, crenças e comportamentos negativos e irracionais; aprendizagem de padrões mais saudáveis e eficazes; ✓ Técnicas chave: restruturação cognitiva, reforço positivo e reforço negativo, psicoeducação, questionamento socrático, dessensibilização sistemática, técnicas de visualização e relaxamento. Aspetos negativos deste modelo ✓ Falta de um referencial teórico claro e diferenciado. É difícil estabelecer o que há de específico no modelo comportamental além de sua aderência à metodologia científica, metodologia que pode ser utilizada, naturalmente, por outras abordagens; ✓ Ênfase injustificada no facto de os princípios e técnicas utilizados derivarem da psicologia científica, quando, na realidade, muitos deles devem mais à experiência clínica; ✓ Falta de reconhecimento de fatores cognitivos e subjetivos em abordagens não técnicas cognitivas; ✓ Subordinação da emoção à cognição nas abordagens cognitivas; ✓ É necessária uma melhor validação dos procedimentos de avaliação cognitiva. Quadro Teórico Sistémico Principais autores: Watzlawick, Minuchin, Haley e Selvini-Palazzoli. Caracteristicas Enfatizam o papel dos sistemas interpessoais: para compreender o comportamento e a experiência de um membro de um sistema (por exemplo, a família), devemos considerar os dos demais membros. Segundo Feixas e Miró (1993), um sistema é um conjunto de elementos estruturados dinamicamente, cuja totalidade gera propriedades que, em parte, são independentes daquelas possuídas por seus elementos separadamente. Portanto, para compreender um sistema, devemos considerar seus elementos, suas propriedades e comportamento, a interação entre eles e as propriedades do todo. 24 Raquel Espadinha 2023/2024 Um sistema pode ser uma família, um casal ou um grupo social, e integra um ou mais elementos ligados entre si, sendo que uma mudança no sistema tem impacto nos seus elementos, e uma mudança num elemento tem impacto sistema, mostrando assim a existência de interdependência entre os membros. Os sistemas são abertos, pois trocam informações com o meio ambiente e têm uma estrutura que respeita limites, hierarquias e grau de diferenciação. Disfunções nas estruturas familiares: Triangulação: é um tipo de disfunção associada à estrutura familiar. Consiste em tentar mascarar os conflitos entre duas pessoas envolvendo uma terceira pessoa, para que suas características, principalmente seus problemas, passem a ser o foco da interação. Assim, um casal com dificuldades conjugais pode concentrar-se nos distúrbios do filho (problemas na escola, dependência de drogas) em vez de nos problemas conjugais; Coligação: é outro tipo de disfunção e consiste na união entre dois membros de uma família contra um terceiro; por exemplo, pai e filho contra o outro pai. Neste modelo teórico são utilizados axiomas da comunicação, que é uma ferramenta que permite clarificar e descodificar a intenção das mensagens entre os elementos. Os membros de um sistema comunicam entre si e vários princípios básicos de comunicação foram distinguidos: ✓ É impossível não se comunicar - Num contexto de interação social, qualquer comportamento (incluindo o silêncio) comunica algo. Nas situações em que não se quer comunicar, podem surgir técnicas ou recursos de desqualificação para comunicar sem comunicar (contradizer-se, mudar continuamente de assunto, perder-se em questões tangenciais, falar de forma obscura, gerar mal- entendidos, não terminar frases) e sintomas como comprometimento (falsificação ou autoconceito de deficiências que impossibilitam a comunicação: sonolência, surdez ou falta de conhecimento do idioma em uma conversa normal); ✓ Em toda comunicação distinguem-se aspetos de conteúdo, geralmente expressos por meios verbais, e aspetos relacionais, normalmente definidos por comportamentos não-verbais (tom de voz, gestos, etc.); Porém, a relação também pode ser definida pelas características da situação e por determinados conteúdos verbais (por exemplo, dizer que vai contar uma piada para indicar que a mensagem não é séria). Os aspetos relacionais qualificam as informações expressas no conteúdo da mensagem; ✓ A incongruência entre os dois níveis de comunicação (conteúdo e relacional) dá origem a mensagens paradoxais. Por exemplo, dizer a alguém de maneira fria que você a ama; ✓ A natureza de um relacionamento depende da pontuação de uma série de eventos repetitivos (quem faz o quê, para quem, em resposta a quê). A forma de organizar os factos para que formem uma sequência ordenada é chamada de pontuação. A falta de acordo sobre como pontuar os factos é uma causa frequente de conflito. Por exemplo, um marido pode alegar que o seu afastamento se deve aos ataques contínuos da esposa, enquanto a esposa explica as suas críticas em termos da passividade do marido (é possível que haja aqui uma causalidade circular). Ou então, um adolescente diz que não 25 Raquel Espadinha 2023/2024 estuda o ensino médio porque seus pais o forçam, enquanto acham que ele é preguiçoso; ✓ Os relacionamentos podem ser simétricos ou complementares. Os primeiros baseiam-se na igualdade no comportamento de interação; qualquer um dos participantes pode, por exemplo, dar conselhos ou formular críticas. Os segundos são aqueles em que existe uma grande diferença no comportamento recíproco devido a um membro estar em posição superior em relação ao outro; por exemplo, as relações entre professor aluno e pais-crianças pequenas. Muitos conflitos relacionais baseiam-se no fato de um participante não aceitar o tipo de relacionamento que o outro deseja. Padrões de comunicação negativa ✓ Culpar e criticar sem ver a própria responsabilidade e/ou sem motivação para mudar as coisas; ✓ “Adivinhar” os pensamentos dos outros e agir de acordo sem lhes perguntar o que pensam e sentem; ✓ Fazer declarações incompletas (por exemplo, “estou com raiva”) sem especificar o porquê; ✓ Encarar os acontecimentos modificáveis como se não fossem modificáveis (“Não consigo fazer com que os meus filhos me respeitem”); ✓ Generalizar demais (“Nunca consigo conseguir nada que valha a pena”). Conceito de circularidade: linha-guia da metodologia da abordagem sistémica → sistema de relações recíprocas entre o terapeuta e a família. É importante ter em mente que embora essas abordagens tenham se especializado no tratamento de famílias e casais, também existem outras formas de abordar esses problemas (dinâmica, comportamental e cognitivo-comportamental) que podem ou não estar integradas à perspetiva sistémica. Técnicas O terapeuta procede à: Co-construção com o paciente ou com a família de uma definição do problema e de possibilidades de mudança; Metacomunicação: comunica-se sobre como se comunica, ou seja, sobre a própria comunicação verbal e não verbal. O terapeuta ajuda a tornar percetível a cada elemento o conteúdo latente das mensagens uns dos outros. Isto é conseguido através de técnicas como: questionamento circular, hipótese é circular, conotação positiva, construção do genograma, cadeira vazia, troca de papeis. Aspetos negativos deste modelo ✓ A psicoterapia sistêmica deriva apenas indiretamente, na melhor das hipóteses, da pesquisa básica; ✓ Agir de acordo com os padrões de interação não é suficiente em muitos casos. A importância dos fatores individuais não pode ser ignorada; ✓ O papel do sistema familiar é muitas vezes enfatizado e outros sistemas que podem ser tão ou mais importantes são esquecidos, como o grupo de trabalho, o grupo de adolescentes; 26 Raquel Espadinha 2023/2024 ✓ Embora estudos não experimentais sugiram a eficácia de intervenções sistêmicas, existem poucas investigações controladas; ✓ O estilo sistêmico de terapia é manipulador ou distante. Uma perspetiva alternativa no primeiro caso é que o terapeuta deve ser diretivo para conseguir a mudança e também tem pouco tempo antes de se tornar um prisioneiro do sistema. No segundo caso, o que às vezes acontece é simplesmente que os terapeutas não querem se envolver na família para não perderem a objetividade e a capacidade de produzir mudanças. Quadro Teórico Humanista/Fenomenológico Existencial Principais autores: Carl Rogers, Abraham Maslow, Yalom, Victor Frankl Objeto de estudo: Aspetos únicos e significativos da experiência humana. Método de estudo: Narrativas e Autorrelatos. Existe uma visão de aceitação incondicional, vendo a pessoa como autónoma e com responsabilidade social e autonomia, digna de confiança, pois por um lado, o ser humano é capaz de dirigir o seu próprio desenvolvimento e de tomar decisões, sendo responsável pelos seus atos. Por outro lado, esta autonomia pessoal é o que nos permite ser responsáveis perante a sociedade. As habilidades ou estratégias de enfrentamento do cliente não são enfatizadas, pois são consideradas. Diz-se que quanto mais próximo o cliente chegar do seu potencial de desenvolvimento, mais capaz ele será de encontrar soluções para os problemas externos de sua vida sem a ajuda de ninguém. De facto, tende a ser considerado contraproducente oferecer ajuda direta a um cliente para resolver os seus problemas, uma vez que, desta forma, o cliente pode tornar-se mais dependente do terapeuta e perder a oportunidade de ser guiado pelas suas ideias e sentimentos. Existe um confronto inevitável com a consciência: da morte, da solidão, da liberdade, da falta de sentido, fomentando a consciência da existência (existir). Trabalha-se o conceito da autorrealização, que diz que cada pessoa possui inatamente um potencial de crescimento ou autorrealização, uma tendência para se desenvolver e progredir em direção à maturidade. As pessoas são vistas como basicamente boas e orientadas para objetivos positivos (amor, felicidade, harmonia, criatividade). O desenvolvimento da tendência para a autorrealização depende em grande medida da satisfação das necessidades básicas do organismo. Por exemplo, Maslow salientou que, para procurar a autorrealização, é necessário satisfazer primeiro quatro tipo de necessidades básicas: fisiológicas (fome, sede, sexo), psicológicas (segurança), sociais (pertença, aceitação) e de autoestima (respeito por si próprio). E neste caso, o papel do terapeuta é fornecer ajuda ao cliente e encorajá-lo para que atinga o seu potencial de crescimento/autorrealização, bem como a liberdade e plenitude. O ponto de vista fenomenológico apoia a ideia do consciente subjetivo, em que os problemas não são causados pelos eventos de vida em si, mas pela forma como os experimentamos: esta vivência determina o sentimento e equilíbrio da pessoa. Ou seja, esta ideia sugere que o comportamento de uma pessoa é considerado determinado principalmente pela perceção que ela tem de si mesma e do mundo à sua volta. A psicoterapia é centrada no cliente e caracteriza-se por: facilitar a autorrealização do cliente, enfatizar o afetivo e não o intelectual, acentuar a importância do presente e considerar a relação terapêutica como uma experiência de crescimento. O terapeuta 27 Raquel Espadinha 2023/2024 deve demonstrar aceitação positiva incondicional (aceitar o cliente como ele é, sem julgamento; isto implica não ser diretivo, não dar conselhos ou orientações), empatia (compreender o cliente do seu ponto de vista) e com graça ou autenticidade (comunicar os próprios sentimentos e experiências internas) no relacionamento com o cliente de forma ativa (relação terapeuta- cliente simétrica). Rogers considera que estas três atitudes do terapeuta são condições necessárias e suficientes para facilitar a autorrealização do paciente. Neste modelo de psicoterapia, o psicólogo clínico não sugere, não interpreta nem aconselha, encoraja a explorar os pensamentos para encontrar as soluções autonomamente “aqui-e-agora”, não dando muita importância à história do cliente, mas sim às experiências imediatas. Técnica chave: autorrevelação, empatia, clarificação, escuta ativa e reflexão. Existe uma diversidade de submodelos fenomenológicos. Devido às limitações de espaço e tempo, discutiremos apenas duas abordagens clássicas, a terapia centrada no cliente de Rogers e a terapia Gestalt de Perls. Uma abordagem mais atual, a terapia experiencial (Greenberg). A terapia experiencial mantém a inspiração rogeriana centrada na pessoa, mas adota uma atitude mais diretiva e uma orientação cognitivo- construtivista. Psicoterapia centrada no cliente As características da psicoterapia centrada no cliente de Rogers são as seguintes: ✓ Confiança na capacidade da pessoa de dirigir a própria vida (saber o que a perturba, tomar decisões, etc.). Existe uma tendência inata à autorrealização, uma tendência ao amadurecimento, à expressão e à ativação de todas as capacidades do organismo; ✓ O crescimento de uma pessoa depende desta tendência inata à autorrealização e de um sistema de avaliação das experiências como positivas ou negativas dependendo se são ou não congruentes com a tendência anterior. (Autorrealização não significa egoísmo, pois dá valor aos outros.) Nesse processo de crescimento, que ocorre na interação com o meio ambiente, o conceito de si mesmo se desenvolve como diferenciado do mundo exterior; ✓ O sistema de avaliação das experiências depende de sentimentos diretos ou organísmicos (algo é diretamente valorizado como positivo ou negativo de acordo com o grau em que é congruente com a tendência à autorrealização). Mas, por outro lado, também depende do julgamento dos outros. Quanto maior for a autoconfiança da pessoa e quanto mais ela se aceitar, menos será influenciada pelas avaliações dos outros. Porém, as práticas educativas levam a pessoa a depender excessivamente dos julgamentos dos outros para agradá- los ou não os incomodar; ✓ A dependência de normas e valores sociais (condições de valor), que em última análise são internalizados, dificulta a auto-estima positiva e dificulta o crescimento pessoal, forçando alguém a pensar e agir de uma forma incongruente consigo mesmo. Criam-se assim atitudes de medo, ansiedade e insegurança e os próprios sentimentos e desejos são negados, distorcidos ou bloqueados. Por exemplo, um homem emotivo, mas criado segundo um padrão clássico de homens tão fortes e impassíveis, pode negar que chorar o faz sentir- se bem; além disso, sua afirmação de que chorar é fraco representa uma distorção de seus próprios sentimentos; 28 Raquel Espadinha 2023/2024 ✓ Os problemas psicológicos surgem da discrepância acentuada entre o que o organismo vivencia e o que é necessário para manter uma consideração positiva por si mesmo ou, em outras palavras, da incongruência entre o eu moldado pelos outros e o eu real. A psicoterapia centrada no cliente caracteriza-se por: Facilitar a autorrealização do cliente; Enfatizar o afetivo e não o intelectual; Acentuar a importância do presente; Considerar a relação terapêutica como uma experiência de crescimento. Os relatos do cliente são aceitos como válidos e confiáveis, independentemente do que pareçam ao terapeuta; O cliente não é interrompido, exceto para verificar ou ampliar uma ideia; ec) não são utilizadas interpretações, pois são consideradas muito diretivas e implicam que o terapeuta sabe mais sobre o cliente do que ele; Considera-se que na situação terapêutica em que o cliente é compreendido e aceite em vez de criticado, ele é livre para se ver sem defesas e para gradualmente reconhecer e admitir o seu verdadeiro eu, com os seus aspetos negativos, como positivos. Essa experiência na consciência de sentimentos até então reprimidos dá origem a uma sensação de mudança psicológica, a um novo estado de compreensão (à vista) e a alterações fisiológicas concomitantes. Além disso, desenvolve-se um sistema de avaliação que não tem de manter os padrões imbuídos de figuras de autoridade, que é capaz de se adaptar a diferentes circunstâncias, que diferencia entre o julgamento pessoal e o julgamento dos outros e que é capaz de tomar decisões diferentes das dos outros especialistas. Terapia de Gestalt Representado por autores como Fritz Perls, Laura Perls, Goodman, Simkin, Weisz e Hefferli, suas características são as seguintes: ✓ Cada pessoa tem uma tendência natural para completar a sua existência (para a autorrealização), para satisfazer as suas necessidades e desejos legítimos; ✓ Cada pessoa é responsável pelo seu comportamento; ✓ O aqui e agora é enfatizado. O objetivo é garantir que o cliente não se refugie no passado; ✓ O objetivo é que o cliente tome consciência de suas necessidades, emoções e demandas do ambiente (positivas e negativas), além de intelectualizações e interpretações. Na consciência o self é vivenciado como uma totalidade (não está dividido entre uma parte que observa e outra que é observada) e o cliente concentra-se espontaneamente no que lhe interessa e descobre coisas novas. Isto leva a uma libertação de tensão e a um aumento de energia que pode ser aplicada à experimentação de novos comportamentos, primeiro num ambiente seguro e depois em situações da vida quotidiana; ✓ A consciência da pessoa pode ficar distorcida ou incompleta ao tentar evitar o conflito entre as próprias necessidades e as exigências do ambiente. O paciente é visto como uma série de polaridades (mandão-submisso, sociável-retraído), de modo que tende a focar em um polo e evitar o outro. Para o pólo que produz medo por si mesmo ou por suas possíveis repercussões, constroem-se defesas e bloqueios. 29 Raquel Espadinha 2023/2024 Perls também se concentra nos mecanismos de defesa que se manifestam nas relações interpessoais. Assim, as pessoas que acham desconfortável experimentar e expressar diretamente certas necessidades (por exemplo, amor) podem desenvolver estratégias ou jogos manipulativos para satisfazer indiretamente essas necessidades. Dessa forma, pessoas cujas interações com outras pessoas são baseadas em infinitas doenças, medos, agressões ou inadequações forçam os outros a serem solícitos ou amorosos. Mas ao perceberem que estão sendo manipulados, podem acabar demonstrando rejeição a essas pessoas, obrigando-as, por exemplo, a procurar outra pessoa para brincar. Para piorar a situação, a consciência incompleta ou suprimida é muitas vezes acompanhada pela impressão de que não somos responsáveis pelos nossos próprios problemas. Assim, há uma tendência a culpar os outros (“se não fossem os meus filhos não teria problemas”), as circunstâncias ambientais (“não há homens interessantes neste país”) ou as forças internas que não podem ser influenciados (“Não consigo controlar minha raiva"). O objetivo fundamental da gestalt-terapia é restaurar o processo de crescimento do cliente. Para isso, são ajudados a tomar consciência dos próprios sentimentos, desejos e impulsos que foram negados, e a reconhecer os sentimentos, ideias e valores que consideram seus, mas que adotaram de outras pessoas. A conquista progressiva desta consciência torna mais fácil ao cliente assimilar ou apropriar-se dos aspetos ou polaridades de si mesmo que rejeitou e deixar de lado as características que realmente não lhe pertencem. A assimilação das próprias polaridades rejeitadas e a integração com os seus opostos, o que implica um reconhecimento de todas as partes do eu e a unidade dos comportamentos verbais e não-verbais, permitirá ao cliente assumir a responsabilidade por si mesmo como ele realmente é em vez de defender uma autoimagem parcialmente falsa e internamente conflituosa; Por exemplo, uma pessoa que se sente superior aos outros, mas que reprimiu esse sentimento e adotou um ar de humildade, será capaz de reconhecer e expressar os dois lados em conflito (“Eu sou o maior” versus “Eu não deveria mostrar"). Uma vez alcançado isso, será mais fácil para você encontrar uma maneira de resolver: “Não há problema em expressar meus sentimentos de competência, mas também preciso levar em consideração os sentimentos dos outros”. Assim, a resolução de conflitos exige total consciência de ambos os polos. As técnicas utilizadas pela Gestalt-terapia são: utilização do presente na comunicação verbal, apontando comportamento não verbal para que o cliente possa analisar seu significado, trabalhar com sonhos, técnica da cadeira vazia. Também são utilizadas técnicas de outras abordagens, como o psicodrama de Moreno ou o trabalho corporal da bioenergética. Duas psicoterapias atuais que foram notavelmente influenciadas pela Gestalt-terapia são a programação neurolinguística de Bandler e Grinder (1975) e a psicoterapia expressiva focada que Daldrup, Beutler, Greenberg e Engle (1988) apresentaram em forma manual. Aspetos negativos deste modelo ✓ As formulações teóricas são imprecisas e vagas, tornando muito difícil ou impossível testá-las. Além disso, com a principal exceção de Rogers, o método 30 Raquel Espadinha 2023/2024 científico é geralmente posto de lado ou rejeitado; isso pode ser devido à ênfase na subjetividade, já que a pesquisa controlada é considerada artificial; ✓ O comportamento humano é descrito, principalmente os aspetos subjetivos, mas, em geral, as variáveis que o controlam não são identificadas e/ou especificadas. Assim, diz-se que a tendência à autorrealização está na base do desenvolvimento comportamental, mas não é especificado em que consiste exatamente ou como atua para influenciar o comportamento. Também não é explicado quais variáveis são responsáveis pelas perceções subjetivas, perceções que são consideradas determinantes do comportamento; ✓ Centram-se na experiência consciente como determinante do comportamento humano e relegam muitos outros fatores (biológicos, situacionais, condições de aprendizagem, motivos inconscientes). Assim, a abordagem fenomenológica é insuficiente para explicar a complexidade do comportamento normal e anormal. Além disso, não enfatizar esses outros fatores pode levar a um tratamento menos eficaz; ✓ A razão está subordinada ao sentimento, o conhecimento é buscado através da experiência subjetiva e a análise racional é relegada. Isto pode tornar mais difícil encontrar uma solução para muitos problemas e aumentar a probabilidade de os efeitos terapêuticos seguidos serem temporários; ✓ Os tratamentos fenomenológicos, especialmente os baseados em relacionamentos, são vagos e irrealistas. Além disso, alguns questionaram se um terapeuta pode ser verdadeiramente empático, não-crítico e não-diretivo. É bem possível que o reforço sutil por parte do terapeuta (expressões faciais, olhares, atenção seletiva) e até mesmo a modelagem contribuam essencialmente para a obtenção da mudança pelos clientes; ✓ Existem poucos estudos controlados sobre a eficácia das terapias fenomenológicas. Em relação ao mais pesquisado, Rogers, é mais eficaz do que nenhum tratamento e parece que as condições de autenticidade, empatia e aceitação positiva incondicional são fatores importantes correlacionados com o sucesso da terapia, mas não parece que por si só sejam suficientes. As restantes terapias fenomenológicas dificilmente foram investigadas ou, quando o foram, o número de estudos é pequeno e a eficácia é relativamente baixa; ✓ Os critérios de sucesso terapêutico são definidos em termos de autorrealização, crescimento, autenticidade, etc. que são muito difíceis de operacionalizar. Além disso, muitos dos dados de tratamento tendem a basear-se principalmente em autorrelatos de fiabilidade e validade desconhecidas; 31 Raquel Espadinha 2023/2024 ✓ Dada a natureza introspetiva destes modelos, a sua aplicabilidade clínica limita- se às pessoas com nível intelectual e sociocultural suficiente para poderem realizar análises introspetivas. Suspeita-se que seu valor seja mínimo ou nulo com psicóticos, crianças, deficientes mentais e pessoas sob estresse intenso; ✓ Grupos de crescimento de curto prazo, baseados em métodos fenomenológicos e centrados nos sentimentos e na experiência e não na razão, podem ter efeitos negativos em até 8% dos participantes. Isto é mais provável em pessoas que já eram instáveis no início, indicando a importância de uma boa seleção de clientes. Síntese dos Modelos Teóricos em Psicologia Clínica Os Modelos Teóricos: ✓ São quadros teóricos de referência que suportam a prática clínica; ✓ Sustentam as intervenções, hipóteses de diagnóstico e compreensão clínica do caso; ✓ Orientadores da atitude do psicólogo e do setting. Psicoterapia de apoio (counseling) “Processo que visa restabelecer o equilíbrio psicológico do paciente, recorrendo a meios psicológicos e assente no conhecimento da ciência psicológica” O modelo teórico de referência determina o Setting: ✓ Tempo de duração da terapia; ✓ Frequência das sessões; ✓ Duração do tempo de sessão; ✓ Atitude do terapeuta; ✓ Técnicas mais recorrentes; ✓ “Clima emocional”; ✓ Forma de recolha de dados; ✓ Escolha dos instrumentos de avaliação. Modelo Psicanalítico / Psicodinâmico – premissas fundamentais Pioneiro: Sigmund Freud Séc.XIX Outros autores relevantes: Melanie Klein, Bion, Winnicott, Anna Freud, Adler, Jung, Erikson, António Coimbra de Matos Pilares: Os fenómenos inconscientes determinam o comportamento; A identificação e interpretação dos fenómenos intrapsíquicos resultam numa alteração dos sintomas e comportamentos desagradáveis; Atitude: o psicólogo não intervém diretamente, é um participante neutro com intuito de aprofundar o autoconhecimento do paciente tornando- o mais capaz de tomar as suas próprias decisões e transformar o seu sofrimento psíquico. Técnicas: 32 Raquel Espadinha 2023/2024 Associação livre: falar livre e espontaneamente com o psicólogo sobre o quer que seja que venha à ideia; Interpretação do material inconsciente (sonhos, atos falhados); Mecanismos de Defesa (recalcamento, deslocamento, negação); Transferência: direcionar os sentimentos sobre alguém familiar para o psicólogo e contratransferência: sentimentos do psicólogo com impacto na relação terapêutica. Modelo Humanista / Fenomenológico Existencial – premissas fundamentais Principais autores: Carl Rogers, Abraham Maslow, Yalom, Victor Frankl Pilares: Existir: confronto inevitável com a consciência: da morte, da solidão, da liberdade, da falta de sentido; Os problemas não são causados pelos eventos de vida em si, mas pela forma como os experimentamos: esta vivência determina o sentimento e equilíbrio da pessoa → consciente subjetivo; Aceitação incondicional → a pessoa, vista como autónoma e responsável, é digna de confiança. Atitude e Técnicas: Relação simétrica; O psicólogo clínico não sugere, não interpreta nem aconselha, encoraja a explorar os pensamentos para encontrar as soluções autonomamente “aqui-e- agora”; Congruência/autenticidade: coerência ou acordo interno → aceitar os sentimentos, experiências, ser genuíno e integrado na relação com o outro (terapeuta e cliente); Encorajar e empoderar: aumentar o poder pessoal do cliente, as suas possibilidades de escolha e de mudança, para que se atinja a liberdade e plenitude; Técnica chave: autorrevelação, empatia, clarificação, escuta ativa, reflexão. Modelo Cognitivo-comportamental – premissas fundamentais Principais autores: Pavlov, Watson, Skinner, Aaron Beck, Albert Ellis Pilares: Articula conceptualizações desenvolvidas pela corrente cognitiva e pela corrente comportamental: influência dos fatores cognitivos e leis gerais do comportamento; Inspira-se nas teorias da aprendizagem e tenta aplicar o método experimental ao domínio da intervenção; Desequilíbrio psicológico tem por base fatores comportamentais, cognitivos, afetivos e fisiológicos. 33 Raquel Espadinha 2023/2024 Atitude e Técnicas: Condicionamento operante: as mudanças das condições do ambiente podem alterar os comportamentos; Identificação e correção de padrões de pensamento, crenças e comportamentos negativos e irracionais; aprendizagem de padrões mais saudáveis e eficazes; Técnica chave: restruturação cognitiva, reforço positivo e reforço negativo, psicoeducação, questionamento socrático, dessensibilização sistemática, técnicas de visualização e relaxamento. Modelo Sistémico Principais autores: Bateson, Watzlawick, Bowen, Minuchin, Whitaker, White, Maturana, Pilares: Visões: teoria geral dos sistemas, teoria da comunicação, cibernética e antropologia; Um sistema — família, casal ou grupo social — integra um ou mais elementos ligados entre si, sendo que uma mudança no sistema tem impacto nos seus elementos, e uma mudança num elemento tem impacto sistema; Axiomas da comunicação→ ferramenta que permite clarificar e descodificar a intenção das mensagens entre os elementos; Conceito de circularidade: linha-guia da metodologia da abordagem sistémica → sistema de relações recíprocas entre o terapeuta e a família. Atitude e Técnicas: O psicólogo olha para a pessoa como um todo inserido num sistema de relações interpessoais; Co constrói com a

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