Psicologia Metafísica e a Alma

Psicologia Metafísica

• Estudo da alma (ou psique) sob uma perspectiva filosófica.
• Transcende explicações físicas ou empíricas.
• A psicologia metafísica investiga a alma como princípio vital, diferente da psicologia moderna que se baseia na neurociência e no comportamento observável.

A Alma na Antiguidade

• Platão e Aristóteles foram dois dos principais pensadores que desenvolveram teorias sobre a alma num contexto metafísico.
• Acreditavam que a alma era essencial para determinar a essência do ser humano, não apenas um conjunto de processos mentais.

Concepção da Alma pelos Primeiros Filósofos (Pré-Socráticos, séc. VI-V a.C.)

• Os primeiros filósofos buscavam o princípio fundamental da vida, sem focar na "alma" como se entende hoje.
• Para Heráclito, a alma era feita de fogo e estava em constante transformação.
• Para Pitágoras, a alma era imortal e reencarnava após a morte.

Heráclito e a Alma de Fogo

• O fogo representava a mudança contínua e a impermanência, simbolizando a natureza dinâmica da alma, alinhado com a ideia de "tudo flui" (panta rhei).
• O crescimento intelectual e espiritual resulta da aceitação do fluxo constante da realidade.
• Uma alma "humida" (passiva e preguiçosa) levaria à ignorância.

Pitágoras e a Metempsicose

• A alma era imortal e sujeita a um ciclo de reencarnações sucessivas, conceito conhecido como metempsicose ou transmigração da alma.
• Após a morte, a alma renasceria noutro corpo, humano ou animal, dependendo da conduta na vida anterior.
• A purificação da alma através do conhecimento e da virtude liberta a alma do ciclo de renascimentos.
• Doutrina com influência nas tradições filosóficas posteriores (Platão) que adotou a crença na imortalidade da alma e a sua purificação.

Platão (427-347 a.C.)

• Defendeu a existência de duas realidades: o mundo sensível (físico) e o mundo inteligível (das ideias).

O Mundo Sensível (Ilusório)

• Mundo físico onde se vive e experimenta a realidade através dos sentidos.
• Caracterizado por constante mudança e imperfeição.
• Os sentidos enganam, impedindo o alcance do verdadeiro conhecimento.

O Mundo Inteligível (Real)

• Mundo das Ideias ou Formas, onde existe a verdadeira realidade.
• As Ideias são eternas, imutáveis e perfeitas (ex: a Ideia de Justiça ou Beleza).
• Só a razão pode aceder a este mundo, pois os sentidos não captam a sua existência.

A Alma em Platão

• Alma imortal e pertencente ao mundo inteligível, mas está temporariamente aprisionada no corpo.
• A morte liberta a alma, permitindo o retorno ao mundo das ideias após purificação pela busca da verdade e filosofia.

Mito da Caverna de Platão

• Os prisioneiros na caverna representam as pessoas no mundo sensível, iludidas pelos sentidos.
• Um prisioneiro que sai e vê a luz (mundo inteligível) representa a alma que busca o conhecimento verdadeiro.
• A libertação da alma é possível através da dialética e do conhecimento filosófico, recordando as Ideias conhecidas antes do nascimento (Teoria da Reminiscência).
• O objetivo final é alcançar o Bem Supremo e retornar ao mundo inteligível; pensamento que influenciou a tradição filosófica e visões religiosas sobre a imortalidade da alma.

A Tríplice Divisão da Alma em Platão

• A alma humana é dividida em três partes com funções específicas e localizações simbólicas no corpo.
• A República compara a alma ao governo de uma cidade justa, onde harmonia depende de cada parte cumprir o seu papel.
• A alma no Fedro e na República é dividida em três partes: Racional (Logos), Irascível (Thymos) e Concupiscente (Epithymia).

Alma Racional (Logos)

• Localizada na cabeça, representa a razão e a busca pelo conhecimento.
• A parte mais elevada da alma.
• Deve governar a alma.
• Ligada ao pensamento lógico, à razão e à busca pela sabedoria.
• Deve governar as outras partes da alma para que o indivíduo viva de forma justa e equilibrada.
• Analogamente à sociedade, é como os filósofos-reis, que devem governar a cidade com sabedoria.
• Exemplo: Resistir a uma decisão impulsiva e agir com lógica e reflexão.

Alma Irascível (Thymos)

• Localizada no peito, relacionada às emoções, coragem e honra.
• Responsável pelas paixões e coragem, associada ao senso de honra e à capacidade de enfrentar desafios.
• Pode auxiliar a razão (quando disciplinada) ou levar à impulsividade (se não for controlada).
• Corresponde aos guerreiros e guardiões que protegem a cidade.
• Exemplo: Sentir raiva ao ver uma injustiça e agir para corrigi-la, em vez de ignorar.

Alma Concupiscente (Epithymia)

• Localizada no ventre, responsável pelos desejos e prazeres corporais.
• Ligada aos desejos e prazeres sensoriais, associada aos desejos básicos do corpo (fome, sede, prazer sexual e conforto material).
• Sem controle, pode levar à indulgência excessiva e descontrole.
• Corresponde à classe produtiva (agricultores, artesãos e comerciantes).
• Exemplo: Decidir entre comer um doce de forma equilibrada ou entregar-se ao excesso.

A Harmonia da Alma

• A vida justa e equilibrada acontece quando a razão governa a alma, controlando as paixões e os desejos.
• O controlo da alma concupiscente ou irascível pode levar à dominação pelos prazeres ou emoções descontroladas.
• Alguns estudiosos comparam essa divisão com a teoria de Freud (id, ego e superego).

Aristóteles (384-322 a.C.)

• Discípulo de Platão que desenvolveu uma visão naturalista da alma, diferente da perspectiva platónica.
• Acreditava que a alma não existia separada do corpo, sendo o seu princípio vital.
• A psicologia aristotélica está presente principalmente na obra "De Anima" (Do Alma).
• A alma é a forma do ser vivo, não uma substância separada do corpo o seu pricípio vital.

Teoria Hilemórfica (Matéria + Forma)

• Aristóteles desenvolveu o conceito de hilemorfismo (hylé = matéria e morphé = forma).
• Matéria é o substrato físico das coisas.
• Forma é o princípio organizador que dá identidade e função à matéria.
• Tudo no mundo, incluindo seres vivos, combina matéria e forma.
• A alma é a forma do corpo.

A Alma e o Corpo em Aristóteles

• "Assim como a lâmina afiada é a "alma" da faca, pois lhe dá função de corte, a alma é o princípio que dá vida ao corpo humano.”
• A alma não é separável do corpo, não pode existir sem ele.
• A alma desaparece quando o corpo morre.
• Ela não é um "fantasma" no corpo, mas aquilo que faz um ser vivo existir.

A Alma como Princípio Vital

• Aristóteles rejeita a teoria platônica da alma como substância separada.
• A alma é o ato do corpo organizado, a sua forma substancial.
• Inseparável do corpo, define sua função e estrutura.

Classificação da Alma em Três Níveis

• No "De Anima", Aristóteles classifica a alma em três tipos, de acordo com as funções vitais: vegetativa, sensitiva e intelectiva.
• A alma vegetativa está presente nas plantas e é responsável pela nutrição, crescimento e reprodução.
• A alma sensitiva está presente nos animais, permite sensações e movimentos, além das funções da alma vegetativa.
• A alma intelectiva é exclusiva dos seres humanos, permite o pensamento racional e a busca pelo conhecimento, além das outras funções.
• A alma não era separável do corpo, como em Platão, sendo o princípio vital que organizava a matéria do ser vivo.

Alma Vegetativa (Nutritiva)

• Presente em plantas, animais e humanos
• Responsável pelas funções básicas da vida: nutrição, crescimento e reprodução
• Nível mais simples da alma, sem percepção nem pensamento
• Exemplo: O funcionamento de uma árvore

Alma Sensitiva (Animal)

• Presente em animais e humanos.
• Permite a percepção do mundo por meio dos sentidos.
• Inclui emoções e desejos básicos, como dor, prazer e movimento.
• Exemplo: Um cachorro que vê comida e corre para pegá-la.

Alma Intelectiva (Racional)

• Presente apenas nos seres humanos.
• Capacidade exclusiva de pensar, raciocinar e tomar decisões morais.
• Permite o conhecimento abstrato, a lógica e a reflexão sobre o mundo.
• Exemplo: Um cientista que desenvolve uma teoria.

A Psicologia Aristotélica e a Metafísica

• A alma é um ente metafísico, um princípio do ser, ligada ao conceito de potência e ato.
• Causalidade Aristotélica:
  • Causa material: o corpo.
  • Causa formal: a alma.
  • Causa eficiente: o princípio da vida.
  • Causa final: a realização do ser vivo.

A Alma como Ato do Corpo

• Exemplo: Uma semente de carvalho tem a potência de se tornar uma árvore.
• Ato do corpo: a alma é o “ato” do corpo, ou seja, aquilo que faz um ser vivo ser o que é.

Causalidade Aristotélica e o Coração

• O funcionamento do coração:
  • Causa material: tecido muscular.
  • Causa formal: forma e estrutura para bombear sangue.
  • Causa eficiente: estímulo elétrico que faz o coração bater.
  • Causa final: manter o organismo vivo.
• O mesmo ocorre com a alma: sua forma e função definem um ser vivo.

Hilemorfismo e a Estátua de Mármore

• Exemplo: Uma estátua de mármore
  • O mármore é a matéria.
  • A forma esculpida é o que dá identidade à estátua.
  • Sem a forma, seria apenas um bloco de mármore.
• O corpo sem alma não tem identidade como ser vivo.

Aristóteles e a Imortalidade

• Aristóteles sugere que essa parte do intelecto pode ser separada do corpo, o que aponta para uma possível imortalidade da alma racional.
• Exemplo: O conhecimento matemático.

Psicologia e Metafísica em Aristóteles

• Estão interligadas pelo estudo da alma (psykhé) como princípio da vida e da mente.
• A psicologia é parte da investigação sobre o que é um ser vivo, como ele pensa, sente e age.

Psicologia como Estudo da Alma (Psykhé)

• A palavra "psicologia" vem do grego psyché (alma) + logos (estudo).
• Aristóteles, no tratado "De Anima" (Da Alma), estuda a alma como princípio vital e sede das capacidades mentais.
• Ele se pergunta: O que faz um ser vivo ser vivo? Como o pensamento e a percepção funcionam?

Psicologia e Hilemorfismo

• Não existe mente sem corpo na psicologia aristotélica.
• A psicologia cognitiva e as neurociências investigam como o cérebro gera pensamentos e emoções.
• Exemplo: Um paciente com lesão cerebral pode perder habilidades cognitivas

Psicologia Aristotélica e a Moderna

• A divisão da alma em vegetativa, sensitiva e racional reflete diferentes funções mentais e comportamentais.
• Neuropsicologia (percepção e movimento → alma sensitiva).
• Psicologia do desenvolvimento (crescimento e amadurecimento → alma vegetativa).
• Psicologia cognitiva (raciocínio e linguagem → alma racional).

Causalidade Aristotélica e a Psicologia

• Biológicas (cérebro, neurotransmissores).
• Ambientais (aprendizado e cultura).
• Intencionais (emoções e decisões).
• Aristóteles já pensava nisso! Sua teoria das quatro causas ajuda a entender os processos psicológicos de forma integrada.

Impacto da Psicologia Aristotélica

• Influenciou a psicologia moderna, especialmente em cognição, percepção e comportamento.
• Aristóteles lançou as bases para muitos dos debates atuais.

Platão X Aristóteles

• Alma e corpo: Platão - a alma é imortal e separada do corpo / Aristóteles - a alma é inseparável do corpo e morre com ele
• Natureza da alma: Platão - a alma pertence ao mundo das Ideias / Aristóteles - a alma é o princípio vital que dá função ao corpo.
• Divisão da alma: Platão - racional, irascível e concupiscente / Aristóteles - vegetativa, sensitiva e intelectiva.