Sebenta DUE I - Direito da União Europeia I - 2017/2018 PDF

Document Details

Uploaded by Deleted User

2018

Jónatas E.M. Machado

Tags

European Union Law EU treaties European integration History of the EU

Summary

These notes, from 2017/2018, cover the history of European integration, focusing on the founding treaties and subsequent reforms. The content discusses the creation of the European Communities, including the Treaty of Paris and the Treaty of Rome, detailing the establishment of the European Coal and Steel Community (ECSC) and the European Economic Community (EEC), respectively. The document also explores subsequent developments and treaties that shaped the EU.

Full Transcript

DUE I 2017/2018 DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA I Jónatas E.M. Machado, Direito da União Europeia, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 2014; CAPÍ...

DUE I 2017/2018 DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA I Jónatas E.M. Machado, Direito da União Europeia, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 2014; CAPÍTULO I - HISTÓRIA DA INTEGRAÇÃO EUROPEIA 1. A CRIAÇÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS No fim da II Guerra Mundial, o problema da reconstrução, estabilização e defesa da Europa colocou-se com especial acuidade. É a tentativa de construir um futuro harmonioso e pacífico que está na base do projeto da unidade europeia; Para o efeito, a paz e a cooperação entre a Alemanha e a França eram vistos por todos como condições essenciais para a estabilidade da Europa. Isso foi claro para Winston Churchill quando este, no seu discurso de Zurique de 1946 defendeu a edificação de uns Estados Unidos da Europa. Este discurso acabou por conduzir ao surgimento do Conselho da Europa, em 1949, uma organização internacional de vocação pan-europeia, tendo tido, também, uma influência decisiva na construção das comunidades europeias. Em 9 de maio de 1950, Robert Schuman, primeiro-ministro francês, avança com a ideia de construção de uma comunidade europeia, que, através de realizações concretas e pacíficas, conseguisse aprofundar a solidariedade de facto entre os povos europeus com base num acervo de valores cristãos, personalistas, sociais e democratas, assentes nos ideais de paz, reconciliação e justiça social, capazes de fazer frente aos vários totalitarismos, de base fascista, comunista e capitalista. Como objetivos fundamentais, a nova entidade europeia tinha:  A redução do risco de guerra entre a França e a Alemanha;  A consolidação da democracia e do Estado de direito;  A reconstrução económica da Europa dilacerada pela guerra;  O reforço do poder político e económico em face dos Estados Unidos, da Rússia, da China e do Japão. 1 DUE I 2017/2018 Entendia-se que uma abordagem regional e centralizada destes problemas possibilitaria economias de escala e uma maior eficiência, desse modo contribuindo para legitimar, junto dos cidadãos, as instituições e as normas comunitárias. 1.1. OS TRATADOS FUNDADORES Os tratados fundadores das comunidades constituem instrumentos convencionais multilaterais de direito internacional, do ponto de vista, tanto da respetiva validade, como do procedimento de negociação, ajuste, aprovação e ratificação. 1.1.1. O TRATADO DE PARIS O projeto europeu assentou em dois tratados fundadores. O primeiro, proposto por Robert Schuman e Jean Monet, foi o tratado de Paris, de 18 de abril de 1951, em vigor desde 23 de julho de 1952, através do qual se instituiu a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), tendo como contratantes a França, a R.F.A., a Itália, a Bélgica, a Holanda e o Luxemburgo; Tratava-se de um importante fator de estabilização da Europa do Pós-guerra, se se pensar na importância que o carvão e o aço assumem num conflito militar. O Relevo económico destas matérias primas também era um fator essencial. A colocação das mesmas sob o controlo de uma autoridade independente e supranacional tornaria a guerra mais difícil e contribuiria para um desenvolvimento económico mais harmonioso. Assim, a CECA caracterizava-se pela sua supranacionalidade e federalismo funcional, prevendo a existência de uma Alta Autoridade. O tratado de Paris foi celebrado por 50 anos, tendo caducado a 23 de julho de 2002. A partir dessa data, a regulação do carvão e do aço reconduz-se ao sistema mais amplo do Tratado de Roma. 2 DUE I 2017/2018 1.1.2. O TRATADO DE ROMA O tratado de Roma, de 25 de março de 1957, instituiu a Comunidade Económica Europeia (CEE), uma OI com características inovadoras. Previa-se aí um processo de integração por fases, começando na criação de uma união aduaneira e progredindo para o estabelecimento de um mercado único, assente na livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais e no direito de estabelecimento; Seguir-se-ia uma fase posterior de união económica e monetária. Dessa forma pretendia-se o desenvolvimento harmonioso e equilibrado das atividades económicas na comunidade; A edificação de uma união política permanecia como objetivo longínquo, sendo também afastada a constituição de uma comunidade europeia de defesa. O mesmo Tratado procedeu à criação da Comunidade Europeia da Energia atómica (CEEA), criada no rescaldo de Hiroshima e Nagasaki e no pressuposto da generalização da energia nuclear como base do desenvolvimento económico; Numa convenção anexa estabeleceu-se, ainda, o Tribunal de justiça (TJCE) e o Parlamento europeu, como órgãos comuns às três comunidades, e o Comité Económico e Social, como órgão comum da CEE e da CEEA. Pela via do Tratado de 8 de Abril de 1965 (tratado de fusão), procede-se à fusão de executivos, através de um Conselho e uma Comissão comuns às comunidades, e cria-se um estatuto único para os funcionários e agentes da Comunidade. Igualmente importante é o estabelecimento de um princípio de unificação orçamental, com raras exceções – A esta fusão dá-se o nome de «Quadro institucional único». CECA CEE EURATOM COMUNIDADE COMUNIDADE COMUNIDADE EUROPEIA DO ECONÓMICA EUROPEIA DA CARVÃO E O AÇO EUROPEIA ENERGIA ATÓMICA COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS CONSELHO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS PARLAMENTO EUROPEU 3 DUE I 2017/2018 O Tratado de Roma foi celebrado com uma duração ilimitada, sem previsão da retirada de Estados. Relativamente à revisão, estabeleceu-se que a mesma pode ocorrer, sob parecer favorável do Conselho e após consulta ao Parlamento, através de uma conferência Intergovernamental e subsequente ratificação pelos Estados, num processo típico do Direito internacional dos Tratados. 1.1.3. REFORMAS POSTERIORES Os referidos tratados constituíram apenas o ponto de partida da Comunidade Europeia. A evolução posterior assenta, basicamente, em dois aspetos fundamentais: aperfeiçoamento institucional e alargamento. Quanto ao primeiro aspeto, destacam-se a ativação de um sistema de financiamento com base em recursos próprios, o estabelecimento do sistema de cooperação política, a instituição do Tribunal de Contas e a consagração do sufrágio universal direto para o parlamento europeu; Quanto ao segundo aspeto, importa ter em conta que a comunidade europeia cresceu muito para além dos Estados fundadores da CEE que foram a França, a RFA, a Itália, a Bélgica, a Holanda e o Luxemburgo. Desde então tiveram lugar vários alargamentos:  O primeiro ocorreu em 1973, com a adesão da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido;  O segundo teve lugar em 1981, com a adesão da Grécia;  O terceiro verificou-se em 1986, com a adesão de Portugal e Espanha;  O quarto alargamento aconteceu em 1995, com a adesão a Áustria, a Finlândia e a Suécia;  Um quinto alargamento ocorreu em 2004, com a adesão da República Checa, da República Eslovaca, da Estónia, da Letónia, Lituânia, Hungria, Polónia, Eslovénia, Chipre e Malta.  Um sexto alargamento ocorreu em 2007, com a adesão da Bulgária e da Roménia;  O sétimo alargamento ocorreu em 2013, com a adesão da Croácia. 4 DUE I 2017/2018 A RETIRADA DO REINO UNIDO Desde o Tratado de Lisboa que se prevê um procedimento para a retirada de um Estado- Membro – Art. 50.º TUE Na sequência de um referendo, o Reino Unido decidiu retirar-se da UE. O Tratado prevê um procedimento de retirada: 1. O Estado-Membro em causa notifica a sua intenção ao Conselho Europeu; 2. Há uma negociação entre a União Europeia e esse Estado para celebrar um Tratado de Retirada, que discipline as futuras relações entre a EU e o Estado em causa é a data da saída; 3. Na falta de acordo, o Estado retira-se da EU dois anos após a notificação. 1.1.4. ATO ÚNICO EUROPEU O primeiro foi o Ato Único Europeu (AUE), um Tratado de revisão, assinado no Luxemburgo em fevereiro de 1986 para vigorar a partir de 1987. Este tratado veio rever os principais pontos do tratado de Roma que não estavam a correr da melhor forma. Contém, desde logo, disposições sobre cooperação em politica externa, tendentes ao desenvolvimento de uma política externa comum; Inaugurou, para algumas matérias, a regra das decisões por maioria e não por unanimidade; Admitiu-se a possibilidade de extensão a uma política de segurança comum e afirmou-se a primazia do conselho europeu neste domínio. 5 DUE I 2017/2018 1.1.5. O TRATADO DE MAASTRICHT Igualmente importante foi a revisão dos tratados operada pela celebração do Tratado de Maastricht sobre a União Europeia, em 7 de fevereiro de 1992 (TUE). Este tratado já não foi uma mera revisão dos tratados anteriores, mas sim um avanço na integração europeia. O tratado UE veio alargar a cooperação entre os Estados-membros para além do sistema das comunidades europeias, 1.1.5.1. MOEDA ÚNICA O projeto da CEE apontava para a criação de uma União Económica e Monetária e de uma moeda única. Tratava-se de um projeto a realizar em diversas fases:  A primeira fase, desde 1990, garantiu a livre circulação de capitais;  A segunda fase passou pela convergência das políticas económicas dos Estados-membros;  A terceira fase, a partir de 1999, envolveu a criação de uma moeda única através de um sistema de gestão monetária centralizada. Este sistema consistiu na criação do Sistema europeu de Bancos centrais (SEBC) composto pelo Banco Central Europeu e pelos Bancos Centrais nacionais. 1.1.5.2. CIDADANIA EUROPEIA O tratado da União Europeia representa mais um passo no aprofundamento da identidade europeia face ao exterior. Neste contexto assume um relevo especial o conceito de cidadania europeia; Este conceito assenta no direito de livre circulação e residência, no direito de sufrágio ativo e passivo nas eleições municipais e para o PE, no direito à proteção diplomática fora da UE por qualquer Estado membro e no direito de petição e de queixa perante os órgãos da UE. A cidadania europeia fundamenta um estatuto de igualdade jurídica, assente no princípio da proibição de discriminação em razão da nacionalidade, sem prejuízo da existência de exceções. 6 DUE I 2017/2018 Trata-se de uma cidadania complementar e de sobreposição, dependente das leis da nacionalidade dos Estados membros, que não pretende substituir. 1.1.5.3. CONSOLIDAÇÃO DO ACERVO COMUNITÁRIO O tratado UE veio consolidar o acervo comunitário adquirido, mediante o alargamento de competências da União Europeia, nos domínios da educação, da formação profissional, da cultura, da saúde pública, da proteção dos consumidores, das redes transeuropeia e da política industrial. 1.1.5.4. APROFUNDAMENTO DOS TRÊS PILARES O tratado UE procurou dar mais um passo no sentido da união política, com especial incidência nos âmbitos da cooperação em matéria de política externa e de defesa (2º pilar) e da justiça e da administração (3º pilar). I. PILAR DE INTEGRAÇÃO II e III PILARES DE INTEGRAÇÃO UNIÃO EUROPEIA EM SENTIDO AMPLO Comunidade europeia do EURATOM UNIÃO EUROPEIA carvão e do (EM SENTIDO aço ESTRITO) Comunidade económica europeia 7 DUE I 2017/2018 UNIÃO EUROPEIA (EM SENTIDO AMPLO) I PILAR II PILAR III PILAR UE (EM SENTIDO UE (EM SENTIDO CE CEEA CECA ESTRITO) ESTRITO) Criação de uma união PESC – Política externa e de JAI – Justiça e Assuntos económica e monetária Segurança Comum Internos  Liberdade de circulação  Criação de uma só voz  Estabelecimento de de pessoas, mercadorias, da União Europeia no plano cooperação entre os Estados- serviços e capitai; internacional; Membros em matéria de  Harmonização das  Coordenação da ação Justiça; políticas económicas; dos Estados-Membros no  Estabelecimento de  Estabelecimento de plano internacional e a nível de sistemas de trocas de política monetária única. política de defesa. informações a nível judicial e policial. Existia um quadro institucional único para os três pilares, com algumas notas específicas quanto ao segundo e terceiro. O conselho europeu definia orientações gerais e posições comuns por unanimidade ou por maioria qualificada. Ao Conselho competia proceder à definição de posições comuns nos domínios da cooperação intergovernamental. Por seu lado, o PE participava no segundo e terceiro pilar através de informações, consultas e recomendações. A Comissão tinha um poder de iniciativa limitado. Com os posteriores aprofundamentos da UE, a separação entre os três pilares esbateu-se substancialmente, tendo os órgãos comunitários vindo assumir um peso decisivo no processo de decisão respeitante ao segundo e terceiro pilares. 8 DUE I 2017/2018 1.1.6. TRATADO DE AMESTERDÃO  Assinado em 1997;  Em vigor desde 1999.  Trouxe a proteção dos Direitos Humanos para a EU;  Reforçou os poderes do PE, para combater o defecit democrático, atribuindo-lhe poder decisório;  Atribui poderes à CE em matéria de cooperação judiciária civil (retirando essa matéria da EU, em sentido estrito). 1.1.7. O TRATADO DE NICE Mais recentemente foi aprovado o Tratado de Nice. O mesmo altera o tratado UE, os tratados que instituem as comunidades e alguns dos atos relativos a esses tratados. A entrada em vigor ocorreu no dia 1 de fevereiro de 2003. 1.1.7.1. OBJETIVOS FUNDAMENTAIS Entre os seus principais objetivos destacam-se, desde logo, a preparação da UE para novas adesões e a reforma institucional; Em 1 de maio de 2004 viria a consumar-se o alargamento da UE às repúblicas checa e Eslovaca, Estónia, Letónia, Lituânia, Hungria, Polónia, Eslovénia, Chipre e Malta. Seguiu-se, em 1 de janeiro de 2007, o alargamento à Bulgária e à Roménia e, por fim, em 2013, o alargamento à Croácia. A perspetiva destes alargamentos da UE esteve na base de algumas das mais importantes reformas institucionais introduzidas pelo Tratado de Nice, tal como:  O alargamento das matérias objeto de maioria qualificada;  O reforço do procedimento de co-decisão entre o PE e o Conselho, tendendo este a funcionar cada vez mais como uma segunda câmara parlamentar, na produção de verdadeira “legislação 9 DUE I 2017/2018 europeia”, relegando a Comissão para uma posição clara de órgão executivo. Dessa forma pretendeu-se combater o tão falado défice democrático das instituições europeias. 1.2. A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA INTEGRAÇÃO EUROPEIA À medida que se sucediam os tratados no processo de integração europeia, foram aumentando as áreas de atuação da UE. Este facto fez com que o direito comunitário aumentasse as suas áreas de tensão com o direito constitucional; Desde cedo reconheceu-se a existência de uma dimensão constitucional no direito comunitários, antes da criação da UE. O TJUE foi transformando os Tratados numa verdadeira carta constitucional. O termo Constituição surge, em regra, ligado à expressão última da soberania de uma comunidade política independente. Ora, enquanto uns sustentam que a UE, por exercer prerrogativas de soberania, tem forçosamente que ter uma Constituição, outros duvidam qua dita constitucionalização dos tratados constitutivos tenha atingido um estado de plenitude constituinte. 1.2.1. PROJETO DE TRATADO CONSTITUCIONAL EUROPEU Em 2001 ganhou consistência o objetivo de criar uma constituição para a UE, capaz de reforçar a respetiva legitimidade, unidade de ação e credibilidade internacional. O projeto de Tratado Constitucional europeu foi assinado em Roma, em 29 de outubro de 2004; Apesar de ser um tratado internacional, o mesmo dotou-se de uma relevância constitucional ostensiva. A expressão “constituição” era claramente assumida, juntamente com o objetivo de criar um instrumento dotado de auto-primazia normativa. Hino, bandeira, adoção de carta de direitos fundamentais da UE, o facto de os regulamentos passarem a ser designados por leis e as diretivas por lei-quadro, são todos pontos assumidamente importantes para a assunção da unidade europeia; Na estrutura institucional destacava-se a existência de um presidente do Conselho europeu e um ministro dos negócios estrangeiros. Paralelamente, procurava-se reforçar o princípio democrático no seio da UE, nas suas dimensões parlamentar, direta e representativa; 10 DUE I 2017/2018 O Projeto estabelecia, ainda, a UE como sucessora da CE e da CEEA, ao mesmo tempo que abolia a estrutura dos três pilares, alicerçando a UE num único pilar. O Projeto de Tratado Constitucional Europeu (PTCE) foi abandonado depois do duplo “não”, em 2005, nos referendos na França, em 29 de maio, e na Holanda, em 1 de junho. 1.2.2. TRATADO DE LISBOA  Assinado em 2007;  Extingue a CE e funde-a com a UE (a EURATOM continua a existir);  Faz algumas modificações de agilização do funcionamento da EU, adotando princípios de democracia participativa;  Cria mecanismos de controlo dos Estados (Parlamentos Nacionais) em relação à União;  Mantém a terminologia europeia própria, não adotando quaisquer designações que sugeriam um Estado;  Simplifica o funcionamento da UE, procurando torna-la mais transparente. PRINCIPAIS NOVIDADES DO TRATADO DE LISBOA I. SIMPLIFICAÇÃO  Extingue a CE e funde-a com e EU, simplificando e organizando as disposições jurídicas que os regulamentavam;  Passam a existir apenas 2 tratados que regulam a União, articulados entre si:  Tratado da União Europeia;  Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.  Diminui o número de atos da União, tornando-se mais cristalina a ação europeia. II. DEMOCRATIZAÇÃO  Aumenta-se os poderes do Parlamento Europeu (único órgão com legitimidade democrática direta);  Criam-se mecanismos de democracia participativa, dando a iniciativa do processo legislativo a um milhão de cidadãos da UE; III. FISCALIZAÇÃO  É atribuído aos Parlamentos Nacionais um papel de fiscalização da ação da União;  Delimitam-se de forma mais recortada as matérias em que a União Europeia pode intervir. 11 DUE I 2017/2018 CAPÍTULO II - DIREITO DA UE, DIREITO EUROPEU E DIREITO INTERNACIONAL 1. O DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA 1.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS Com o Tratado de Lisboa, a União Europeia sucedeu à Comunidade Europeia, assumindo todo o acervo do direito comunitário, que passa a ser caracterizado por direito da UE. Nos pontos que se seguem procuraremos apresentar a UE como comunidade de direito e diferenciar o direito da UE distinguindo-o do direito europeu, do direito internacional geral e do direito nacional. 1.3. A UE COMO ORGANIZAÇÃO SUPRANACIONAL Antes de mais, convém ter presente a ambiguidade que rodeava o estatuto da UE antes dos artigos 1º e 47º do TUE na redação que lhe foi dada pelo Tratado de Lisboa. Por vezes a UE era qualificada como uma organização internacional de natureza supranacional, por sinal com o grau de integração e institucionalização mais elevado, seguida pelo Mercosul e pela União Africana. A criação destas instituições, deve-se, em boa medida, ao sucesso do projeto de integração europeia. Porém, depois de clarificados os conceitos veremos que semelhante qualificação jurídica assentava mais corretamente à antiga CE, que durante muito tempo foi o coração da UE. Por um lado, esta não era uma mera organização internacional de tipo intergovernamental. Por outro lado, não se tratava de um Estado, visto faltar-lhe a competência das competências, o monopólio da coação legítima e o exercício da soberania interna e externa. Embora a sua configuração atípica, o certo é que a CE se afirmou como uma comunidade paraestadual supranacional, dotada de um ordenamento jurídico próprio e autónomo, fortemente indicador de uma estadualidade de tipo federal. Alguma doutrina aludia a uma dupla constituição ou a um duplo poder estadual, assente na sobreposição dos níveis nacionais e supranacional, dando como adquirida a existência, pelo menos materialmente, de um direito constitucional e interno europeu (CONSTITUCIONALISMO MULTINÍVEL). 12 DUE I 2017/2018 Refira-se que também a CEEA detinha as mesmas características de organização dotada de personalidade jurídica internacional, de natureza supranacional. Com as devidas adaptações da CECA, que se extingui em 2002. A CEEA e a CE integravam primeiro pilar da EU quando da entrada em vigor do Tratado de Lisboa. Esta última instituição fornecia o teto onde se abrigavam os três pilares que já mencionámos. Estas comunidades tratavam-se de organizações internacionais dotadas de personalidade jurídica internacional, exercendo, pela via jurídico-normativa, prerrogativas de soberania que lhes foram transferidas pelos Estados Membros, relativamente ao primeiro pilar de integração; Por sua vez, a atividade no âmbito dos segundo e terceiro pilares assumia uma natureza intergovernamental, preponderantemente política. A presença no seio de diferentes níveis de integração jurídica e política tornava o estatuto internacional da UE algo duvidoso. Não era certo que se estivesse aí perante uma organização internacional dotada de personalidade jurídica internacional A mesma funcionava, acima de tudo, como um “forum” para a unificação das vontades dos Estados. Em todo ocaso, o objetivo do processo de integração tem sido o de dotar a UE de um quadro institucional, político e jurídico coerente, assegurando a sua natureza de verdadeira união e não uma mera proliferação de pilares. O problema foi definitivamente resolvido pelo Tratado de Lisboa. 1.4. A UE COMO COMUNIDADE DE VALORES A UE pretende ser uma comunidade de direito. Isso significa que a UE pretende atuar através de instrumentos jurídicos, inseridos num universo normativo mais vasto. Isso exige, evidentemente, uma significativa articulação entre as instâncias jurisdicionais europeias e nacionais, aspeto tanto mais relevante quanto é certo que estas obedecem a diferentes configurações institucionais e processuais. Essa articulação assenta na centralidade da jurisdição da UE, vedando-se aos tribunais nacionais o controlo da constitucionalidade e legalidade das normas jurídicas da UE, a prossecução de uma 13 DUE I 2017/2018 interpretação própria e singular das mesmas e ainda a aplicação das normas nacionais contrárias ao direito da união. A fragmentação hermenêutica do direito da EU conduziria ao fim desse direito. 2. DIREITO DA UE E DIREITO EUROPEU EM SENTIDO AMPLO Antes da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, em dezembro de 2009, o direito comunitário dizia respeito ao funcionamento da Comunidade Europeia (CE) e da Comunidade Europeia de Energia atómica (CEEA) – OI’s de natureza supranacional que integravam o primeiro pilar a da União Europeia; Atualmente, pode dizer-se que o direito europeu em sentido estrito corresponde ao direito da UE. Assim sucede, na medida em que o tratado de Lisboa reuniu na UE (em sentido estrito) toda a matéria do direito comunitário e do direito da UE – Não se considera mais três pilares separadamente. Na base do direito da UE estão, agora, o Tratado da União Europeia (TUE) e o Tratado sobre o financiamento da União Europeia (TFUE), dispondo, os mesmos, de igual valor jurídico. O direito da UE é considerado direito supranacional, com características que o diferenciam do direito internacional e do direito interno. Desde logo, o mesmo manifesta-se por via de atos com valor legislativo, dotados de primazia sobre as normas legislativas e regulamentares de direito interno. Além disso, o Direito da UE corresponde a apenas uma parte do chamado direito europeu em sentido amplo. Este inclui uma pluralidade de ordenamentos jurídicos, relacionados entre si de uma forma complexa, que regulam as diversas modalidades consultivas, intergovernamentais e supranacionais da cooperação política e jurídica regional entre os Estados europeus, nos mais variados setores. O mesmo inclui, portanto, direito supranacional e direito internacional regional. 14 DUE I 2017/2018 3. DIREITO DA UE E DIREITO INTERNACIONAL O direito da UE estabelece desde a sua origem comunitária uma estreita relação com o direito internacional. A mesma tem sido aproximada pela Jurisprudência do TJUE. No entanto, os mesmos não podem ser entendidos como partes integradas num sistema jurídico mais vasto, a despeito das várias portas de intercomunicação material e formal entre eles; -Importa salientar alguns dos aspetos mais importantes dessa relação. Em primeiro lugar, atentaremos para os domínios em que o direito internacional ainda é relevante para a UE. Em segundo lugar, examinaremos alguns problemas relacionados com a articulação entre o direito da UE e o direito internacional. 3.1. A PRESENÇA DO DIREITO INTERNACIONAL NO DIREITO DA UE 3.1.1. INTERAÇÃO DESDE A FUNDAÇÃO DAS COMUNIDADES O direito internacional esteve presente na celebração dos tratados de Paris e de Roma instituidores da CECA, CEE e CEEA. Os mesmos foram aprovados e ratificados de acordo com as regras que regem os tratados internacionais entre Estados. Desde então, o direito internacional continua a ser relevante para compreender os sucessivos tratados que estruturaram e aprofundaram o processo de integração europeia; Também pode ser salientado o papel que o direito internacional desempenha como elemento de integração das lacunas do direito da UE; O mesmo faz sentir a sua influência no funcionamento do Conselho Europeu e do Conselho, especialmente na sua formação de negócios estrangeiros. 3.1.2. AS RELAÇÕES ENTRE A UE E ESTADOS E ENTIDADES TERCEIRAS O direito internacional continua a manter toda a sua atualidade e relevância, no quotidiano da UE, disciplinando as relações que se estabelecem entre ela e terceiros Estados e organizações internacionais. 15 DUE I 2017/2018 3.1.2.1. JUS TRACTUM DA UE O direito da UE e o direito internacional relacionam-se, além disso, através do chamado Jus tractum, ou poder de celebrar tratados internacionais. Nos termos dos Tratados, a UE sucede à Comunidade Europeia, disponde de personalidade e capacidade jurídica internacional e podendo celebrar contratos com pessoas e organizações e tratados com Estados e OI’s (Artigos 1.º e 47.º TUE) 3.1.2.2. JUS LEGACIONES DA UE As relações entre a UE e Estados terceiros e organizações internacionais passam igualmente pelo chamado ius legacionis, que consiste na possibilidade de estabelecer relações diplomáticas e consulares. Neste âmbito, a UE pode estabelecer delegações em países terceiros, organizações internacionais e conferências internacionais, pretendendo-se que as mesmas operem em articulação com as missões diplomáticas e consulares dos Estados da UE (Artigo 32.º e 35.º TUE). 3.1.3. RELAÇÕES ENTRE OS ESTADOS MEMBROS As relações entre os Estados membros regem-se, ainda, pelo direito internacional, exceto na medida em que o direito internacional tenha sido preterido a favor do direito comunitário; No entanto, litígios entre Estados membros podem envolver, a um tempo, direito internacional e direito da UE. Em casos como estes, quando a par do direito internacional também seja relevante o direito da UE, deve aplicar-se a norma do artigo 344.º TFUE, através da qual os Estados membros se comprometem a não submeter qualquer diferendo relativo à interpretação e aplicação dos Tratados a um modo de resolução diferente do que neles estão previstos – Expressão do dever de cooperação leal que, nos termos do artigo 4.º do TUE, deve reger as relações entre os Estados membros e a UE. Quando o direito internacional e o direito da UE possam estar em causa num determinado litígio, a decisão sobre se os Estados podem submeter o seu litígio a um tribunal internacional deverá pertencer ao TJUE. 16 DUE I 2017/2018 3.2. RELAÇÃO ENTRE O DIREITO DA UE E O DIREITO INTERNACIONAL 3.2.1. SUBORDINAÇÃO DA UE AO DIREITO INTERNACIONAL GERAL As instituições da UE devem observar o direito internacional na atuação das suas instituições, sendo os respetivos princípios parte integrante da ordem pública comunitária. Reconhece-se explicitamente a subordinação das instituições comunitárias aos princípios gerais do direito internacional, como sucede com os princípios da boa fé e da proteção das expectativas legítimas e reconhece-se à jurisprudência do TIJ a sua qualidade de fonte auxiliar de direito internacional. 3.2.2. SUBORDINAÇÃO DA UE AOS TRATADOS INTERNACIONAIS Uma vez celebrado um tratado internacional pela UE coloca-se a questão de saber se, em que termos e com que força jurídica é que o mesmo pode ser invocado diante dos tribunais, e no seio da União, diante do TJUE. A especial pertinência da questão resulta do facto de que os tratados já não podem ser vistos como tendo por destinatários apenas as partes contratantes, mas também os particulares que se movem nas respetivas ordens jurídicas. Dada a centralidade na doutrina do efeito direto no direito comunitário, a mesma acaba por estender o seu âmbito de aplicação, em certos casos, às convenções internacionais de que a UE seja parte, desde que as mesmas tenham um conteúdo claro, preciso, incondicional e vinculado, com consequências diretas e imediatas nas ordens jurídicas dos Estados. 3.2.3. DIREITO DA UE E RESOLUÇÕES DO CONSELHO DE SEGURANÇA Um problema que se tem colocado prende-se com saber em que medida é que o direito da UE se encontra subordinado aos atos do CS das NU praticados ao abrigo do Artigo VII da respetiva carta. 17 DUE I 2017/2018 A TJUE tem competência para controlar atos do Conselho que executem resoluções do CS das NU. Este tribunal considerou que as normas materialmente constitucionais da UE podem limitar as pretensões de primazia do direito internacional, e especialmente das resoluções do CS das NU que, de forma direta e pessoal, atinjam direitos humanos, violando o princípio da proporcionalidade ou direitos de audiência e defesa. 3.2. DIREITO DA UE E DIREITOS HUMANOS O direito da UE articula-se de vários modos com o direito internacional dos direitos humanos. Não podia deixar de ser de outro modo numa organização que pretende reagir deliberadamente contra a teoria e a prática política, jurídica e militar que conduziram à II Guerra Mundial, ao Holocausto e à divisão da Europa. Os direitos humanos, tal como se manifestam nas tradições constitucionais nacionais em matéria de direitos fundamentais, integram desde há muito os princípios gerais do direito comunitário. Isto mesmo é corroborado pelo facto de a CEDH e a jurisprudência que sobre ela tem sido desenvolvida pelo TEDH, ser expressamente considerada direito materialmente europeu, influenciando o modo como o mesmo é interpretado, integrado e aplicado. O reconhecimento do lugar central dos diretos humanos adquiriu uma nova profundidade na sequência do Tratado de Lisboa com a entrada em vigor da Carta de Direitos Fundamentais da UE, que passa a ter um mesmo valor jurídico dos tratados, e com a adesão da UE à CEDH. 4. DIREITO DA UE E DIREITO NACIONAL 4.1. DIREITO DA UE COMO DIREITO CONSTITUCIONAL A UE é uma organização supranacional dotada de características constitucionais. O direito originário da UE é direito constitucional pois estabelece, organiza e limita o exercício de poderes de autoridade pública, a nível da UE, com incidência nos domínios político, administrativo e jurisdicional, fazendo-o com efeito direito e primazia sobre o direito interno dos Estados. 18 DUE I 2017/2018 A natureza constitucional do direito da UE manifesta-se na primazia do direito da UE sobre o direito nacional, na impossibilidade geral de controlo da constitucionalidade das normas do direito da UE pelos tribunais nacionais e pela previsão das instâncias e mecanismos de controlo jurisdicional, no seio da UE, da validade dos respetivos atos de direito derivado. A natureza constitucional do direito da UE provoca uma fricção com as pretensões constitucionais formuladas a partir do direito interno. 4.1.1. CARACTERÍSTICAS DO DIREITO DA UE O direito da UE tem vindo a ser caracterizado pela sua atipicidade, autonomia, uniformidade e integração. O direito da UE, desde a sua fase comunitária, tem vindo a ser entendido como uma ordem jurídica atípica, porque distinta do direito nacional e do direito internacional. O mesmo apoia-se numa autolimitação dos poderes soberanos dos Estados, em domínios delimitados, tendo como destinatários não apenas os Estados, mas também os respetivos cidadãos. Estes não apenas estão vinculados pelo direito da UE, como dele também recebem direitos. Estes podem ter um fundamento expresso nos Tratados, ou resultar de normas que estabelecem obrigações às instituições da UE, aos Estados e aos particulares; O direito da UE goza de autonomia relativamente ao direito dos Estados. Isto significa que tem as suas próprias fontes e instâncias e procedimentos de interpretação e aplicação. Do mesmo modo, os conceitos que utiliza também têm frequentemente sentido autónomo, diferente do que os mesmos conceitos possam assumir na ordem jurídica interna; A uniformidade do direito da UE significa que o conteúdo das suas normas não pode variar de Estado para Estado, de acordo com diferentes interpretações que delas são feitas pelos respetivos operadores jurídicos; O direito da UE busca a integração com as ordens jurídicas nacionais. Os detalhes desta acoplagem podem variar de Estado para Estado. Em termos gerais, ela significa que todos os órgãos estaduais e particulares se encontram vinculados pelas normas europeias. Aos tribunais nacionais incumbe garantir essa vinculação, em cooperação com a jurisdição da UE. 19 DUE I 2017/2018 4.1.2. DIREITO DA UE E DIREITO CONSTITUCIONAL 4.1.2.1. OS TRIBUNAIS NACIONAIS EM GERAL E O DIREITO DA UE Os tribunais ordinários dos Estados aceitam a primazia e o efeito direto do direito da UE. Para eles o direito da UE é um direito especial dotado de primazia sobre o direito interno, entendida como primazia de aplicação, conduzindo a preempção (não é invalidade) do direito nacional contrário. O mesmo pode criar direitos e obrigações para os particulares, diretamente acionáveis junto dos tribunais nacionais. 4.1.2.2. A POSIÇÃO DAS JURISDIÇÕES CONSTITUCIONAIS À medida que o direito europeu se expande aumentam as zonas de contacto e conflito com o direito constitucional nacional, especialmente no domínio dos direitos fundamentais. Por esse motivo, os tribunais constitucionais nacionais ainda estão à procura da melhor maneira de lidar com esta realidade. Neste contexto, têm sido feitas afirmações sobre as relações entre o direito europeu e o direito constitucional que devem ser tidas em conta na discussão. As mesmas apontam para soluções de primazia tendencial do direito constitucional europeu, primazia tendencial do direito constitucional nacional e de fricção tendencialmente paritária entre o direito constitucional e o europeu. 4.1.2.2.1. PRIMAZIA DO DIREITO CONSTITUCIONAL EUROPEU Tende aqui a aceitar-se a primazia do direito da UE originário e derivado sobre o direito constitucional nacional, embora não deixe de se chamar a atenção para o facto de que se trata de um fenómeno material e funcionalmente limitado. Deste modo, as pretensões constitucionais do ordenamento jurídico da UE obtêm uma satisfação adequada. 20 DUE I 2017/2018 4.1.2.2.2. PRIMAZIA DO DIREITO CONSTITUCIONAL NACIONAL O direito constitucional nacional assume claramente a primazia sobre o direito constitucional europeu. Uma posição extrema de afirmação da primazia do direito constitucional encontramos naqueles que tendem a negar quaisquer pretensões constitucionais ao direito europeu. Para estes, o direito europeu não passe de direito internacional, não havendo qualquer lugar para conceitos como supranacionalidade, entidade supranacional sui generis, direito constitucional europeu, entre outros. A constituição só seria pensável no contexto de um Estado e de um Povo. Este entendimento pretende assegurar o monopólio da última palavra aos tribunais constitucionais. 4.1.2.2.3. TENDENCIAL PARIDADE DO DIREITO CONSTITUCIONAL EUROPEU E NACIONAL Uma outra leitura da questão constitucional europeia pode ser tentada a partir de premissas pós-estatistas ou pós-soberanistas, rompendo deliberadamente com conceções tradicionais. Neste domínio, os problemas de hierarquia ou primazia das normas europeias e nacionais não deixam de colocar-se, mas são resolvidos de uma forma mais discreta e menos confrontacional, através de um discurso mais pragmático, orientado para uma ideia de paridade constitucional tendencial. Para este entendimento, o Estado e o Povo não têm necessariamente o monopólio da constituição e da democracia e, por isso, da soberania. Existem Estados com vários povos e povos com vários Estados, todos dotados de constituição, havendo igualmente constitucionalismo subnacional. Por esse motivo, não se vê qualquer razão ontológica que impeça o desenvolvimento de um direito constitucional supranacional, apoiado em vários povos e vários Estados em condições de igualdade e reciprocidade. Surge, assim, uma espécie de constitucionalismo pactuado europeu que deixa em suspenso a questão da titularidade última da soberania. 21 DUE I 2017/2018 4.2. INFLUÊNCIA DO DIREITO NACIONAL NO DIREITO DA UE Um aspeto que deve ser salientado prende-se com a influência que se observa do direito interno e no direito da UE. De um modo geral, os princípios materialmente conformadores do Estado constitucional, como sejam o respeito pela dignidade humana, a liberdade, a igualdade, a não discriminação, a democracia, o pluralismo, a proteção de minorias, o Estado de direito, a justiça, a solidariedade, etc. são hoje princípios estruturantes da UE (Artigo 2.º TUE). Isto significa que a densificação e concretização que deles tem sido feita no direito interno vale, com as devidas adaptações, no direito da UE; Igualmente relevante é a influência dos modelos administrativos e regulatórios do direito interno no seio do direito da União. 4.3. LIMITAÇÃO DO DIREITO DA UE PELOS INTERESSES NACIONAIS Pode suceder que a aplicação de algumas normas de direito da UE tenha um forte impacto em interesses essenciais ou vitais dos Estados membros. Entre os princípios fundamentais que presidem ao direito da UE encontram-se os relativos ao respeito pela identidade nacional e pela estadualidade, entendida esta última como reserva de soberania estadual. A proteção de interesses essenciais e vitais dos Estados constitui uma expressão destes princípios. Os tratados consideram seriamente a possibilidade da ocorrência de situações excecionais, justificadores de medidas excecionais. Por esse motivo, eles preveem a existência de cláusulas de salvaguarda desses interesses. Do mesmo modo estão previstas cláusulas de necessidade. Umas e outras integram, em primeira linha, o direito primário da UE. No entanto, as cláusulas de salvaguarda podem surgir, também, no direito secundário. 22 DUE I 2017/2018 CAPÍTULO III ORGANIZAÇÃO DA UNIÃO EUROPEIA 1. MODELOS DE INTEGRAÇÃO A análise do direito da UE remete para a consideração de dois modelos básicos de integração que se encontram subjacentes à construção europeia. É por referência a estes dois modelos que deve ser equacionada a relação entre a UE e os Estados membros. Ambos correspondem a visões bastante distintas desta entidade supranacional. 1.1. FUNCIONALISMO E COOPERAÇÃO INTERGOVERNAMENTAL O primeiro modelo assenta na compreensão do direito comunitário a partir de um sistema de funcionalismo/cooperação intergovernamental, através da criação de uma OI no sentido tradicional do termo, com objetivos de gerir de forma cooperativa e não competitiva, recursos escassos e promovendo a prosperidade económica. A doutrina observa que a perspetiva funcionalista de integração económica através do mercado tem tido a virtualidade de aprofundar a cooperação política e a construção jurídica em áreas que extravasam largamente o domínio económico, em termos porventura mais eficazes do que um tipo de integração estadual/federão. Apesar disso, o mesmo depara com algumas dificuldades de relevo:  Uma integração técnico-económica em larga escala exige maior integração institucional, política e jurídica;  A regulação do comércio entre Estados membros favorecerá sempre a expansão dos poderes da UE. Apesar de tudo, o modelo de integração funcionalista de cooperação internacional tem dominado em áreas como a política agrícola comum e os dois últimos pilares de segurança e defesa comum e de justiça e cooperação policial.  No entanto, o funcionalismo não responde à necessidade de maior integração e legitimidade política democrática de uma UE que afeta cada vez com mais intensidade as vidas quotidianas de centenas de milhões de cidadãos europeus. 23 DUE I 2017/2018 1.2. SUPRANACIONALISMO E FEDERALISMO O segundo modelo aponta para uma integração de natureza supranacional com vocação federal. O mesmo caracteriza-se pela primazia do político sobre o económico, pela imitação de modelos existentes (EUA por exemplo), pelo exercício em comum de prerrogativas de soberania estadual e pelo reforço dos poderes das instituições supranacionais. O mesmo aponta ainda para o exercício do poder constituinte e para a consequente supranacionalização da competência das competências e da legitimidade política democrática. Mesmo sem chegar a estes níveis de integração, é evidente o reforço dos elementos federativos no direito europeu. Apesar disso, este modelo tem deparado com uma forte resistência dos chamados Estados- Nação, alegando-se a inexistência de um povo europeu que possa chamar a si a titularidade do poder constituinte. O modelo de integração federal conheceu um novo alento com a entrada em circulação do Euro e com a convocação de uma Convenção constitucional para a reforma política institucional da Europa. 2. REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS A delimitação da competência da União Europeia está subordinada a princípios basilares:  Princípio da Especialidade das Competências/ da Atribuição / das Atribuições Limitadas;  Princípio da Subsidiariedade;  Princípio da Proporcionalidade;  Princípio da Preempção. 24 DUE I 2017/2018 A ATRIBUIÇÃO DAS COMPETÊNCIAS Para identificar as competências ao dispor da União Europeia, pode vigorar um de dois princípios:  Princípio da Competência das Competências: vigora nos Estados Soberanos. Cada Estado decide quais são as competências que quer ter, em que domínios deve atuar o Estado e em que domínios não deve atuar. São as instituições próprias de cada Estado que o definem: Assembleia Constituinte, Governo, etc.  O princípio da especialidade de competências/ da atribuição de competências/ das atribuições limitadas: é um princípio geral do direito internacional, sendo vigente em muitas organizações internacionais. Significa que as instituições só têm as competências que os Estados lhe delegam (delegação de poderes) e nas condições em que os Estados a definem. QUAL VIGORA NA UE? QUEM DECIDE AS COMPETÊNCIAS DA UE? A PRÓPRIA UE OU OS ESTADOS-MEMBROS? Art.5º/1: A delimitação das competências rege-se pelo princípio da atribuição; Art. 5º/2 TUE: Em virtude do princípio da atribuição, a União atua unicamente dentro dos limites de as competências que os Estados-Membros lhe tenham atribuído nos Tratados para alcançar os objetivos fixados por estes últimos. As competências que não sejam atribuídas à União nos Tratados pertencem aos Estados-Membros. REGRA DA ESPECIALIDADE  A União Europeia só dispõe das competências especificamente atribuídas pelos Estados.  Tudo o que não tiver sido atribuído expressamente é competência exclusiva dos Estados- Membros.  As competências nacionais são a regra e as competências europeias são a exceção. Não podemos presumir competências comunitárias! 25 DUE I 2017/2018 ONDE É QUE OS ESTADOS-MEMBROS ATRIBUEM COMPETÊNCIAS À UE? Nos Tratados! Os Tratados é que elencam as competências que estão atribuídas à UE. O que não estiver nos Tratados não está atribuído à UE. IMPLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE:  Cada ato comunitário tem de identificar com rigor qual é a base jurídica, a norma do Tratado que lhe dá competência para atuar!  Toda a atuação concreta das instâncias comunitárias tem de se basear concretamente numa qualquer norma específica das comunidades. Esta ideia tem sido reafirmada quer do ponto de vista do direito positivo (Art. 5.º TUE), quer do ponto de vista da jurisprudência.  BASE JURÍDICA: Norma dos Tratados que autoriza a UE a agir (a maioria das bases jurídicas está no TFUE). Quando a União tem competência para agir, importa saber de que modo deve exercê-la. Para este fim auxiliam-nos os Princípios da Subsidiariedade e da Proporcionalidade. Art. 5.º/1 TUE, parte final: “O exercício das competências da União rege-se pelos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade”. 26 DUE I 2017/2018 AS COMPETÊNCIAS PÚBLICAS No que concerne à definição das atribuições dos Estados-Membros e da UE, podemos categorizar as competências em vários grupos. MATÉRIAS QUE NÃO CONSTAM MATÉRIAS QUE CONSTAM DOS TRATADOS – DOS TRATADOS ATRIBUÍDAS À UE Não são todas iguais. Quando atribuem competências à Competência exclusiva dos Estados- UE, os Estados fazem-no de forma diferenciada Membros (art. 5.º/2, parte final, Competências Competências Competências de TUE). Exclusivas da UE Concorrentes Coordenação É uma consequência do princípio da Só a UE pode Tanto a EU como A UE atua em especialidade das atribuições atuar. Os Estados- os Estados- segunda linha, (atribuições limitadas) Membros Membros podem apenas para comprometem-se atuar nestas coordenar a a não exercer matérias atuação (primária) competência ao nível nacional nestes domínios. Quando os Tratados incluem determinada competência, como saber se:  É uma competência EXCLUSIVA da União (os Estados transferiram os poderes e comprometeram-se a não agir individualmente); ou  É uma competência CONCORRENTE da União e dos Estados (Os Estados atribuíram à União poderes para atuar mas não abdicaram de regular individualmente aquele domínio); ou  É uma competência de COORDENAÇÃO (os Estados atuam e a UE, só num segundo momento, pode coordenar as políticas nacionais)? ATÉ AO TRATADO DE LISBOA:  Grande incerteza: era o Tribunal de Justiça que vinha interpretando os Tratados e declarando se era uma competência exclusiva da União ou uma competência concorrente. 27 DUE I 2017/2018 DESDE O TRATADO DE LISBOA:  Há uma lista de competências exclusivas (art. 3.º TFUE), uma lista de competências concorrentes (art. 4.º TFUE) e uma lista de competências de coordenação (art. 6.º TFUE).  E se certa competência não constar de qualquer lista? Art. 4.º/1 TFUE: é uma competência concorrente. NOTA 1: No art. 4.º, o Tratado fala de competências partilhadas, o que parece ser uma incorreta tradução. As competências são concorrentes e não partilhadas NOTA 2: As competências do art. 4.º/3 e do 4.º/4 têm um regime diferente. Por isso alguma doutrina chama-lhes competências paralelas. COMPETÊNCIAS EXCLUSIVAS DA UE São muito poucas (art. 3.º TFUE):  União Aduaneira (direitos alfandegários entre os Estados-Membros);  Política de Concorrência;  Política monetária, para os Estados aderentes ao Euro;  Conservação dos recursos biológicos do mar;  Política comercial comum (relações comerciais com Estados Terceiros). Como se exercem as competências exclusivas da União?  Nos termos do art. 2.º/1 TFUE (fazer remissão).  Só a União pode atuar nessa matéria (Os Estados não podem tomar decisões cambiais sobre o euro, por exemplo).  Porém, os Estados sempre atuam no quadro do sistema de administração indireta executando os comandos da União.  A União pode delegar nas autoridades nacionais algumas competências. 28 DUE I 2017/2018 COMPETÊNCIAS CONCORRENTES (Art. 4.º TFUE) Vigoram dois princípios fundamentais quanto ao exercício de competências concorrentes.  PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE (Art. 5.º/1 e 5.º/3):  Aplicável aos “domínios que não sejam da sua competência exclusiva”. LOGO: vale para as competências partilhadas e para as competências de coordenação (fazer remissão a partir dos arts. 4.º/2 e 6.º TFUE).  PRINCÍPIO DA PREEMPÇÃO (Art. 2.º/2 TFUE):  Só para as competências concorrentes (Art. 2.º/2 TFUE fala expressamente em competências partilhada). PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE Artigo 5.º/3: Nas matérias de competência concorrente, a União apenas pode atuar quando provar estarem cumpridas 2 condições: 1. A ação dos Estados-Membros não seja suficiente para atingir os objetivos dos Tratados, nem ao nível local, nem ao nível central; 2. Os objetivos, atendendo à dimensão ou efeitos da atuação que se pretende, são mais bem alcançados através de uma ação comunitária. Isto é, a UE, quando atua em matérias de competência concorrente tem de fundamentar porque é que a ação dos Estados não seria suficiente.  Mensagem normativa: a regulação pública deve sempre ocorrer ao nível mais baixo. Só se for impossível a ação estadual deve intervir a UE.  Objetivos do Princípio da Subsidiariedade: Preservar as prerrogativas de soberania dos Estados-Membros. Face a este princípio, nas competências concorrentes, de quem é em regra a competência? Dos Estados ou da UE? Dos Estados! A EU só pode atuar excecionalmente, demonstrando a respetiva necessidade, pelo cumprimento dos dois pressupostos. 29 DUE I 2017/2018 E se não se demonstrar a necessidade, através do cumprimento dos dois pressupostos? Como se controla o princípio da subsidiariedade?  Ex post: os atos comunitários são inválidos. Podem ser anulados judicialmente. Veremos como em DUE II.  Ex ante (novidade do Tratado de Lisboa – art. 5.º/3/2º parágrafo TUE): papel dos Parlamentos Nacionais previsto em protocolo anexo.  As iniciativas legislativas comunitárias são enviadas sempre aos Parlamentos Nacionais, acompanhadas de uma ficha que explica as razões pelas quais se entende que “a ação nacional não é suficiente” e “os objetivos são mãos bem alcançados ao nível comunitário”.  No prazo de 8 semanas, qualquer Parlamento Nacional pode emitir um parecer fundamentado explicando as razões por que entende estar a ser violado o princípio da subsidiariedade.  Se 1/3 dos Parlamentos entender que está a ser violado o princípio da subsidiariedade, o projeto legislativo não pode ser adotado. PRINCÍPIO DA PREEMPÇÃO  Suponhamos que a UE consegue demonstrar que a ação europeia cumpre todos os princípios europeus (nomeadamente a subsidiariedade) e legisla nesta matéria. Podem os Estados-Membros, depois disso, aprovar legislação nacional diferente? Isto é: Se a competência é concorrente, podem os Estados-Membros atuar depois da UE? Parece que é isso que resulta do art. 2.º/2 TFUE, primeira parte! NÃO. Vigora nas competências concorrentes o princípio da preempção (art. 2.º/2 segunda parte TFUE). Art. 2.º/2 TFUE: “Quando os Tratados atribuem à União competência partilhada com os Estados-Membros em determinado domínio, a União e os Estados-Membros podem legislar e adotar atos juridicamente vinculativos nesse domínio”. 30 DUE I 2017/2018 “Os Estados-Membros exercem a sua competência na medida em que a União não tenha exercido a sua” Quando a UE atua numa competência concorrente, proíbe os Estados de o fazer. Só podem voltar a legislar individualmente se a UE desregular a matéria. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE (Art. 5.º/ 4 TUE) Afere a legitimidade da concreta medida, ligando-se ao princípio da subsidiariedade. O princípio da proporcionalidade tem 3 vetores fundamentais:  Princípio da adequação: Saber se a medida tomada pela comunidade é adequada a atingir o objetivo dos tratados.  Princípio da necessidade ou exigibilidade: Saber se a medida a tomar pela comunidade é necessária, se não há outras medidas menos intrusivas nos Estados-Membros que possam ser tomadas.  Princípio da proporcionalidade em sentido estrito: Trata-se de pesar os inconvenientes da medida com as suas vantagens e saber se deve ser tomada. Este princípio é mais uma forma de preservar as competências preferenciais dos estados, complementando o princípio da subsidiariedade. Art. 5.º/4 TUE: “O conteúdo e forma da ação da União não devem exceder o necessário para atingir os objetivos dos Tratados” Mensagem Normativa: Preservação da autonomia decisória dos Estados-Membros, mesmo nas matérias em que há regulação comunitária. Preferência pela solução que mais privilegia o espaço de intervenção dos Estados. Deve sempre escolher-se a medida comunitária menos interventiva e menos rígida. 31 DUE I 2017/2018 PRINCÍPIO DA QUANDO A UE TEM COMPETÊNCIAS, ELAS NÃO SÃO TODAS IGUAIS. ESPECIALIDADE COMO SE EXERCEM? COMPETÊNCIAS COMPETÊNCIAS COMPETÊNCIAS DE Diz quando é que a UE EXCLUSIVAS DA UE CONCORRENTES COORDENAÇÃO tem competências Quando os Tratados não Só a UE pode atuar Atua a UE ou os Estados- A EU só pode atuar prevejam poderes, trata- (art. 2.º/1 TFUE). MAS: Membros: depois de os Estados o se de competências  Princípio da  Princípio da terem feito (art. 2.º/5 exclusivas dos Estados- Proporcionalidade Subsidiariedade (art. TFUE). MAS: Membros. (Art. 5.º/4 TUE): Tem 5.º/3 TUE): A UE só atua  Princípio da de escolher o modo excecionalmente; proporcionalidade de intervenção menos  Princípio da (Art. 5.º/4 TUE): Tem intrusivo da soberania proporcionalidade (Art. de escolher o modo de estadual 5.º/4 TUE): Quando intervenção menos atua, deve escolher o intrusivo da soberania modo menos estadual. intervertido;  Princípio da Preempção (Art. 2.º/2 TFUE): Depois de a UE atuar, os Estados deixam de poder agir. Iguais às concorrentes mas não vigora o COMPETÊNCIAS princípio da PARALELAS preempção: Os Estados podem agir mesmo depois da UE. 32 DUE I 2017/2018 O PRINCÍPIO DOS PODERES IMPLÍCITOS JÓNATAS MACHADO encontra ainda outro princípio de delimitação das competências da UE. É um princípio que não costuma ser identificado pela Doutrina. Trata-se do Princípio dos Poderes Implícitos, que este Autor retirou da forma como se vem fazendo a integração de lacunas dos Tratados quanto às competências da UE. Há naturalmente omissões nos Tratados. É natural que surjam algumas lacunas. Algumas dessas omissões podem ser corrigidas, justamente quanto à competência atribuída à UE. Assim, da sua consagração, retira-se este princípio. Há três mecanismos de integração de lacunas:  Unidade de Sentido dos Tratados;  Cláusula de Flexibilidade (art. 352.º TFUE);  Teoria das Competências Implícitas. 1º MECANISMO - UNIDADE DE SENTIDO DOS TRATADOS HISTORICAMENTE:  A UE (em sentido amplo) era composta por várias organizações internacionais (CECA; CE; EURATOM; UE em sentido estrito). Os tratados de cada uma das organizações internacionais apresentavam LACUNAS, não prevendo solução para todos os problemas. MATRIZ DO MECANISMO: Apesar de existirem várias organizações internacionais, há uma unidade de sentido entre si:  Os mesmos Estados-Membros;  As mesmas Instituições e Órgãos;  Objetivos complementares. LOGO, nos Tratados de cada uma das organizações (TCECA, TCE, TUE, TCEEA) pareciam existir respostas idênticas, mas com formulações diferentes. ISTO É: há uma unidade de sentido dos Tratados. Os objetivos e os mecanismos são tendencialmente os MESMOS, embora com formulações diferentes.  Há uma UNIDADE DE SENTIDO nos tratados, há uma COERÊNCIA dos Tratados. 33 DUE I 2017/2018 ASSIM: Havia matérias que estavam reguladas no TCECA, outras no TCE, outras no TCEEA e outras no TUE. Havendo uma lacuna NUM DOS TRATADOS, se a questão estiver resolvida nalgum nos Tratados, essa norma deve ser aplicada para integrar qualquer lacuna dos outros Tratados. ISTO É: se a resposta nos Tratados é tendencialmente uniforme, podem aplicar-se normas de outro Tratado ao funcionamento de uma das várias organizações internacionais que compunham a UE. MAS: A Unidade de Sentido nem sempre podia ser utilizada! Nalguns casos, a diferença entre as disposições é tudo menos acidental, pode ser propositada. Os próprios Tratados apontava, para o respeito da autonomia dos próprios tratados, valendo cada tratado de per si (resultava dos arts. 305º TCE e ex art. 47º TUE) QUESTÃO - Esta via de integração de lacunas AINDA EXISTE?  A CECA extinguiu-se em 2002, sendo as suas competências absorvidas pela CE;  O Tratado de Lisboa veio fundir a CE com a UE. HOJE:  UE: Dois tratados complementares (sem contradições ou diferenças de regulação) – TUE e TFUE; EURATOM: Um tratado autónomo. Pode usar-se o TUE para completar lacunas do TCEEA? Pode usar-se o TCEEA para colmatar lacunas do TUE? Aquando da CIG2003 (que decidiu assinar o Tratado que Estabelece uma Constituição para a Europa), alguns Estados declararam entender que o TCEEA está desatualizado. (declaração n.º 44 CIG2003) Nessa medida, a Doutrina vem defendendo que as suas disposições não podem ser utilizadas para completar as lacunas do TUE ou do TFUE. TODAVIA, a inversa não é verdadeira: as disposições do TUE e do TFUE podem ser utilizadas na integração das lacunas do TCCEA. Alguns Autores (como Jónatas Machado) deixaram de referir esta via como mecanismo de integração de lacunas. 34 DUE I 2017/2018 2.º MECANISMO: ART. 352.º TFUE (CLÁUSULA DE FLEXIBILIDADE). Se não existir ou não for suficiente um outro exercício jurídico ou base jurídica para comportar certa ação, o art.352º TFUE PERMITE ATRIBUIR À UE PODERES NÃO EXPRESSAMENTE PREVISTOS. PRESSUPOSTOS:  Proposta da Comissão (representa o Interesse Geral da União);  Parecer do PE (representa a audição dos cidadãos da União);  Decisão do Conselho, por unanimidade (representa a vontade unânime dos Estados- Membros) ESTE MECANISMO COMPORTA 1 RISCO:  Pode modificar o equilíbrio institucional entre UE e Estados- Membros.  Na verdade, implica a atribuição à União Europeia de poderes que, até aí, não lhe tinham sido atribuídos. O TJ veio afirmar as condições em que é possível lançar mão deste mecanismo, moderando o risco de alteração do equilíbrio de competências entre Estados e União Europeia: Parecer do TJCE n.º 2/94, de 28 de Março de 1996, relativo à adesão da Comunidade Europeia à Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 1. Deve respeitar-se a Constituição Comunitária.  Há 1 núcleo fundamental q não pode ser desrespeitado. VALE SEMPRE O PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE DAS ATRIBUIÇÕES! Só pode lançar-se mão deste mecanismo quando o Tratado tenha plasmado os OBJECTIVOS e faltem apenas os PODERES para agir. 2. Não se pode, por esta via, dar 1 salto qualitativo no plano da integração.  Só pode dar-se 1 salto quantitativo.  Só podem ser AUMENTADOS, AMPLIADOS os poderes previstos. 35 DUE I 2017/2018 3º MECANISMO: TEORIA DAS COMPETÊNCIAS IMPLÍCITAS. Esta tese encerra a ideia de que 1 organização tem todas as competências para realizar os objetivos inscritos nos seus tratados institucionais. Em face de um objetivo prescrito pelos Tratados, estão implícitos os poderes necessários para perseguir o dado objetivo. Esta teoria tem acolhimento no quadro comunitário? Tem, num único domínio: Acórdão AETR de 1971, proc. 22/70. O TJCE aceita a tese das competências implícitas NO DOMÍNIO DA S COMPETÊNCIAS INTERNACIONAIS: Há 1 paralelismo de competências internas/ externas.  Os Tratados foram mais detalhados quanto às competências internas em detrimento das competências externas.  OU SEJA, quando os Tratados conferem à EU uma competência interna (competência para agir NO INTERIOR DA UE), deve entender-se que também tem competências de celebrar convenções internacionais nessas matérias Nos termos em que é aceite, vem impor a seguinte conclusão:  Se a União Europeia pode agir no quadro comunitário na matéria X;  ENTÃO, pode celebrar convenções internacionais sobre a matéria X  O Poder de contratação internacional está implícito. NOVIDADE DO TRATADO DE LISBOA: Consagração expressa do princípio das competências implícitas neste domínio: - Art. 216.º TFUE: “ A União pode celebrar acordos com um ou mais países terceiros ou organizações internacionais quando os Tratados o prevejam ou quando a celebração de um acordo seja necessária para alcançar, no âmbito das políticas da União, um dos objetivos estabelecidos pelos Tratados” 36 DUE I 2017/2018 CONCLUINDO: Segundo JÓNATAS MACHADO, o princípio jurídico dos Poderes Implícitos significa que, em certos casos, a UE pode dotar-se de mais poderes do que aqueles que constam dos Tratados. Em que casos?  Unidade de Sentido;  Cláusula de Flexibilidade;  Teoria das competências implícitas. OUTROS PRINCÍPIOS DE RELACIONAMENTO ENTRE UE E ESTADOS MEMBROS  Princípio da Cooperação Leal (art. 4.º/3 TUE): os Estados-Membros devem cooperar lealmente com a UE.  Princípio da Cooperação Diferenciada:  Em certos casos, admite-se que só alguns Estados-Membros participem em certo aprofundamento da cooperação (art. 20.º TUE): são as cooperações reforçadas.  Em certos casos, admite-se que certos Estados não participem em certa forma de cooperação: são as derrogações à integração, que são acordadas em Tratado com os Estados que não participam.  Princípio do Respeito pelas Identidades Nacionais (art. 4.º/2 TUE): uma competência negativa. Proíbe-se a intervenção europeia se ela puser em causa as identidades nacionais.  Princípio do Respeito pela Estadualidade: A UE mantém-se uma União de Estados Soberanos. Por isso, garante-se o direito de sair da UE (art. 50.º TUE). 3. QUADRO INSTITUCIONAL ÚNICO QUE SIGNIFICA?  Historicamente, a expressão mencionava a existência de várias Organizações Internacionais diferentes (embora compostas pelos mesmos Estados) dispondo dos MESMOS ÓRGÃOS.  Os mesmos órgãos atuavam em organizações internacionais diferentes.  Comunidade Europeia (CE);  União Europeia (em sentido estrito);  Comunidade Europeia da Energia Atómica (EURATOM); 37 DUE I 2017/2018  Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA).  Ao conjunto destas organizações internacionais dá-se o nome de União Europeia (em sentido amplo).  Os órgãos são OS MESMOS em todas estas organizações.  MAS, os seus poderes variavam ligeiramente consoante atuem no quadro da CE, da UE ou da EURATOM. Com o Tratado de Lisboa, a expressão perde importância, em virtude da fusão da União Europeia com a Comunidade Europeia. A expressão ainda faz sentido? Sim, A expressão mantém-se adequada, uma vez que menciona os órgãos comuns da EU e da EURATOM. UE EURATOM (sentido estrito) União Europeia em Sentido Amplo Os mesmos órgãos para as duas organizações QUAIS SÃO AS INSTITUIÇÕES DA UNIÃO (O TAL QUADRO INSTITUCIONAL ÚNICO)?  Artigo 13.º TUE:  Parlamento Europeu;  Conselho;  Conselho Europeu;  Comissão Europeia; As instituições da União Europeia  Tribunal de Justiça da União Europeia;  Banco Central Europeu;  Tribunal de Contas. 38 DUE I 2017/2018  Além destas Instituições, os Tratados estabelecem outros órgãos. Ex:  Comité das Regiões;  Comité Económico e Social; Os órgãos da  Provedor de Justiça da União; União Europeia  Banco Europeu de Investimento. NOTAS INICIAIS 1. O Conselho e o Conselho Europeu; 2. A diferença entre órgãos e instituições; 3. As responsabilidades institucionais e as matérias tratadas; 4. O princípio democrático nas Instituições e Órgãos Europeus; 5. O Princípio da União de Direito e suas implicações institucionais. I. CONSELHO ǂ CONSELHO EUROPEU ATENÇÃO: O Conselho Europeu não é o Conselho! 1. Conselho (ou Conselho da União Europeia OU Conselho de Ministros).  Previsto nos artigos 16.º TUE e 237.º a 243.º TFUE;  Composto por representantes dos Estados-Membros a nível ministerial;  Várias composições: Assuntos Gerais (MNEs de todos os Estados) ou composições especializadas (ECOFIN, por exemplo.) 2. Conselho Europeu.  Previsto no artigo 15.º TUE e 235.º e 236.º TFUE;  Órgão político no seio da União Europeia;  Composto pelos Chefes de Estado e de Governo mais Presidente da Comissão Europeia;  É o órgão de impulso político da União. 39 DUE I 2017/2018 II. DISTINÇÃO ENTRE ÓRGÃOS E INSTITUIÇÕES  Na versão originária, os Tratados diferenciavam entre órgãos e instituições e aparentemente reservavam esta designação a órgãos com particular dignidade política:  Porque participam no procedimento decisório;  Porque resolvem contenciosamente litígios.  Este critério foi-se esvaziando até ao Tratado de Nice, pois foram sendo criados órgãos com mais poderes que certas instituições (o BCE era o exemplo clássico).  O Tratado de Lisboa retomou o critério originário, promovendo ao epíteto de instituições quer o Banco Central Europeu, quer o Conselho Europeu. III. RESPONSABILIDADES INSTITUCIONAIS As instituições europeias desempenham um papel decisivo no processo de decisão da UE e na dinamização e promoção das suas finalidades. As mesmas exercem as suas funções autonomamente, de acordo com as atribuições e competências que lhes são tipificadas nos Tratados, e numa posição de paridade. As suas responsabilidades funcionais abrangem todas as áreas da atividade da UE. Enquanto a atividade dos órgãos da UE assume uma natureza preponderantemente jurídica e supranacional no âmbito do mercado interno, já no que diz respeito à política externa e de segurança e à cooperação policial e judiciária a mesma assume, em maior medida, uma coloração política e intergovernamental. Isto é assim, não obstante estar superado o modelo anterior de diferenciação entre pilares. À amplitude das responsabilidades funcionais das instituições funcionais da UE não é alheio o objeto de assegurar uma maior legitimidade das mesmas, num contexto de otimização funcional, bem como a vontade de, a prazo, consolidar e integrar toda a atividade da UE nos mais diversos domínios. IV. O PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO  A UE está vinculada ao princípio democrático (arts. 2.º e 10.º TUE).  Implicações para o funcionamento da UE e para a representação dos Estados- Membros  MAS fala-se num deficit democrático da UE! Nota-se falta de controlo democrático das decisões tomadas ao nível europeu. 40 DUE I 2017/2018  Como se combate?  Aumento dos poderes do PE (única instituição com legitimidade democrática direta);  Ampliação dos direitos de cidadania europeia (reforçando a proximidade dos cidadãos à UE);  Transparência e abertura do funcionamento das Instituições (a democracia participativa) Art. 10.º TUE 1. O funcionamento da União baseia-se na representativa. 2. Os cidadãos estão diretamente representados, ao nível da União, no Parlamento Europeu. Os Estados-Membros estão representados no Conselho Europeu pelo respetivo Chefe de Estado ou de Governo e no Conselho pelos respetivos Governos, eles próprios democraticamente responsáveis, quer perante os respetivos Parlamentos nacionais, quer perante os seus cidadãos. 3. Todos os cidadãos têm o direito de participar na vida democrática da União. As decisões são tomadas de forma tão aberta e tão próxima dos cidadãos quanto possível. V. A ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL E O PRINCÍPIO DA UNIÃO DE DIREITO  O Princípio da União de Direito tem para a UE as mesmas implicações que o Princípio do Estado de Direito tem para o Estado:  Designadamente, o controlo jurídico e político da atuação dos órgãos e instituições.  Assim, também vigora na UE um princípio de separação de poderes embora com características diferentes:  Estrutura conversacional do processo legislativo (mais do que encontrar um órgão competente exige-se o acordo de várias Instituições);  Intervenção de órgãos de soberania nacionais na atuação da UE. 41 DUE I 2017/2018 PARLAMENTO EUROPEU (Art. 14.º TUE; Arts. 223.º a 234.º TFUE) 1. Legitimidade; 2. Natureza; 3. Composição; 4. Organização; 5. Poderes. 1. LEGITIMIDADE:  Legitimidade Democrática:  Pretende representar os CIDADÃOS da União (depois veremos quem são).  Não os Governos, mas os Povos, os Cidadãos! ATÉ 1979:  Era composto por deputados dos Parlamentos Nacionais, de vários partidos.  Já aí se denunciava que os eurodeputados representavam os POVOS e não os Estados, pois não representavam apenas o partido do Governo DESDE 1979:  Os membros do Parlamento são eleitos diretamente por sufrágio universal. MAS As regras eleitorais são as que vigorarem nos Estados-Membros:  As eleições para o Parlamento Europeu não são todas no mesmo dia;  As incapacidades eleitorais variam (idade, por exemplo). Atendendo ao Princípio da Democracia Representativa (art. 10.º/1 e 10.º/2 TUE), ocupa um lugar central. 42 DUE I 2017/2018 NOVIDADE DO TRATADO DE LISBOA Regras eleitorais comuns (art. 223.º TFUE):  Para evitar as disparidades nas regras eleitorais das eleições para o Parlamento Europeu, confere-se competência à União para adotar regras uniformes ou princípios uniformes.  Terão de ser fixadas por unanimidade dos Estados-Membros (no Conselho) e de ser aprovadas pelo Parlamento Europeu. (223.º/2 TFUE)  Ainda não foram adotadas. Caso Prático: Karkov é cidadão polaco residente em Portugal e quer saber se pode votar, em Portugal, para as eleições para o Parlamento Europeu. Em caso afirmativo, quer saber se o seu voto será nas listas que concorrem na Polónia ou se, pelo contrário, votará nas listas concorrentes em Portugal.  RESOLUÇÃO  O direito a votar no Estado da sua residência é um dos direitos conferidos pela cidadania europeia (que depois veremos).  O artigo 22.º/2 do TFUE permite que os cidadãos possam votar para o PE no Estado da sua residência.  E QUANTO À SEGUNDA PERGUNTA?  Deve votar Karkov nas listas polacas ou nas listas portuguesas?  NAS LISTAS DO ESTADO DA RESIDÊNCIA (22.º/2 TFUE)! PORQUÊ? Porque o PE representa os povos e não os Governos. Os deputados europeus, no Parlamento Europeu, não se agrupam por países; Não existe uma disciplina de voto por Estado. Onde quer que resida, Karkov pode escolher representantes da sua ideologia, sem necessidade de proceder a procedimentos internacionais de troca de votos. 43 DUE I 2017/2018 2. NATUREZA: é um órgão ou uma Instituição?  É uma instituição. Consta da lista do art. 13.º TUE.  Isso permite adivinhar que tem poderes relevantes, dignidade política. 3. COMPOSIÇÃO:  Composto por deputados ao Parlamento Europeu, que são representantes dos cidadãos europeus (14.º/2 TUE).  O seu número é definido pelo Parlamento Europeu (art. 14.º/2 TUE), sendo atribuído um certo número de deputados por cada país.  Atualmente são 751 representantes dos cidadãos europeus; o seu numero máximo é justamente de 751. QUAL É O CRITÉRIO DE REPARTIÇÃO DOS EURODEPUTADOS POR PAÍS?  Art. 14.º/2 TUE: O critério de distribuição é demográfico de residência, regressivamente proporcional, com os limites de 6 deputados para o Estado-Membro menos populoso e 96 para o Estado- Membro mais populoso.  Alemanha: 96 Deputados.  Malta: 6 Deputados. Porquê a proporcionalidade regressiva? Para não prejudicar os Estados mais pequenos: Se cada deputado representasse 1 Milhão de votos, em Malta não existiria nenhum eurodeputado PAPEL DO PARLAMENTO EUROPEU  O PE representa os povos e não os Governos. Os deputados europeus, no parlamento, não se agrupam por Estados e não existe uma disciplina de voto por Estado.  Os deputados europeus agrupam-se por ideologias e afinidades, em GRUPOS políticos Europeus. Cada deputado só pode pertencer a um grupo político, e também pode exercer a sua atividade como deputado não inscrito. 44 DUE I 2017/2018  As maiores famílias políticas europeias estão no Partido Socialista Europeu (PSE) e no Partido Popular Europeu (PPE). Curiosidade dos Partidos Portugueses:  PSD e CDS: Partido Popular Europeu;  PS: Partido Socialista Europeu;  PCP e BE : Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia;  PEV: Federação dos Verdes Europeus;  MPT: Grupo da Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa. GRUPOS POLÍTICOS EUROPEUS Os grupos políticos desempenham um importante papel no PE:  O presidente do PE é eleito na base de um acordo entre o PPE e o PSE (veremos já porquê).  Quem decide a ordem de trabalhos é a Conferência dos Presidentes: O Presidente do PE e os Presidentes dos grupos políticos europeus.  A distribuição de tempo é feita em ordem aos grupos políticos. PARTIDOS POLÍTICOS A NÍVEL EUROPEU Novidade do Tratado de Lisboa Democratização da União  O Tratado de Lisboa prevê os partidos políticos a nível europeu. (Art. 10.º/4 TUE; art. 224.º TFUE).  Serão partidos políticos internacionais, abertos à filiação individual. O objetivo é trazer provocar discussão política acerca das competências da União, aproximar os cidadãos da União.  Os Grupos Políticos Europeus (confederações de partidos políticos nacionais) pediram o registo na União como partidos políticos europeus. 45 DUE I 2017/2018 PARLAMENTO EUROPEU MANDATO:  Os deputados são eleitos por 5 anos, por sufrágio direto e universal (14.º/3 TUE) ESTATUTO:  O mandato é representativo (14.º/2 TUE).  Isto é, os deputados votam individualmente e não podem receber ordens de ninguém (artigo 2.º Regimento PE). Há total independência em relação aos Governos e aos Parlamentos nacionais! Não representam o Estado mas os cidadãos que os elegeram. QUESTÃO: O Ministro da Defesa espanhol pretende candidatar-se ao Parlamento Europeu. Pode acumular as funções governativas com as funções de deputado europeu?  NÃO! Isso seria incompatível com o carácter representativo e independente do cargo! (artigo 2.º Regimento).  Se se permitisse a acumulação, o deputado europeu estaria ali a defender o seu governo e não os cidadãos eleitores. E um deputado nacional, pode acumular com as funções de eurodeputado?  Pode. O facto de ser deputado não o impede de representar com independência o povo europeu que o elegeu.  Simplesmente, alguns Parlamentos Nacionais têm uma regra de incompatibilidade nesse sentido.  Isto é, o PE não proíbe que um eurodeputado seja deputado nacional; mas alguns parlamentos nacionais proíbem que se seja deputado nacional, sendo já eurodeputado. 46 DUE I 2017/2018 4. ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO:  O PE aprova o seu próprio regimento: Princípio da autonomia institucional.  O Regimento do Parlamento Europeu é o ato jurídico que estabelece as respetivas regras de funcionamento. REGRA DE DELIBERAÇÃO DO PE:  Maioria absoluta (metade + 1) dos votos expressos é a regra (231.º TFUE). EXCEÇÕES:  Rejeição de proposta no processo legislativo ordinário (art. 294.º/7/b) TFUE) exige maioria absoluta dos deputados.  Rejeição do orçamento (314.º/7/c) TFUE), exige maioria absoluta dos deputados. REUNIÕES (229.º TFUE)  O Parlamento realiza uma sessão legislativa anual. A Legislatura (5 anos) é dividida em 5 sessões legislativas.  Em cada ano, tem lugar uma sessão contínua, que se subdivide em reuniões diárias. Quando reúne?  O Parlamento reúne por direito próprio na segunda terça-feira de Março (artigo 229.º TFUE).  Diariamente ocorrem reuniões do Parlamento Europeu.  O Plenário reúne às segundas-feiras e às quintas feiras;  Nos outros dias reúnem as comissões Parlamentares SEDE  A sede do PE foi objeto de acesa controvérsia.  O problema só ficou resolvido no Tratado de Maastricht, que tem um Protocolo relativo às sedes das instituições (anexo ao Tratado).  O Parlamento Europeu tem sede oficial em Estrasburgo;  Realizam-se em Estrasburgo as 12 sessões plenárias anuais; 47 DUE I 2017/2018  As sessões plenárias extraordinárias realizam-se em Bruxelas.  As Comissões Parlamentares reúnem em Bruxelas.  Os serviços do PE e o Secretariado-Geral estão no Luxemburgo.  Além da sede, o PE tem representações permanentes em todos os Estados-Membros, responsáveis pela ligação do Parlamento quer aos cidadãos desse Estado, quer aos Governos. ALÉM DOS DEPUTADOS EUROPEUS, HÁ OUTROS ÓRGÃOS, DENTRO DO PARLAMENTO. Mesa do Comissões Parlamento Europeu Presidente Parlamentares PARLAMENTO EUROPEU I. MESA DO PARLAMENTO EUROPEU (Art. 24.º Regimento)  Presidente do PE – Eleito pelos eurodeputados: (na prática, acordo entre PPE e PSE).  14 Vice-Presidentes (eleitos pelos deputados europeus), com funções delegadas pelo Presidente (art. 23.º Regimento);  5 Questores (consultores da mesa): não têm direito a voto. (28.º Regimento) Os mandatos do presidente, dos vice-presidentes e dos questores são de dois anos e meio! Isto é, em cada legislatura, temos duas mesas diferentes! COMPETÊNCIA DA MESA (ART. 25.º REGIMENTO):  Regular as questões relativas ao funcionamento do PE (financeiras, organização, administrativas;  Nomear o secretário-geral e estabelecer o organigrama do secretariado-geral. Este secretariado-geral gere os funcionários do PE e assegura a logística;  Nomear o Secretário-Geral do PE (chefe administrativo); 48 DUE I 2017/2018  Tomar as decisões sobre o modo de funcionamento das sessões;  Encabeçar as relações do PE com os Parlamentos Nacionais II. PRESIDENTE DO PE (art. 21.º Regimento):  Dirige os Trabalhos;  Representa institucionalmente. III. COMISSÕES PARLAMENTARES  Tal como nos parlamentos nacionais, o PE tem 21 comissões parlamentares em razão das matérias.  Quer isto dizer que, antes da discussão de qualquer matéria no plenário, as matérias são discutidas na comissão respetiva. Antonio Tajani (candidato PPE) Comissões Parlamentares 1. Assuntos Externos; 14. Desenvolvimento Regional 2. Direitos do Homem; 15. Pescas 3. Segurança e Defesa; 16. Cultura e Educação 4. Desenvolvimento; 17. Assuntos Jurídicos; 5. Comércio Internacional; 18. Liberdades Cívicas, Justiça e 6. Orçamentos; Assuntos Internos; 7. Controlo orçamental; 19. Assuntos Constitucionais; 8. Assuntos económicos e monetários; 20. Direitos da Mulher e 9. Emprego e assuntos sociais; Igualdade de Géneros; 10. Ambiente, Saúde Pública e Segurança Alimentar; 21. Petições 11. Indústria, Inovação e Energia; 12. Mercado Interno e proteção de consumidores; 13. Transportes e Turismo; 49 DUE I 2017/2018 PODERES E COMPETÊNCIAS Temos de distinguir os Poderes do PE consoante a área onde os exerça.  Generalidade das Matérias e Políticas;  Política Externa e de Segurança Comum No fundo, apesar de o Tratado de Lisboa ter acabado com a estrutura em Pilares (a UE e a CE tinham funcionamentos diferentes), mantém-se uma diferenciação no funcionamento da UE A PESC “está sujeita a regras e procedimentos específicos” (art. 24.º/1/2.º§ TUE) PORQUÊ? Porque é uma matéria mais sensível à soberania dos Estados. Logo, as instituições europeias têm nesta matéria menos poderes e competências.  Princípio da Autonomia da PESC - Art. 24.º/1/2.º § TUE PODERES NA GENERALIDADE DAS POLÍTICAS EUROPEIAS  O Parlamento Europeu é o órgão comunitário que passou por um verdadeiro processo de mutação.  No início, era um mero órgão de consulta.  HOJE o Parlamento Europeu tem verdadeiros poderes de decisão política, mas fora da PESC (anterior II Pilar)  PODERES LEGISLATIVOS Nunca legisla sozinho. Não é um Parlamento igual aos nacionais. MAS:  Pode desencadear o processo legislativo (225.º TFUE).  Em algumas matérias tem verdadeiro poder de decisão, embora apenas em parceria com o Conselho, no processo legislativo ordinário (art. 294.º TFUE).  Participa QUASE SEMPRE na adoção de quaisquer atos comunitários, embora por vezes apenas por parecer. PROCESSO LEGISLATIVO ORDINÁRIO COMISSÃO PROPÕE Atos são aprovados por acordo entre Conselho e PE 50 DUE I 2017/2018  PODERES DE CONTROLO O Parlamento é, por excelência, o órgão de controlo da Comissão Europeia:  Controla a designação da Comissão Europeia (depois veremos melhor);  Antes de começar a sessão legislativa, a Comissão submete ao Conselho um relatório das sua atividades. O PE d

Use Quizgecko on...
Browser
Browser