UC: Introdução ao Direito e à Ordem Jurídica da União Europeia - Profª Helena Telino PDF

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Prof. Helena Telino

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law legal studies European union law

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These lecture notes discuss the introduction to law and the legal order of the European Union, provided by Prof. Helena Telino from the Polytechnic University of Lisbon.

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Prof. Helena Telino UC: Introdução ao Direito e à Ordem Jurídica da União Europeia – Profª Helena Telino Prof. Helena Telino VIII - A INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DAS LEIS Nota prévia: Hierarquia das Leis e Processo LegislaD...

Prof. Helena Telino UC: Introdução ao Direito e à Ordem Jurídica da União Europeia – Profª Helena Telino Prof. Helena Telino VIII - A INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DAS LEIS Nota prévia: Hierarquia das Leis e Processo LegislaDvo 1. Noção de interpretação: os n.º 1 e 3 do arDgo 9.º do Código Civil. 2. Formas de Interpretação. 3. Tipos de Interpretação pelo Resultado 4. Integração de Lacunas da Lei. 5. Sucessão de leis no tempo. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Hierarquicamente podemos dividir as leis em três grandes grupos: 1. Leis Constitucionais 2. Leis Ordinárias 3. Regulamentos Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Leis Constitucionais O Estado português rege-se por uma Constituição escrita, a Constituição da República Portuguesa, que obedece a um processo legislativo diverso das demais normas. As normas jurídicas que a compõe chamam-se leis constitucionais e têm um valor hierárquico superior ao de quaisquer outras. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Leis Ordinárias (Atos normativos/Atos Legislativos) No grau imediatamente inferior às leis constitucionais surgem as leis ordinárias: - Leis da Assembleia da República (que não sejam constitucionais); - Decretos-Leis emanados do Governo, no exercício das suas funções legislativas (artigos 112.º, n.º 1, 198.º e 201.º, n.º 3 da CRP). Artigo 112.º (Atos normativos) 1. São atos legislativos as leis, os decretos-leis e os decretos legislativos regionais. Art. 198.º (Competência legislativa) 1. Compete ao Governo, no exercício de funções legislativas: a) Fazer decretos-leis em matérias não reservadas à Assembleia da República; Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Leis e Decretos-Leis têm o mesmo valor e força obrigatória. Artigo 112.º (Atos normativos) 2. As leis e os decretos-leis têm igual valor... Tal significa que, regra geral, Decretos-Leis podem modificar, interpretar, suspender ou revogar Leis oriundas do Parlamento. Uma Lei poderá ser alterada ou revogada por um Decreto-Lei e vice-versa. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo As leis gerais decorrem do poder legislativo, e surgem na sequência de designado processo legislativo. O processo legislativo, ou seja, o processo de elaboração das leis, comporta diversas fases ou momentos fundamentais: - Elaboração; - Aprovação; - Promulgação; - Referenda; - Publicação; - Entrada em Vigor; Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Elaboração: o processo legislativo só pode ser iniciado pelo órgão com competência legal, a Assembleia da República (AR). Aprovação: depois de iniciado o processo legislativo, o texto da lei é discutido e votado. A discussão dos projectos e propostas de lei admitidos compreende sempre um debate na generalidade e um debate na especialidade. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Debate na generalidade: onde se tenta indagar da justificação da iniciativa, da sua oportunidade, e do seu sentido. https://www.youtube.com/shorts/7YamRYzdC74 Debate na especialidade: onde se discute capítulo por capítulo, artigo por artigo, a substância e o mérito da dita iniciativa. https://www.youtube.com/shorts/SDwSoEYwLx0 Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Promulgação: Encontra-se concluído o ciclo de formação da lei. Mas esta, que materialmente já existe, não apresenta ainda vida jurídica, havendo lugar, subsequentemente, à sua promulgação. A promulgação é o acto pelo qual o Presidente da República “atesta solenemente a existência da norma e intima à sua observância”, no pressuposto que está regularmente aprovada nos termos constitucionais. Vide artigo 134º, alínea b) da CRP: Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Vide artigo 134º, alínea b) da CRP: Artigo 134.º (Competência para prática de atos próprios) Compete ao Presidente da República, na prática de atos próprios: a) Exercer as funções de Comandante Supremo das Forças Armadas; b) Promulgar e mandar publicar as leis, os decretos-leis e os decretos regulamentares, assinar as resoluções da Assembleia da República que aprovem acordos internacionais e os restantes decretos do Governo; c) Submeter a referendo questões de relevante interesse nacional, nos termos do artigo 115.º, e as referidas no n.º 2 do artigo 232.º e no n.º 3 do artigo 256.º; d) Declarar o estado de sítio ou o estado de emergência, observado o disposto nos artigos 19.º e 138.º; e) Pronunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da República; f) Indultar e comutar penas, ouvido o Governo; g) Requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação preventiva da constitucionalidade de normas constantes de leis, decretos-leis e convenções internacionais; h) Requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade de normas jurídicas, bem como a verificação de inconstitucionalidade por omissão; i) Conferir condecorações, nos termos da lei, e exercer a função de grão-mestre das ordens honoríficas portuguesas. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Conforme disposto no artigo 136º, nº 1 da CRP, no prazo de 20 dias a contar do recebimento de qualquer decreto da Assembleia da República para ser publicado como lei, o Presidente da República deve promulgá-lo ou por outro lado exercer o seu direito de veto. Se tal direito for exercido, este deve reenviar o texto à Assembleia da República, solicitando nova apreciação do diploma. O veto pode ser superado nos termos do nº 2 do artigo 136º da CRP. Vejamos os n.º 1 e n.º 2 do artigo 136.º da CRP: Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Artigo 136.º (Promulgação e veto) 1. No prazo de vinte dias contados da receção de qualquer decreto da Assembleia da República para ser promulgado como lei, ou da publicação da decisão do Tribunal Constitucional que não se pronuncie pela inconstitucionalidade de norma dele constante, deve o Presidente da República promulgá-lo ou exercer o direito de veto, solicitando nova apreciação do diploma em mensagem fundamentada. 2. Se a Assembleia da República confirmar o voto por maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções, o Presidente da República deverá promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua receção. 3. Será, porém, exigida a maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções, para a confirmação dos decretos que revistam a forma de lei orgânica, bem como dos que respeitem às seguintes matérias: a) Relações externas; b) Limites entre o sector público, o sector privado e o sector cooperativo e social de propriedade dos meios de produção; c) Regulamentação dos atos eleitorais previstos na Constituição, que não revista a forma de lei orgânica. 4. No prazo de quarenta dias contados da receção de qualquer decreto do Governo para ser promulgado, ou da publicação da decisão do Tribunal Constitucional que não se pronuncie pela inconstitucionalidade de norma dele constante, deve o Presidente da República promulgá-lo ou exercer o direito de veto, comunicando por escrito ao Governo o sentido do veto. 5. O Presidente da República exerce ainda o direito de veto nos termos dos artigos 278.º e 279.º Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Artigo 279.º (Efeitos da decisão) 1. Se o Tribunal Constitucional se pronunciar pela inconstitucionalidade de norma constante de qualquer decreto ou acordo internacional, deverá o diploma ser vetado pelo Presidente da República ou pelo Representante da República, conforme os casos, e devolvido ao órgão que o tiver aprovado. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Em síntese: Aprovação do projeto de lei pela Assembleia da República/Conselho de Ministros, seguida da promulgação do Presidente da República. Ou... Em alternativa poderá o Presidente da República: - remeter o diploma para o T.C. para remoção de dúvidas relativas à sua constitucionalidade em respeito às normas constitucionais (fiscalização preventiva da constitucionalidade); - exercer o seu veto político. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Referenda: aposição da assinatura de um ou mais membros do Governo por baixo da assinatura que o Presidente da República pôs em determinado ato legislativo, após a promulgação (cf. art. 140.º, n.º 1 da CRP). A falta de referenda determina a inexistência jurídica do ato que dela careça (artigo 140.º, n.º 2, da CRP). Publicação das Leis: A publicação das leis é o meio de as levar ao conhecimento geral dos indivíduos. Com efeito, a publicação das leis é determinada pela necessidade destas serem conhecidas para poderem ser aplicadas. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Publicação das Leis: É a publicação que confere publicidade aos atos legislativos, dado que a sua ignorância não aprova a ninguém. Facilmente se compreende que a lei tenha de ser dada a conhecer àqueles cujos comportamentos serão por ela afetados, bem como àqueles que tenham por missão aplicá-la. Vide artigo 6º Código Civil: Artigo 6.º - (Ignorância ou má interpretação da lei) A ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas. Prof. Helena Telino 1. Hierarquia das Leis Publicação das Leis: O artigo 119º da CRP indica um conjunto de atos que estão sujeitos a publicação. A falta de publicação determina a ineficácia jurídica desses atos, isto é, não produzem efeitos, como se tais atos legislativos estivessem suspensos, não sendo obrigatórios. Artigo 119.º (Publicidade dos atos) 1. São publicados no jornal oficial, Diário da República: a) As leis constitucionais; b) As convenções internacionais e os respetivos avisos de ratificação, bem como os restantes avisos a elas respeitantes; c) As leis, os decretos-leis e os decretos legislativos regionais; d) Os decretos do Presidente da República; e) As resoluções da Assembleia da República e das Assembleias Legislativas das regiões autónomas; f) Os regimentos da Assembleia da República, do Conselho de Estado e das Assembleias Legislativas das regiões autónomas; g) As decisões do Tribunal Constitucional, bem como as dos outros tribunais a que a lei confira força obrigatória geral; h) Os decretos regulamentares e os demais decretos e regulamentos do Governo, bem como os decretos dos Representantes da República para as regiões autónomas e os decretos regulamentares regionais; i) Os resultados de eleições para os órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local, bem como para o Parlamento Europeu e ainda os resultados de referendos de âmbito nacional e regional. 2. A falta de publicidade dos actos previstos nas alíneas a) a h) do número anterior e de qualquer ato de conteúdo genérico dos órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local implica a sua ineficácia jurídica. 3. A lei determina as formas de publicidade dos demais atos e as consequências da sua falta. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Publicação das Leis: Prescreve o artigo 5º, nº 1, do Código Civil: Artigo 5.º (Começo da vigência da lei) 1. A lei só se torna obrigatória depois de publicada no jornal oficial. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Repartição de competências legislativas (mais relevantes) Assembleia da República: 164.º e 165.º da CRP Governo: 198.º da CRP Vejamos... Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Repartição de competências legislativas: Artigo 164.º (Reserva absoluta de competência legislativa) É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias: a) Eleições dos titulares dos órgãos de soberania; b) Regimes dos referendos; c) Organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional; d) Organização da defesa nacional, definição dos deveres dela decorrentes e bases gerais da organização, do funcionamento, do reequipamento e da disciplina das Forças Armadas; (...) Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Repartição de competências legislativas: Artigo 165.º (Reserva relativa de competência legislativa) 1. É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: a) Estado e capacidade das pessoas; b) Direitos, liberdades e garantias; c) Definição dos crimes, penas, medidas de segurança e respetivos pressupostos, bem como processo criminal; d) Regime geral de punição das infrações disciplinares, bem como dos atos ilícitos de mera ordenação social e do respetivo processo; e) Regime geral da requisição e da expropriação por utilidade pública; (...) Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Repartição de competências legislativas: Artigo 165.º (Reserva relativa de competência legislativa) 2. As leis de autorização legislativa devem definir o objeto, o sentido, a extensão e a duração da autorização, a qual pode ser prorrogada. 3. As autorizações legislativas não podem ser utilizadas mais de uma vez, sem prejuízo da sua execução parcelada. 4. As autorizações caducam com a demissão do Governo a que tiverem sido concedidas, com o termo da legislatura ou com a dissolução da Assembleia da República. 5.As autorizações concedidas ao Governo na lei do Orçamento observam o disposto no presente artigo e, quando incidam sobre matéria fiscal, só caducam no termo do ano económico a que respeitam. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Repartição de competências legislativas: Artigo 198.º (Competência legislativa) 1. Compete ao Governo, no exercício de funções legislativas: a) Fazer decretos-leis em matérias não reservadas à Assembleia da República; b) Fazer decretos-leis em matérias de reserva relativa da Assembleia da República, mediante autorização desta; c) Fazer decretos-leis de desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam. 2. É da exclusiva competência legislativa do Governo a matéria respeitante à sua própria organização e funcionamento. 3. Os decretos-leis previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1 devem invocar expressamente a lei de autorização legislativa ou a lei de bases ao abrigo da qual são aprovados. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo As leis ordinárias não podem contrariar ou desrespeitar as leis constitucionais sob pena de poderem ser consideradas inconstitucionais (inválidas). Artigo 199.º (Competência administrativa) Compete ao Governo, no exercício de funções administrativas: c) Fazer os regulamentos necessários à boa execução das leis; Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Lei em sentido material / Lei em sentido formal Lei em sentido material: todo o ato normativo emanado de um órgão do Estado, mesmo que não tenha uma função legislativa, desde que contenha uma verdadeira regra jurídica. Exemplo: uma portaria que aprove um regulamento de exames. Lei em sentido formal: todo o ato normativo emanado de um órgão com competência legislativa, quer contenha, ou não uma verdadeira regra jurídica. Exemplo: as que conferem ao Governo autorizações legislativas. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Artigo 5.º do Código Civil: Artigo 5.º (Começo da vigência da lei) 1. A lei só se torna obrigatória depois de publicada no jornal oficial. 2. Entre a publicação e a vigência da lei decorrerá o tempo que a própria lei fixar ou, na falta de fixação, o que for determinado em legislação especial. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Todavia, a publicação das Leis não significa que estas entram imediatamente em vigor. Torna-se, ainda, necessário observar o período da vacatio legis, conforme prescreve o n.º 2 do artigo 5.º do C.C. Vacatio legis: Tempo que medeia a publicação da lei e a sua entrada em vigor. Este período destina-se a permitir a divulgação da lei tornando possível o seu conhecimento pelos respetivos destinatários. Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legisla3vo Assim, quando uma lei é publicada importa, em primeiro lugar, verificar se ela indica da data em que deverá entrar em vigor ou se, pelo contrário, nada diz a esse respeito. Se a lei for omissa relativamente a essa matéria, aplica-se o regime supletivo previsto no artigo 2.º da Lei n.º 74/98 (Lei Formulária). Vejamos... Prof. Helena Telino Hierarquia das Leis e Processo Legislativo Lei n.º 74/98, de 11 de novembro Artigo 2.º (Vigência) 1. Os atos legislativos e os outros atos de conteúdo genérico entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência verificar-se no próprio dia da publicação. 2. Na falta de fixação do dia, os diplomas referidos no número anterior entram em vigor, em todo o território nacional e no estrangeiro, no quinto dia após a publicação. 3. (Revogado.) 4. O prazo referido no n.º 2 conta-se a partir do dia imediato ao da sua disponibilização no sítio da Internet gerido pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda, S.A. Prof. Helena Telino Time to think (and work) Prof. Helena Telino Time to think (and work) Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação INTERPRETAR Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação O Direito exprime-se pela palavra, que é ela própria um símbolo, cujo conteúdo varia ao longo dos tempos e de lugar para lugar. A palavra que exprime o Direito necessita ser conhecida, para ser aplicada corretamente. O imediatismo, decorrente da língua, por vezes não permite conhecer o texto da lei em todo o seu alcance. Interpretar quer dizer determinar o significado de qualquer ato ou fenómeno. A interpretação da lei consiste em fixar o verdadeiro sentido e alcance do preceito legal. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Se a norma legal se apresenta ao jurista como um conjunto de palavras que constituem um texto, então: Interpretar consiste em retirar desse texto um determinado sentido ou conteúdo de pensamento. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Daí justamente a necessidade da interpretação, ou seja, daquela atividade do jurista que se destina a fixar o sentido e o alcance com que o texto deve valer. De entre os sentidos possíveis do texto há que eleger um. Qual deles? Fixar um critério que garanta um mínimo de uniformidade de soluções. Prof. Helena Telino Posição do Código Civil Ar@go 9.º Interpretação da lei 1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconsWtuir a parWr dos textos o pensamento legislaWvo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação A lei deve valer com o sentido correspondente à vontade real do legislador, desde que esta seja clara, e inequivocamente demonstrada. Caso contrário deve o intérprete atender a critérios objetivos, partindo do princípio que a lei procede de um legislador razoável. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Como fazer para interpretar (artº 9º)? A que elementos atender? 1º a letra como ponto de partida – reconstituir o pensamento legislativo através da letra da lei. 2º letra da lei como limite: “Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”. 3º - “o intérprete presumirá” que o legislador “soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação 4º “o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas”. 5º A interpretação deve ter em conta “as circunstâncias em que a lei foi elaborada” as “condições específicas do tempo em que a lei é aplicada". 6º “a unidade do sistema jurídico”. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Do artº 9º do Código Civil extraem-se os elementos a atender para interpretar: Elementos da interpretação Os elementos da interpretação consistem nos instrumentos que o intérprete deve utilizar na fixação do sentido da lei: os elementos de interpretação (literal/gramatical, elemento lógico, elemento sistemático, elemento histórico). * Vejamos esses elementos... Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Elementos de interpretação da lei 1.Elemento literal Elemento literal – letra da lei (ver o que aí se diz). Dá origem à interpretação literal ou exegese. É um elemento necessário, mas não suficiente (artº 9º, nº 2 do CC: “Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”). O intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, e designadamente ao seu sentido técnico jurídico no pressuposto de que o legislador soube exprimir corretamente o seu pensamento. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Elementos de interpretação da lei 2.Elemento lógico Elemento lógico – para além da letra da lei, deve recorrer-se a todas as potencialidades de transmissão de pensamento que a frase encerra. São processos de dedução jurídica. a) A lei que permite o mais também permite o menos; a lei que proíbe o menos proíbe o mais. Se um proprietário tem permissão para construir um ediDcio de três andares, isso implica que ele também poderia ter o direito de construir um ediDcio de dois andares ou um único andar. Por outro lado, se a legislação proíbe a construção de ediDcios de três andares, então essa proibição se estende a ediDcios de quatro ou mais andares (proibir o menos, proibição do mais). Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Elementos de interpretação da lei 2.Elemento lógico (conInuação) b) Relações entre meios e fins – a lei que permite o fim permite os meios necessários à sua prossecução; a lei que proíbe o fim proíbe os meios que a ele conduzem; a lei que permite os meios permite o fim a que eles conduzem; a lei que proíbe os meios proíbe o fim. A Cons'tuição Portuguesa permite a liberdade de expressão. Assim, todos os meios pacíficos que asseguram essa liberdade (tais como manifestações públicas, imprensa, redes sociais) também são permi'dos. Contudo, se o uso de meios específicos, como incitação à violência, é proibido, isso também impede o fim de uma expressão que promova a violência, já que os meios e fins se relacionam. O direito ao ambiente implica a possibilidade de restrições de a'vidades poluentes (meios que afetam o ambiente). A lei que proíbe um determinado agente químico nas indústrias também proíbe a produção de bens que não pudessem ser fabricados sem esse agente, pois o fim (proteger o ambiente) exige a proibição dos meios que o prejudicam. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação 2.Elemento lógico (continuação) Na fixação do sentido lógico sobressai a ratio legis. c) Ratio legis: consiste na razão de ser da lei, no fim visado pelo legislador ao elaborar a lei, bem como o conhecimento das circunstâncias (políticas, sociais, económicas, morais, etc.) em que a norma foi elaborada ou da conjuntura político-económico-social que motivou a “decisão” legislativa (ocasio legis). Normalmente é o fim da lei, a finalidade que o legislador pretende alcançar através da lei. Ex.: RCM Seca, Lei da Qualidade do ar, Lei casamento homoafetivo d) Argumento a contrario sensu – ex. artº 875º CC exige a escritura pública para alienação de imóveis: “o contrato de compra e venda de bens imóveis só é válido se for celebrado por escritura pública”. Interpretando-o a contrário, a alienação de móveis não carece de escritura pública. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação 3. Elemento sistemático ou sistémico Elemento sistemático: posição da norma no sistema. Da circunstância de certa norma pertencer a certo capítulo e não outro, deduzem-se conclusões sobre o sentido da lei. O contexto da norma também é elemento sistemático (artº 9º, nº 1 CC) – “tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico” Este elemento diz respeito à contemplação das normas no complexo normativo onde se integra a norma interpretada, de modo a salvaguardar coerência do ordenamento. No Código Civil, o regime de bens no casamento está regulamentado no “Livro IV DIREITO DA FAMÍLIA Secção IV Regimes de bens (art. 1717º ss)”. Essa localização normativa indica que as disposições sobre bens dos cônjuges se destinam principalmente a regular aspectos patrimoniais dentro das relações familiares, e não se destinam a ser aplicadas em outras relações jurídicas, como contratos comerciais entre sócios. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação 4. Elemento histórico Elemento histórico – evolução que deu origem à norma. Extrai-se de: trabalhos preparatórios, preâmbulos, ocassio legis (conjunto das circunstâncias da sociedade que justificam o aparecimento da lei), artº 9º, nº 1: “reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo”, tendo sobretudo em conta “as circunstâncias em que a lei foi elaborada” Aspetos a considerar: - História evolutiva do instituto, da figura ou do regime jurídico em causa. - As fontes de lei (fontes de inspiração do legislador – Ex. Código Civil português, código civil italiano ou alemão) -Trabalhos preparatórios – estudos e anteprojetos que acompanham a lei. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação 4. Elemento histórico Prof. Helena Telino Regras fundamentais de interpretação: "Presume-se que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e se exprimiu em termos adequados" (artº 9, nº 3 do CC) 1. Presume-se que não há normas, frases ou palavras inúteis; 2. A lei não impõe impossíveis; Ex.: Em um processo judicial, a lei não exige que as partes apresentem provas que estejam fora de seu alcance ou que sejam manifestamente impossíveis de obter. Ex.: um documento destruído num incêndio. 3. Onde a lei não distingue não cabe ao intérprete distinguir. Ex.: Se a lei permite o cancelamento de um contrato de prestação de serviços por justa causa, mas não especifica diferentes tipos de contratos, o intérprete não deve limitar a aplicação dessa regra apenas a certos serviços ou condições. Se a lei prevê que todos os rendimentos provenientes do trabalho devem ser tributados de maneira igual, o intérprete (como um juiz ou agente da autoridade tributária) não deve fazer distinções entre rendimentos de diferentes profissões, como médicos, advogados ou professores. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Tipos de Interpretação da Lei: a) Pela Fonte: - Autêntica - Oficial - Judicial - Doutrinária Prof. Helena Telino Interpretação pela fonte (continuação) a) AutênIca É a que é feita por lei de valor igual ou superior à lei interpretada. A lei que interpreta tem a designação de lei interpretarva. Vd. artº 13º CC: “Ar@go 13.º - (Aplicação das leis no tempo. Leis interpreta@vas) 1. A lei interpreta@va integra-se na lei interpretada...” b) Oficial É a interpretação que é feita em lei (em sen]do lato), de valor inferior ao da lei interpretada. Esta interpretação não é vincularva, designadamente não vincula os tribunais, mas já pode ter caráter vincularvo, por exemplo, ao nível hierárquico. Ex: interpretação que o Ministro faz de uma certa Lei através de Despacho: é vincularva para os serviços que dirige. Prof. Helena Telino Interpretação pela fonte (continuação) c) Judicial É a interpretação feita pelos Tribunais, que só é vincularva no âmbito do processo respervo. d) Doutrinária Trata-se da interpretação dada fora dos outros meios: será o caso dos pareceres dos jurisconsultos, advogados, etc e que não têm força vincularva. Só poderão ter o valor persuasivo que resultar do pressgio de quem fez a interpretação. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Tipos de Interpretação da Lei b) Pela finalidade (teleológica) - Objetivista - Subjetivista - Histórica - Atualista Prof. Helena Telino Interpretação pela finalidade (teleológica) - continuação a) Objetivista Procura determinar o sentido da lei, desligada da pessoa que legislou. Procura-se alcançar aqui a mens legis = “espírito da lei” b) Subjetivista Pretende alcançar o pensamento concreto do legislador. Procura-se alcançar aqui a mens legislatoris = “espírito do legislador” Prof. Helena Telino Interpretação pela finalidade (teleológica) - continuação c) Histórica Pretende reconstituir o sentido da lei no momento da sua aprovação e da sua entrada em vigor. A interpretação subjetivista é naturalmente histórica. d) Atualista Pretende determinar o sentido que a lei tem no momento da sua aplicação. Por alteração das circunstâncias e até do sentido das palavras, os dois sentidos (histórico e atualista) podem ser diferentes. Entende-se conveniente que a interpretação seja atualista. A interpretação objetivista é atualista. Ex.: Historicamente, o conceito de "domicílio" referia-se ao local fixo onde uma pessoa vivia e estabelecia sua residência habitual. No entanto, com as mudanças sociais e tecnológicas, o conceito de “domicílio” tem se adaptado para incluir novas realidades, como o trabalho remoto e a mobilidade internacional. Prof. Helena Telino 2 e 3. Formas e Tipos de Interpretação Tipos de Interpretação da Lei c) Interpretação da Lei em função do Resultado -Declararva, Enunciarva, Extensiva -Restrirva, Ab-rogante Prof. Helena Telino Interpretação da Lei em função do Resultado (continuação) Quanto ao resultado, a interpretação distingue-se em: a) Interpretação declarativa – a que fixa um determinado sentido à norma (por ex.: quando se refere a homem, no sentido de ser humano e não de ser do sexo masculino). -o intérprete limita-se a eleger um dos sentidos que o texto direta e claramente comporta, por ser aquele que corresponde ao pensamento legislativo. b) Interpretação enunciativa – quando o intérprete deduz da norma outras normas afins (ex. quem pode o mais, pode o menos). - é aquela pela qual o intérprete deduz de uma norma um preceito que nela apenas está virtualmente contido, utilizando certas inferências lógicas. Ex.: se uma lei permite que uma autoridade faça algo mais amplo (como ordenar um despejo), entende-se que também pode adotar medidas menos severas, como solicitar a retirada voluntária. Prof. Helena Telino Interpretação da Lei em função do Resultado (continuação) c) Interpretação extensiva - o intérprete chega à conclusão de que a letra do texto fica aquém do espírito da lei, isto é, diz menos do que aquilo que pretendia dizer. Alarga então o texto fazendo corresponder a letra ao espírito da lei. – Quando se chega à conclusão de que a letra é mais restrita que o espírito. Ex artº 877º, nº 1 CC, não se refere a bisavós, mas apenas a pais e avós: “1. Os pais e avós não podem vender a filhos ou netos, se os outros filhos ou netos não consentirem na venda”. Entende-se, por interpretação extensiva, que também estão abrangidos na proibição os bisavós. Imagine uma lei que proíbe a discriminação no trabalho por motivos de sexo. A redação da norma menciona especificamente "sexo", mas o espírito da lei é proteger contra qualquer tipo de discriminação, incluindo aquelas relacionadas à identidade de gênero ou à orientação sexual. Prof. Helena Telino Interpretação da Lei em função do Resultado (continuação) d) Interpretação restri]va – o intérprete limita a norma por entender que o texto vai além do sen]do. O intérprete chega à conclusão de que o legislador adotou um texto que atraiçoa o seu pensamento, na medida em que diz mais do que aquilo que pretendia dizer. Ex.: artº 938.º do CC, que regula a sucessão hereditária: “a herança defere-se, no momento da morte dos herdeiros, aos seus sucessores”. Se interpretarmos literalmente, pensamos que a herança é sempre transmi]da automa]camente aos sucessores, independentemente de qualquer circunstância. No entanto, o intérprete, ao considerar o contexto e o espírito da lei (raZo legis), poderia entender que o legislador não quis incluir, p. ex., sucessores que adquiriram direitos de forma ilegí]ma (como por meio de fraude ou crime contra o falecido). Assim, o intérprete restringiu o alcance da norma, concluindo que a intenção do legislador era beneficiar apenas aqueles que estão em condições legí]mas e é]cas para herdar. Prof. Helena Telino Interpretação da Lei em função do Resultado (continuação) e) Interpretação ab-rogante – a interpretação que conduz à conclusão de que a norma não tem conteúdo válido, isto é, não tem sen]do nenhum. Ex.: duas normas do mesmo valor, mas contraditórias e com entrada em vigor na mesma data. O intérprete deve procurar resolver a contradição mas, se tal for impossível, então deve sacrificar-se a norma que lhe pareça menos adequada (interpretação ab-rogante). Ex.: Suponha que, em Portugal, existem duas leis. Uma estabelece que “todo cidadão pode circular livremente por qualquer município sem restrições”. A outra lei, publicada no mesmo dia e com a mesma validade, determina que "os cidadãos só podem circular entre municípios com autorização prévia da autoridade local". Aqui, temos uma contradição direta e irreconciliável. Se ambas as normas se aplicarem ao mesmo tempo, criarão confusão e insegurança jurídica, pois se contradizem no direito à livre circulação. O intérprete deve escolher uma delas. Nesse caso, poderia ab-rogar (ou eliminar) o que exige autorização, pois a liberdade de circulação é mais compaRvel com os valores do sistema jurídico português. Prof. Helena Telino Time to think (and work) INTEPRETAÇÃO JURÍDICA - CASOS PRÁTICOS Objetivos: q Identificar o que está em discussão e/ou em causa, nomeadamente um tema ou expressão utilizada; q Identificar os argumentos lógicos invocados; q Identificar e analisar os elementos da interpretação (saber referir onde se encontram consagrados no CC e como podemos definir cada um deles); q Apresentar uma solução de interpretação e definir a modalidade de interpretação que permite compreender e fixar o sentido que a lei pretende exprimir; q Determinar quem é que, no caso concreto, tem razão. Prof. Helena Telino Time to think (and work) Caso n.º 1 Imagine que o Governo pretende aprovar um pacote de medidas capazes de proteger a maternidade. Para esse efeito cria um conjunto de normas, entre as quais se inclui o Decreto-Lei n.º XXX/2024, no qual se encontra um artigo com o CASO PRÁTICO seguinte teor: N.º 1 “As mães solteiras beneficiam de uma redução de 50% no seu horário de trabalho, nos seis meses após o parto”. A Sra. Ana é recém divorciada e mãe de uma criança de dois meses. Pergunta-se: a Sra. Ana tem direito à redução de horário? Prof. Helena Telino Tópicos de resolução do caso n.º 1 – está em causa a interpretação da expressão “mães solteiras”: q Abordar o elemento literal: pelo elemento literal a Sra. Ana não teria direito a redução, pois mães solteiras serão apenas aquelas que nunca se casaram. q Abordar o elemento lógico: o objetivo do Governo será a proteção da maternidade, em particular das mães que possam estar sozinhas com filhos recém-nascidos (isto é, sem companheiro). q Há uma desarmonia entre o elemento literal e o elemento lógico, já que o legislador referiu-se a menos do que deveria ter referido (queria referir- se a todas as mães sem um companheiro num pós-parto, mas referiu-se a mães solteiras). q Solução? Deveria fazer-se uma interpretação extensiva da lei, estendendo a letra da lei de modo a abranger também as mães divorciadas. q A Sra. Ana tem direito a pedir a redução de horário de trabalho. Prof. Helena Telino Time to think (and work) Caso n.º 2 Uma determinada norma, relativa ao ensino superior e fixada numa determinada entidade de ensino, estipula o seguinte: “As grávidas e mães têm direito a realizar exames em época especial”. CASO PRÁTICO A. A Clara é mãe do Dinis, de 3 meses, e depois de ler as normas que regulam a N.º 3 matéria (isto é, o contexto da lei), chegou à conclusão que apenas as mesma grávidas e mães cujos filhos tenham até três anos de idade gozam deste direito. Pergunta-se: qual foi o resultado da interpretação a que a Clara chegou? B. Imagine que Bruno, pai do Dinis, recém-nascido, fustigado pelas poucas horas de sono que tem tido, dirige-se àquela entidade de ensino para se inscrever na época especial com base naquela norma. Pode? Prof. Helena Telino Tópicos de resolução do caso n.º 2: está em causa uma interpretação restri>va e uma interpretação extensiva qQuestão A: estamos perante uma interpretação restritiva de Clara, pois o legislador disse mais do que pretendia dizer. O contexto da lei indica que só as grávidas ou mães com filhos até 3 anos podem aceder à época especial. qQuestão B: Bruno pode fazer exames em época especial, recorrendo a uma interpretação extensiva. A razão de ser da norma é facilitar ou garantir que as pessoas com filhos pequenos tenham direito a realizar exames em época especial. Dever-se-ia ler “grávidas, mães e pais”, de forma a respeitar também o princípio da igualdade. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Artigo 10º Código Civil, Integração das lacunas da lei 1. Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável aos casos análogos. 2. Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei. 3. Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Lacunas da lei Apesar do ordenamento jurídico português ser composto por um conjunto vasto de ramos de direito e normas legais, o certo é que, por vezes, surgem situações reais que não encontram resposta na lei. Nenhum legislador é capaz de prever todas as relações da vida social merecedoras de tutela jurídica, por mais diligente e precavido que seja. Os casos em que a lei não dá resposta denominam-se de lacunas. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Lacunas: ocorre quando a lei (dentro dos limites de uma interpretação ainda possível) não contém a resposta a uma questão jurídica. Integração da lei: Corresponde à atividade destinada a encontrar solução para estes casos omissos (colmatar/preencher lacunas). Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Há várias perspetivas de apresentar as lacunas. Segundo a maioria dos autores as lacunas podem ser: Voluntárias - Se a inexistência de disciplina jurídica é algo querido pelo legislador, se há um silêncio eloquente da lei. Involuntárias - Se o legislador não previu o caso que reclama solução jurídica, e por isso não elaborou a correspondente lei. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Dentre as numerosas razões que explicam as lacunas, destacam-se: 1. IMPREVISIBILIDADE – num complexo de acontecimentos diários é impossível prever todas as situações, e portanto há casos que são insusceptíveis de serem entendidos pelo legislador a priori numa lei. 2. INTENÇÃO DE NÃO LEGISLAR – Por vezes, o legislador pode ter intenção de não disciplinar determinada matéria. Por ser muito fluida, por ser arriscado sem o completo conhecimento da situação, ou mesmo quando o legislador prefere deixar aos órgãos que aplicam o direito à resolução da questão. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Perante uma lacuna da lei, como deverá ele proceder o intérprete, designadamente o julgador? Código Civil Artigo 8.º (Obrigação de julgar e dever de obediência à lei) 1. O tribunal não pode abster-se de julgar, invocando a falta ou obscuridade da lei ou alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio. 2. O dever de obediência à lei não pode ser afastado sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo. 3. Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Código Civil ArIgo 10.º (Integração das lacunas da lei) 1. Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável aos casos análogos. 2. Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões jus]fica]vas da regulamentação do caso previsto na lei. 3. Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. O legislador deverá aplicar por analogia aos casos omissos as normas que diretamente contemplem casos análogos – e só na hipótese de não encontrar no sistema jurídico uma norma aplicável a casos análogos é que deverá proceder de acordo com o n.º 3. Razões para esta solução: a) princípio da igualdade – casos semelhantes devem ter um tratamento semelhante. b) certeza de direito -muito mais fácil obter a uniformidade de casos julgados. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. A aplicação analógica da lei distingue-se da interpretação extensiva. Aplicação analógica: Aplicação de uma lei a casos que ela não contempla, nem na letra nem no espírito. Interpretação extensiva: Aplicação da lei a situações deficientemente abrangidas pela sua letra, mas compreendidas no seu espírito, em virtude de o legislador, ao elaborar a norma, ter dito menos do que pretendia. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Exemplo de aplicação analógica: As regras relativas à escrituração dos comerciantes (artigo 29.º do Código Comercial: “Todo o comerciante é obrigado a ter escrituração mercantil efetuada de acordo com a lei”) são aplicáveis por analogia às sociedades civis (artigos 998.º e 1014.º do Código Civil). O Código Civil Português prevê no artigo 493.º a responsabilidade por danos causados por coisas ou atividades perigosas. No entanto, este artigo não menciona explicitamente novas tecnologias como drones. Ainda assim, em caso de danos causados por drones, poderia aplicar-se analogicamente este artigo, dado que drones podem ser consideradas atividades perigosas. Prof. Helena Telino 4. Integração de Lacunas da Lei. Norma Ad hoc Na hipótese do julgador não poder recorrer à analogia, terá de proceder à criação de uma norma ad hoc. (Ad hoc é uma expressão la

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