Unidade 02 Parte 02 PDF
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Ana Leticia Losano
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Este documento discute a importância de ensinar ciências naturais na educação infantil. Argumenta que é crucial despertar a curiosidade científica em crianças pequenas, promovendo a compreensão do mundo natural e o pensamento crítico sobre as ações humanas. O papel do professor como mediador é destacado.
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NÃO PODE FALTAR AS CIÊNCIAS NATURAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL 0 Ana Leticia Losano seõçatona reV INICIAÇÃO CI...
NÃO PODE FALTAR AS CIÊNCIAS NATURAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL 0 Ana Leticia Losano seõçatona reV INICIAÇÃO CIENTÍFICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL Promover a iniciação científica das crianças desde a educação infantil é imprescindível para cultivar sua curiosidade, para que possam compreender o mundo natural ao seu redor e para que possam refletir e se posicionar perante as ações do homem sobre o meio ambiente. Fonte: Shutterstock. Deseja ouvir este material? Áudio disponível no material digital. PRATICAR PARA APRENDER Há lugar na educação infantil para o ensino de Ciências Naturais? Será importante que as crianças aprendam ciências mesmo sendo tão pequenas? Será que elas produzem algumas explicações sobre os fenômenos naturais à sua volta? Ensinar ciências na educação infantil supõe esperar que alunos de quatro ou cinco anos aprendam teorias e conceitos científicos que levaram muito tempo para serem desenvolvidos por adultos? Será que eles podem aprender a participar de certas práticas de natureza científica? O ensino de ciências pode cultivar a curiosidade natural das crianças? O ensino de ciências é uma questão complexa para muitos professores, que pode se tornar ainda mais desafiadora quando consideramos o seu ensino na educação infantil. Nesta seção você compreenderá os principais argumentos a favor do ensino de ciências na educação infantil, o que lhe permitirá, não só começar a imaginar práticas docentes orientadas a esse objetivo como também explicar e defender suas ideias perante outros colegas. Promover a iniciação científica das crianças já desde a educação infantil é imprescindível para cultivar sua curiosidade, para que possam compreender o mundo natural ao seu redor e para que possam refletir e se posicionar perante as ações do homem sobre o meio ambiente. Nesta seção você também aprenderá sobre o papel do professor no ensino e na aprendizagem da natureza e sociedade na educação infantil. Essas discussões permitirão compreender a importância da mediação que o professor realiza entre os conhecimentos científicos e a criança. A noção de intencionalidade educativa, 0 que discutiremos, é particularmente importante nessa direção, já que ela será o seõçatona reV guia da sua prática profissional para selecionar, planejar, mediar e orientar atividades nas quais seus alunos possam desenvolver novas formas de falar, de fazer e de pensar sobre os fenômenos naturais e sociais. Essa visão sobre seu papel como professor que ensina ciências na educação infantil lhe permitirá descobrir que, ao entrar em contato com o mundo social e natural, a criança desenvolve hipóteses e teorias sobre os fenômenos que observa e experimenta. Assim, será parte da sua tarefa como professor criar oportunidades para que os alunos possam explicitar e articular tais conhecimentos, propiciando a reflexão sobre eles e fazendo-os avançar. Finalmente, você poderá compreender a potência de propiciar um ensino de ciências naturais centrado nos aspectos procedimentais do fazer científico, dando oportunidades para que as crianças participem de algumas práticas científicas fundamentais, tais como observar, experimentar, formular perguntas e descrever. Ana é professora de educação infantil há vinte anos. Ela mora numa cidade do interior do estado de São Paulo, tendo sido nessa cidade que nasceu e fez os seus estudos. Ela trabalha na maior escola pública da cidade, localizada num bairro da periferia, cuja população aumentou nos últimos anos, principalmente devido à migração de famílias vindas de diversas regiões do País para trabalhar na colheita de frutas. A escola atende a mais de mil alunos que são, na sua grande maioria, moradores do bairro. Ana está encarregada de uma das salas da pré-escola. Ana costuma debater com suas colegas, durante o horário de trabalho pedagógico coletivo (HTPC), se é importante que os alunos da educação infantil aprendam sobre esses temas. Há espaço para o ensino das Ciências Naturais na educação infantil? Será que os alunos constroem explicações sobre a natureza? Será que eles podem compreender alguma coisa das mudanças ambientais e climáticas? Ana tem ouvido seus alunos falarem sobre a seca e as inundações e sabe que eles têm ideias bastante criativas para tentar explicar esses fenômenos. Se vocês estivessem no lugar de Ana, o que poderiam fazer? “Na vida não existe nada a temer, mas a entender.” Motivados pelas palavras de Marie Curie, convido você a começar os estudos desta seção. CONCEITO-CHAVE A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DAS CIÊNCIAS NATURAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL 0 Na seção anterior, estudamos as complexas relações entre ciência, natureza e seõçatona reV sociedade e enfatizamos como todos nós vivemos nossas vidas rodeados de artefatos tecnológicos advindos dos resultados dos avanços científicos desenvolvidos, principalmente no século XX, que produziram mudanças, também, nos nossos valores. Nesse cenário, a educação em Ciências se torna imprescindível para que as novas gerações possam compreender, discutir, refletir e se posicionar sobre questões emergentes desses avanços e sobre suas prováveis consequências para a vida de todos os habitantes no planeta. Assim, a presença do ensino das Ciências Naturais na educação infantil se torna indispensável (ROSA; ROSSETO; TERRAZAZAN, 2003). Além de possibilitar a compreensão e a interpretação do mundo tecnológico que o rodeia, o ensino das Ciências Naturais na educação infantil se revela em toda sua potência quando consideramos uma visão da ciência – e a da sua produção – como um processo histórico associado a uma diversidade de práticas culturais. Colinvaux (2004, p. 110) define, de maneira precisa e sintética, as ciências naturais da seguinte forma: “ As ciências naturais visam descrever e explicar o mundo natural. Para tanto, formulam leis, elaboram conceitos e teorias e desenvolvem explicações a respeito dos fenômenos à nossa volta, buscando alcançar ‘verdades’, isto é, conhecimentos (provisoriamente) confiáveis e comprovados. Dessa categorização se desprendem duas conclusões importantes para pensar a importância do ensino das Ciências Naturais na educação infantil. Em primeiro lugar é preciso pontuar que, em cada momento histórico, a atividade científica se inscreve dentro de paradigmas definidores de quais são os supostos básicos sobre a realidade natural aceitos, de quais são os problemas e as perguntas relevantes a serem exploradas e de quais são os métodos e as explicações consideradas aceitáveis. Em segundo lugar, o objetivo fundamental da ciência é a elaboração teórica, ou seja, a produção de representações ou modelos do mundo e de seus fenômenos. Para atingir esse objetivo, os cientistas fazem uso de múltiplas estratégias e instrumentos, que vão desde a experimentação até a mobilização de complexas ferramentas matemáticas. Podemos dizer, então, que, em cada momento histórico, a ciência é mais do que seus produtos finais: as teorias. As ciências naturais também envolvem múltiplos procedimentos e práticas, pois são eles os que permitem que os cientistas, trilhando diversos caminhos segundo a disciplina, consigam interpretar o mundo natural (COLINVAUX, 2004). O ensino de ciências na educação básica tem privilegiado fortemente uma visão das ciências naturais com foco nos seus produtos finais: ensinam-se as leis que regem o movimento dos corpos, as teorias que explicam a evolução das espécies, os modelos que esclarecem os ciclos dos elementos no planeta. Esse enfoque desconsidera a reflexão sobre as perguntas que originaram tais leis, sobre os dados e as análises que foram necessárias para formular essas teorias e sobre porque tais modelos podem ser considerados razoáveis. Assim, esse enfoque não permite que os alunos compreendam e se familiarizem com os procedimentos e as práticas científicas. Essa distinção é particularmente importante quando 0 consideramos a importância do ensino das ciências na educação infantil: a ideia seõçatona reV não é escolarizar a educação infantil, introduzindo as crianças aos produtos finais da ciência desde o seu ingresso no sistema educativo. A importância do ensino de ciências na educação infantil se relaciona com oportunizar uma iniciação às ciências que prioriza “processos ao invés de produtos, com base em uma ideia de ciência como um conjunto de práticas intelectuais e materiais” (COLINVAUX, 2004, p. 115). Dessa maneira, o ensino das ciências na educação infantil se torna relevante, porque permite apresentar aos alunos processos e procedimentos cognitivos diversos – tais como observar, experimentar, descrever, explicar, etc. – que, ao longo do tempo, irão se desenvolvendo, tornando-se gradativamente mais complexos e sofisticados. Essa perspectiva sobre o ensino de ciências na educação infantil está de acordo com o enfoque por competências assumido na BNCC. As competências indicam o que os alunos devem “saber” – em termos de conhecimentos científicos e habilidades científicas consideradas enquanto produtos –, mas principalmente o que os alunos devem “saber fazer”, o que requer “a mobilização desses conhecimentos, habilidades, atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho” (BRASIL, 2017, p. 13). Essa perspectiva, baseada na iniciação da criança ao questionamento, à argumentação, à observação e ao espírito investigativo, está em ressonância com a curiosidade natural da criança, que se corporifica nos constantes “por quês” e “como”, que os formula para tentar compreender o mundo natural que a rodeia. O ensino das ciências pode, assim, estimular e convidar as crianças a se formularem perguntas, a produzir argumentos, a observar sistematicamente, a buscar causas para os fenômenos naturais, contribuindo, de maneira fundamental, com a formação de cidadãos que conhecem o mundo que habitam e que podem colaborar e agir de forma solidária em relação ao bem-estar do meio ambiente e da sociedade da qual fazem parte (ROSA; ROSSETO; TERRAZAZAN, 2003). Existe, ainda, mais um argumento que justifica a importância do ensino das ciências naturais na educação infantil: ao aprender ciências, a criança tem a oportunidade de se aproximar da natureza e de sentir o seu pertencimento ao mundo natural, desenvolvendo atitudes fundamentais para a sustentabilidade do planeta. Em palavras de Tiriba (2018, p. 4) “o que será de um planeta cuja infância e juventude crescem distantes da natureza, sem a possibilidade de desenvolver sentimentos de amor e compreensão clara, existencial, do que são os processos de nascimento, crescimento e morte dos frutos da terra?”. O PAPEL DO PROFESSOR NO ENSINO E APRENDIZAGEM DE NATUREZA E SOCIEDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL A implementação de um ensino de ciências naturais na educação infantil que, em 0 lugar de ter um caráter disciplinar e fragmentado, defenda a iniciação científica das seõçatona reV crianças através do seu compromisso com os procedimentos científicos, requer que o professor assuma o papel de mediador das práticas próprias da ciência e das crianças. Tal mediação envolve, em primeiro lugar, a realização de práticas pedagógicas de ciências de maneira integrada com as demais áreas do conhecimento escolar (ROSA; ROSSETO; TERRAZAZAN, 2003). Em lugar de destinar tempos diferenciados para o trabalho com ciências, defende-se que a observação e a reflexão sobre um fenômeno natural – como a chuva ou o crescimento das plantas e frutos – se integre com o desenvolvimento de explicações orais ou escritas – em formato de desenho, por exemplo. Por sua vez, o papel do professor envolve interagir com a criança, orientando-a na procura de respostas para os fenômenos do seu entorno que lhe provocam surpresa ou assombro. Isso propicia o descobrimento e a experimentação de maneira que o aluno compreenda melhor sua realidade (TRUJILLO, 2007). Nesse ponto, é preciso que o professor se sensibilize sobre a importância das experiências vividas em territórios naturais, onde a criança interatua diretamente com a natureza e seus os fenômenos. REFLITA Barros (2018, p. 44), ao falar da importância das experiências vividas pelo aluno em contextos naturais, sublinha que os educadores devem tomar contato com “sua memória de infância e com as relações que construíram com a natureza nesse período”. Neste espaço propõe-se que você realize essa reflexão: quais são as lembranças a respeito da sua infância e da natureza que considera mais significativas? Por quê? Quais fenômenos naturais elas lhe permitiram descobrir, observar ou explicar? Você considera que seus futuros alunos da educação infantil terão a oportunidade de vivenciar experiências similares? Quais delas poderiam ser incluídas nas práticas pedagógicas na escola? Um ponto importante a destacar, quando consideramos a criança como ser capaz de observar, questionar, levantar hipóteses e tirar conclusões sobre os fenômenos naturais e sociais, é que a produção e a apropriação de conhecimentos não deve ser confinada a um processo de desenvolvimento espontâneo ou natural (BRASIL, 0 2017). Ou seja, embora colocar o aluno em contato com os fenômenos naturais e seõçatona reV sociais seja um importante primeiro passo para a sua iniciação científica, não podemos esperar que ele construa conhecimentos sobre tais fenômenos ou se aproprie dos conhecimentos sistematizados pela humanidade de maneira simplesmente espontânea. É necessário, então, que exista uma intencionalidade educativa por traz das práticas pedagógicas na educação infantil. A BNCC caracteriza tal intencionalidade como envolvendo a “organização e proposição, pelo educador, de experiências que permitam às crianças conhecer a si e ao outro e de conhecer e compreender as relações com a natureza, com a cultura e com a produção científica” (BRASIL, 2017, p. 39). Portanto, parte do papel do professor é refletir, selecionar, organizar, planejar, mediar e monitorar práticas pedagógicas que favoreçam, por meio da ação e nas interações com o mundo físico e social, o fato de o aluno poder desenvolver práticas de cuidado consigo e com o meio ambiente, assim como aproximar-se da sua cultura e da cultura dos outros ao seu redor. Considerando a noção de intencionalidade educativa, uma ideia importante que pode servir de guia para o professor é a compreensão de que uma iniciação científica tem por objetivo desenvolver modos de observar a realidade e modos de se relacionar com ela, o que supõe desenvolver na criança modos de pensar, de falar e de fazer. O modo de falar diz respeito ao plano da linguagem, ou seja, aos modos de representação da realidade, que podem incluir palavras, desenhos, tabelas, gráficos, etc. O modo de fazer tem relação com o plano da experiência, da interação direta com e na realidade. Já o modo de pensar refere-se ao plano do conhecimento e se alimenta tanto da linguagem como da experiência. Se levarmos em consideração que toda criança, desde seu nascimento, é alimentada pelo seu contexto familiar, pela vivência, pelas experiências e desenvolve modos de representá-las e de conhecê-las, reconhecemos que é papel do professor oportunizar uma pluralidade de situações que promovam novos modos de observar a realidade e de se relacionar com ela (COLINVAUX, 2004). Atividades particularmente fecundas nessa direção são aquelas de experimentação que, aproveitando a curiosidade natural das crianças, favorecem o desenvolvimento de práticas vinculadas ao fazer, ao pensar e ao conhecimento científico: observação, formulação de perguntas, formulação de predições e depois de submissão à prova, interpretação e comunicação de resultados e evidências, etc. (TRUJILLO, 2007). EXEMPLIFICANDO Algumas atividades de experimentação simples de serem desenvolvidas com as crianças são aquelas que permitem observar transformações nas 0 propriedades físicas de certas substâncias quando se misturam (por exemplo, misturar água quente com cubinhos de gelo), experiências com seõçatona reV bexigas que evidenciem a existência do ar, a observação sistemática dos seres vivos que habitam o jardim da escola, a observação de câmbios energéticos em reações químicas (mistura de água, vinagre e bicarbonato), experiências com ímãs e limalhas de ferro dissolvidas em óleo. Com a orientação e guia do professor, essas atividades podem ajudar os alunos a aprenderem os modos de fazer, de pensar e de falar científicos, assim como a compreenderem melhor o mundo ao seu redor. Em cada uma delas o educador pode se aliar “às crianças para, juntos, começar a descobrir o fascinante mundo das ciências (COLINVAUX, 2004, p. 120). AS HIPÓTESES E TEORIAS QUE AS CRIANÇAS DESENVOLVEM SOBRE NATUREZA E SOCIEDADE Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil a criança é um: “ Sujeito histórico e de direitos, que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura. (BRASIL, 2010, p. 12) Partindo dessa concepção, entende-se que, ao entrar em contato com o mundo social e natural, a criança vai desenvolvendo hipóteses ou teorias sobre os fenômenos que observa e experimenta. A criança não é simplesmente reprodutora, mas é também construtora de conhecimentos sobre a natureza e a sociedade. A partir dessa perspectiva, a educação infantil tem muito a oferecer na iniciação científica dos alunos. Essas ideias ganham mais força quando consideramos o ensino de natureza e sociedade na educação infantil com base na perspectiva construtivista. Essa postura parte de três pressupostos: 1. O aluno é construtor de seu conhecimento. 2. Todo novo conhecimento é construído a partir do já conhecido. 3. O conhecimento a ensinar deve partir do conhecimento que o aluno traz para a sala de aula (CARVALHO, 1992). Assumir essa perspectiva na educação infantil supõe propiciar situações nas quais os alunos consigam expressar e articular os conhecimentos que desenvolveram sobre os fenômenos sociais e naturais e supõe proporcionar reflexões sobre eles mesmos para detectarem suas limitações e irem tornando-se gradativamente mais complexos. Tomar como ponto de partida as compreensões que os alunos produziram sobre os fenômenos naturais e sociais nos leva, mais uma vez, a considerar a diferença entre o conhecimento científico e o conhecimento espontâneo ou de senso comum. Não podemos esquecer que os conhecimentos científicos e os 0 conhecimentos prévios, por meio dos quais os alunos se aproximam do universo seõçatona reV científico, às vezes estão em oposição e que muitas explicações científicas são fundamentalmente contraintuitivas. Por sua vez, os conhecimentos elaborados pelos alunos são geralmente de caráter pontual ou fragmentado, pautados em dados perceptivos mais do que em noções teóricas (CARVALHO, 1992). Ademais, muitos dos conhecimentos espontâneos dos alunos possuem grandes semelhanças com ideias ou noções científicas que, em algum momento da história, também foram aceitas pelos cientistas sendo, posteriormente, refutadas, abandonadas ou refinadas. Essa reflexão sobre os conhecimentos desenvolvidos pelos alunos não supõe descartá-los ou ignorá-los pelo seu caráter fragmentário ou incompleto, pelo contrário: a perspectiva construtivista supõe tomar por base tais conhecimentos para fazê-los avançar em direção a perspectivas aceitas pela ciência contemporânea. Pensemos, por exemplo, numa atividade de experimentação sobre flutuação. Os alunos podem, primeiro, analisar se diversos objetos flutuam ou não; depois podem começar a agrupá-los e buscar motivos para explicar por que alguns deles flutuam enquanto outros afundam. Assim, é possível que digam que flutuam os objetos cheios de ar – tais como bolas ou garrafas vazias – e que não flutuam aqueles que ficam pesados para a água (FERREIRA, 2005). Outro aluno pode imaginar que um objeto flutua ou não de acordo com a quantidade de água do vasilhame (CARVALHO, 1992). Essas ideias são parciais ou não totalmente coincidentes com aquelas aceitas pela ciência. Em lugar de descartá-las, o professor deve favorecer a sua explicitação, saber ouvi-las e dar a oportunidade para que os alunos as testem, propondo, por exemplo, colocar mais água no vasilhame para ver se a ideia do aluno se sustenta ou não. Isto nos leva a analisar quão importante é que o aluno da educação infantil possa produzir hipóteses sobre o mundo natural, pois são elas que lhe permitam explicar o seu entorno. Esse será o tópico da seguinte seção. A IMPORTÂNCIA DA REFLEXÃO E A BUSCA DE EXPLICAÇÕES DA CRIANÇA SOBRE NATUREZA E CIÊNCIAS PARA EXPLICAR O SEU ENTORNO Quando o aluno da educação infantil é confrontado com um fenômeno natural e com a busca de explicações para este, temos a oportunidade de atingir diversas metas. Em primeiro lugar, fomentamos o desenvolvimento de competências científicas, de habilidades de comunicação e de valores cidadãos. Em segundo lugar, contribuímos com a criação de uma visão da ciência como uma ferramenta que permite dar respostas aos fenômenos naturais. Os alunos podem começar a perceber, assim, as interconexões entre as leis e princípios que governam o mundo das ciências. Por último, e não por isso menos importante, possibilitamos que as crianças compreendam o mundo natural ao seu redor. Nessa direção, é importante destacar a riqueza das práticas científicas da produção de explicações. Ao orientar e estimular que nossos alunos reflitam sobre fenômenos e os expliquem, eles deverão: Observar, formular perguntas e estabelecer relações. Conversar sobre o que observaram. Comparar as observações realizadas. Reunir, classificar e agrupar. Medir e contar. Formular hipóteses, testá-las e modificar suas compressões quando 0 necessário. seõçatona reV Experimentar com diversos materiais (TRUJILLO, 2007). Podemos ver, então, como não se trata da “observação pela observação”, mas de observar e de experimentar para que os alunos consigam explicar o seu entorno. A produção de reflexões e de explicações sobre fenômenos naturais contribui, ainda, para a manutenção da curiosidade e da capacidade investigativa natural da criança. É importante que, ao produzir explicações, os alunos não só descrevam aquilo que fizeram ou observaram, mas que descrevam as sensações e sentimentos que experimentaram. Desde muito pequenas as crianças demonstram curiosidade pelo seu próprio corpo, pelos fenômenos atmosféricos, pelos animais e plantas, pelas transformações da natureza, etc. Viver experiências de interação direta com o mundo natural, tais como brincar na areia, ouvir o canto dos pássaros, cultivar uma horta, visitar criações, explorar descampados, percorrer o bairro, são ricas oportunidades para convidar os alunos a refletir e a explicar o seu entorno: o que acontece com a areia quando se molha? Toda a areia é igual? O que diferencia a areia da terra? Como podem cantar os pássaros? Por que eles cantam? Quando o fazem? Como crescem as plantas? O que é necessário para elas crescerem? Por que existem animais de diferentes tamanhos? Em que lugar moram os animais? O que eles gostam de fazer? Quais bichos podem ser encontrados no descampado? Quais plantas? Que tipos de prédios existem no bairro? Quais são os lugares aos quais todos podemos ir? Qual a distância entre minha casa e a escola? FOCO NA BNCC A BNCC coloca, em um lugar de destaque, a reflexão e a busca de explicações da criança sobre fenômenos naturais que lhe permitam 0 conhecer, compreender e interpretar o seu entorno. Isto fica evidente ao observar as dez competências gerais da educação básica. Pelo menos três seõçatona reV delas se vinculam diretamente a este assunto: “ Competência 1: Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade. Competência 2: Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas. Competência 4: Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das linguagens artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo. (BRASIL, 2017) Podemos ver, assim, como é importante que, já desde a educação infantil, sejam oportunizadas situações para os alunos produzirem explicações que os ajudem a compreender o mundo natural e para refletirem sobre elas e as refinarem gradativamente. Vamos analisar algumas estratégias que escolas de educação infantil desenvolveram para oportunizar situações em que as crianças possam viver experiências de contato direto com fenômenos naturais. POR DENTRO DA BNCC Todas as práticas que descrevemos nesta seção estão contempladas na BNCC. Particularmente, elas podem ser encontradas nos objetivos de aprendizagem e desenvolvimento dentro do campo de experiências “espaços, tempos, quantidades, relações e transformações”. Vejamos alguns exemplos para crianças pequenas (de 4 anos a 5 anos e 11 meses): “ EI03ET02: Observar e descrever mudanças em diferentes materiais, resultantes de ações sobre eles, em experimentos envolvendo fenômenos naturais e artificiais. EI03ET04: Registrar observações, manipulações e medidas, usando múltiplas linguagens (desenho, registro por números ou escrita espontânea), em diferentes suportes. EI03ET05: Classificar objetos e figuras de acordo com suas semelhanças e diferenças. (BRASIL, 2017, p. 51) É fácil ver como os experimentos com as plantas do jardim da Márcia contribuem para desenvolver os objetivos EI03ET02 e EI03ET04. O trabalho com os peixes do lago do Ibirapuera permitiria trabalhar EI03ET04 e EI03ET05, enquanto que o trabalho na praça contribuiria para EI03ET04. PESQUISE MAIS Seguem algumas referências importantes para ajudá-lo a aprofundar seus conhecimentos sobre as temáticas discutidas nesta seção. A partir da 0 leitura desses textos, você poderá compreender melhor os argumentos que defendem o ensino das ciências naturais na educação infantil, o enfoque seõçatona reV mais apropriado para o ensino de ciências nesse nível, o papel do professor e a importância das hipóteses dos alunos e da construção de explicações para compreender o mundo natural ao redor da criança Desemparedamento da infância: a escola como lugar do encontro com a natureza (BARROS, 2018) – Recomenda-se a leitura das páginas 16 a 25. Ciências e crianças: delineando caminhos de uma iniciação às ciências para crianças pequenas (COLINVAUX, 2004). Educação infantil como direito e alegria (TIRIBA, 2017). Nesta seção estudamos os diversos argumentos que apoiam o ensino de Ciências Naturais na educação infantil a partir de uma perspectiva em que os alunos se familiarizam, principalmente, com as práticas científicas. Além disso, analisamos o papel do professor nos processos de ensino e aprendizagem e a importância das hipóteses e teorias que os alunos constroem sobre os fenômenos naturais. Finamente, exploramos a importância das explicações próprias das Ciências Naturais para que a criança possa compreender o seu entorno. A partir dos conhecimentos produzidos, na próxima seção, poderemos refletir sobre como podemos ensinar Ciências Naturais nas distintas idades. FAÇA A VALER A PENA Questão 1 Aparecida é uma professora da educação infantil. Durante uma reunião com seus colegas, outra professora que trabalha na escola comentou que, segundo sua opinião, era importante ensinar ciências já na educação infantil porque assim “as crianças ficam preparadas para as séries iniciais do ensino fundamental, visto que poderão adiantar a aprendizagem de conteúdos de ciências incluídos no currículo desse nível. Aparecida ficou bastante pensativa e conseguiu imaginar diversos argumentos para responder a sua colega. Selecione o argumento correto: b. Eu não concordo com a sua opinião. Do meu ponto de vista, a educação infantil não deveria se preocupar com o ensino de ciências naturais. Isso é um assunto do qual deverá se encarregar o ensino fundamental. Na educação infantil, o importante é que a criança tenha oportunidade de brincar. 0 Correto! seõçatona reV Aparecida deveria discordar de sua colega visto que o principal argumento para incluir o ensino de Ciências Naturais na educação infantil não deve ser o de escolarizar as práticas desse nível, mas o de oportunizar situações nas quais as crianças possam entrar em contato com o mundo natural e, através da participação em práticas científicas, começar a compreendê-lo melhor. Desse modo, os processos cognitivos da criança são, também, desenvolvidos. c. Eu concordo com a sua opinião e acrescentaria, ainda, que isso poderia ajudar a formar pequenos cientistas desde a mais terna idade. Tente novamente... Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente. c. Eu concordo com a sua opinião e acrescentaria, ainda, que isso poderia ajudar a formar pequenos cientistas desde a mais terna idade. Tente novamente... Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente. d. Eu concordo com a sua opinião. De fato, os alunos da educação infantil estão preparados para compreender conceitos e teorias científicas complexas. Tente novamente... Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente. e. Eu concordo com a sua opinião. De fato, as professoras da educação fundamental vão ficar muito agradecidas ao receber alunos que já conseguem compreender alguns conceitos científicos. Questão 2 Diego é um professor de educação infantil que propôs a seguinte atividade de ciências para seus alunos: ele levou as crianças para visitar o maior parque da cidade. A principal tarefa que o professor sugeriu a elas foi a de “observar”. De volta à escola, ele perguntou aos alunos o que tinham observado, obtendo respostas tais como: “tinha árvores”, “tinha um lago grande!”, “o céu estava azul”. Depois disso, Diego deu por encerrada a atividade e passou para outro assunto. A atividade proposta por Diego: a. Poderia ser melhorada se ela tivesse uma intencionalidade educativa mais clara, isto é, se estivessem definidos, por exemplo, alguns aspectos a observar no parque para os quais depois se buscariam explicações. Correto! A atividade proposta por Diego poderia ser melhorada se ele pudesse definir uma intencionalidade educativa clara. Na educação infantil não se pode esperar que a criança desenvolva suas aprendizagens de forma espontânea ou natural. No caso do ensino de Ciências Naturais, essa intencionalidade consiste 0 em organizar e propor situações nas quais os alunos possam conhecer-se e seõçatona reV conhecer os outros assim como compreender os fenômenos naturais a sua volta. b. Poderia ser melhorada se ele, antes da visita ao parque, tivesse destinado um tempo para explicar o ciclo da fotossíntese. Desse modo, os alunos poderiam observá-lo em funcionamento ao visitar o parque. Tente novamente... Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente. c. É adequada visto que permite que seus alunos vivenciem experiências de contato direto com a natureza, e esse é o principal objetivo do ensino das Ciências na educação infantil. Tente novamente... Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente. d. É adequada visto que Diego abriu um espaço para que seus alunos compartilhassem as suas observações. Tente novamente... Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente. e. É exemplar visto que a observação espontânea é uma prática cientifica fundamental. Com essa atividade, Diego está introduzindo os alunos nessa prática. Questão 3 Pedro tem cinco anos e mora numa região rural do interior do estado de São Paulo. Já faz várias gerações que sua família possui uma chácara onde desenvolvem atividades agropecuárias. Já faz alguns dias que Paula, sua professora da educação infantil, percebe que Pedro está preocupado e triste. Quando ela lhe pergunta o que está acontecendo, Pedro lhe responde que está preocupado com a seca. Seu pai tinha lhe contado que esta era a maior seca que ele já tinha visto na vida e que, se a chuva não chegasse logo, os animais e as plantações da chácara correriam um sério perigo. A partir desse depoimento, Paula decidiu desenvolver um pequeno projeto no qual, com seus alunos, pudessem analisar e compreender melhor as mudanças climáticas buscando explicações para fenômenos como a seca e as inundações. Através do projeto proposto: a. A professora está fazendo com que os alunos compreendam melhor o mundo ao seu redor a partir da construção de explicações científicas para fenómenos naturais. Correto! Através do projeto, a professora Paula está fazendo com que, tanto Pedro como seus demais colegas, compreendam melhor o mundo ao seu redor, incluindo, também, aqueles aspectos problemáticos presentes neles. É nesse ponto que as explicações para fenômenos naturais se tornam relevantes para 0 a educação infantil. seõçatona reV b. A professora está se desviando do objetivo da educação infantil, que é proporcionar oportunidades para o aluno brincar e se desenvolver naturalmente. Tente novamente... Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente. c. A professora está atingindo as metas do ensino de ciências na educação infantil, visto que o projeto permitirá introduzir conceitos incluídos no currículo do ensino fundamental. Tente novamente... Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente. d. A professora não está favorecendo a curiosidade natural das crianças já que as explicações científicas oferecem uma única resposta para um fenômeno natural Tente novamente... Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente. e. A professora está se desviando das metas próprias do ensino de ciências na educação infantil porque, nesse nível de ensino, as crianças ainda não constroem explicações para fenômenos naturais. REFERÊNCIAS BARROS, M. I. A. Desemparedamento da infância: a escola como lugar do encontro com a natureza. Rio de Janeiro: Alana, 2018. Disponível em: https://bit.ly/2TRcGf2. Acesso em: 8 out. 2020. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: https://bit.ly/3oWirWX. Acesso em: 8 out. 2020. BRASIL. Diretrizes curriculares nacionais para a educação infantil. Brasília: MEC, 2010. Disponível em: https://bit.ly/3er0VFI. Acesso em: 8 out. 2020. CARVALHO, A. M. P. 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