A Teoria da Justiça de John Rawls

A Teoria da Justiça de John Rawls

• Regimes absolutistas foram substituídos por regimes democráticos liberais, que reconheceram formalmente a igualdade de direitos a todos os cidadãos
• As sociedades liberais corrigiram várias injustiças sociais do absolutismo, mas também tornaram outras mais visíveis, criando um fosso chocante entre ricos e pobres no século XIX, levando a revoltas constantes
• Muitos denunciaram a incapacidade da igualdade jurídica dos cidadãos de proteger os pobres dos desvios do capitalismo
• Neste contexto, surgiram movimentos políticos como o anarquismo, o comunismo e a social-democracia, defendendo uma sociedade mais justa com desigualdades sociais suprimidas ou corrigidas
• Assimetrias profundas na sociedade parecem estar associadas ao modelo político-financeiro vigente
• É necessário questionar se a existência destas desigualdades sociais permite afirmar que vivemos em sociedades justas e, caso não, como estruturar a sociedade para a justiça social
• As razões para princípios de organização de uma sociedade justa relevam da existência de desigualdades sociais e económicas decorrentes da organização social
• Os indivíduos mais desfavorecidos dificilmente conseguirão ultrapassar as desigualdades existentes, impostas socialmente por critérios arbitrários, como género ou cor da pele

Enquadramento Político-Social de John Rawls

• O liberalismo democrático de Rawls foca-se no discurso racional, na discussão e aceitação de ideias divergentes e na legitimidade das ideias políticas decorrentes dessa argumentação racional
• A ideia é de que as melhores ideias se mantenham e orientem o futuro da sociedade
• Rawls analisa se este modelo político não é meramente um ideal ilusório da era do iluminismo que não poderá ser levado a cabo com sucesso durante um longo período
• A perceção das duas Grandes Guerras Mundiais indica que talvez não sejamos capazes de seguir um modelo político deste tipo sem cair em regimes totalitários
• Nesses regimes, as ideias são implementadas não pela argumentação racional, mas por imposição da vontade de alguns pela força
• Rawls questiona se haverá sempre um ponto de desacordo onde os seres humanos estão dispostos a subverter a conversação racional
• Rawls questiona se seres humanos podem realmente viver e florescer em sociedades liberais e democráticas
• A teoria de Rawls procurará defender a democracia liberal, justificando os fracassos constantes das democracias liberais com o pressuposto de que existe um desvio de prioridades
• É preciso, para Rawls, estabelecer o que se entende por justiça para perceber o falhanço das democracias liberais
• A justiça é a primeira virtude das instituições sociais, tal como a verdade o é para os sistemas de pensamento
• Da mesma forma que se julga a legitimidade de um sistema de ideias com base na veracidade, deveríamos julgar a legitimidade das nossas instituições sociais com base na sua justiça

Justiça

• A justiça pode ser entendida em dois sentidos distintos
• Justiça Retributiva: É uma punição legal que exige que o infrator receba uma punição proporcional ou semelhante ao seu crime
• Justiça Distributiva: É aquela que concerne a repartição dos bens primários, como liberdades, oportunidades, rendimentos e riqueza

Teoria da Justiça de Rawls

• A teoria de Rawls enquadra-se no pensamento contratualista, onde os modelos políticos vigentes, os direitos e obrigações numa sociedade decorrem de acordos previamente estabelecidos pelas partes
• A teoria de Rawls divide-se em três partes: a situação pré-contratual, o contrato hipotético entre as partes e os resultados desse contrato

Posição Original

• A Posição Original é a situação imaginada por John Rawls, onde os indivíduos estabelecem um contrato social sob certas condições, idêntica ao estado natureza de Locke
• Nesta, deve-se construir de raiz uma sociedade, escolhendo as regras e princípios fundamentais que a irão organizar
• Em posição original, os indivíduos encontram-se sob véu de ignorância, uma barreira contra o uso de interesses parciais e considerações pessoais na determinação dos princípios da justiça
• O véu impede-nos de conhecer as suas características pessoais, interesses e objetivos particulares, estatuto social nem o dos outros
• Os indivíduos na "situação original" devem imaginar-se na pior de todas as situações sociais, isto é, como pobres e marginalizados
• Conhecido como Critério Maximin, é sempre preferível escolher a opção mais segura, melhorando a situação dos indivíduos em posições de desvantagem

Consenso Original

• O Consenso Original representa a aceitação e validação dos princípios orientadores do Estado, enquanto garante da aplicação desses mesmos princípios
• A adesão ao consenso original deve ser voluntária

Estabelecimento dos Princípios Norteadores de uma Sociedade Justa

• A fundamentação dos princípios escolhidos não é simplesmente Rawls pensar que isso é o mais justo
• Rawls considera que qualquer ser racional em posição original iria ser conduzido a estes princípios na medida em que, mesmo na pior das hipóteses, ficariam numa situação mais favorável

Princípio da Liberdade (Igual)

• A sociedade deve proporcionar a máxima liberdade possível para cada pessoa, compatível com uma igual liberdade para todas as outras
• Este princípio estabelece que a sociedade deve garantir a máxima liberdade para cada pessoa compatível com uma liberdade igual para todos os outros
• Assegura as liberdades básicas: liberdade política, de religião, de reunião, de pensamento e de opinião, liberdade de expressão, liberdade de voto, etc.; a liberdade da pessoa (direito à integridade pessoal; à propriedade; proteção face a detenção e prisão arbitrárias)
• Não pode ser violado a favor da utilidade social e, em caso de conflito de interesses, este princípio tem prioridade
• Segundo o princípio da maximização do mínimo, convém elevar ao máximo compatível com a liberdade dos restantes elementos e com o direito de estes procurarem uma vida boa

Segundo Princípio

• O segundo princípio estabelece os limites das desigualdades justas ou toleráveis

Princípio da Igualdade (Equitativa) de Oportunidades

• As desigualdades sociais e económicas devem ser distribuídas de forma que estejam ligadas a funções e a posições abertas a todos em condições de igualdade equitativa de oportunidades
• Algumas diferenças na distribuição dos rendimentos são justificadas, caso haja igualdade na oportunidade de acesso
• Isto significa que há empregos e funções que devem ser mais pagos do que outros, mas o Estado deve garantir que qualquer pessoa tem acesso a essas posições, independentemente da sua posição socioeconómica à partida
• Este princípio deve combater a injustiça provocada pela lotaria social – ou seja, deve promover as mesmas oportunidades para todos, independentemente se nasceram numa família rica ou pobre, instruída ou não instruída, etc

Princípio da Diferença

• As desigualdades sociais e económicas devem ser distribuídas de forma que proporcionem a maior expectativa de benefício aos menos favorecidos
• Não é justa a sociedade que permite que os que têm mais talentos naturais e condições para os desenvolver tenham mais vantagens a não ser que essas vantagens contribuam para o benefício de todos
• A sociedade deve promover a distribuição igual da riqueza, exceto se a existência de desigualdades económicas e sociais beneficiar os mais desfavorecidos
• Devemos dar atenção especial aos que nasceram em posições sociais menos favorecidas, corrigindo a influência destas contingências

Justiça Como Equidade

• A conceção do que é justo, para Rawls, não passa por uma distribuição igualitária dos bens sociais primários
• Para Rawls, a justiça consiste na equidade, os seres humanos devem ter os mesmos direitos e liberdades porque têm igual valor moral
• A realização da distribuição dos bens deve ser realizada em função das desigualdades naturais existentes
• Uma sociedade justa será aquela que melhor garante a equidade

A Rejeição do Utilitarismo

• A perspetiva utilitarista defende um fundamento da moralidade baseado nas consequências das nossas ações, colocando a tónica sobre fatores contigentes, medindo a moralidade pela felicidade agregada alcançada
• Rawls rejeitaria a hipótese de seres oprimidos, mesmo que isso pudesse maximizar os direitos e benefícios

A Crítica Comunitarista de Michael Sandel

• A crítica de Sandel prende-se com o individualismo metodológico, embora Sandel não se oponha à validade do princípio da igualdade equitativa de oportunidades
• Estes não resolvem o maior problema de justiça distributiva enfrentado nas sociedades contemporâneas
• Sandel defende que estes princípios não resolvem o fosso existente entre as diferentes classes sociais resultante das desigualdades económicas, isto é, o agravamento da bipolaridade social
• Há casos muito mais raros de pessoas bem sucedidas devido a uma lotaria social, do que aquelas que são bem sucedidas por terem nascido numa familia com uma boa posição social

A Crítica Libertarista de Robert Nozick

• A teoria da justiça recebe uma crítica ao princípio da diferença com exigências de redistribuição a favor das pessoas menos favorecidas
• Há o dever de garantir e proteger o direito à propriedade privada, mas o estado nunca poderia redistribuir essa riqueza
• Criar limitações à propriedade cria restrições direitos básicos, gerando uma incompatibilidade entre o princípio da diferença e o princípio da liberdade igual
• Nozick defende o estado mínimo, um estado guarda noturno, que protege a segurança e impede o uso indiscriminado de força
• O estado não se deve intrometer na redistribuição de rendimento e riqueza

A Rejeição Das Teorias Padronizadas

• Existe uma incompatibilidade entre o princípio da liberdade igual e o princípio da diferença, pelo que qualquer tentativa de padronização da justiça será uma invasão da propriedade privada

Teoria Padronizada

• Teorias que afirmam que a distribuição de riqueza deve ser feita de acordo com um padrão

Teoria Não Padronizada

• A justiça da distribuição prende-se essencialmente com aspetos processuais pelos quais as pessoas adquirem os bens que possuem

O Argumento da Titularidade (Ou do Justo Título)

• As desigualdades não são um mal em si mesmas, o que importa é conhecer o processo que deu origem à titularidade, isto é, a história que deu origem aos bens que cada um possuí
• É justo se a aquisição dos bens se deu por legitimidade ou alguém passa a ser proprietário de algo através de uma transferência legitima