Doutrina de Uso da Força e Treinamento da PM

Capítulo I - Das Generalidades

• As instituições policiais modernas estão adaptando seus procedimentos operacionais para atender às exigências da sociedade, que busca serviços públicos eficientes e de qualidade.
• A sociedade está mais consciente de seus direitos e exige que as agências públicas se legitimem perante os cidadãos, em conformidade com o Estado Democrático de Direito estabelecido na Constituição de 1988.
• As instituições de controle social, como a Polícia Militar, precisam se legitimar perante a comunidade, pois a razão de sua existência é servir aos interesses e objetivos da sociedade.
• O uso da força pelo Estado, um direito exclusivo, deve ser aprimorado continuamente, com foco no respeito e na promoção dos direitos humanos.
• É crucial substituir a lógica do "direito da força" pela "força do direito" na relação Estado-Cidadão, legitimando o uso da força como manifestação do poder estatal.
• O cidadão deve perceber o uso da força pelo Estado como legítimo e necessário em situações extremas, desde que não seja arbitrário ou desproporcional.
• A abordagem do uso da "força letal" pelas instituições policiais é um tema de extrema importância e delicadeza, com repercussões institucionais e na vida dos agentes de segurança pública.
• O conhecimento da doutrina de uso diferenciado da força é essencial para o sucesso da missão institucional do policial militar, evitando o emprego inadequado e desproporcional da força, que pode prejudicar o direito à vida.
• Preparar o policial para momentos críticos que envolvem o uso da força letal é um dever institucional, e este material busca fornecer a melhor capacitação técnica para o manejo e emprego de armamento letal na PMDF.
• O programa foi desenvolvido pelo Departamento de Educação e Cultura da Polícia Militar do Distrito Federal (DEC/PMDF), através do Centro de Treinamento e Especialização (CTEsp/PMDF) e pela Academia de Polícia Militar de Brasília (APMB/PMDF).
• O programa consiste em um conjunto doutrinário sistematizado e padronizado para o planejamento, desenvolvimento, coordenação, controle e execução das instruções e atividades da disciplina de Tiro Policial Militar.
• A construção metodológica baseou-se na observação e vivência dos autores na prática policial, incluindo áreas operacionais, docência em unidades de ensino policiais militares e conhecimento científico, visando uniformizar os procedimentos na área de tiro policial.
• As Instruções Gerais de Tiro Policial Militar (IGTPM) têm como finalidade capacitar os policiais militares para servir e defender a sociedade com o uso de armas de fogo em situações de conflito e risco, seguindo a doutrina institucional.
• Ao ler este material, é possível compreender conceitos sobre armamento, munição e tiro, além de aprender e aplicar técnicas de saque, disparos em diferentes posições e outras habilidades úteis nas atividades cotidianas.

Regras de Segurança

• As Normas de Segurança e Conduta aplicadas à Instrução de Tiro têm como objetivo orientar o policial militar sobre sua conduta e os procedimentos a serem observados durante a instrução prática, minimizando os riscos inerentes.
• As regras devem ser seguidas durante o manejo, acondicionamento e manutenção do armamento, mesmo fora das instruções de ensino.
• As regras de segurança existem para prevenir tiros acidentais ou outras consequências negativas relacionadas ao uso de armas de fogo, cujo manejo apresenta riscos elevados.
• É importante seguir rigorosamente as prescrições, observando locais seguros e adequados para o manejo do armamento e mantendo a preocupação com as regras na rotina policial.
• As regras são divididas em regras gerais, regras em instruções práticas e condutas de segurança com armas de fogo.

Regras Gerais

• Trate qualquer arma como se estivesse municiada, alimentada e carregada, mesmo que seja de treino, simulador ou já tenha sido inspecionada.
• Controle a direção do cano, apontando o armamento apenas para locais onde um projétil possa ser disparado com segurança.
• Mantenha o dedo estendido ao longo da armação (fora do guarda-mato) até o momento de efetuar o disparo de forma consciente; em armas portáteis, mantenha o dedo polegar e indicador em contato com a trava de segurança.
• Observe o perímetro do alvo para evitar efeitos colaterais indesejáveis dos disparos.
• Durante o treinamento com armas de fogo, todas as ações devem ser orientadas e determinadas pelo instrutor responsável.
• As demais regras devem ser observadas com o mesmo rigor:
  • Obtenha informações sobre como manusear a arma com um instrutor certificado antes de utilizá-la.
  • Inspecione o armamento com o cano apontado para um local seguro, com absorção balística, anteparo de contenção e acesso limitado.
  • Verifique se a arma sofreu danos nos mecanismos em caso de queda.
  • Verifique se a munição é adequada e corresponde ao calibre do armamento.
  • Garanta que a munição e o armamento tenham procedência legal e estejam em bom estado de conservação.
  • Nunca modifique as características de fábrica da arma de fogo.

Regras no Estande

• Todas as ações do público presente na instrução de tiro devem ocorrer sob comando do instrutor, incluindo saídas e retornos à instrução, com inspeção do armamento ao retornar.
• O uso de equipamentos de proteção individual (EPI) como colete balístico, óculos e abafador é obrigatório para todos na instrução de tiro.
• Atente-se a qualquer anormalidade no funcionamento da arma como: recuo, excesso de fumaça e mudança no som da detonação, falha na percussão, suspeita de obstrução do cano.
• Caso ocorra qualquer anormalidade, interrompa os disparos, mantenha o cano voltado para o alvo e avise o instrutor de tiro mais próximo.
• Certifique-se de que o alvo e a área ao redor sejam capazes de receber os impactos dos disparos com segurança.
• Tenha atenção ao efetuar disparos em superfícies rígidas ou líquidas, pois pode haver ricochete dependendo do ângulo de incidência.
• Em caso de acidente ou incidente de tiro, permaneça de frente para o alvo com a arma apontada em direção segura, e o aluno ou quem estiver ao lado deve informar imediatamente o instrutor na impossibilidade.
• O silêncio é fundamental para a segurança e deve ser rigorosamente observado em instruções com armas.
• Dúvidas devem ser esclarecidas apenas com o instrutor de tiro; policiais não devem sanar dúvidas ou fazer correções a outros alunos durante as instruções.
• Nunca manuseie armamento sob efeito de substâncias que diminuam as capacidades neuromusculares (álcool, drogas ilícitas, medicamentos, etc.).
• É proibida a produção e o compartilhamento de imagens, vídeos, áudios e qualquer outra mídia durante as instruções se não houver a aceitação do responsável pela atividade.
• Policiais que incorrerem em imperícia, imprudência ou negligência quanto às normas serão retirados da instrução e apresentados ao responsável para as devidas providências.

Comandos e Procedimentos na Instrução de Tiro

• MUNICIAR CARREGADORES: Os alunos devem municiar os carregadores com a quantidade de munições informada e posicionar-se na linha conforme determinado pelo instrutor.
• CARREGAR E FICAR PRONTO: O aluno deve:
  • Inserir o carregador no armamento (alimentar) e puxá-lo para certificar-se do encaixe.
  • Executar o manejo do ferrolho levando uma munição à câmara (carregar).
  • Inspecionar visualmente o correto trancamento do armamento e visualizar o indicador de câmara cheia visual e tátil.
  • Aguardar o início do exercício na posição determinada, em frente ao seu alvo.
• PISTA QUENTE: Sinaliza que todas as armas estão em condições de disparo e os exercícios serão iniciados.
• CESSAR FOGO: Todos interrompem os disparos e não realizam mais nenhum manuseio da arma até receberem novo comando.
• PISTA FRIA: O aluno deve coldrear a arma e bater palmas sobre a cabeça, mostrando ao instrutor que as mãos estão livres e não tocarão mais na arma até novo comando.
• INSPEÇÃO DO ARMAMENTO, EXECUTAR!: Os alunos devem estar alinhados lado a lado e executar os seguintes procedimentos:
  • Retire o carregador, inspecione visualmente e guarde em local apropriado.
  • Dê dois golpes no ferrolho para retirar a munição na câmara, se houver, e deixe-a cair no chão.
  • Mantenha o ferrolho para retaguarda, deixe a arma aberta para inspeção visual e tátil da câmara e alojamento do carregador.
  • Coldrear o armamento ou colocar em sua bandoleira.
  • Recolher a munição do solo, caso exista.

Conceitos, História e Evolução das Armas de Fogo

• Arma: Objeto que aumenta a capacidade de ataque ou defesa do homem.
• Decreto nº 3.665/2000 (R-105), revogado pelo Decreto 10.030/2019, definia como "Artefato que tem por objetivo causar dano permanente ou não, a seres vivos e coisas".
• Definição de armas de fogo no glossário do mesmo decreto: "Armas que arremessam projéteis empregando a força expansiva dos gases gerados pela combustão de um propelente confinado em uma câmara que, normalmente está solidária a um cano que tem a função de propiciar continuidade à combustão do propelente, além de direção e estabilidade ao projétil".
• Definição encontrada para armas de fogo no livro Coleção Armamento: "Máquina térmica que utiliza a força explosiva de uma mistura ou composto químico, transferindo- a ou dirigindo-a para um corpo sólido e móvel (Projétil) ".
• A origem das armas de fogo está ligada à invenção da pólvora pelos chineses no século IX.
• Os canhões foram as primeiras armas de fogo desenvolvidas, por volta do início do século XIV.
• As primeiras armas portáteis surgiram no século XV, permitindo o uso individual nos campos de batalha.
• O arcabuz e o mosquete de ignição por mecha eram armas de antecarga, acionadas por uma mecha que necessitava de fonte externa de calor para a ignição da pólvora.
• A evolução seguinte veio com o sistema de fecho de roda e depois para o de pederneira, com suas variações.
• O surgimento da espoleta em cápsula aumentou a velocidade da recarga e a quantidade de disparos por minuto.
• No início do século XIX, começaram as tentativas de unir espoleta, pólvora e projétil em um mesmo conjunto, dando origem aos primeiros cartuchos.
• Samuel Colt patenteou seu revólver com tambor giratório, que efetuava disparos seguidos ao pressionar o gatilho de forma intermitente, em 1835.
• Ainda no século XIX, surgiram as carabinas por ação de ferrolho (bolt action) e as de ação por alavanca, com o uso de munições com estojo metálico.
• O final do século XIX e início do século XX marcaram o surgimento das primeiras pistolas semiautomáticas, submetralhadoras e metralhadoras de apoio de fogo.
• Do início dos anos 50 aos dias atuais, houve uma evolução nas armas de fogo com o avanço das tecnologias de construção, como o uso de polímeros, sistemas de segurança e adaptabilidade, resultando em armas mais leves, resistentes e confiáveis.

Classificação das Armas de Fogo

• Quanto ao Tipo:

  • De porte: armas que podem ser conduzidas no coldre devido ao seu tamanho e peso reduzidos; exemplos: pistolas e revólveres.
  • Portátil: armas que, mesmo possuindo peso relativo, devem ser conduzidas numa bandoleira por um só homem; exemplos: espingardas, fuzis e carabinas.
  • Não portátil: armas que só podem ser conduzidas numa viatura ou divididas em fardos para serem transportades por mais de um homem; exemplo: metralhadora .50 Browning.

• Quanto ao Emprego:

  • Individual: arma destinada à proteção de quem a conduz.
  • Coletivo: arma destinada à proteção de um grupo ou fração de tropa, operada por pelo menos dois homens.

• Quanto ao Sistema de Carregamento:

  • Antecarga: o carregamento é feito pela boca do cano.
  • Retrocarga: o carregamento é feito pela parte posterior da arma, ou seja, pela culatra.

• Quanto à Alma do Cano:

  • Lisa: a superfície interna do cano não possui ressaltos ou rebaixos, como a espingarda.
  • Raiada: a superfície interna do cano possui sulcos que imprimem ao projétil movimento de rotação, dando-lhe estabilidade.

• Quanto ao Sistema de Inflamação:

  • Por percussão de fogo central: o misto iniciador está no centro do cartucho, e o percussor o atinge para deflagrá-lo.
  • Por percussão de fogo circular ou radial: o misto iniciador está na virola do cartucho, e o percussor precisa atingir a lateral do cartucho para deflagrá-lo.

• Quanto ao Funcionamento:

  • Tiro Unitário: a arma não executa as operações de manejo mecanicamente; o atirador realiza as operações manualmente, com destaque para o carregamento.
  • Repetição: são armas que realizam o carregamento mecanicamente, acomodando vários cartuchos, utilizando a força muscular do atirador.
  • Semiautomática: a arma realiza todas as ações de manejo automaticamente, exceto o disparo, que necessita do acionamento da tecla do gatilho.
  • Automática: todas as ações de manejo, inclusive os disparos, são automáticas; basta pressionar o gatilho continuamente, desde que haja munição.

• Quanto ao Princípio de Funcionamento:

  • Ação muscular do atirador: as operações de funcionamento da arma dependem do atirador para cada novo disparo.
  • Ação dos gases sobre o ferrolho: as operações de funcionamento da arma decorrem da força dos gases provenientes da queima do propelente, que movimentam todo o mecanismo.

Este estudo aborda a importância do conhecimento da doutrina de uso diferenciado da força para policiais militares, o papel do DEC na capacitação em tiro, e a relevância das IGTPM. Examina o impacto do uso inadequado da força e a necessidade de treinamento no manejo de armas letais como dever institucional.