Moeda e Taxa de Juros em Keynes PDF
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Este documento examina as ideias de John Maynard Keynes sobre as taxas de juros em relação à economia. O texto analisa como as expectativas de curto e longo prazo influenciam na taxa de juros e como a teoria de Keynes difere da teoria neoclássica sobre o assunto. As principais ideias da teoria de Keynes sobre este tema são apresentadas.
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MOEDA, TAXA DE JUROS E ALOCAÇÃO DE PORTFÓLIO Bibliografia: Keynes (1936, caps. 13, 14, 15 e 17); Keynes (1937a); Dillard (1948, cap. 8)*. 1. INTRODUÇÃO Após a discussão sobre as expectativas de longo prazo, é possível sintetizar o estado de construção do modelo de Keynes da seguinte forma:...
MOEDA, TAXA DE JUROS E ALOCAÇÃO DE PORTFÓLIO Bibliografia: Keynes (1936, caps. 13, 14, 15 e 17); Keynes (1937a); Dillard (1948, cap. 8)*. 1. INTRODUÇÃO Após a discussão sobre as expectativas de longo prazo, é possível sintetizar o estado de construção do modelo de Keynes da seguinte forma: Nível de emprego e produção Função demanda Função oferta agregada (ex ante) agregada (ex ante) Período de produção Expectativas de demanda Expectativas de custo EXPECTATIVAS DE CURTO PRAZO Quebra temporal Resultados efetivamente realizados (ex post): renda nominal, quantidade vendida, Períodos de preços, custos efetivos, etc. mercado anteriores PDE Demanda realizada (ex post) Propensão marginal Unidade a consumir Multiplicador de salários (W) (PMgC) Investimento privado (Iw) Taxa nominal de Escala de EMgK em geral juros Lucros Preço de oferta dos esperados bens de capital esperado Receitas Custos Bolsa de valores: esperadas esperados Preço das ações EXPECTATIVAS DE LONGO PRAZO: especulação Demanda, salários, inflação, inovações X tecnológicas, etc. empreendimento INCERTEZA NÃO-PROBABILÍSTICA Estado de confiança potencialmente instável Estado de ânimo Teoria prática (animal spirits) do futuro; convenções 1 2. CRÍTICA À TEORIA NEOCLÁSSICA DA TAXA DE JUROS No modelo neoclássico a taxa de juros era a variável capaz de equilibrar investimento (demanda por crédito) e poupança (oferta de crédito). Era, portanto, determinada por forças do lado real da economia, quais sejam, a produ- tividade marginal do capital (pelo lado da função investimento) e pela taxa intertem- poral de descontos (pelo lado da função poupança); além da política fiscal (que afeta a poupança e o investimento). Contudo, da forma como Keynes definiu poupança e investimento (que passou a ser acei- ta como sistema de contabilidade social, baseado no manual do FMI que a utiliza), eles são iguais por definição. Portanto, não há necessidade de uma variável que cumpra o pa- pel de igualá-las. Logo, de acordo com o autor, a taxa de juros não poderia ser concebida de acordo com a teoria neoclássica. Ademais, para Keynes a poupança não é a mesma coisa que a oferta de crédito, pois nem toda poupança vira aplicação financeira (oferta de crédito). Parte pode ser mantida na forma de moeda. Assim, a taxa de juros não deve ser vista como um rendimento da pou- pança enquanto tal. 3. A TEORIA DA TAXA DE JUROS EM KEYNES Dois tipos de decisões bem diferenciadas: Uma sobre FLUXOS: qual parcela da renda consumir (PMgC); Outra sobre ESTOQUES: em que forma manter a riqueza. Para Keynes, a taxa de juros é determinada através desta última decisão, e não da primei- ra. Obs.: Trata-se de uma taxa de juros representativa; ela representa na verdade um complexo de taxas de juros de prazos e condições de pagamento muito variados. Há três formas básicas de aplicar o estoque de riqueza (patrimônio líquido): Bens de capital (máquinas, equipamentos e construções); Títulos (aplicações financeiras em sentido amplo, inclusive ações); Moeda (papel-moeda mais depósitos à vista – sem juros – nos sistema bancário). ▪ Já vimos anteriormente como os agentes escolhem entre bens de capital e títulos; precisamos observar agora a escolha entre moeda e títulos. Conceito: Preferência pela liquidez (PPL) é o montante de seus recursos que um agente econômico deseja manter em forma líquida, isto é, de moeda. “Substancialmente idêntico” à demanda por moeda. Inversamente relacionada à velocidade-renda de circulação moeda (quanto maior a PPL, menor V). A taxa de juros é vista como recompensa pela renúncia à preferência pela liquidez. É portanto uma medida da relutância dos que possuem dinheiro em dispor do mesmo. 2 É o “preço” mediante o qual o desejo de manter riqueza na forma líquida (moeda) se concilia com a quantidade de moeda existente. Portanto, a taxa de juros é determinada: Pela escala de preferência pela liquidez (L); Pela quantidade de moeda em circulação (M). ▪ Em particular, como veremos, ela é determinada pela interseção das duas funções, conforme abaixo: Equilíbrio no mercado monetário com oferta de moeda exógena: M i i0 L(Y;ie) M0=L0 M, L A quantidade de moeda em circulação M não é determinada pelo “público” (agentes pri- vados) mas sim: Pela política monetária do governo (é exógena); Em alguns tratamentos, pela preferência pela liquidez dos bancos; ▪ A PPL dos bancos pode ser vista como afetando ou a PPL total ou a quantidade de moeda em circulação M; De um jeito ou de outro, acaba afetando a taxa de juros: quanto maior a PPL do sistema bancário, maior a taxa de juros. Ponto fundamental: por que existe preferência pela liquidez, se a moeda nada rende? A teoria neoclássica identificou apenas o motivo transação: convêm sacrificar, até cer- to ponto, os juros pela conveniência da liquidez; Keynes porém argumenta que a moeda é objeto de preferência também como forma de manter riqueza. Mas a moeda é estéril, ao contrário de, praticamente, todas as ou- tras formas de reserva de valor que proporcionam alguma remuneração. “Fora de um hospício para loucos, por que alguém desejaria usar o dinheiro como re- serva de valor? Porque, em parte por motivos razoáveis e em parte por razões instinti- vas, nosso desejo de manter o dinheiro como reserva de valor constitui um barô- metro do grau de nossa desconfiança de nossos cálculos e convenções quanto ao futuro (...) A posse do dinheiro tranqüiliza nossa inquietação; e o prêmio que exigi- mos para nos separarmos dele é a medida do grau de nossa inquietação (Keynes, 1937b, pág. 173, 2º parágrafo). ▪ A condição necessária para tanto é a existência de incerteza quanto ao comporta- mento futuro da taxa de juros; 3 Se não houvesse tal incerteza, todas as taxas futuras poderiam ser determinadas a partir das taxas correntes; ▪ Quem divergir da opinião do mercado (achando que a taxa futura será maior que a esperada) pode manter recursos líquidos para a especulação, na expectativa de que os preços dos títulos caiam (“baixistas”); ▪ Quem divergir no sentido contrário tomará emprestado para comprar títulos na ex- pectativa de que seus preços subam (“altistas”); ▪ O preço de mercado se fixará no ponto em que a venda dos baixistas se equilibrar com a compra dos altistas; As expectativas quanto ao futuro da taxa de juros, fixadas pela psicologia de massa, têm seus reflexos na preferência pela liquidez; Motivos para a preferência por liquidez: Motivo-transação: necessidade de moeda para operações correntes; implica uma rela- ção direta entre L e Y1; Motivo-precaução: desejo de segurança; entra aí o grau de confiança como determi- nante; quanto menor o grau de confiança no futuro, maior a PPL; Motivo-especulação: propósito de obter lucros por formar expectativas diferentes das do mercado; implica uma relação inversa entre L e i; mas também é uma relação entre a taxa de juros esperada (convencional) e a efetiva; se a efetiva cai em relação à espe- rada (isto significa que os preços efetivos subindo em relação ao esperado): ▪ Caem os juros que compensam os riscos de capital: ▪ Limites a uma baixa acentuada da taxa de juros – “armadilha da liquidez”); Motivo-finanças: posterior à Teoria Geral; trata da relação entre gastos discricionários (em grande valor) esperados, que levam certo agente a acumular liquidez para poder realizar tal gasto; ▪ Motivo especulação torna a PPL potencialmente instável. ▪ A estabilidade do sistema e sua sensibilidade a aumentos na oferta de moeda de- pendem da existência de divergência de opiniões. ▪ Taxa de juros = fenômeno basicamente psicológico (ou, preferencialmente, fenô- meno altamente convencional); seu valor corrente depende muito do valor previsto para o futuro; ▪ Não pode permanecer em um nível inferior ao de pleno emprego; mas pode perma- necer em um nível que esteja acima da correspondente ao pleno emprego; ▪ A política monetária controla facilmente a taxa de juros de curto prazo, mas não a de longo prazo; Em tese, seria possível utilizar a política monetária para baixar a taxa de juros, estimular o investimento e, através deste, a produção e o emprego. Contudo, como afirma Keynes, há muitos “percalços entre a taça e os lábios”: Um aumento na quantidade de moeda não reduzirá a taxa de juros se a PPL aumentar mais do que a quantidade de moeda; 1 No capítulo 15 Keynes subdivide o motivo-transação em motivo-renda e motivo-negócios (vide Keynes, c1936, cap. 15, item I, parágrafos 4 e 5). 4 Uma baixa na taxa de juros não estimulará o investimento se a escala da EMgK em ge- ral cair mais depressa do que a taxa de juros; Um aumento no investimento não ampliará a demanda se a PMgC cair em montante superior; O aumento na demanda aumentará a renda nominal, com seu efeito se distribuindo em parte em uma elevação do emprego e parcialmente dos preços; O aumento da renda nominal aumentará a quantidade de moeda necessária para manter certa taxa de juros. Há, além disso, dois problemas adicionais que diminuem a capacidade da política mone- tária contribuir para reduzir o desemprego: Se a autoridade monetária estivesse disposta a operar com dívidas de vários vencimen- tos e riscos, a relação entre o complexo de taxas de juros e a quantidade de moeda se- ria direta. Mas como a autoridade monetária concentra suas operações nas dívidas de curto prazo, as de longo prazo (e o spread) ficam muito sensíveis à PPL; Possibilidade de armadilha da liquidez implica perda de controle da taxa de juros; Resultava disso certo pessimismo em relação à política monetária: “Já devem ser bastante evidentes para o leitor as dificuldades que se antepõem ao propósito de manter uma de- manda efetiva de nível suficientemente alto para garantir o pleno emprego, resultantes da associação de uma taxa de juros a longo prazo convencional e bastante estável com uma eficiência marginal do capital inconstante e altamente instável” (Keynes, 1936, cap. 15, item II, penúltimo parágrafo). Talvez por isso ele tenha dito em outro momento: “Da minha parte sou presentemente al- go cético quanto ao êxito de uma política meramente monetária orientada no sentido de exercer influência sobre a taxa de juros. Encontrando-se o Estado em situação de poder calcular a eficiência marginal dos bens de capital a longo prazo e com base nos interesses gerais da comunidade, espero vê-lo assumir uma responsabilidade cada vez maior na or- ganização direta dos investimentos, ainda mais considerando-se que, provavelmente, as flutuações na estimativa do mercado da eficiência marginal dos diversos tipos de capital, calculada na forma descrita antes, serão demasiado grandes para que se possa compensá- las por meio de mudanças viáveis na taxa de juros” (Keynes, 1936, cap. 12, item VIII, úl- timo parágrafo). Mas ao mesmo tempo não desiste de manter as esperanças: “Se quisermos tirar proveito de reflexões mais animadoras, temos de procurá-los convictos de que a convenção nem sempre oferecerá muita resistência a uma lógica contundente e a um firme propósito da autoridade monetária. A opinião pública é suscetível de acostumar-se com bastante rapi- dez a uma baixa moderada da taxa de juros e, consequentemente, podem-se modificar as expectativas convencionais quanto ao futuro, preparando-se, assim, o caminho para um novo movimento – até certo ponto” (Keynes, 1936, cap. 15, item II, último parágrafo). 5