Gasto Energético e Calorimetria

Determinação das Necessidades Energéticas

• O organismo consome energia continuamente para manter todos os processos funcionantes.
• O metabolismo energético é uma atividade celular que abrange reações anabólicas (que consomem energia) e catabólicas (que liberam energia).
• Metabolismo é a soma total das transformações químicas em uma célula ou organismo.
• Energia é a capacidade de realizar trabalho ou produzir mudanças na matéria.
• O metabolismo energético compreende todas as vias utilizadas pelo organismo para obter e usar energia química dos nutrientes.

Unidades de Energia

• A caloria é a unidade padrão para medir energia, sendo a quantidade de energia térmica necessária para elevar a temperatura de 1 mL de água a 15 °C em 1 °C.
• A quilocaloria (kcal), equivalente a 1.000 calorias, é utilizada para medir a energia no metabolismo dos alimentos.
• O joule é uma unidade de medida de calor mecânico, onde 1 kcal equivale aproximadamente a 4,184 quilojoules (kJ).
• Para converter kcal em kJ, multiplica-se o valor em kcal por 4,2.

Fontes de Energia: Alimentos

• Para que a energia dos alimentos (carboidratos, proteínas e lipídios) seja utilizável, eles passam por digestão, absorção e metabolismo.
• As etapas convergem para a liberação de acetil e a formação de acetil coenzima A.
• As moléculas de acetil coenzima A entram no ciclo de Krebs, liberando hidrogênio que é oxidado na cadeia respiratória para gerar água, gás carbônico e energia em forma de ATP.

Conteúdo Energético dos Alimentos

• Cada alimento tem um valor energético específico.
• Cada grama de carboidratos e proteínas fornece 4 Kcal.
• Cada grama de lipídeos fornece 9 Kcal.

Componentes do Gasto Energético

• A taxa metabólica basal (TMB), o efeito térmico da atividade física, o efeito térmico dos alimentos e a termogênese facultativa são os componentes do gasto energético de 24 horas.

TMB (Taxa Metabólica Basal)

• É a quantidade mínima de energia gasta para manter as funções vitais.
• O gasto energético basal (GEB) reflete a energia usada em 24 horas em repouso e em ambiente termicamente neutro.
• O GEB corresponde a 60-75% do gasto energético diário.
• As mensurações do GEB devem ser feitas antes de qualquer atividade física e 10-12 horas após a última refeição.
• O GEB é notavelmente constante quando avaliado diariamente.

GER (Gasto Energético de Repouso) / TMR (Taxa Metabólica de Repouso)

• A taxa de metabolismo de repouso (TMR) é similar à TMB, representando a energia gasta em condições semelhantes.
• A TMR pode ser medida após o indivíduo se deslocar para o local do exame e não requer jejum de 12-14 horas.
• Recomenda-se um repouso de 30 minutos antes do exame para neutralizar efeitos da atividade física.
• A TMR tende a ser 10-20% maior que a TMB.
• Quando extrapolada para 24 horas, a TMR é equivalente ao gasto energético de repouso (GER).

Fatores que afetam o GER

• O tamanho e a composição corporal são os fatores que mais afetam o GER.

Idade

• O gasto energético em repouso é influenciado pela proporção de massa corporal magra (MCM), sendo maior em períodos de crescimento rápido, como nos primeiros anos de vida.

Composição Corporal

• A MCM é o principal componente metabolicamente ativo e preditor do gasto energético em repouso.
• A massa livre de gordura (MLG) contribui com cerca de 80% das variações no gasto energético em repouso.
• Atletas com maior desenvolvimento muscular têm um GER aproximadamente 5% maior que não atletas.

Tamanho Corporal

• Pessoas maiores geralmente exibem taxas metabólicas mais altas.
• Indivíduos altos e magros têm taxas metabólicas mais elevadas em comparação com pessoas baixas e obesas.

Clima

• Extremas de temperatura ambiental afetam o gasto energético em repouso.
• Indivíduos que habitam climas tropicais tipicamente apresentam gastos energéticos em repouso 5-20% maiores do que aqueles em áreas temperadas.

Sexo

• As diferenças nas taxas metabólicas entre os sexos são principalmente devido a variações no tamanho e na composição corporal.
• Mulheres geralmente apresentam taxas metabólicas 5-10% inferiores às dos homens.

Estado Hormonal

• Hormônios influenciam a taxa metabólica.
• Distúrbios endócrinos, como hipertireoidismo e hipotireoidismo, podem aumentar ou diminuir o gasto energético.
• Hormônios intestinais como grelina e peptídeo YY regulam o apetite e a homeostase energética.
• A taxa metabólica das mulheres flutua durante o ciclo menstrual, aumentando discretamente na fase lútea.
• Na gravidez, o crescimento dos tecidos uterino, placentário e fetal contribui para um aumento gradual de aproximadamente 15% no gasto energético basal.

Temperatura

• Febres aumentam o GER em aproximadamente 7% por cada grau acima de 37°C.

Outros Fatores

• Cafeína, nicotina e álcool estimulam a taxa metabólica.
• Em situações de estresse ou doença, o gasto energético pode aumentar ou diminuir.
• Pessoas obesas podem ter um gasto energético maior, enquanto a inanição ou dietas prolongadas podem reduzi-lo.

Efeito Térmico da Atividade Física

• O efeito térmico da atividade física corresponde a 15-30% das necessidades diárias de energia.
• É o aumento do gasto energético resultante da atividade física, sendo o componente mais variável do gasto energético.

Efeito Térmico dos Alimentos

• Contribui com cerca de 10% do gasto energético diário.
• Equivale ao aumento no gasto energético acima da TMB, devido às atividades de digestão, transporte, absorção e metabolismo dos nutrientes.

Termogênese Facultativa

• Refere-se à modificação no gasto de energia devido a mudanças na temperatura, estresse emocional e adaptação a condições ambientais.
• Contribui com aproximadamente 10-15% do gasto de energia diário.
• O gasto energético total (GET) é obtido a partir da determinação das necessidades energéticas.
• A TMB pode ser medida ou estimada por fórmulas para obter o GET.

Métodos utilizados para medir o gasto energético

• É necessário incluir o gasto relativo às atividades físicas realizadas.

Calorimetria Direta

• É o método mais preciso (erro de 1-2%) para medir o gasto energético.
• Mede diretamente o calor gerado pelo organismo em uma câmara metabólica.
• Não reflete o gasto energético usual de 24 horas.
• Utilizado em estudos científicos e para validar métodos de avaliação do gasto energético devido ao seu alto custo operacional.

Calorimetria Indireta

• Estima o calor gerado pelo organismo medindo o consumo de oxigênio, a produção de dióxido de carbono (CO2) e a excreção de nitrogênio urinário.
• Apresenta boa acurácia (erro de 2-5%).
• Os valores são incluídos na equação de Weir para fornecer o gasto energético do indivíduo.
• A troca gasosa permite calcular o quociente respiratório, indicando o substrato oxidado como fonte de energia.
• Utilizada em estudos científicos e UTIs.

Água Duplamente Marcada

• Avalia o gasto energético de 24 horas em um ambiente normal.
• Utiliza água marcada com isótopos estáveis, administrada oralmente.
• Monitora a taxa de desaparecimento dos isótopos nos fluidos corporais por 7-21 dias.
• A diferença no desaparecimento dos isótopos estima a produção de CO2 e, com informações sobre a dieta, calcula o gasto energético.
• Ajustes são necessários se houver ganho ou perda de peso.
• O alto custo dos isótopos e do equipamento dificulta o uso.

Métodos para Estimar o Gasto Energético

• Métodos diretos são impraticáveis em ambientes hospitalares e ambulatoriais.
• Fórmulas são importantes na prática clínica para estimar as necessidades de energia.

Estimativa da TMB: Harris e Benedict (1919)

• Fórmula utilizada para indivíduos normais, doentes ou lesionados.
• Superestima a TMB em 10-15% em relação à calorimetria indireta.
• Para indivíduos com IMC > 40 kg/m², usa-se o peso ideal ou desejável.
• Ajusta o valor da TMB por sexo, peso, estatura e idade.
  • Homens: TMB (kcal/dia) = 66 + (13,7 x P) + (5 x E) - (6,8 x I)
  • Mulheres: TMB (kcal/dia) = 655 + (9,6 x P) + (1,7 x E) - (4,7 x I)
    • P (kg): peso atual (IMC < 40 kg/m²) ou peso ideal (IMC > 40 kg/m²)
    • E (cm): estatura
    • I (anos): idade

FAO/ONU/OMS (2001)

• Superestima a TMB comparada à calorimetria indireta em populações saudáveis e enfermas, ajustada por sexo, peso e idade.
  • 18 a 30 anos:
    • Homens: 15,057 x peso (kg) + 692,2
    • Mulheres: 14,818 x peso (kg) + 486,6
  • 30 a 60 anos:
    • Homens: 11,472 x peso (kg) + 873,1
    • Mulheres: 8,126 x peso (kg) + 845,6
  • > 60 anos:
    • Homens: 11,711 x peso (kg) + 587,7
    • Mulheres: 9,082 x peso (kg) + 658,5

Estimativa das Necessidades: Comitê de DRI de Energia (2005)

• Utiliza o conceito de necessidade estimada de energia (EER) para calcular as necessidades energéticas de indivíduos saudáveis, considerando peso, estatura, idade e coeficiente de atividade física (CAF).
  • Homens: EER (kcal/dia) = 662 - 9,53 x idade + CAF x (15,91 x peso + 539,6 x estatura)
  • Mulheres: EER (kcal/dia) = 354 - 6,91 x idade + CAF x (9,36 x peso + 726 x estatura)
    • Idade em anos, peso em kg, estatura em metros
    • CAF: coeficiente de atividade física
      • CAF = 1 (NAF sedentário ≥ 1 < 1,4)
      • CAF = 1,11 (NAF leve ≥ 1,4 < 1,6)
      • CAF = 1,25 (NAF moderado ≥ 1,6 < 1,9)
      • CAF = 1,48 (NAF intenso ≥ 1,9 < 2,5)

Níveis de Atividade Física (NAF)

• Sedentário (≥ 1 e < 1,4): trabalhos domésticos leves, caminhadas para atividades cotidianas, ficar sentado por várias horas.
• Leve (≥ 1,4 e < 1,6): caminhadas a 6,4 Km/h, além das atividades do NAF sedentário.
• Moderado (≥ 1,6 e < 1,9): ginástica aeróbica, corrida, natação, tênis, além das atividades do NAF sedentário.
• Intenso (≥ 1,9 e < 2,5): ciclismo moderado, corrida, pular corda, tênis, além das atividades do NAF sedentário.
• O Gasto Energético Total (GET) é o valor calórico necessário para manutenção das atividades do indivíduo.
• O Valor Energético Total (VET) é o valor calórico escolhido para alcançar o objetivo específico, como manutenção, perda ou ganho de peso.

Dietary Reference Intakes (DRIS)

• As DRIs são usadas no planejamento e avaliação de dietas de indivíduos e populações saudáveis.
• Incluem quatro conceitos de referência para o consumo de nutrientes.

Conceitos de Referência

• Necessidade média estimada (EAR).
• Ingestão dietética recomendada (RDA).
• Ingestão adequada (AI).
• Nível máximo de ingestão tolerável (UL).

EAR (Estimated Average Requirement)

• Representa a ingestão de um nutriente para cobrir as necessidades de 50% dos indivíduos saudáveis em um grupo etário, estado fisiológico e sexo.
• Usada para estabelecer a RDA e avaliar a adequação da dieta.
• Ao planejar a dieta de grupos, adiciona-se 2 DP (desvio padrão) da ingestão do grupo à EAR.
• O risco de inadequação é de 50%.

RDA (Recommended Dietary Allowance)

• Nível de ingestão dietética suficiente para cobrir as necessidades de 97-98% dos indivíduos saudáveis em um grupo etário, estado fisiológico e sexo.
• Se o DP da EAR for conhecido e a distribuição for normal: RDA = EAR + 2 DP.
• Usada como meta de ingestão na prescrição da dieta individual, mas não na avaliação da dieta ou no planejamento de cardápios para grupos.
• O risco de inadequação é muito pequeno (2,28%).

AI (Adequate Intake)

• Nível de ingestão de nutrientes usado em substituição à RDA quando não há evidências científicas suficientes para calcular a EAR.
• Baseia-se no consumo médio de nutrientes observado ou estimado experimentalmente em grupos considerados saudáveis.
• Usada como meta de consumo de nutrientes na prescrição individual.

UL (Tolerable Upper Intake Level)

• Nível máximo de ingestão diária de nutrientes que não causa efeitos adversos à saúde na maioria da população.
• Não é um nível de ingestão recomendável, pois questiona-se os benefícios do consumo de nutrientes acima dos valores da RDA ou AI.
• Os riscos de inadequação ou excesso são menores quando a ingestão está entre a RDA e a UL.
• Quanto mais o consumo ultrapassar a UL, maior o risco de efeitos adversos.
• A AI pode não ter relação consistente com a EAR ou RDA e é estabelecida quando a necessidade não é conhecida, estimando-se que seu valor esteja próximo ou acima da RDA.

Uso das DRIS para Indivíduos e Grupos Saudáveis

• Planeamento:
  • Individual: RDA/AI (meta de ingestão), UL (guia para limitar o consumo).
  • Grupo: EAR (estabelecer metas para o consumo médio).
• Avaliação:
  • Individual: EAR (verificar inadequação do consumo), AI (baixa probabilidade de inadequação), UL (verificar excesso de consumo).
  • Grupo: EAR (estimar a prevalência de inadequação de consumo), AI (baixa frequência de inadequação), UL (estimar frequência de níveis de ingestões sujeitos a risco).

Este questionário aborda os princípios da calorimetria e sua aplicação na medição das trocas gasosas e do gasto energético. Inclui o método da água duplamente marcada, suas limitações e o cálculo do quociente respiratório, além de explorar a taxa metabólica basal (TMB).