Summary

This document appears to be a course outline or study guide on disaster law in Brazil. It covers various aspects, including the definition and impact of disasters in Brazil, related legal policies, and international perspectives. It also outlines the structure and goals of the course.

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DIREITO DOS DESASTRES ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO E OBJETIVO DO CURSO...........................................................................3 2. AFINAL, O QUE SÃO DESASTRES?.......................................................

DIREITO DOS DESASTRES ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO E OBJETIVO DO CURSO...........................................................................3 2. AFINAL, O QUE SÃO DESASTRES?..................................................................................4 3. IMPACTO DOS DESASTRES NO BRASIL E A INCAPACIDADE DO CENÁRIO JURÍDI- CO HERMÉTICO.........................................................................................................................6 4. DIREITO DOS DESASTRES................................................................................................8 5. CICLO DOS DESASTRES..................................................................................................10 6. POLÍTICA NACIONAL DE PROTEÇÃO E DEFESA CIVIL (PNPDEC) - PARTE 1........12 Diretrizes da PNPDEC........................................................................................................................................................12 Deveres dos entes federados.........................................................................................................................................12 7. POLÍTICA NACIONAL DE PROTEÇÃO E DEFESA CIVIL (PNPDEC) - PARTE 2........14 Municípios.............................................................................................................................................................................. 14 Deveres compartilhados entre os entes federados............................................................................................. 14 Crítica à Lei Federal n° 12.608/2012............................................................................................................................ 14 8. DEMAIS LEGISLAÇÕES FEDERAIS................................................................................15 9. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO EM CASO DE DESASTRES SOCIOAM- BIENTAIS..................................................................................................................................16 10. DESASTRES, PROCESSO CIVIL E LITÍGIOS ESTRUTURAIS.................................... 17 Litígio estrutural....................................................................................................................................................................17 Críticas à tutela judicial......................................................................................................................................................17 11. PANORAMA ESTRANGEIRO E INTERNACIONAL.......................................................18 Evolução da atuação da ONU acerca de desastres socioambientais.......................................................... 18 UNDRR..................................................................................................................................................................................... 19 1. Introdução e objetivo do curso Trilheiro e Trilheira, quantas vezes você já viu relatos em jornais sobre deslizamentos de terra, enchentes, rompimentos de barragens e outros eventos que promoveram danos humanos, sociais, econômicos e ambientais? Pois é, cada dia mais é comum ouvirmos e falarmos sobre desastres, suas causas e consequências. Dada a importância do tema, o Trilhante preparou este Curso de Direito dos Desastres, de modo a compreendermos melhor esses eventos catastróficos que nos afetam e, principalmente, qual a relação do Direito com esse cenário. Nesse sentido, o Curso de Direito dos Desastres visa: Compreender o que são desastres e o papel do Direito nas ações de prevenção e preparação a esses eventos, mitigação dos danos causados, acompanhamento das vítimas e recuperação e recomposição dos ambientes afetados. Para tanto, abordaremos no decorrer das aulas os seguintes conteúdos: Conceituação de desastres; Impacto dos desastres no Brasil e a incapacidade do cenário jurídico hermético; Principais aspectos do Direito dos Desastres e seus princípios; Ciclo dos Desastres; Política Nacional de Proteção e Defesa Civil; Demais legislações atinentes à Proteção e Defesa Civil no âmbito federal; Responsabilidade civil do Estado em casos de desastres; Processo Civil e Tutelas estruturais; Panorama estrangeiro e internacional do Direito dos Desastres. 3 2. Afinal, o que são desastres? Afinal, o que são desastres? Não existe uma resposta pronta para essa pergunta, pois a compreensão de “desastre” varia consoante os parâmetros utilizados para analisar o evento e com a subjetividade de cada um dos afetados e observadores do caso. Ao longo da história, diferentes compreensões sobre o que é um desastre e seu(s) significado(s) existiram. Por muito tempo e para muitas religiões, um desastre era um Ato de Deus(es) criado para punir ou ensinar uma população. Com o passar do tempo e com a internalização e naturalização dos riscos, típica de uma sociedade (pós-)industrial, os desastres passaram a ser vistos como eventos naturais e/ou humanos que ensejam danos humanos, sociais, culturais, econômicos e ambientais. Sem prejuízo de demais debates sobre o tema, cumpre trazer duas compreensões do que são desastres na atualidade. Segundo o Escritório da Organização das Nações Unidas para Prevenção e Risco de Desastres (UNDRR, na sigla em inglês), desastres são considerados: Uma interrupção grave do funcionamento de uma comunidade ou sociedade em qualquer escala devido a eventos perigosos que interagem com condições de exposição, vulnerabilidade e capacidade, levando a um ou mais dos seguintes: perdas e impactos humanos, materiais, econômicos e ambientais. Já o Decreto Federal n° 10.593/2020, que dispõe sobre a organização e funcionamento do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil e dá outras providências, considera desastre como (art. 2°, VII): Art.2º. [...] VII. Resultado de evento adverso decorrente de ação natural ou antrópica sobre cenário vulnerável que cause danos humanos, materiais ou ambientais e prejuízos econômicos e sociais; Em ambas as compreensões, depreende-se que o conceito de desastre está pautado na (i) exposição ao risco, (ii) vulnerabilidade e (iii) multiplicidade de danos. Como o presente curso discute o âmbito jurídico dos desastres, a definição dada pelo Decreto Federal n° 10.593/2020 guiará as nossas observações, sem se desconsiderar as demais compreensões aplicadas a esse evento em outras ciências e ordenamentos jurídicos estrangeiros. Em função de todos os diversos elementos que o compõem, um desastre deve ser visto a partir de sua complexidade - o que é um desafio para o Direito formalista. Por conta dessa complexidade, multiplicidade de danos e diversos atores presentes no evento, cumpre indicar a adoção da expressão “desastre socioambiental”, em detrimento da expressão “desastre 4 natural”, que pode emitir a ideia de que um desastre é um evento “natural” e que, portanto, não poderia ser evitado ou combatido. 5 3. Impacto dos desastres no Brasil e a incapacidade do cenário jurídico hermético Para muitas pessoas, desastres ainda são vistos como “eventos imprevisíveis e incontroláveis”, ou mesmo atos de Deus(es) para “castigar” ou “ensinar” uma comunidade. Essa lógica, embora não seja mais aceita do ponto de vista científico, é recorrentemente utilizada por gestores públicos para justificar eventos catastróficos ocorridos em determinados locais. Utilizando a desculpa de que não se poderia evitar um deslizamento de terra ou uma forte enchente, tenta-se excluir a responsabilização nesses casos, beneficiando aquele gestor público que não adotou as atividades cabíveis para evitar o desastre. Todavia, falar sobre desastres no Brasil é enfrentar uma triste realidade: muitas famílias perdem entes queridos, recursos financeiros, moradias e saúde mental por conta de eventos catastróficos todos os anos. Segundo dados do Banco Mundial (2012) os fortes deslizamentos de terra na Região Serrana do Rio de Janeiro deixaram mais de novecentos mortos, trezentas mil pessoas diretamente afetadas e perdas e danos estimados em quatro bilhões setecentos e oitenta milhões de reais. Já o rompimento da Barragem de Fundão (Mariana/MG) gerou danos à infraestrutura e prejuízos em duzentos e cinquenta milhões de reais somente na escala microrregional, conforme dados do relatório produzido pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional, Política Urbana e Gestão Metropolitana de Minas Gerais (2016). Por sua vez, o Atlas da Mortalidade e das Perdas Econômicas devido ao Clima (1970-2019), desenvolvido pela Organização Meteorológica Mundial (2021) nos informa entre os anos analisados no relatório, ocorreram 867 desastres, 57.982 mortes e U$100.900.000.000,00 em perdas econômicas apenas na América do Sul, sendo que de todos esses eventos, 59% dos desastres na América do Sul decorreram de inundações. Observada a magnitude da questão, é importante comentar que os desastres possuem a característica da multiplicidade de danos, ou seja, desastres geram no curto, médio e longo prazo: Danos à qualidade de vida; Danos patrimoniais; Danos ambientais; Danos psicológicos; Danos culturais, dentre outros Inclusive, danos podem ocorrer mesmo antes do evento catastrófico em si, pois o risco, preocupação e mesmo necessidade de realocação de comunidades com possibilidade 6 significativa de serem atingidas por eventuais desastres já pode ser considerado um dano a essas pessoas. Mas como o Direito pode enfrentar esse problema? De plano, é importante notar a insuficiência de apenas um “ramo” do Direito. Os desastres socioambientais relacionam-se com o Direito Administrativo, Ambiental, Civil, Internacional, Urbanístico, Sociologia do Direito, etc. Ou seja, é importante que exista uma visão sistêmica e integrada na relação entre o Direito e o desastre. Daí surge o Direito dos Desastres como um ramo jurídico para compreender o caráter multifacetado que caracteriza o desastre e reagir à complexidade do referido evento. 7 4. Direito dos desastres O Direito dos Desastres surge como resposta à complexidade dos desastres socioambientais. O(a) jurista precisa ter uma visão abrangente sobre os impactos jurídicos causados pelo Desastre em todo o ordenamento jurídico, desde questões estritamente vinculadas à prevenção, relacionadas ao Direito Administrativo, Ambiental e Urbanístico, por exemplo, até as fases de recuperação e reabilitação das comunidades atingidas, demandados, além dos ramos jurídicos já referidos, questões securitárias, de responsabilidade civil, etc. Nota-se, portanto, que o Direito dos Desastres acompanha as fases de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação voltadas à proteção e defesa civil. Também, o Direito dos Desastres envolve um caráter interdisciplinar e multidisciplinar, para dentro e fora do Direito, devendo dialogar com outras áreas da ciência, tais como Geografia, Ecologia e Urbanismo. E quais são os princípios do Direito dos Desastres? Não existe exatamente um rol definido de princípios para o Direito dos Desastres, existindo certa variação de acordo com os(as) pesquisadores(as) da área. Mas, em suma, os princípios que costumam aparecer nos textos sobre o tema são os seguintes: Precaução; Prevenção stricto sensu; Proporcionalidade; Informação; Provisoriedade das Decisões ou Adaptabilidade; Participação; Supervisão. Alguns desses princípios são familiares aos estudantes de Direito Ambiental, sobretudo quanto aos princípios da precaução e prevenção stricto sensu. O Princípio da Proporcionalidade vincula-se à noção de que as ações jurídicas e administrativas em todas as fases do ciclo de desastres devem se vincular entre os riscos, vulnerabilidades e danos do evento catastrófico com as medidas a serem adotadas. Ou seja, deve haver uma relação de proporcionalidade entre risco, vulnerabilidade, potencial de dano ou dano e a medida a ser executada em cada caso. O Princípio da Informação deve ser visto em dois planos: (i) transmissão de informações à população vulnerável ao desastre sobre os riscos do evento e as formas de preveni-lo, mitigá-lo e/ou o que fazer durante o desastre em si, e (ii) produção de informações sobre os riscos, vulnerabilidades e o próprio desastre em si. O Princípio da Provisoriedade das Decisões ou Adaptabilidade determina que as ações adotadas durante o ciclo do desastre devem ser adaptadas de acordo com as novas 8 informações sobre o tema e o ocorrido. No processo civil, por exemplo, pode ser que uma tutela provisória deferida pelo magistrado deva ser revista conforme novos dados demonstram que ela é insuficiente ou mesmo excessiva. O Princípio da Participação, muito vinculado ao Direito Urbanístico, determina que as decisões que envolvam o ciclo de desastres, na medida do possível, devem ser permeadas de participação popular. Por exemplo, não há como se pensar em um Plano de Ação em Desastres em um Município sem que a população diretamente vulnerável ao evento não seja ouvida e que não possa indicar ações a serem adotadas durante o evento e mesmo na própria elaboração do plano. O Princípio da Supervisão deve existir uma cadeia de comando preestabelecida para as ações das fases emergenciais do ciclo de desastre, de modo que durante os momentos mais urgentes, não ocorram confusões nas decisões técnicas/administrativas - o que poderia causar desencontros, atrasos e, por consequência, agravamento dos danos. 9 5. Ciclo dos desastres Ciclo dos Desastres é uma forma de compreender as “fases” que um desastre possui, desde os elementos de prevenção ao evento ou aos riscos e vulnerabilidades que podem impactar no evento catastrófico, como nas ações a serem tomadas durante o desastre e após a sua ocorrência. Há certa variação entre a nomenclatura das fases, inclusive com determinadas etapas vinculadas diretamente a outras. De todo modo, em síntese, podemos apresentar as seguintes fases do Ciclo dos desastres: Ações de prevenção - medidas prioritárias destinadas a evitar a conversão de risco em desastre ou a instalação de vulnerabilidades; Ações de mitigação - medidas destinadas a reduzir, limitar ou evitar o risco de desastre; Ações de preparação - medidas destinadas a otimizar as ações de resposta e minimizar os da- nos e as perdas decorrentes do desastre; Ações de resposta - medidas de caráter emergencial, executadas durante ou após a ocorrência do desastre, destinadas a socorrer e assistir a população atingida e restabelecer os serviços essen- ciais; Ações de restabelecimento - medidas de caráter emergencial destinadas a restabelecer as condições de segurança e habitabilidade e os serviços essenciais à população na área atingida pelo desastre; Ações de recuperação - medidas desenvolvidas após a ocorrência do desastre destinadas a res- tabelecer a normalidade social que abrangem a reconstrução de infraestrutura danificada ou destruí- da e a recuperação do meio ambiente e da economia; Ações de reconstrução - medidas desenvolvidas para a reconstrução das comunidades atin- gidas, objetivando que as novas construções, infraestruturas e semelhantes sejam feitas de forma mais segura que a anterior; Ações de reabilitação - medidas desenvolvidas para reabilitar as populações atingidas e serviços públicos e privados impactados pelo desastre. A imagem abaixo representa as informações trazidas nesta aula: 10 ​ Fonte da imagem: Sedec - Disponível em: https://www.gov.br/mdr/pt-br/assuntos/protecao- e-defesa-civil/sinpdec/como-se-organiza. 11 6. Política nacional de proteção e defesa civil (PNPDEC) - Parte 1 A Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNPDEC) foi instituída pela Lei Federal n° 12.608/2012, abrangendo as ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação voltadas à proteção e defesa civil. A PNPDEC deve integrar-se às políticas de ordenamento territorial, desenvolvimento urbano, saúde, meio ambiente, mudanças climáticas, gestão de recursos hídricos, geologia, infraestrutura, educação, ciência e tecnologia e às demais políticas setoriais, tendo em vista a promoção do desenvolvimento sustentável. Inclusive, a Lei n.° 12.608/2012 modificou o Estatuto da Cidade, a Lei nº 12.340/2010, a Lei nº 6.766/1979, dentre outras. Diretrizes da PNPDEC Atuação articulada entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios para redução de desastres e apoio às comunidades atingidas; Abordagem sistêmica das ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação; Prioridade às ações preventivas relacionadas à minimização de desastres; Adoção da bacia hidrográfica como unidade de análise das ações de prevenção de desastres relacionados a corpos d’água; Planejamento com base em pesquisas e estudos sobre áreas de risco e incidência de desastres no território nacional; Participação da sociedade civil. Deveres dos entes federados Em síntese, os principais deveres dos entes federativos concentram-se em: UNIÃO Expedir normas para implementação e execução da PNPDEC; Promover estudos referentes às causas, possibilidades de incidência, extensão e consequência de desastres; Apoiar Estados, Distrito Federal e os Municípios; Instituir e manter sistema de informações e monitoramento; Instituir e manter cadastro nacional de municípios em áreas de risco. ESTADOS Executar a PNPDEC em seu âmbito territorial; 12 Instituir Plano Estadual de Proteção e Defesa Civil; Em articulação com a União e os Municípios: Identificar e mapear áreas de risco; Realizar monitoramento meteorológico, hidrológico e geológico das áreas de risco. 13 7. Política nacional de proteção e defesa civil (PNPDEC) - Parte 2 Municípios Aos municípios, em regra, ficaram os deveres mais específicos e localizados: Executar a PNPDEC em âmbito local; Incorporar as ações de proteção e defesa civil no planejamento municipal; Identificar e mapear as áreas de risco de desastres; Promover a fiscalização das áreas de risco de desastre Vedar novas ocupações nessas áreas; Vistoriar edificações e áreas de risco e promover, quando for o caso, Manter a população informada sobre áreas de risco e ocorrência de eventos extremos, bem como sobre protocolos de prevenção e alerta e sobre as ações emergenciais em circunstâncias de desas- tres; Realizar regularmente exercícios simulados, conforme Plano de Contingência de Proteção e Defe- sa Civil; Manter a União e o Estado informados sobre a ocorrência de desastres e as atividades de proteção civil no Município; Todavia, existe a dúvida sobre a possibilidade de os municípios conseguirem cumprir todos os deveres previstos na legislação. Deveres compartilhados entre os entes federados Desenvolver cultura nacional de prevenção de desastres; Estimular a reorganização do setor produtivo e a reestruturação econômica das áreas atingidas por desastres; Estabelecer medidas preventivas de segurança contra desastres em escolas e hospitais situados em áreas de risco; Oferecer capacitação de recursos humanos para as ações de proteção e defesa civil; e Fornecer dados e informações para o sistema nacional de informações e monitoramento de de- sastres. Crítica à Lei Federal n° 12.608/2012 Texto programático; Demora para sua complementação; Demora para a instituição do “cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos”. 14 8. Demais legislações federais O Direito dos Desastres, enquanto ramo jurídico, é dotado de diferentes fontes legislativas. Para além da Lei Federal n° 12.608/2012, existem outras normativas federais que tratam no todo ou em parte acerca da gestão de riscos e de desastres. Dentre elas, cabe citar: Lei Federal n° 10.257/2001 (Estatuto da Cidade); Lei Federal n° 13.089/2015 (Estatuto da Metrópole); Lei Federal n° 13.465/2017 (REURB); Lei Federal n° 6.766/1979 (Parcelamento do solo urbano); Lei Federal n° 12.340/2010 (Transferência de recursos); Lei Federal n° 12.334/2010 (Política Nacional de Segurança de Barragens); Decreto Federal n° 10.593/2020 (Organização do Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil); Decreto Federal nº 10.692/2021 (Cadastro Nacional dos Municípios em áreas de risco) Conforme visto em aula, parte dessas leis envolvem questões ligadas ao uso e ocupação do solo urbano e as medidas para prevenir a ocorrência de riscos, vulnerabilidades e ocorrência de desastres nesse caso, enquanto outra parte institui políticas e planos próprios para outro(s) tipos de desastres ou lógicas de atuação. 15 9. Responsabilidade civil do estado em caso de desastres socioambientais A responsabilidade civil do Estado em casos de desastres socioambientais é tratada por diversas teorias jurídicas. Normalmente, a responsabilização em casos de desastres se fundamenta pela omissão do ente público na prevenção do evento ou na mitigação dos riscos e danos gerados. Nesse sentido, o debate acerca da responsabilidade objetiva ou responsabilidade subjetiva perde força, já que, na doutrina majoritária, a responsabilidade, nesses casos, fundamenta- se na vertente subjetiva, admitindo-se, via de regra, a aplicação de excludentes de responsabilidade, tal como o caso fortuito e a força maior. Mas, como avaliar caso fortuito e força maior? Desconhecimento: o evento era previsto? Se sim, o ente público tomou medidas adequadas para enfrentá-lo (em todas as fases do ciclo dos desastres?). Se não, deveria ou poderia procurar saber dos riscos de ocorrência desse evento? (In)capacidade financeira: o ente público possuía recursos para evitar enfrentar o desastre em todas as fases de seu ciclo? (In)capacidade técnica: o ente público possuía capacidade técnica para evitar enfrentar o desastre em todas as fases de seu ciclo? Outros elementos para compreensão da responsabilidade civil por omissão: Princípio da Reserva do Possível. Responsabilidade compartilhada com outros entes federativos e com pessoas jurídicas de direito privado. 16 10. Desastres, processo civil e litígios estruturais Processos judiciais envolvendo desastres costumam ter: Complexidade e multiplicidade de causa; Falhas estruturais em políticas públicas; Multiplicidade de sujeitos, danos e direitos; Dificuldade em precisar os danos; Natureza coletiva. Litígio estrutural Um litígio estrutural é um tipo de litígio que busca mudar as estruturas sociais, econômicas ou políticas que causam ou perpetuam a injustiça. Ao contrário de outros tipos de litígios que, geralmente, visam resolver um conflito específico ou reivindicar uma compensação financeira para uma pessoa ou grupo de pessoas, os litígios estruturais visam abordar questões sistêmicas mais amplas que afetam muitas pessoas ou grupos marginalizados. Os litígios estruturais podem ser usados para desafiar leis ou políticas que discriminam determinados grupos ou impedem o acesso igualitário a oportunidades econômicas ou educacionais. Eles também podem ser usados para abordar desigualdades sociais mais amplas, como a falta de moradia, pobreza ou falta de acesso a serviços básicos de saúde. Assim, muitas vezes, os litígios estruturais exigem um longo processo judicial, com diversos recursos, e podem levar anos para serem resolvidos. No entanto, eles podem ter um impacto duradouro e significativo na sociedade, mudando as estruturas que perpetuam a injustiça e criando oportunidades para as pessoas mais marginalizadas. Dada a complexidade do processo envolvendo desastre socioambiental, cumpre pensar em novas técnicas decisórias, pois o tempo do processo judicial é diferente do tempo do desastre. Críticas à tutela judicial O Judiciário pode determinar Políticas Públicas? Há capacidade institucional para acompanhar as decisões exaradas? Haverá segurança jurídica aos atingidos? A “justiça possível” (rough justice) é segura aos atingidos? Há assessoria técnica independente suficiente para os atingidos? Qual a legitimidade e segurança para realização de negócios jurídicos processuais? 17 11. Panorama estrangeiro e internacional O Direito dos Desastres no âmbito estrangeiro e internacional também se faz presente. Em necessária síntese, é importante destacar que os EUA, a Colômbia e a União Europeia são exemplos de países/bloco econômico-político com normativas avançadas acerca da gestão de riscos e de desastres. Os EUA, inclusive, desenvolveram a fortemente questão securitária de desastres, sobretudo quanto aos danos causados no seu agronegócio por esses eventos. Evolução da atuação da ONU acerca de desastres socioambientais Desde a sua criação, a Organização das Nações Unidas trabalha em colaboração com os países membros para reduzir os riscos de desastres e responder efetivamente quando ocorrem. Inclusive, a ONU estabeleceu o Escritório das Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres (UNDRR), que promove uma abordagem coordenada para prevenir e responder a desastres em todo o mundo. A ONU também criou várias agências especializadas, como o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), que trabalham em estreita colaboração com os governos e organizações locais para enfrentar os desafios de desastres em diferentes contextos. Além disso, a Organização das Nações Unidas tem um papel importante na coordenação de esforços internacionais de resposta a desastres, incluindo a mobilização de recursos e o fornecimento de assistência humanitária. Ela também promove a construção de resiliência para desastres em nível comunitário e nacional, trabalhando em parceria com organizações locais e governos para fortalecer as capacidades de resposta e recuperação em caso de desastres. Ao longo de sua história, a Assembleia Geral da ONU promoveu diversas resoluções (não- vinculantes) que, em maior e menor grau de complexidade e objetivo, incentivaram medidas positivas acerca de desastres socioambientais. Eis as listas das principais: 1. Resolução n° 2034, ano de 1965 2. Resolução n° 2717, ano de 1970 3. Resolução n° 2816, ano de 1971 4. Resoluções nº 3345/1974, 33/22/1978, 34/55/1979 e 36/225/1981 5. Resolução n° 42/169, ano de 1987 6. Resolução n° 54/219, ano de 1999 7. Resolução n° 56/195, ano de 2001 18 UNDRR Em maio de 2019, a United Nations International Strategy for Disaster Reduction (UNISDR) passou a ser reconhecida como United Nations Office for Disaster Risk Reduction (UNDRR). Tal escritório da ONU, desde a sua fundação, preocupou-se em produzir planos de ação para incentivar os países-membros a adotarem ações adequadas e orientadas em prol da redução de riscos, desastres e danos. O plano de ação mais recente é o Plano de Sendai (2015/2030), que propõe sete metas globais para serem cumpridas até 2030: Reduzir substancialmente a mortalidade global por desastres até 2030; Reduzir substancialmente o número de pessoas afetadas em todo o mundo até 2030; Reduzir a perda econômica direta por desastres em relação ao produto interno bruto (PIB) global até 2030; Reduzir substancialmente os danos causados por desastres à infraestrutura crítica e a interrupção dos serviços básicos, entre eles instalações de saúde e educacionais, inclusive por meio do desenvol- vimento de sua resiliência até 2030; Aumentar substancialmente o número de países com estratégias nacionais e locais de redução de riscos de desastres até 2020; Melhorar substancialmente a cooperação internacional para os países em desenvolvimento por meio de apoio adequado e sustentável; Aumentar substancialmente a disponibilidade e o acesso a sistemas de alerta rápido multirrisco e informações e avaliações de risco de desastres para pessoas até 2030. 19 Direito dos Desastres

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