01. Princípios do Direito Administrativo.pdf
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www.trilhante.com.br ÍNDICE 1. DEFINIÇÃO, UTILIDADES E PANORAMA..................................................................3 Definição de Princípios......................................................................
www.trilhante.com.br ÍNDICE 1. DEFINIÇÃO, UTILIDADES E PANORAMA..................................................................3 Definição de Princípios........................................................................................................................................................ 3 Funções dos Princípios....................................................................................................................................................... 3 Panorama dos Princípios do Direito Administrativo...................................................................................... 3 2. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE........................................................................................6 Definição........................................................................................................................................................................................ 6 Legalidade como Supremacia do Direito.............................................................................................................. 6 Legalidade Forte e Fraca....................................................................................................................................................7 Derivações da Legalidade..................................................................................................................................................7 3. PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE..............................................................................9 Conceito......................................................................................................................................................................................... 9 Objetividade................................................................................................................................................................................ 9 Neutralidade/Imparcialidade........................................................................................................................................ 10 Igualdade......................................................................................................................................................................................12 Medidas Discriminatórias..................................................................................................................................................12 4. PRINCÍPIO DA MORALIDADE....................................................................................14 Moral e Direito...........................................................................................................................................................................14 Moralidade...................................................................................................................................................................................14 Meios de Controle..................................................................................................................................................................16 5. PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE.................................................................................... 17 Motivação.....................................................................................................................................................................................17 Transparência e Acesso à Informação.....................................................................................................................19 Publicidade Ilícita...................................................................................................................................................................22 6. PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA.......................................................................................24 Eficiência em Sentido Estrito....................................................................................................................................... 24 Eficiência como Efetividade..........................................................................................................................................25 Eficiência como Economicidade................................................................................................................................25 ÍNDICE 7. PRINCÍPIO DO INTERESSE PÚBLICO..................................................................... 27 Interesses Públicos...............................................................................................................................................................27 Interesses Públicos e Direitos Fundamentais....................................................................................................27 Manifestações do Interesse Público........................................................................................................................ 28 8. SEGURANÇA JURÍDICA NO DIREITO ADMINISTRATIVO................................. 29 Segurança do Direito......................................................................................................................................................... 29 Segurança no Direito.........................................................................................................................................................30 Segurança pelo Direito.....................................................................................................................................................30 Manifestações da Segurança Jurídica...................................................................................................................30 Teoria do Fato Consumado.............................................................................................................................................31 Teoria da Autovinculação................................................................................................................................................32 Teoria do Agente de Fato............................................................................................................................................... 33 1. Definição, Utilidades e Panorama Definição de Princípios Até meados do Século XX, os princípios não eram vistos como uma espécie de norma jurídica. Eles eram considerados uma fonte do direito secundária e meramente supletiva nas situações em que havia alguma lacuna na lei, ou seja, eram considerados “servos das leis”. Atualmente, porém, eles são tomados como espécies de normas ao lado das regras. Essa interpretação começou no Pós-Positivismo, quando muitos princípios alcançaram as Constituições. Nesse contexto, os princípios podem ser definidos como normas escritas ou não escritas que estruturam o ordenamento jurídico. Esses princípios também são marcados por enunciados abstratos, concisos e vagos, absorvendo inúmeras interpretações possíveis. As consequências dessa abstração são que os efeitos normativos dos princípios variam e se adaptam no espaço e no tempo, conforme as modificações culturais da sociedade, e também alcançam destinatários amplos e imprevistos. Importante dizer que os conteúdos que irradiam dos princípios acabam permeando o ordenamento jurídico como um todo, podendo ser considerados, por exemplo, em vários aspectos do Direito Administrativo. Funções dos Princípios Na prática, no que se refere ao Direito Administrativo, os princípios da Administração Pública têm as seguintes funções: Função Diretiva: os princípios orientam condutas de agentes públicos e particulares, a fim de saber, principalmente, se determinado comportamento é lícito ou ilícito. Função Interpretativa: os princípios guiam o exame dos textos jurídicos para que se pos- sa extrair deles seu significado normativo, ou seja, as normas. Função Integrativa: os princípios permitem a construção de soluções na falta de normas específicas, ou seja, no caso de lacunas; Função de Controle: os princípios oferecem parâmetros para o exame da legalidade de comportamentos dos agentes públicos ou privados. Panorama dos Princípios do Direito Administrativo PRINCÍPIOS GERAIS Os princípios gerais permeiam todas as funções administrativas, todos os campos da Administração Pública. Eles estão enumerados no art. 37, caput, da CF: www.trilhante.com.br 4 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] Os princípios gerais descritos de forma expressa no dispositivo, portanto, são: Legalidade; Impessoalidade; Moralidade; Publicidade; Eficiência (inserido pela EC nº 19/1998). Além dos cinco princípios expressos, os doutrinadores consideram que existem mais dois princípios implícitos, extraídos do texto constitucional como um todo, quais sejam: Interesse público; Segurança Jurídica. Esses dois princípios aparecem de forma explícita na legislação infraconstitucional (Lei de Processo Administrativo Federal, LINDB, entre outras). Veja, por exemplo, no caso da LINDB: Art. 26. Para eliminar irregularidade, incerteza jurídica ou situação contenciosa na aplicação do direito público, inclusive no caso de expedição de licença, a autoridade administrativa poderá, após oitiva do órgão jurídico e, quando for o caso, após realização de consulta pública, e presentes razões de relevante interesse geral, celebrar compromisso com os interessados, observada a legislação aplicável, o qual só produzirá efeitos a partir de sua publicação oficial. §1º O compromisso referido no caput deste artigo: I - buscará solução jurídica proporcional, equânime, eficiente e compatível com os interesses gerais; [...] Art. 30. As autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de regulamentos, súmulas administrativas e respostas a consultas. PRINCÍPIOS SETORIAIS Os princípios setoriais permeiam uma parte da Administração Pública, ou seja, eles têm uma aplicabilidade mais restrita. Esses princípios vão ser abordados em outras aulas de Direito Administrativo. Veja alguns exemplos: Princípios processuais, como o formalismo mitigado, a duração razoável do processo, a oficialidade, a gratuidade, etc. www.trilhante.com.br 5 Princípios do serviço público, como a continuidade dos serviços, a atualidade tecnológi- ca e a modicidade tarifária. Princípios contratuais, como o respeito à boa-fé, a vinculação ao instrumento convoca- tório e a mutabilidade dos contratos. Princípios organizacionais, como os da tutela e da autotutela, planejamento, etc. Princípios laborais, relativos ao exercício das tarefas pelos agentes públicos, como a ur- banidade, a assiduidade, a pontualidade, etc. www.trilhante.com.br 6 2. Princípio da Legalidade O primeiro princípio do rol do art. 37 da CF que vamos falar é o da Legalidade. Definição Resumidamente, Legalidade indica harmonia de um estado, uma ação ou um comportamento com o ordenamento jurídico. No Estado de Direito a legalidade se expandiu, atingindo não só os particulares, mas qualquer agente público, inclusive os agentes políticos. Ademais, no modelo democrático, a Legalidade serve como um instrumento comunicativo, na medida em que o povo pode transmitir suas vontades, por meio de seus representantes eleitos, aos agentes públicos que formam o Estado. Isso é feito principalmente por meio das leis, feitas pelos representantes eleitos a partir das necessidades e anseios da população. Na prática, porém, o processo legislativo nem sempre é desenvolvido de acordo com as vontades do povo. Assim, nem sempre o que é colocado nas leis é o desejado pela sociedade, ou seja, a legalidade (o que está na lei) nem sempre é compatível com a legitimidade (compatibilidade da lei com os anseios da população). Legalidade como Supremacia do Direito O princípio da Legalidade Administrativa indica a supremacia da lei na medida em que a Administração Pública deve executar suas tarefas à luz do ordenamento jurídico, e não pode, em nenhuma hipótese, atuar contra ele. Isso porque o Estado é criado e sustentado pelo povo, devendo, portanto, agir em benefício do povo. Assim, resumidamente, cabe à Administração observar sempre o que determina o ordenamento construído pelos representantes do povo. É importante salientar que isso não significa que a Administração só possa fazer o que está literalmente expresso no texto legislativo. Esse tópico será aprofundado mais a frente. Em sentido amplo, a Legalidade abrange várias camadas de normas jurídicas, ou seja, analisa-se a compatibilidade do comportamento do agente público com: Legalidade estrita: as normativas internas do órgão ou entidade e as leis, ordinárias ou complementares; Constitucionalidade: normas constitucionais (Constituição Federal, Constituições estadu- ais e leis orgânicas dos Municípios); Convencionalidade: tratados internacionais firmados pelo Brasil; Juridicidade: todas as normas expressas ou implícitas do ordenamento jurídico. O direito não se esgota no que está escrito nos textos legais, como demonstra, por exemplo, o art. 2º, parágrafo único, da Lei de Processo Administrativo Federal (Lei nº 9.784/99) www.trilhante.com.br 7 Art. 2º. A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: I - atuação conforme a lei e o Direito; Legalidade Forte e Fraca Existem vários padrões de legalidade, os quais variam de acordo com o setor, com o tipo de ato e com a função administrativa exercida. Como citado anteriormente, Legalidade não significa que todo comportamento da Administração deva estar descrito no texto normativo. De acordo com Charles Eisenmann, destacam-se dois padrões de legalidade: Legalidade Fraca: indica uma relação de compatibilidade da conduta com o ordena- mento jurídico, ou seja, tudo é permitido, desde que a lei não proíba. Assim, basta a com- provação de que o agente público não fez algo que o ordenamento jurídico proíba. Legalidade Forte: exige a conformidade do comportamento com o texto legal, ou seja, o agente pode fazer apenas aquilo que o Direito expressamente autoriza. É importante salientar que esses padrões de Legalidade convivem no ordenamento jurídico. Haverá preferência pelo padrão de Legalidade Forte quando a Administração Pública restringir a liberdade dos particulares. Isso porque, de acordo com o art. 5º, inciso II da CF, a restrição da liberdade dos indivíduos (ou seja, forçá-los a fazer ou deixar de fazer algo) pela Administração depende de uma autorização em lei. Art. 5º. [...] II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; A Legalidade Forte, portanto, é uma reserva legal, ou seja, todas as ações restritivas do Estado necessitam de previsão legal anterior. Contrariamente, as ações benéficas ou prestativas não se enquadram no art. 5º, inciso II, da CF, quer dizer, se enquadram no padrão de Legalidade Fraca. Derivações da Legalidade São subprincípios derivados do princípio da Legalidade Administrativa: Subprincípio da tutela ou supervisão que os entes da Administração Direta (secretarias ou Ministérios), exercem sobre a Indireta (autarquias, empresas estatais etc.). Há, portanto, www.trilhante.com.br 8 uma relação de vinculação, visto que os entes da Administração Direta zelam para que os entes especializados da Administração Indireta exerçam suas funções adequadamente, respeitem normas orçamentárias, finalidades, entre outros aspectos. Subprincípio da autotutela das entidades públicas, pelo qual a Administração Pública pode anular, revogar, confirmar, convalidar ou revisar seus próprios atos de ofício, indepen- dentemente de uma manifestação judicial prévia (Súmulas 346 e 473 do STF). Presunção relativa de legalidade e de veracidade favorável à Administração Pública, ou seja, acredita-se que os atos do Estado são verdadeiros e estão alinhados com a legislação. A partir da presunção, é possível entender a proibição constitucional de recusar fé a docu- mentos públicos (art. 19, II, CF) e o poder de qualquer agente autenticar documentos (art. 22, §3º, Lei de Processo Administrativo). www.trilhante.com.br 9 3. Princípio da Impessoalidade Conceito O princípio da impessoalidade é uma inovação do art. 37 da CF. De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro, é possível analisar a impessoalidade por duas perspectivas. A primeira é do cidadão em relação à Administração Pública. Para o cidadão, não importa qual é o agente público com o qual ele se relaciona, ou seja, quem está “atrás do balcão”. A relação do cidadão se dá com o órgão público, e não com a pessoa física que o está atendendo. Já a segunda perspectiva é da Administração em relação ao administrado/cidadão. Nesse contexto, não interessa para o agente público quem é a pessoa com a qual ele se relaciona, quer dizer, quem está “à frente do balcão”. O administrador público não deve preferir uns em relação a outros sem fundamentação, e também não pode deixar seus sentimentos, preferências pessoais e desejos guiarem suas condutas no tratamento dos cidadãos e no exercício de suas funções na Administração Pública. Destarte, a Administração deve tratar o administrado de modo impessoal. Importa destacar que, do ponto de vista do conteúdo, podemos dividir o princípio da impessoalidade em: Objetividade; Imparcialidade e Neutralidade; Igualdade. Objetividade Objetividade significa estrita vinculação dos comportamentos do agente público às finalidades públicas, evitando-se o uso do aparelho estatal em benefício próprio do agente público ou de terceiros. É possível observar a manifestação da objetividade, por exemplo, nos seguintes dispositivos: “Objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades” (art. 2º, parágrafo único, III, da Lei de Processo Administrativo Fe- deral); Proibição do uso de publicidade governamental para fins de promoção pessoal de agen- tes públicos (art. 37, §1º da CF); Imposição do pagamento de precatórios na ordem de sua apresentação (art. 100, caput, da CF); e O dever de julgamento objetivo nas licitações (art. 3º, caput, da Lei de Licitações). www.trilhante.com.br 10 Neutralidade/Imparcialidade Trata-se de outra importante faceta do princípio da impessoalidade. O agente público age com neutralidade/imparcialidade quando, ao executar as funções administrativas quotidianas, evita agir orientado por concepções religiosas, partidárias ou ideológicas, e também evita interferências de seus sentimentos na execução de suas tarefas. O ordenamento prevê regras para garantir a ação neutra, como: Impedimento e suspeição aplicáveis aos processos administrativos por força da Lei de Processos Administrativos Federal (arts. 18 a 21). Resumidamente, o impedimento é aplica- do em situações nas quais há um risco de quebra da impessoalidade. Por exemplo: quando o agente público analisa um processo no qual ele é uma das partes interessadas, ou quando tem um conflito ou parentesco com algum interessado no processo. A suspeição é prevista nos casos em que o agente público responsável por decidir o processo tem uma amizade íntima ou inimizade notória com algum interessado. Vedação de aquisição de bens estatais por determinados agentes públicos (art. 479 do CC). Quer dizer, certos agentes públicos não podem participar de procedimentos de aliena- ção de bens estatais. Vedação do nepotismo direto ou cruzado na Súmula Vinculante nº 13 do STF. O nepotis- mo direto ocorre quando a autoridade nomeia seu próprio parente. O nepotismo cruzado, por sua vez, é uma troca de favores entre duas autoridades, em que uma nomeia o parente próximo da outra. Sobre isso, diz a Súmula Vinculante nº 13 do STF. Súmula Vinculante 13, STF. A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal. CONFLITOS DE INTERESSES A Lei Federal nº 12.813/2013 define conflito de interesses no art.3º, I: Art. 3º. [...] I. situação gerada pelo confronto entre interesses públicos e privados, que possa comprometer o interesse coletivo ou influenciar, de maneira imprópria, o desempenho da função pública. A Lei também prevê situações que configuram o conflito de interesse concomitante ao exercício do cargo ou emprego, como divulgação ou uso de informação privilegiada obtida no exercício das funções em proveito próprio ou de terceiros: www.trilhante.com.br 11 Art. 5º Configura conflito de interesses no exercício de cargo ou emprego no âmbito do Poder Executivo federal: I - divulgar ou fazer uso de informação privilegiada, em proveito próprio ou de terceiro, obtida em razão das atividades exercidas; II - exercer atividade que implique a prestação de serviços ou a manutenção de relação de negócio com pessoa física ou jurídica que tenha interesse em decisão do agente público ou de colegiado do qual este participe; III - exercer, direta ou indiretamente, atividade que em razão da sua natureza seja incompatível com as atribuições do cargo ou emprego, considerando-se como tal, inclusive, a atividade desenvolvida em áreas ou matérias correlatas; IV - atuar, ainda que informalmente, como procurador, consultor, assessor ou intermediário de interesses privados nos órgãos ou entidades da administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; V - praticar ato em benefício de interesse de pessoa jurídica de que participe o agente público, seu cônjuge, companheiro ou parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, e que possa ser por ele beneficiada ou influir em seus atos de gestão; VI - receber presente de quem tenha interesse em decisão do agente público ou de colegiado do qual este participe fora dos limites e condições estabelecidos em regulamento; e VII - prestar serviços, ainda que eventuais, a empresa cuja atividade seja controlada, fiscalizada ou regulada pelo ente ao qual o agente público está vinculado. Parágrafo único. As situações que configuram conflito de interesses estabelecidas neste artigo aplicam-se aos ocupantes dos cargos ou empregos mencionados no art. 2º ainda que em gozo de licença ou em período de afastamento. Ainda, a norma trata de conflitos após a cessação do vínculo do indivíduo com o cargo ou emprego que ocupou na Administração Pública, criando quarentena de seis meses, de modo a vedar ao ex-agente público a aceitação de cargo de administrador em pessoa jurídica que desempenhe atividade relacionada à área de competência do cargo. Art. 6º Configura conflito de interesses após o exercício de cargo ou emprego no âmbito do Poder Executivo federal: I - a qualquer tempo, divulgar ou fazer uso de informação privilegiada obtida em razão das atividades exercidas; e II - no período de 6 (seis) meses, contado da data da dispensa, exoneração, destituição, demissão ou aposentadoria, salvo quando expressamente autorizado, conforme o caso, pela Comissão de Ética Pública ou pela Controladoria-Geral da União: a) prestar, direta ou indiretamente, qualquer tipo de serviço a pessoa física ou jurídica com quem tenha estabelecido relacionamento relevante em razão do exercício do cargo ou emprego; b) aceitar cargo de administrador ou conselheiro ou estabelecer vínculo profissional com pessoa física ou jurídica que desempenhe atividade relacionada à área de competência do cargo ou emprego ocupado; www.trilhante.com.br 12 c) celebrar com órgãos ou entidades do Poder Executivo federal contratos de serviço, consultoria, assessoramento ou atividades similares, vinculados, ainda que indiretamente, ao órgão ou entidade em que tenha ocupado o cargo ou emprego; ou d) intervir, direta ou indiretamente, em favor de interesse privado perante órgão ou entidade em que haja ocupado cargo ou emprego ou com o qual tenha estabelecido relacionamento relevante em razão do exercício do cargo ou emprego. Igualdade O terceiro aspecto do princípio da impessoalidade é a igualdade. Há dois tipos de igualdade: Igualdade formal: tratamento igual de todos. Igualdade material: tratamento desigual dos desiguais. A Constituição da República consagra as duas vertentes citadas acima. Por exemplo: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito... à igualdade” (art. 5º, caput) = Igualdade Formal; “Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações” (art. 5º, I) = Igualdade Formal. Licitação deve assegurar “igualdade de condições a todos os concorrentes...” (art. 37, XXI) = Igualdade Formal; “A lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão” (art. 37, VIII) = Igualdade Material. Medidas Discriminatórias A Administração Pública pode criar medidas discriminatórias? Sim, desde que: 1. Haja fundamento fático; 2. Haja um valor constitucional a ser protegido; 3. A discriminação se imponha para concretizar o valor; 4. E não seja direcionada a uma ou outra pessoa, do contrário, ela se transfor- mará em privilégio. Exemplos de medidas discriminatórias: licitações de ME e EPP (procedimento simplificado de licitação), quotas, tarifa social, etc. A partir desses critérios, retirados do livro “Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade”, do professor Celso Antonio Bandeira de Mello, é possível identificar dois tipos de medidas discriminatórias: Lógicas: impostas em razão de uma atividade concreta, por exemplo, limitação da idade entre os candidatos de um concurso público pela Administração Pública. Inclusivas: têm o intuito de promover direitos fundamentais, principalmente de natureza social, para grupos socioeconomicamente vulneráveis. www.trilhante.com.br 13 Ambas medidas podem ser criadas pela Administração Pública, desde que respeitados os critérios legais e a lógica entre o valor a ser protegido e a situação fática. www.trilhante.com.br 14 4. Princípio da Moralidade Moral e Direito A relação da moral com o direito é abordada por vários ramos da ciência jurídica. De maneira simplificada, há três modelos descritivos da relação entre a moral e o direito. 1. O Estado e o Direito como instrumentos da moral preexistente. Esse modelo é comum nos Estados Totalitários de caráter religioso, na medida em que o Di- reito é um fruto das concepções religiosas ou ideológicas dos líderes do Estado. 2. A moral como expressão da legalidade e do Direito. Nesse modelo, a moral é completamente absorvida pelo Direito, na medida em que só é moral aquilo que o Direito diz que é lícito na sociedade. 3. A moral e o direito como círculos que se interpenetram. O campo da moral e o campo do direito são diferentes e, por vezes, podem se comunicar. O terceiro modelo é o mais adequado para a realidade brasileira. Na prática, significa que o direito abarca normas morais (compatíveis com a moral dominante), amorais (independentes ou não se relacionam com a moral dominante) e imorais (contrárias à moral dominante).Como exemplos de normas imorais, podemos citar a autorização de o agente público, em certos casos, decidir o aumento da própria remuneração ou de receber auxílio moradia, mesmo que já tenha casa própria. Moralidade A ação administrativa necessita sempre observar o princípio da moralidade. No Direito Administrativo, a moralidade administrativa pode se desdobrar em: 1. A moralidade como probidade; 2. A moralidade como razoabilidade; e 3. A moralidade como cooperação. PROBIDADE A probidade significa honestidade no exercício das funções públicas. No Brasil, as ações de improbidade administrativa tendem a ser vulgarizadas, devido à confusão entre a honestidade e as possíveis falhas cometidas pelos agentes públicos. Entretanto, é importante destacar que a improbidade ou desonestidade não pode ser confundida com irregularidade ou falhas funcionais (erros do agente público no exercício de suas funções). As falhas configuram infração disciplinar e podem gerar responsabilidade civil do Estado. Porém, nem toda falha profissional ou irregularidade será desonestidade. Os atos que violam o dever de honestidade são descritos pela Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa, atualizada pela Lei nº 14.230, de 2021). Essa norma contém www.trilhante.com.br 15 um rol exemplificativo de ações que violam a probidade administrativa. De modo geral, o ato de improbidade depende de um resultado inaceitável. Ou seja, consistem em ações que: 1. Dolosamente geram enriquecimento pessoal indevido; 2. Dolosa ou culposamente causam dano ao Erário, inclusive por mal uso de benefício financeiro ou tributário; 3. Dolosamente importam em violação de princípio da Administração. Além das hipóteses previstas na Lei nº 8.429/1992, também existem atos de improbidade em leis especiais, como o Estatuto da Cidade (improbidade urbanística), a Lei Federal de Conflito de Interesses, entre outras. RAZOABILIDADE OU PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO AMPLO Esse princípio deriva da moralidade e guia ações discricionárias do Estado, principalmente as de caráter restritivo de direitos. Em termos simples, o Poder Discricionário é aquele que permite à Administração Pública praticar atos com a liberdade de escolha, com base na conveniência e oportunidade. O termo “Proporcionalidade em Sentido Amplo” é utilizado pelos doutrinadores e juristas alemães como sinônimo de “Razoabilidade”. Para ser razoável, uma medida administrativa deve cumulativamente: 1. Ser adequada (apta a atingir o fim público); 2. Necessária (mais branda dentre as medidas adequadas disponíveis para o administrador público); e 3. Proporcional em sentido estrito (ou seja, que seus benefícios superem os malefícios). Se algum desses requisitos não for observado, a medida administrativa será automaticamente irrazoável, contrária ao princípio da moralidade e inconstitucional. COOPERAÇÃO O princípio da cooperação deve aparecer nas relações externas e interadministrativas da Administração Pública. Nas relações externas, ou seja, nas relações com o cidadão, a Administração Pública deve agir para facilitar o exercício de direitos e auxiliar os cidadãos no cumprimento de seus deveres. Esse mandamento consta no art. 3º, I da Lei de Processo Administrativo Federal: Art. 3º O administrado tem os seguintes direitos perante a Administração, sem prejuízo de outros que lhe sejam assegurados: I - ser tratado com respeito pelas autoridades e servidores, que deverão facilitar o exercício de seus direitos e o cumprimento de suas obrigações; www.trilhante.com.br 16 A Administração Pública pode agir de maneira colaborativa para com o cidadão de diversas maneiras, como, por exemplo, por fomento, acesso à informação, prestação de esclarecimentos, facilitação de obtenção de provas em processos administrativos, editar cartilhas e guias, entre outros. Nas relações interadministrativas também deverá ocorrer a cooperação, na medida em que órgãos públicos trabalhem em conjunto tanto quanto for possível, por exemplo, por mecanismos de cooperação técnica, humana e financeira, por meio de atuação supletiva na insuficiência de outro órgão, por meio de delegação de tarefas etc. Um exemplo de como essa cooperação ocorre na prática é no que se refere ao licenciamento ambiental (LC 140/2011): Art. 4º Os entes federativos podem valer-se, entre outros, dos seguintes instrumentos de cooperação institucional: [...] II - convênios, acordos de cooperação técnica e outros instrumentos similares com órgãos e entidades do Poder Público, respeitado o art. 241 da Constituição Federal; [...] V - delegação de atribuições de um ente federativo a outro, respeitados os requisitos previstos nesta Lei Complementar; VI - delegação da execução de ações administrativas de um ente federativo a outro, respeitados os requisitos previstos nesta Lei Complementar. Meios de Controle O ordenamento jurídico oferece uma série de instrumentos para combater violações à moralidade. A CF/1988 prevê ação popular para atacar atos que ofendam a moralidade administrativa (art. 5º, LXXIII) e também mandado de segurança para atacar abuso de poder (art. 5º, LXIX), uma forma de imoralidade administrativa. Art. 5º. [...] LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por “habeas-corpus” ou “habeas-data”, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público; LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência; Violação da moralidade, por exemplo, também pode configurar infração disciplinar, crime de responsabilidade e ato de improbidade. Além disso, a inobservância da moralidade pode ocasionar a anulação de procedimentos, atos, contratos e normas. www.trilhante.com.br 17 5. Princípio da Publicidade O princípio da publicidade envolve a divulgação de informações pela Administração Pública. Esse princípio tem a finalidade de mostrar que o Poder Público deve agir com maior transparência possível, para que a população tenha conhecimento de todos os seus atos. Muitos doutrinadores alegam que a publicidade é um princípio instrumental, ou seja, ela não vale por si mesma, mas serve para outras finalidades práticas. Do ponto de vista teórico, o princípio da publicidade tem, ao menos, quatro facetas, as quais designam a função desse princípio: 1. Publicidade Formal: requisito de validade e/ou eficácia jurídica a atos convo- catórios, intimações, contratos da Administração, etc. 2. Publicidade Educativa: difusão de valores públicos como estímulo à geração de conscientização social ou divulgação de políticas públicas por meio de carti- lhas, guias, entre outros. 3. Publicidade Transparência: oferta de informações necessárias ao fortaleci- mento do controle externo e social do Estado, como a divulgação do orçamen- to, contratos, vencimentos, etc. 4. Publicidade Interna: divulgação de informações internamente, dentro de um órgão público, com o objetivo de promover a coordenação de tarefas, capacitar agentes públicos e avaliar ações, por exemplo, em audiências governamentais, circulares etc. O princípio da publicidade se desdobra em: 1. Motivação; 2. Transparência e acesso à informação. Motivação Uma das principais decorrências da publicidade é a regra da motivação. Motivar envolve explicitar os motivos, ou dar publicidade aos motivos de um ato administrativo, um ato normativo ou uma ação da Administração Pública. É importante ressaltar que todos os atos da Administração Pública devem ser regidos por um motivo. Porém, a responsabilidade de explicitar ou dar publicidade a esses motivos é um requisito formal de apenas alguns atos, sobretudo os atos restritivos (que limitam as liberdade, o patrimônio ou as posições jurídicas de um cidadão) e os atos discricionários (nos quais a Administração Pública detém margem de escolha). Além disso, o art. 50 da Lei de Processo Administrativo Federal aponta também um rol de atos que devem ser motivados, principalmente por conta da relevância da matéria abordada: www.trilhante.com.br 18 Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses; II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções; III - decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública; IV - dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório; V - decidam recursos administrativos; VI - decorram de reexame de ofício; VII - deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais; VIII - importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo. §1º A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato. §2º Na solução de vários assuntos da mesma natureza, pode ser utilizado meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que não prejudique direito ou garantia dos interessados. §3º A motivação das decisões de órgãos colegiados e comissões ou de decisões orais constará da respectiva ata ou de termo escrito. Salienta-se que esse rol é meramente exemplificativo, uma vez que é possível que a Administração Pública dê publicidade a todos os seus atos, exceto, por exemplo, aqueles que são praticados em caráter emergencial, nos quais a motivação, normalmente, é explicitada após o ato ter sido concretizado. CONTEÚDO DA MOTIVAÇÃO A motivação abrange a explicitação de: 1. Pressupostos fáticos: fatos que estão por trás da decisão, ou seja, qual é o diagnóstico da realidade que exige aquela decisão escolhida. 2. Pressupostos jurídicos: a maneira como o ato se acopla ao ordenamento jurídico. 3. Prognóstico: é o exame das consequências do ato, em conformidade com o art. 20 da LINDB: www.trilhante.com.br 19 Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas. Transparência e Acesso à Informação O ordenamento jurídico brasileiro tem muitas diretrizes favoráveis à transparência. Como exemplo, veja o que diz o art. 3º da Lei de Acesso à Informação: Art. 3º Os procedimentos previstos nesta Lei destinam-se a assegurar o direito fundamental de acesso à informação e devem ser executados em conformidade com os princípios básicos da administração pública e com as seguintes diretrizes: I - observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção; II - divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações; III - utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação; IV - fomento ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública; V - desenvolvimento do controle social da administração pública. Em resumo, tem-se as seguintes diretrizes gerais: Transparência como regra geral e sigilo como exceção; Divulgação de informações de interesse público a despeito de solicitação (publicidade ativa); Fomento à cultura de transparência na Administração etc. Além disso, a Constituição Federal garante o direito à informações de interesse particular, coletivo ou geral. Observe: Art. 5º. [...] XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; A CF ainda oferece instrumentos para a defesa desse direito, tais como: o direito de petição aos Poderes Públicos (art. 5º, XXXIV, “a”); www.trilhante.com.br 20 o direito de obtenção de certidões em repartições públicas (art. 5º, XXXIV, “b”); o habeas data para a obtenção de informações (art. 5º, LXXII). Inclusive, a Lei de Acesso à Informação, já citada, prevê a responsabilização do agente público que nega indevidamente o acesso à informação (arts. 32 ao 34). RESTRIÇÕES DE ACESSO À INFORMAÇÃO O ordenamento jurídico brasileiro prevê duas situações excepcionais em que o Estado pode negar acesso à informação: 1. Informações relativas à segurança do Estado e da sociedade; e 2. Informações relativas à vida privada, intimidade, honra e imagem de pessoas físicas e jurídicas. A primeira situação está descrita no art. 5º da CF: Art. 5º. [...] XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; Como exemplo de informações relativas à segurança do Estado e da sociedade, informações relativas à material bélico, pesquisas estratégicas e sigilosas, relações diplomáticas. Essas informações estão descritas pelo art. 23 da Lei de Acesso à Informação (LAI): Art. 23. São consideradas imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado e, portanto, passíveis de classificação as informações cuja divulgação ou acesso irrestrito possam: I - pôr em risco a defesa e a soberania nacionais ou a integridade do território nacional; II - prejudicar ou pôr em risco a condução de negociações ou as relações internacionais do País, ou as que tenham sido fornecidas em caráter sigiloso por outros Estados e organismos internacionais; III - pôr em risco a vida, a segurança ou a saúde da população; IV - oferecer elevado risco à estabilidade financeira, econômica ou monetária do País; V - prejudicar ou causar risco a planos ou operações estratégicos das Forças Armadas; VI - prejudicar ou causar risco a projetos de pesquisa e desenvolvimento científico ou tecnológico, assim como a sistemas, bens, instalações ou áreas de interesse estratégico nacional; www.trilhante.com.br 21 VII - pôr em risco a segurança de instituições ou de altas autoridades nacionais ou estrangeiras e seus familiares; ou VIII - comprometer atividades de inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a prevenção ou repressão de infrações. Ao restringir o acesso a essas informações, a Administração Pública terá que classificá- las em ultrassecretas, secretas ou reservadas pela autoridade pública competente. Cada uma dessas tem um período de proteção, nos termos do art. 24 da LAI: Art. 24. A informação em poder dos órgãos e entidades públicas, observado o seu teor e em razão de sua imprescindibilidade à segurança da sociedade ou do Estado, poderá ser classificada como ultrassecreta, secreta ou reservada. §1º Os prazos máximos de restrição de acesso à informação, conforme a classificação prevista no caput, vigoram a partir da data de sua produção e são os seguintes: I - ultrassecreta: 25 (vinte e cinco) anos; II - secreta: 15 (quinze) anos; e III - reservada: 5 (cinco) anos. Após o término desse período de proteção, a informação volta a ser de acesso público. Já nos casos de restrição de acesso à informação pela proteção de direitos fundamentais de pessoas físicas e jurídicas (vida privada, honra, intimidade e imagem), a proteção é automática (não há necessidade de processo de classificação) pelo prazo mínimo de 100 anos. Durante a vigência desse prazo, o acesso à informação pode ser dado apenas em situações excepcionais, quais sejam, com a autorização do titular dos dados ou pela previsão da LAI. É importante ler na íntegra quais são os casos em que a própria lei libera o acesso à informação, mesmo sem a autorização do titular: Art. 31. O tratamento das informações pessoais deve ser feito de forma transparente e com respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às liberdades e garantias individuais. §1º As informações pessoais, a que se refere este artigo, relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem: I - terão seu acesso restrito, independentemente de classificação de sigilo e pelo prazo máximo de 100 (cem) anos a contar da sua data de produção, a agentes públicos legalmente autorizados e à pessoa a que elas se referirem; e II - poderão ter autorizada sua divulgação ou acesso por terceiros diante de previsão legal ou consentimento expresso da pessoa a que elas se referirem. §2º Aquele que obtiver acesso às informações de que trata este artigo será responsabilizado por seu uso indevido. www.trilhante.com.br 22 §3º O consentimento referido no inciso II do § 1º não será exigido quando as informações forem necessárias: I - à prevenção e diagnóstico médico, quando a pessoa estiver física ou legalmente incapaz, e para utilização única e exclusivamente para o tratamento médico; II - à realização de estatísticas e pesquisas científicas de evidente interesse público ou geral, previstos em lei, sendo vedada a identificação da pessoa a que as informações se referirem; III - ao cumprimento de ordem judicial; IV - à defesa de direitos humanos; ou V - à proteção do interesse público e geral preponderante. §4º A restrição de acesso à informação relativa à vida privada, honra e imagem de pessoa não poderá ser invocada com o intuito de prejudicar processo de apuração de irregularidades em que o titular das informações estiver envolvido, bem como em ações voltadas para a recuperação de fatos históricos de maior relevância. §5º Regulamento disporá sobre os procedimentos para tratamento de informação pessoal. Na prática há vários instrumentos para conciliar o sigilo com o acesso à informações, por exemplo, as certidões, versões públicas de documentos, técnicas de divulgação parcial de documentos, entre outros. Publicidade Ilícita A publicidade é manejada de maneira indevida nas seguintes hipóteses: 1. Publicidade de dados protegidos com o objetivo de violar direitos; 2. Publicidade autopromocional de obras, atos, programas etc., que o agente público faz com a intenção de se promover (art. 37, §1º, CF); 3. Publicidade de dados ou opiniões para influenciar processos decisórios na Administração ou no Judiciário; 4. Publicidade de informações estatais privilegiadas para favorecer agentes de mercado ou se favorecer economicamente. Essa conduta se caracteriza como ato de improbidade, nos termos do art. 11, inciso VII, da Lei de Improbidade Ad- ministrativa: Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço. www.trilhante.com.br 23 Ainda sobre a questão da publicidade autopromocional, observe o que diz o art. 37, §1º, da CF: Art.37. [...] §1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos. www.trilhante.com.br 24 6. Princípio da Eficiência A eficiência foi incluída no rol dos princípios gerais da Administração Pública do art. 37 da CF por meio da Emenda Constitucional nº19/1998. A eficiência pode ser interpretada por meio de três conteúdos básicos: 1. Eficiência em sentido estrito (racionalidade); 2. Eficiência como efetividade; 3. Eficiência como economicidade. Eficiência em Sentido Estrito Envolve a organização dos processos e comportamentos da Administração Pública de modo racional, a fim de atingir, de maneira mais rápida, fácil e simples, o interesse público primário a que o processo se direciona. No ordenamento jurídico brasileiro há inúmeros mandamentos que concretizam a ideia de eficiência em sentido estrito. Por exemplo, a garantia de duração razoável dos processos administrativos (art. 5º, LXXVIII da CF); mecanismos de aceleração do processo administrativo em favor de deficientes, pessoas com doenças graves, idosos, entre outros grupos vulneráveis (art. 69-A da Lei de Processo Administrativo Federal); atos fictícios liberatórios da atividade econômica (art. 3º, IX, da Lei de Liberdade Econômica), entre outros. Outra manifestação da racionalidade se encontra no princípio do formalismo mitigado, informalismo, ou,ainda, na economia processual. O art. 2º, parágrafo único, IX da Lei de Processo Administrativo Federal prevê que a Administração deve adotar formas simples, que sejam suficientes para propiciar um adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados. Essas formas devem ser utilizadas para beneficiar o administrado/cidadão, e não contra ele. Se não houver uma razão de proteção ao cidadão que leve a uma necessidade de uma determinada formalidade, tal formalidade deverá ser abandonada. Isso também se verifica no art. 22, caput, da mesma lei. Art. 2º. [...] Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: [...] IX - adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados; [...] Art. 22. Os atos do processo administrativo não dependem de forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir. www.trilhante.com.br 25 Ademais, também se encontra a eficiência em sentido estrito no aproveitamento de atos processuais, ou seja, a preferência pela correção, pela convalidação (suprimir o vício) e pela confirmação, bem como na manutenção de atos inofensivos, ao invés da anulação completa de um ato administrativo. Eficiência como Efetividade A eficiência também exige que as decisões e os atos da Administração Pública atinjam resultados esperados, ou seja, que sejam efetivos. No ordenamento jurídico, a efetividade se vê, por exemplo: No princípio da vantajosidade dentro das licitações públicas (a Administração deve cele- brar contratos e selecionar agentes econômicos para celebrar esses contratos que possam satisfazer os interesses do Estado da melhor forma possível); Na possibilidade de revisão de sanções administrativas inadequadas para a satisfação do interesse público que se encontrem, por exemplo, na Lei de Processo Administrativo, no Estatuto dos Servidores Civis da União, entre outros diplomas; No dever de planejamento que aparece nas políticas de cultura, de educação, de am- biente, de urbanização (o dever de planejamento envolve o diagnóstico da realidade, esta- belecimento de metas e ações que serão empregadas para atingir tais metas); Na exigência de que as decisões sejam elaboradas com base em um prognóstico de consequências, inclusive quando anulatórias de atos; Na exigência de análise de impacto regulatório (AIR) como etapa preparatória da edi- ção de atos normativos. Eficiência como Economicidade A Administração Pública deve agir para maximizar os resultados obtidos com o emprego dos recursos extraídos, principalmente da população. Envolve, portanto, uma melhor relação de custo-benefício, visto que é possível dizer que o Estado custa muito caro para o cidadão, já que é sustentado pelo povo, por meio dos tributos. Sendo assim, é plausível que o cidadão veja um retorno de tudo que gasta com a Administração Pública. É importante ressaltar que a Economicidade não envolve um menor gasto ou menor preço a despeito de uma avaliação de resultado, pelo contrário, envolve a relação de custo-benefício. Por exemplo: é mais vantajosa a construção de uma ponte que custe R$ 100 milhões de reais, mas que dure 50 anos, do que uma que custe R$ 50 milhões e dure apenas 10 anos. O ordenamento jurídico também estimula a Administração Pública a buscar a economicidade, estabelecendo, muitas vezes limites, por exemplo: Fixação de tetos e subtetos de remuneração de servidores; Estabelecimento de limites de gastos orçamentários por cada Poder; Flexibilização da estabilidade do servidor diante de excesso de gastos; www.trilhante.com.br 26 Permissão de controle externo para verificação da economicidade da gestão. CUIDADO! Certas leis, porém, forçam o menor gasto ou custo, a despeito de uma análise de custo benefício, ou seja, independentemente de uma análise de du- rabilidade ou qualidade do investimento. Um exemplo disso são as leis relacio- nadas à licitações. www.trilhante.com.br 27 7. Princípio do Interesse Público O princípio do interesse público, conhecido também por princípio da supremacia do interesse público, não está expresso no art. 37, caput, da CF, mas é um princípio da Administração Pública de extrema importância. Interesses Públicos Os indivíduos isoladamente não conseguem tutelar todos os objetos necessários e desejados pela coletividade. Assim, a comunidade cria e sustenta o Estado para zelar por interesses públicos primários, como o ambiente equilibrado, o funcionamento da concorrência, a ordem urbanística, a cultura, a saúde, a proteção do consumidor etc. Nesse contexto, todos esses bens difusos de relevância social, sob tutela do Estado por decisão constitucional, configuram interesses públicos primários. Diferentemente, os interesses secundários do Estado são os interesses quotidianos, como os de adquirir veículos, distribuir remédios, construir estações de metrô, entre outros. Os interesses secundários apenas serão lícitos se forem compatíveis com os interesses públicos primários. Por exemplo: caso a Administração Pública tenha o interesse de construir um prédio, essa construção apenas será lícita se o prédio objetivar a promoção de interesses primários, ou seja, se o prédio for sediar um hospital, uma escola, ou qualquer outra tarefa de interesse público primário. Interesses Públicos e Direitos Fundamentais Na prática, a tutela dos direitos fundamentais é, por si só, um interesse público a ser perseguido pelo Estado por mecanismos: 1. Defensivos ou de abstenção estatal; 2. Prestativos ou de oferta de comodidades; 3. Participativos ou de diálogo. Contudo, não é incomum que os interesses públicos entrem em choque e originem restrições a certos direitos fundamentais. A título de exemplo: o Estado pode buscar o interesse público de promoção da educação e, para isso, precisa desapropriar um imóvel de um particular para construir uma escola. Veja que, ao mesmo tempo que o Estado promove o interesse público de educação, ele ataca o direito fundamental de propriedade mediante a desapropriação. Destarte, a CF prevê que as restrições aos direitos fundamentais deverão ser sempre motivadas, razoáveis e harmônicas com o ordenamento jurídico. Ademais, restrições mais graves dependerão de reserva constitucional ou reserva legal, ou seja, devem ser previstas pelo ordenamento jurídico. É o caso, por exemplo, da desapropriação de imóveis urbanos, a qual está prevista pelo art. 182, §3º, da CF: www.trilhante.com.br 28 Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. [...] §3º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. Manifestações do Interesse Público São exemplos de aplicação do princípio do interesse público no ordenamento jurídico brasileiro: 1. Vedação da renúncia de competência (o agente público não pode se recusar a exercer as tarefas atribuídas a ele pela legislação, exceto quando as normas assim permitirem); 2. Oficialidade no processo administrativo (no processo administrativo, a Ad- ministração Pública pode tomar ações independentemente de solicitação das partes interessadas, por exemplo, produzir provas, revisar sanções etc); 3. Dever de interpretar a “norma administrativa da forma que melhor garante o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação” (art. 2º, XIII, da Lei de Processo Administrativo Federal); 4. Poderes exorbitantes nos contratos administrativos instrumentais a favor do Estado nas relações com particulares, como o de alteração unilateral do contra- to, extinção unilateral do contrato, entre outros, descritos pela Lei de Licitações; 5. Presunções relativas de veracidade e de legalidade de atos da Administra- ção, que justificam, por exemplo, possibilidade de autenticação de documentos por qualquer agente público. www.trilhante.com.br 29 8. Segurança Jurídica no Direito Administrativo Outro princípio que não está expresso no art. 37, caput, da Constituição Federal, mas que pode ser deduzido do texto constitucional e das normas infraconstitucionais é o princípio da segurança jurídica. De acordo com o professor Paulo Modesto, o princípio da segurança pode ser desmembrado em: Segurança “do” direito; Segurança “no” direito; Segurança “pelo” direito. Segurança do Direito Em primeiro lugar, para que haja segurança jurídica, é preciso ter segurança “do” direito, ou seja, um ordenamento jurídico marcado pela objetividade, clareza e previsibilidade acerca da legalidade ou ilegalidade de condutas. Para que exista de fato essa previsibilidade, é preciso que o texto legal seja construído de maneira clara e precisa, indicando de forma explícita o que é permitido e proibido, bem como as consequências da violação de normas jurídicas. Além disso, é importante que todos os textos normativos sejam articulados e harmônicos entre si, evitando antinomias, ou seja, normas que sejam contraditórias entre si. Finalmente, é requisito importante para se atingir a segurança do direito a simplificação da legislação, quer dizer, as normas devem ser construídas da maneira mais simples possível. O direito busca promover essa segurança ao exigir que as leis sejam redigidas com clareza, precisão e ordem cronológica, como diz o art. 11 da Lei Complementar 95/98: Art. 11. As disposições normativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem lógica [...]. Outro exemplo da busca do ordenamento jurídico brasileiro em promover a segurança do direito é o que consta no art. 2º do Estatuto da Cidade. Observe: Art. 2º. A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: [...] XV – simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos lotes e unidades habitacionais; www.trilhante.com.br 30 Segurança no Direito Uma segunda faceta da segurança jurídica é a chamada segurança “no” direito, a qual impõe o respeito a situações jurídicas constituídas, a garantia de mínima estabilidade nas relações e a proteção da confiança dos indivíduos em relação ao sistema jurídico/ legislação e ao Estado/Administração Pública.A legislação administrativa prevê vários mecanismos para buscar a segurança no direito. Podemos citar como exemplos: A Lei de Processo Administrativo Federal veda a retroatividade de nova interpretação, ou seja, a Administração Pública não pode usar uma nova interpretação de um texto legal para modificar situações jurídicas já constituídas no passado sob outra interpretação; A LINDB exige que situações passadas sejam examinadas à luz das orientações da épo- ca; O ordenamento jurídico limita o poder anulatório da Administração Pública em relação aos sujeitos de boa-fé (art. 54 da Lei de Processo Administrativo Federal); A LINDB protege o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Segurança pelo Direito A terceira faceta da segurança jurídica é a segurança “pelo” direito, quer dizer, o direito precisa oferecer meios e remédios de defesa contra ameaça a situações jurídicas estabilizadas, como o ato perfeito, a coisa julgada, os direitos adquiridos, entre outros. O direito garante essa segurança, por exemplo, ao: Criar mecanismos de controle interno e externo, inclusive social, da Administração; Garantir o acesso ao Judiciário diante de ilegalidades ou abusos (há várias ações espe- ciais para isso, por exemplo: mandado de segurança, mandado de injunção, habeas data, entre outras); Oferecer ações judiciais especiais para combater falhas da Administração. Manifestações da Segurança Jurídica Podemos dividir as manifestações da segurança jurídica em dois blocos, quais sejam: Manifestações expressas no ordenamento jurídico; Manifestações construídas pela doutrina e pela jurisprudência. Nesta aula, foram dados vários exemplos de manifestações da segurança jurídica expressas no ordenamento, como: 1. Irretroatividade da nova interpretação; 2. Decadência do poder anulatório; 3. Motivação por abandono de jurisprudência firmada; www.trilhante.com.br 31 4. Consideração de orientações de exame de legalidade etc. Além disso, existem teorias construídas pela doutrina e pela jurisprudência que também visam a promoção da segurança jurídica, por exemplo: A teoria do fato consumado; A teoria do agente/funcionário de fato; e A teoria da autovinculação. Teoria do Fato Consumado A teoria do fato consumado sugere a manutenção de situações jurídicas estabilizadas e autorizadas por uma decisão anterior precária, ainda que a decisão final a entenda ilegal. A título de exemplo, podemos imaginar um estudante que conseguiu ingressar em uma universidade pública com base em uma decisão judicial liminar, mas cujo mérito é examinado somente após sua colação de grau e, na decisão final, os magistrados entendem que a matrícula do estudante na graduação foi indevida. Nesse caso, a graduação é um fato consumado e, por isso, exige a proteção da posição jurídica. Assim, a decisão não surte qualquer efeito na prática. Sobre um caso como esse, veja a seguinte decisão do STJ (REsp 709.934-RJ, Rel. Min. Humberto Martins, 2007): ADMINISTRATIVO DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS MATÉRIA AFETA AO STF MILITAR TRANSFERÊNCIA EX OFFICIO ENSINO SUPERIOR MATRÍCULA DE DEPENDENTE CONGENERIDADE DECURSO DE 6 ANOS DA CONCESSÃO DA SEGURANÇA APLICAÇÃO DA TEORIA DO FATO CONSUMADO. 1. A apreciação de suposta ofensa a preceitos constitucionais não é possível na via especial, nem à guisa de prequestionamento; porquanto matéria reservada, pela Carta Magna, ao Supremo Tribunal Federal. 2. É assegurado o direito à transferência obrigatória de servidor militar estudante e de seus dependentes quando ele tenha sido removido ex officio e no interesse da Administração Pública, desde que a instituição de ensino seja congênere à de origem; ou seja, de pública para pública ou de privada para privada, caso dos autos. 3. Entretanto, na hipótese dos autos, verifica-se que, entre a sentença que concedeu a segurança tornando possível a matrícula da ora recorrida na UFRJ e a presente data, decorreram aproximadamente seis anos. 4. Impõe-se, no caso, a aplicação da Teoria do Fato Consumado, segundo a qual as situações jurídicas consolidadas pelo decurso do tempo, amparadas por decisão judicial, não devem ser desconstituídas, em razão do princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais. Recurso especial conhecido em parte e improvido. www.trilhante.com.br 32 TEORIA DO FATO CONSUMADO E CONCURSO PÚBLICO O STF entende que a teoria do fato consumado não se aplica para manter indivíduos que tenham assumido cargos públicos precariamente por decisão judicial liminar, não confirmadas ao final do processo (STF, RE 608.482, Rel. Min. Teori Zavascki, 2014): CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO REPROVADO QUE ASSUMIU O CARGO POR FORÇA DE LIMINAR. SUPERVENIENTE REVOGAÇÃO DA MEDIDA. RETORNO AO STATUS QUO ANTE. “TEORIA DO FATO CONSUMADO”, DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA E DA SEGURANÇA JURÍDICA. INAPLICABILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Não é compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo, sob fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou posse em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro provimento judicial de natureza precária, supervenientemente revogado ou modificado. 2. Igualmente incabível, em casos tais, invocar o princípio da segurança jurídica ou o da proteção da confiança legítima. É que, por imposição do sistema normativo, a execução provisória das decisões judiciais, fundadas que são em títulos de natureza precária e revogável, se dá, invariavelmente, sob a inteira responsabilidade de quem a requer, sendo certo que a sua revogação acarreta efeito ex tunc, circunstâncias que evidenciam sua inaptidão para conferir segurança ou estabilidade à situação jurídica a que se refere. 3. Recurso extraordinário provido. Teoria da Autovinculação A teoria da autovinculação é também conhecida como teoria dos atos próprios ou da proibição do venire contra factum proprium. Nesse caso, o Poder Público deve manter a coerência em suas ações, sobretudo quando os cidadãos de boa-fé nelas confiam e as utilizam para guiar suas próprias condutas particulares. Sendo assim, é incompatível com a segurança jurídica a contradição comportamental imotivada, desarrazoada, ardilosa ou realizada de má-fé pelo agente público. Mais recentemente, a Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro (LINDB) absorveu em grande parte a teoria da autovinculação em alguns dispositivos. A LINDB, por exemplo, exige que se respeitem as manifestações prévias contidas em respostas a consultas e súmulas expedidas pela Administração Pública, ou seja, se o Estado respondeu a uma consulta ou a uma súmula no passado, deverá também observar essa resposta que deu ao tratar do caso no futuro. Ademais, a LINDB também prevê a observância de orientações administrativas da época da prática do ato sempre que se examinar sua legalidade. Resumindo, a Administração Pública deve agir de maneira coerente, harmônica, evitando tomar decisões surpresa, ignorar interpretações que adotou no passado e evitar contradições no dia a dia. Na prática, a teoria da autovinculação reduz a discricionariedade da Administração Pública, ou seja, a liberdade de ação administrativa, sujeitando o Estado a atuar de forma coerente com o ordenamento. www.trilhante.com.br 33 Teoria do Agente de Fato A teoria do agente/funcionário de fato busca garantir a manutenção da eficácia jurídica de atos praticados por sujeitos incompetentes em favor de um cidadão de boa-fé, que acreditou no ato, perante a Administração Pública. É o caso, por exemplo, do ato administrativo editado por indivíduos que usurpam funções públicas, como o particular, não concursado, que indevidamente exerce atividades de médico ou docente. Pela teoria do agente de fato, são mantidos os atos praticados a despeito da incompetência do sujeito que agiu como servidor público. De acordo com a doutrina, há dois requisitos para que se aplique em um caso concreto a teoria do agente de fato: 1. Comprovar que o destinatário do ato plausivelmente considerou legal o exercício da função pública, ou seja, que o destinatário do ato acreditou que a pessoa que estava no exercício da função administrativa tinha todos os requisi- tos para exercê-la ; e 2. Comprovar que o destinatário seria injustamente afetado pela anulação. O STF estende a aplicação da teoria do agente de fato também para situações em que um agente público atua indevidamente em outra função (STF, RE 78209, Rel. Min. Aliomar Baleeiro, 1974): OFICIAIS DE JUSTIÇA - EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES POR AGENTES DO EXECUTIVO. I - MESMO DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI QUE COLOCOU AGENTES DO EXECUTIVO A DISPOSIÇÃO DOS JUIZES, PARA EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES DE OFICIAIS DE JUSTIÇA, ESSES SERVENTUARIOS NÃO SÃO USURPADORES, MAS FUNCIONÁRIOS DO ESTADO COM DEFEITO DE COMPETÊNCIA. II - SE O DIREITO RECONHECE A VALIDADE DOS ATOS ATÉ DE FUNCIONÁRIOS DE FATO, ESTRANHOS AOS QUADROS DO PESSOAL PÚBLICO, COM MAIOR RAZÃO HÁ DE RECONHECE-LA SE PRATICADOS POR AGENTES DO ESTADO NO EXERCÍCIO DAQUELAS ATRIBUIÇÕES POR FORÇA DE LEI, QUE VEIO A SER DECLARADA INCONSTITUCIONAL. III - E VALIDA A PENHORA FEITA POR AGENTES DO EXECUTIVO, SOB AS ORDENS DOS JUIZES, NOS TERMOS DA LEI ESTADUAL DE SÃO PAULO, S/N, DE 3.12.1971, MORMENTE SE NENHUM PREJUIZO DISSO ADVEIO PARA O EXECUTADO. www.trilhante.com.br 34 PRINCÍPIOS DO DIREITO ADMINISTRATIVO www.trilhante.com.br /trilhante /trilhante /trilhante