Sensação, Perceção e Cognição

Sensação, Perceção e Cognição

• A perceção é mais rica que a realidade, por exemplo, a imagem de um cubo.
• Sensação: O primeiro contacto com a realidade, a captação imediata e pura de um objeto sensorial pelos sentidos, sem qualquer construção.
• Perceção: O cérebro seleciona, organiza e atribui significado à informação recebida, transformando as sensações em representações mentais significativas. Esse processo é mais rico que o estímulo proximal. Este processo inclui componentes bottom-up, afetados diretamente pelo estímulo, e top-down, afetados por conhecimentos e expectativas baseadas em contexto e experiências passadas. A perceção é conduzida por hipóteses e expectativas, suscetíveis de erro.
• Cognição: O processo que envolve a manipulação das perceções.

Características dos Sistemas Sensoriais

• Órgãos sensoriais específicos, recetores específicos e córtex específicos, especializando-se em suas funções.
• Funcionam com limiares de ativação/resposta:
  • Limiar absoluto: A intensidade mínima de estímulo para causar sensação.
  • Limiar de discriminação: A diferença mínima necessária na intensidade de dois estímulos para serem percebidos como diferentes.
• Input dos órgãos sensoriais: energia ambiental.
• Output dos órgãos sensoriais: impulsos nervosos.
• Variam entre espécies.
• Habituação: Adaptação ao estímulo.

Problemas do Sistema Visual

• O problema da "projeção inversa": O sistema visual precisa compreender qual objeto externo gerou a imagem na retina.
• Variedade de estímulos proximais - mesmo estímulo distal: objetos distantes, de mesmo tamanho, aparecem com tamanhos diferentes na imagem retiniana.
• Variedade de estímulos distais - mesmo estímulo proximal: objetos diferentes, mas a mesma projeção retiniana, podem ser percebidos como tendo o mesmo tamanho, mas não no caso de um estar mais distante.
• Informação visual degradada: objetos podem estar desfocados, com pouca iluminação, ou confundir-se com o fundo. No entanto, os objetos são frequentemente percebidos como completos e facilmente reconhecíveis.

Do Mundo Visual até ao Cérebro

• Órgão sensorial: Olho.
• A quantidade de luz que entra no olho é controlada pela pupila, através da íris.
• O olho projeta uma imagem nítida na retina a partir da luz exterior.
• Tecido sensorial: Retina
• Receptores sensoriais (retinianos): Convertem energia da luz em impulsos nervosos (transdução):
  • Cones: Funcionam em luminosidade intensa, detectando cores e formas.
  • Bastonetes: Funcionam em baixa luminosidade, detectando movimento e visão periférica.
• A retina inverte a imagem que recebe, devido às propriedades refletoras do globo ocular.
• Hemicampo visual direito: Parte externa (temporal) da retina esquerda e parte interna (nasal) da retina direita.
• Hemicampo visual esquerdo: Parte externa (temporal) da retina direita e parte interna (nasal) da retina esquerda.
• Destino da informação visual: Córtex visual.
• Córtex visual primário: Recebe informação sobre tamanho, cor, luminosidade, movimento e dimensões.
• Córtex visual secundário: Interpreta a informação proveniente do córtex visual primário, transformando o estímulo em perceptos com significado e transmitindo a informação a outras áreas do cérebro para a sua integração.

Processamento Visual

• Representação de baixo nível (córtex primário): Detecta cor, luminosidade, contraste, arestas.
• Representação intermédia (córtex secundário): Extrai objetos do fundo, avalia profundidade, determina características dos objetos.
• Representação de alto nível: Reconhece objetos e faces.

Teoria Gestaltista

• Processamento visual rápido e eficaz através da organização perceptiva.
  • Lei da pregnância: Busca por estrutura mais simples no estímulo.
  • Lei da proximidade: Elementos próximos são agrupados.
  • Lei da semelhança: Elementos semelhantes são agrupados.
  • Lei da boa continuidade: Linhas contínuas são agrupadas.
  • Lei do fechamento: Partes em falta são preenchidas.
  • Lei do destino comum: Elementos em movimento conjunto são agrupados.
• Segregação perceptiva: Determinar que partes da informação visual fazem parte do mesmo objeto.
• Segregação figura-fundo: Distinguir o objeto principal (figura) do fundo.
  • Lei da pequenez: áreas pequenas destacam-se como figura.
  • Simetria: Formas simétricas tendem a ser agrupadas.
• O agrupamento dos elementos ocorre numa fase inicial do processo visual (bottom-up), embora existam influências de processos top-down.
• “O todo é mais do que a soma das partes”.
• Processamento global (todo o objeto) seguido por processamento analítico (detalhes) é sugerido pela investigação de David Navon, mas isso depende das características do estímulo.

Perspectiva Construtivista da Percepção Visual

• A perceção é um processo ativo e construído, combinando processamento bottom-up e top-down.
• A informação retiniana é ambígua e incompleta, exigindo inferências inconscientes para construir uma interpretação provável do mundo.
• A perceção depende de conhecimentos implícitos sobre o meio e de hipóteses formuladas pelo observador, com base no processamento de informação top-down.
• A mente constrói uma representação 3D estável de um mundo 2D e instável.

Uma Percepção 3D - Através da Percepção da Profundidade/Distância

Uma Percepção Estável - Através dos Mecanismos de Constância Perceptiva

• Índices de profundidade:

  • Oculomotores/primários: Informação dos músculos oculares (pistas de distância).
  • Visuais/secundários: Informação da imagem retiniana (altura no plano, paralaxe de movimento).
  • Cognitivos: Conhecimento prévio sobre os objetos.

• Índices visuais monoculares dinâmicos:

  • Paralaxe de movimento: Deslocamento da imagem na retina devido ao movimento da cabeça ou do observador. A velocidade dos objetos é inversamente proporcional à distância.
  • Sobreposição: Objeto que cobre outro é percebido como mais próximo.
  • Tamanho da imagem retiniana: Objeto distante projeta imagem menor.
  • Perspetiva linear: Linhas paralelas convergem com a distância.
  • Gradiente de textura: Textura mais densa em objetos mais distantes.
  • Altura no plano: Objetos mais altos no plano parecem mais distantes.
  • Sombreado: Objetos mais distantes parecem mais escuros ou com sombras mais suaves.
  • Perspetiva aérea: Objetos mais distantes parecem mais pálidos, azuis ou nublados.
  • Desfocagem: Objetos mais distantes parecem mais desfocados.

• Índices visuais binoculares:

  • Disparidade binocular/retiniana: As imagens diferentes de um objeto projetado nas duas retinas são usadas para calcular a profundidade. Quanto mais próximo o objeto, maior a diferença.

• Índices oculomotores:

  • O cérebro interpreta o grau de contração muscular para determinar a distância do objeto.

• Índices cognitivos:

  • Conhecimentos prévios sobre tamanho, posição, velocidades e outras características dos objetos do observador.

Mecanismos de Constância Perceptiva

• A perceção permite extrair características invariantes de um estímulo distal a partir de estímulos proximais variantes.
• Mecanismos de constância perceptiva:
• Constância de tamanho
• Constância de forma
• Constância de cor

Ilusões Perceptivas

Perspectiva Direta da Percepção Visual

• Gibson: Perceção direta sem interferência mental.
• Muita informação disponível no estímulo (gradientes de textura, etc) para uma perceção direta.
• O organismo extrai informação do meio (estímulos distais) a partir dos estímulos proximais.
• Os organismos percecionam características do ambiente, posição em relação ao ambiente, acontecimentos e affordances (possibilidades de ação).

Reconhecimento de Objetos

• O reconhecimento de objetos/cenas é complexo, devido à variabilidade dos estímulos distais (e proximais), do ângulo de visão e das propriedades visuais de objetos de mesma categoria.

Teorias Clássicas sobre o Reconhecimento de Objetos

• As imagens de objetos refletem fatores intrínsecos (características do objeto, forma, propriedades da superfície) e extrínsecos (mudanças na imagem - ponto de vista, luz, oclusões, fundo).
• Existem teorias independentes do ponto de vista (viewpoint invariant) e dependentes do ponto de vista (viewpoint dependent).
• Teorias incluiem:
  • Template matching
  • Análise de características
  • Abordagem computacional de Marr (independente)
  • Reconhecimento por componentes de Biederman (independente)
  • Teoria dependente do ponto de vista de Tarr.

Teoria Computacional de David Marr

• O objetivo da visão é reconstruir uma representação mental 3D do estímulo distal, independente do ponto de vista.
• A organização visual é modular.
• Cada estádio de processamento usa o output do estádio anterior.
• São criadas representações visuais crescentes, a partir da imagem retiniana:
  • Matriz de níveis de cinzento (raw primal sketch)
  • Esboço Primário (completo primal sketch).
  • Esboço 2½D (profundidade, orientação das superfícies).
  • Modelo 3D (independente do ponto de vista).

Teoria por Componentes de Biederman

• Objetos são descritos por arranjos espaciais de geões (blocos, cilindros, esferas, arcos).
• Extração de contornos, concavidades e geões descreve o objeto.
• Correspondência com modelos na memória a longo prazo.
• Limitações: não explica discriminações sutis dentro de classes, pressupõe independência ao ponto de vista (contrariado por estudos), é excessivamente bottom-up.

Teorias Dependentes do Ponto de Vista

• Representação mental de um objeto como uma coleção de perspetivas.
• Reconhecimento mais fácil com perspetivas familiares.

Teorias Independentes vs. Dependentes

• Ambas são relevantes.
• Invariantes (independentes): discriminações de categorias (ex: carros vs bicicletas).
• Dependentes: discriminações dentro de categorias (ex: modelos de carros).

Contributo de Estudos com Doentes com Lesão Cerebral

• Agnosia visual: dificuldade em descrever ou nomear objetos por reconhecimento visual, mas o reconhecimento ocorre com outras modalidades.
• Anomia: reconhecimento com informações sobre o objeto sem nome.
• Demência semântica: perda de conhecimento sobre os objetos, independentemente da modalidade.

Modelo em Cascata de Humphreys

• Reconhecimento ao nomeação do objeto:
  • Extração de características visuais (forma, tamanho, cor)
  • Processamento de características categoriais, funcionais e associativas.
  • Nome do objeto.
• Nomeação é mais lenta quando os objetos partilham semelhanças estruturais.

Evidencias de doentes com lesão cerebral:

• Agnosia aperceptiva: défices no processamento percetivo, pré-categorial (pessoas incapacitadas para reconhecer/copiar formas).
• Agnosia visual da forma (só reconhece alguns objetos reais).
• Agnosia visual integrativa (dificuldades de reconhecimento quando objetos estão juntos ou sobrepostos)
• Agnosia associativa: dificuldade no acesso à informação sobre o objeto na memória.
• Afasia anómica