Mapa Político Pós-Primeira Guerra Mundial (PDF)

Summary

Este documento analisa as mudanças geopolíticas após a Primeira Guerra Mundial, destacando o desmembramento dos impérios e a criação de novos estados. Também aborda as dificuldades econômicas enfrentadas pela Europa e o surgimento do comunismo na Rússia.

Full Transcript

O novo mapa político após a 1.ª Guerra A 1.ª Guerra Mundial foi um momento de rutura e de mudança em diversos aspetos. Trouxe muitas alterações na geografia política, nas relações internacionais e, consequentemente, na economia mundial. Após os acordos de paz, cujo mais importante foi o Tratado de V...

O novo mapa político após a 1.ª Guerra A 1.ª Guerra Mundial foi um momento de rutura e de mudança em diversos aspetos. Trouxe muitas alterações na geografia política, nas relações internacionais e, consequentemente, na economia mundial. Após os acordos de paz, cujo mais importante foi o Tratado de Versalhes assinado em 1919 (o qual afetou sobretudo a Alemanha), 2 verificaram-se alterações nas fronteiras e no mapa político, sobre- tudo da Europa 1 . Houve um desmembramento dos grandes impé- rios autocráticos e ditatoriais e a formação de novos Estados que adotaram formas políticas mais democráticas. Os tratados de paz revelam uma clara vitória das democracias na 1.ª Guerra Mundial; contudo, a assinatura dos armistícios não resolveu os problemas decorrentes da guerra ou já herdados do período que a antecedeu. Muitos desses problemas agravaram-se, causando um conjunto de dificuldades internacionais, das quais se destacam:   o facto de alguns Estados não terem aceitado as fronteiras estabelecidas nos tratados de paz, pelo que se envolveram em disputas, e só em 1925 foi definido um novo mapa político;   a continuação das divergências entre os grandes Estados ven- cedores da guerra, que continuavam a rivalizar entre si, mas arbitravam os conflitos entre as nações secundárias;   a continuidade da exacerbação dos nacionalismos. A Sociedade das Nações Na Conferência da Paz de 1919, o então presidente dos Estados Unidos da América, Woodrow Wilson, desempenhou um papel de árbi- tro, fazendo prevalecer o que designou de "new diplomacy". Este pre- tendia a criação de uma organização mundial e não europeia, que fosse ao encontro do que queria: "the world safe for democracy", isto é, um mundo onde a segurança permitisse o desenvolvimento das democra- cias. Em abril de 1919, ainda durante as conversações do Tratado de Versalhes, foi criada a Sociedade das Nações (SDN), que tinha por objetivos principais manter a paz e a segurança dos Estados e fomen- tar a cooperação financeira, económica e sociocultural entre os Estados-Membros 3 . Estes objetivos eram grandiosos, mas os acordos apresentavam fragilidades. Apesar de fomentar a sua criação, os EUA nunca chega- ram a aderir à SDN, bem como os países vencidos na Guerra e alguns dos países vencedores, de que são exemplo a Itália, Portugal e outros, pois sentiam-se injustiçados com as resoluções tomadas nos acordos de paz. Por tudo isto, a SDN não teve capacidade para evitar novos conflitos. \ \ \ O fim da hegemonia europeia Entre 1914 e 1918, a Europa foi palco de guerra. Perderam-se milhares de vidas, muita população foi obrigada a deslocar-se para fugir às zonas de combate, as cidades, as infraestruturas, os terrenos agrícolas, tudo ficou destruído. Os países europeus, sobretudo a Ale- manha, ficaram completamente desorganizados e sem capacidade para produzirem e distribuírem bens ou garantirem serviços 1 . Durante a Guerra e nos anos que se seguiram para a reconstrução, a Europa foi obrigada a importar de tudo, sobretudo aos EUA 3 . A Europa perdeu a sua posição de hegemonia para os EUA. A maior parte dos países europeus deparou-se com uma difícil recons- trução e reconversão económica, o que os levou ao endividamento (interno e externo) e à desvalorização monetária, gerando graves crises inflacionistas 2 . A situação foi particularmente grave na Alemanha, na Áustria e na Hungria, países que também ficaram sujeitos ao pagamento de elevadas indemnizações de guerra 3 . A recuperação da Europa foi difícil, o que agravou a sua depen- dência com os EUA 5 . Com o decorrer da Guerra, a produção indus- trial europeia baixou cerca de 40% e a produção agrícola 30%, provocando a perda de mercados internacionais a favor dos EUA e do Japão. Os EUA rapidamente passaram de devedores a credores da Europa 4 . Em 1922, a Europa detinha 52% do comércio internacional contra 63% em 1913; os países em guerra passaram a ter défices na balança de pagamentos, assistindo, em simultâneo, à desvalorização das suas moedas (em relação ao dólar, a libra esterlina baixou 27%, o franco 63% e o marco alemão 98%). Mesmo os países que não sofreram destruições no seu território sentiram dificuldades devido à desorganização do comércio interna- cional e à necessidade de reconverter, para o desenvolvimento econó- mico das populações, as forças produtivas que até aí haviam sido canalizadas para a guerra. Este esforço foi sentido até mesmo nos EUA, onde se verificou a primeira crise económica, logo em 1920-21, provocada pela acumula- ção de stocks, falências, desemprego e deflação , que rapidamente se propagou a outros países dependentes da economia americana. \ \ O desenvolvimento da economia americana A quebra económica da Europa contrastava com o grande desen- volvimento registado nos Estados Unidos durante e após a 1.ª Grande Guerra. Este crescimento económico resultou do boom industrial, comercial e financeiro que, por sua vez, contribuiu para a expansão do capitalismo liberal, criando um clima de otimismo e confiança a que os historiadores deram o nome de "era da prosperidade" e que marcou a década de 1920. "O grande negócio da América são os negócios", declarava Coo- lidge (presidente dos EUA entre 1923 e 1928), tendo-se verificado, no seu mandato, um crescimento de 64% do conjunto da produção indus- trial, ao mesmo tempo que se verificava um alargamento do mercado interno (121 milhões de habitantes em 1929) e externo: a expansão do crédito e da Bolsa, a concentração industrial em trusts e holdings, como a United States Steel Corporation -- Grupo Morgan (60% da pro- dução do aço), a General Motors e a Ford (66% da produção automó- vel), a Standard Oil e Socony Vacuum -- Grupo Rockfeller, e a Gulf Oil -- Grupo Mellon (quase a totalidade da refinação e distribuição do petró- leo), representando uma forte concentração comercial. A aplicação de novos métodos de produção e de organização do trabalho -- o taylorismo e o fordismo 3 -- ajudou a acelerar o cresci- mento económico. Frederick Taylor (1856-1915) tinha definido, nos pri- meiros anos do século XX, a racionalização do trabalho, baseado no princípio do trabalho em cadeia, em que cada operário desempenhava apenas uma tarefa. Henry Ford (1863-1947), baseado no taylorismo, projetou o sistema de produção em série ou em massa, através de uma estandardização (uniformização de modelos). Deste modo, era possível produzir mais, a menor custo. O desenvolvimento do consumo Para garantir o poder de compra necessário ao escoamento da produção, motivados pelos novos sistemas de vendas a crédito e pela publicidade, e aplicando os novos métodos de produção, os industriais implementaram uma política de altos salários com vista à promoção do consumo e consequente dinamização da economia. Estes novos métodos de produção exigiam grandes investimen- tos, quer em novas máquinas quer na mão de obra, por isso, apenas as empresas maiores conseguiam ter sucesso; isto levou à concentração de empresas, à formação de monopólios e ao desenvolvimento do capitalismo liberal . Mas também permitiram criar produtos mais baratos, aumentando, desta forma, os mercados e o consumo. Este período de prosperidade e euforia, que se desenvolveu nos EUA após a Guerra, ficou conhecido por "os loucos anos 20", contri- buindo para o característico "estilo de vida americano" (the american way of life). \ \ A Rússia Czarista A Rússia, no início do século XX, era um Estado com uma estru- tura política, social e económica típica de Antigo Regime. Com a agri- cultura e indústria rudimentares, a economia atravessava uma crise profunda que acentuava as desigualdades sociais entre a nobreza e o clero privilegiados e os camponeses e operários que viviam em condi- ções miseráveis com baixos salários, excesso de horas de trabalho e más condições de habitação e alimentação 1 . Estas desigualdades levaram a um clima de contestação e revolta que abriu caminho à implantação de ideias socialistas. A 22 de janeiro de 1905, a população de S. Petersburgo saiu à rua pedindo melhores condições de vida 2 . A revolução foi prontamente esma- gada pelas tropas do czar ("Domingo Sangrento"), mas abriu as portas a algumas mudanças: Nicolau II viu-se obrigado a abolir alguns privilé- gios da aristocracia e a autorizar a existência de partidos políticos e a criação da Duma (Parlamento). Contudo, estas medidas não foram efi- cazes, pois os partidos e a Duma eram controlados pelo Czar, cres- cendo o descontentamento da população. O arranque da Revolução A população russa exigia o fim do czarismo, demonstrando-o em sucessivas greves e manifestações. Em janeiro de 1917, a Duma foi dissolvida, acusada de corrupção. Em fevereiro de 1917, a população da capital, Sampetersburgo, voltou a manifestar-se contra o Czar, mas contando agora com o apoio de grande parte dos soldados, que se recusaram a agir contra os manifestantes. O Czar, sem proteção, foi obrigado a abdicar. Foi o início da Revolução 3 ! Formaram-se então os sovietes dos operários e soldados, com o objetivo de defender a revolução. Entregaram o governo a um Comité Executivo Provisório. Este governo provisório tomou medidas para aproximar a Rússia dos regimes liberais dos países ocidentais. Destas medidas, destacavam-se: a abolição da pena de morte; a amnistia para os presos políticos e exilados; a abolição das diferenças relacionadas com a raça e a religião e a convocação de uma assem- bleia constituinte. Contudo, estas medidas não eram suficientes para os sovietes, principalmente para os bolcheviques que pretendiam uma revolução mais radical começando a fazer oposição ao Governo Provisório 4 , criticando, sobretudo, a permanência da Rússia na Guerra. \ \ A Revolução Bolchevique -- outubro de 1917 Entre os que faziam oposição ao Governo Provisório, destaca- vam-se os bolcheviques que pretendiam uma revolução profunda e não apenas reformas superficiais. O principal líder dos bolcheviques era Lenine 2 que, juntamente com Trotsky e baseado na ideologia socialista de Marx, inicia uma forte oposição ao Governo Provisório. Em outubro de 1917, as milícias militares dos bolcheviques desti- tuíram o governo e instauraram um governo revolucionário liderado por Lenine. Trotsky e Estaline assumiram também funções no governo. Este novo governo defendeu a nacionalização e a coletivização de toda a economia russa, os operários deviam participar na gestão das fábricas e a propriedade privada foi abolida. Através do Decreto da Terra, as grandes propriedades rurais foram distribuídas entre os camponeses. Avançava, assim, a instauração de uma ditadura do proletariado 3 . Em março de 1918, o novo governo assinou com a Alemanha o Tratado de Brest-Litovsk, retirando a Rússia da 1.ª Guerra Mundial 1 . A Guerra Civil Após a Revolução de Outubro, alguns elementos da burguesia e da aristocracia, apoiados por países defensores do capitalismo como a Inglaterra, a França e os EUA, apoiaram a criação de um exército para combater os apoiantes de Lenine -- o Exército Branco. Em resposta, os bolcheviques organizaram um Exército Vermelho e instalou-se na Rússia uma guerra civil 4 que levou ao assassinato brutal do Czar Nicolau II e da sua família, à morte de milhares de russos e ao agrava- mento da situação económica do país. Em 1921, o regime Bolchevique conseguiu controlar todo o território pondo fim a esta guerra civil. O Partido Bolchevique, que desde 1918 passara a chamar-se Partido Comunista, consolidou a sua posição no governo. Era a vitória da Revolução Comunista. Terminada a guerra civil, a Rússia estava com- pletamente arrasada, com grandes dificuldades para reerguer os seus setores agrícola e industrial. \ \ O triunfo dos bolcheviques e a implantação do Marxismo-Leninismo Apesar da difícil situação em que a Rússia se encontrava, Lenine adaptou o Marxismo à realidade da Rússia, desenvolvendo o Marxismo-Leninismo. Implementou um conjunto de medidas com vista a impor a ditadura do proletariado, às quais se deu o nome de comunismo de guerra 1 . Algumas das principais medidas do comunismo de guerra foram:   a negociação imediata da paz com os alemães e a retirada da Rússia da guerra;   a proclamação dos "Direitos do Povo Russo" (Carta das Nações Russas), que outorgava a igualdade e a soberania aos diferentes povos da Rússia, reconhecendo o princípio do livre desenvolvi- mento das minorias nacionais e étnicas;   a organização dos vários sovietes numa hierarquização em pirâ- mide, sendo que no vértice dessa pirâmide estaria a Assembleia do Congresso dos Sovietes, de onde saía, por eleição, o Conse- lho dos Comissários do Povo (Sovnarkom), supremo órgão exe- cutivo cuja presidência foi entregue a Lenine, tendo Trotsky como Comissário de Guerra e Estaline como Comissário das Nacionalidades;   a promulgação da 1.ª Constituição da Revolução (julho de 1918), aprovada pelo 5.º Congresso Geral dos Sovietes, que favoreceu o proletariado, declarou o Estado russo um Estado federalista e multinacional, constituído pela união das nacionali- dades, e adotou o centralismo democrático ;   a destruição do sistema capitalista e a coletivização de toda a economia pela nacionalização imediata de todos os meios de produção: terras, fábricas, minas e bancos;   a instituição do regime de partido único -- o Partido Comunista Russo (ex-bolchevista) -- e a criação da polícia política e da cen- sura;   a preocupação com o movimento socialista internacional e com a sua união, incentivando, em 1919, a reunião da III Internacional -- a Internacional Comunista --, que propôs a união de todos os partidos comunistas num organismo internacional -- o Komin- tern. Apesar das mudanças que marcaram estes períodos, em 1921, os problemas económicos da Rússia persistiam. Lenine, tendo em vista a reconstrução económica interna, criou um novo modelo económico: a Nova Política Económica ou NEP 2 . Através do restabelecimento da pequena livre iniciativa e da pequena propriedade privada, e com o apoio de financiamentos estrangeiros, conseguiu que, até 1927, a URSS atingisse níveis de produção idênticos aos de 1913.  O impacto do socialismo revolucionário A Rússia ocupava um vasto território com diferentes povos. Para facilitar a gestão e impedir a influência dos regimes capitalistas nos seus domínios, foi criada, em 1918, uma estrutura federal. Em 1922, uma nova Constituição veio reforçar esta organização, formando-se a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), que ocupava uma extensa área toda ela unida pelo mesmo regime político e econó- mico 1 . Os acontecimentos políticos, a guerra e a situação económica que marcou as primeiras décadas do século XX favoreceram novas formas de pensamento económico e político em várias regiões do mundo. Na maior parte dos países europeus, os movimentos revolu- cionários foram apaziguados durante a guerra. Todavia, terminado o conflito, a revolução propagou-se, devido ao agravamento das más condições de vida e ao apoio do Governo russo que, a partir da III Internacional (Moscovo, 1919), resolveu apoiar o socialismo interna- cional, visando diminuir a oposição externa ao regime. O exemplo da revolução bolchevique teve impacto nos movimentos operários de toda a Europa 4 . As dificuldades económicas e o desemprego na Europa, no período imediato do pós-guerra, sobretudo nos países que participa- ram na guerra, motivaram movimentos sociais, apoiados por novas forças políticas. Servindo-se do desespero das populações nesta época de crise e do descrédito nos regimes vigentes, estas novas forças políticas foram-se implantando junto do eleitorado, propondo soluções novas e radicais. O aparecimento de regimes autoritários Paralelamente a estes movimentos socialistas revolucionários, desenvolveram-se outros de sentido contrário. Alguns governos pro- curaram resolver as questões sociais e as dificuldades económicas com uma maior intervenção do Estado. Em alguns países, a defesa de maior intervencionismo estatal fez emergir movimentos autoritários e antidemocráticos, que atacavam as ideias comunistas e o sistema das democracias parlamentares. Na Itália e na Alemanha, os movimentos, respetivamente fascista e nazi, germinaram na década de 1920, impondo-se logo na década de 1930. O mesmo aconteceu em Portu- gal, com a Revolta do 28 de Maio (1926) e a implantação do salaza- rismo (década de 1930), e na Espanha, com Primo de Rivera (1923) e com Francisco Franco (década de 1930) 2 . Desta forma, a Revolução Russa e a contrarrevolução (noutros países) constituíram um manifesto da crise das democracias liberais, fragilizando o sistema pluripartidário. A democracia parlamentar encontrava-se agora ameaçada por forças de esquerda e de direita, verificando-se uma regressão do demoliberalismo 3 .  O crescimento das cidades e as transformações da vida urbana O crescimento das cidades foi um dos fenómenos mais marcan- tes do século XIX. Consequência da industrialização, este crescimento ocorreu, em primeiro lugar, no Ocidente, expandindo-se depois para a América e para o resto do Mundo. Este crescimento urbano culminou, na primeira metade do século XX, com a formação de grandes metrópoles e até de megaló- poles 1 que congregavam vários milhões de habitantes, fazendo com que, pela primeira vez na História, a população das cidades ultra- passasse, nalguns países, o total da população rural. As cidades, para além de grandes núcleos populacionais, torna- ram-se também o centro das atividades fundamentais da vida das comunidades -- sedes políticas e administrativas, bancárias, comer- ciais e industriais, dos serviços, entre outros, situavam-se nas cidades, tornando-as os centros do poder. Este extraordinário crescimento transformou a estrutura urbana já desde o século XIX:   para alojar as novas multidões, as zonas residenciais aumenta- ram, prolongando-se pelas ruas e praças que se estenderam por quilómetros;   a construção em altura aumentou, tornando as cidades mais sombrias e fechando os horizontes;   o tráfego e a poluição intensificaram-se;   o coração da cidade deixou de ser a praça ou a catedral, tradi- cionais locais de convívio, estendendo-se para as zonas de comércio;   os grandes edifícios, onde se alojavam funções públicas, sedes de empresas, bancos ou centros comerciais, passaram a consti- tuir polos agregadores de pessoas e, como tal, "novos centros". Com o objetivo de responder às exigências e às necessidades de milhões de pessoas (a densidade urbana chegava a atingir 100 000 hab./km em alguns bairros de Paris e de outras metrópoles), 2 as cidades precisaram de equipar-se com serviços públicos suficien- tes -- transportes, escolas, abastecimentos de água, eletricidade e gás, rede de esgotos, recolha de lixo, assistência médica, etc. -- e estruturas complexas, gigantescas, dispendiosas, planificadas para uma expan- são contínua 2 . Rapidamente, estes novos serviços tornaram-se necessidades básicas, parte integrante da vida moderna e atrativos da vida citadina 3 .  A vida urbana na década de 1920 A proliferação dos grandes centros urbanos, a comunicação à distância, e a maior rapidez dos transportes foram alguns dos fatores que contribuíram para a alteração dos ritmos de vida e das relações quer pessoais quer comerciais 1 e 2 . O crescente empobrecimento de algumas camadas da socie- dade contribuiu para que o agregado familiar (homens e mulheres) tra- balhasse fora do lar, nas fábricas ou serviços, desencadeando uma desestruturação da tradicional relação familiar e mesmo social. Todo o sistema de vida e de trabalho, até então dominado por ritmos lentos, pela tradição, pela pouca mobilidade, por laços de familiaridade e vizinhança, pela colaboração e entreajuda mútuas, se transformou 1 e 2 . A vida, sobretudo urbana, transformou-se significativamente. Algu- mas dessas mudanças trouxeram melhorias, outras acentuaram difi- culdades ou criaram novos problemas. Na grande cidade, que vive em função do conjunto, um ser humano sozinho perde-se facilmente na multidão. Não conhece o rosto, muito menos o nome da maioria dos seus vizinhos; fora da sua rua e do seu bairro é um estranho, um anónimo. O desconhecimento instalou a desconfiança, o afastamento e a indiferença social. Subme- tidos às exigências do mesmo ambiente urbano (os horários de traba- lho nas empresas e no comércio, os transportes urbanos...), os ritmos de vida padronizaram-se, passando a cidade a ser uma enorme "máquina social". Perante esta nova mentalidade, uma nova maneira de viver con- tagiou os citadinos. Foi o "american way of life" da década de 1920, a que os Europeus da época chamavam "vida moderna". Intensificou-se a vida noturna (teatros, cinemas, nightclubs, casinos) 4 e 5 e alguns desportos ganharam uma dimensão nova e passaram a atrair multi- dões (futebol, corridas de automóveis...). A facilidade de comunicação 3 e de mobilização incentivou o gosto pelas viagens, que entraram nos hábitos e prazeres das classes médias. Nas cidades, também nasceram as zonas de degradação, bair- ros pobres onde se alojavam os marginalizados, onde a pobreza e a violência contrastavam com a riqueza dos que habitavam nas outras partes da cidade. Os grandes centros urbanos deram origem à massi- ficação social: as sociedades de massas, caracterizadas pelo grande número de pessoas, pela dispersão espacial e pelo anonimato, puseram em causa as solidariedades campesinas, trouxeram fortes mudanças nos comportamentos e levaram ao desenraizamento de populações.  A crise dos valores tradicionais Até ao início do século XX, a família e a propriedade privada, o pensamento racional, laico e positivista, a democracia liberal e parla- mentar e um conjunto de direitos e liberdades individuais como os de reunião, de expressão, de imprensa, entre outros, faziam parte dos valores das sociedades ocidentais. Todos estes valores foram conquistados pelas sociedades bur- guesas e industriais da Europa do século XIX, cujo modo de vida consi- deravam superior ao dos restantes continentes. Estas convicções desenvolveram, a partir do último quartel do século XIX e até à 1.ª Grande Guerra, uma mentalidade confiante e oti- mista que acreditava na ciência e na técnica como construtoras do progresso. Todavia, a 1.ª Grande Guerra veio pôr em causa essas certezas, fazendo crescer um clima de inquietude e de desencanto 2 , que, por sua vez, conduziu à contestação e ao abandono progressivo dos valores tradicionais 4 , nomeadamente os mais importantes como os da família, do casamento, da sexualidade, do relacionamento entre os sexos e dos papéis estatuídos da mulher e do homem na sociedade, da religião, entre outros 1 . Assim, no pós-guerra, surgiram, de forma crescente, certos com- portamentos, designados de anomia social 3 . Como vimos, após a Grande Guerra e a Revolução Socialista (1917), as massas trabalhado- ras de diversos países reivindicavam a ordem instituída e lutavam pela queda dos valores da sociedade burguesa. Os governos e os grupos sociais conservadores preocupavam-se com a propagação destes movimentos, tendentes a levar as massas até ao poder. Alguns gover- nos lutavam pela ordem tradicional, outros pela recriação dos seus princípios, "como forma de resistir tanto ao individualismo liberal como à ameaça do trabalhismo e do socialismo". As populações ou apoiavam a revolução social e mental proposta pelas novas ideologias de esquerda, ou as tendências que se afirma- vam nos nacionalismos e que assentavam em ressentimentos prove- nientes dos tratados de paz de 1918-20 e no eclodir de sentimentos de xenofobia de massas, resultantes das vagas de imigração e migração para as grandes cidades, desde o século XIX, e enfasados pelos movi- mentos de direitas radicais.  A emancipação feminina Até ao século XIX, a mulher era considerada um ser frágil que pre- cisava da tutela e da proteção do homem. Um jurista inglês, Sir William Blackstone, refletindo a mentalidade comum na época, afirmava que, em relação aos direitos da mulher casada, "a capacidade jurídica da mulher é anulada pelo casamento e passa a fazer parte da do marido". Contudo, a sua entrada no mundo do trabalho assalariado rompeu com esta visão e o papel da mulher na sociedade foi repensado, assim como o seu estatuto social. Com a industrialização, as mulheres passaram a ser recrutadas como mão de obra barata, trabalhando, principalmente, na indústria têxtil e nas minas de carvão, até 16 horas diárias por salários que cor- respondiam, com frequência, a metade dos salários dos homens. A exploração do trabalho feminino viria a constituir uma das características sociais de todo o século XIX. Mas, uma vez que partici- pava em grande escala na produção, ganhando o seu salário, a mulher conquistou uma certa independência económica, que a levou a reivindi- car os mesmos direitos que o homem. Iniciava-se, assim, a luta das mulheres pela sua emancipação ( feminismo ). Nos finais do séculoXIX, surgem as primeiras formas de luta, com vista à liberdade e igualdade de direitos, e o sufrágio universal: os movimentos sufragistas. Em 1918, as mulheres inglesas com mais de 30 anos obtiveram o direito de voto. Só 10 anos mais tarde esse direito seria concedido a todas as inglesas com mais de 21 anos. A 1.ª Grande Guerra contribuiu, significativamente, para a evolu- ção da condição feminina ao proporcionar a intervenção da mulher em quase todos os setores da atividade económica e social, desde os trabalhos pesados nas fábricas até à gestão e direção de empresas (substituindo os maridos que estavam nas frentes de combate), bem como o acesso a alguns divertimentos e desportos. A emancipação da mulher refletiu-se, também, na moda e nas mentalidades. A bainha das saias subiu até aos tornozelos, as saias passaram a ser justas e a cair a direito; por sua vez, as relações entre sexos tornaram-se mais livres, com tendência para a diminuição do número de filhos (controlo da natalidade). As famílias tradicionalmente multigeracionais foram substituídas por famílias nucleares, passando a família a ser pai, mãe e filhos a viverem no mesmo lar e com meios eco- nómicos comuns. Depois da década de 30, o padre, antes tão impor- tante na gestão de conflitos, foi substituído pelo médico ou psicólogo. Todas estas mudanças contribuíram para a laicização das socie- dades ocidentais.  A descrença no pensamento positivista e as novas conceções científicas Em finais do século XIX, o grande desenvolvimento das ciências foi marcado pelo positivismo, segundo o qual a formação de conheci- mentos assentava na observação sistemática e na análise rigorosa, para se obter respostas corretas. Para os positivistas, até a História, a Literatura e a Arte poderiam explicar-se em termos científicos objeti- vos, testando-se as hipóteses em referência aos factos. Em 1893, o filósofo italiano Benedetto Croce (1866-1952) con- testou as teorias positivistas aplicadas à História 2 , uma vez que negou a possibilidade de uma visão objetiva do passado, defendendo que a nossa compreensão dos factos humanos do passado depende da recriação do pensamento dos agentes históricos, através de um esforço imaginativo para nos identificarmos com eles. Assim, Croce negava às ciências humanas e sociais, em geral, e à História, em parti- cular, o carácter de ciências objetivas. Segundo o filósofo, todo o conhecimento histórico é sempre um conhecimento relativo e sub- jetivo. Nos princípios do século XX, outros campos da ciência iriam gra- dualmente abandonar o racionalismo, a certeza e o absoluto, adotando a incerteza e o relativismo 1 . Na Física, Albert Einstein formulou a Teoria da Relatividade, segundo a qual o espaço e o tempo são grandezas relativas e depen- dem uma da outra. Esta teoria demonstrou que a verdade científica era menos universal do que se supunha, derrubando as certezas da Física newtoniana. Outra personalidade que se distinguiu foi Sigmund Freud com a sua nova teoria, apresentada em 1908, no 1.º Congresso Internacional de Psicanálise, em Salzburgo (Áustria): a psicanálise 3 . Além desta teoria, escreveu várias obras em que apresentava uma visão revolucio- nária para a época sobre vários assuntos, como a "divisão da mente" (em id, inconsciente; ego ou eu, racional; e superego, inibidor do ego, com sentimentos de culpa), sexo, sonhos, religião, etc. As teorias de Freud foram um grande contributo, não só para a sociedade e para a Arte 4 do seu tempo, como também para a sociedade atual. Todas estas teorias causaram grande polémica e discussão entre profissionais que se dedicavam ao estudo e tratamento da mente humana, bem como admiração pelo radicalismo que apresentavam. Entre os seus seguidores, contam-se escritores, artistas e outros intelectuais que ansiavam por  As vanguardas: ruturas com os cânones das artes e da literatura Entre os finais do século XIX e os inícios do século XX, assistimos a profundas inovações na sociedade, na ciência e na técnica, que se repercutiram na literatura e nas artes. A arte espelha sempre o seu tempo e a sociedade que a cria. Os novos modos de vida e as novas formas de pensar, de trabalhar e de viajar influenciaram os artistas, dando origem a movimentos inovadores que romperam com as nor- mas e as "escolas" da época. Inovação e provocação são duas das características que, de um modo geral, marcaram a arte neste período. A inquietação, a instabili- dade e as transformações sociais e morais resultantes da Grande Guerra originaram novas formas de encarar as artes e a literatura, evi- denciando-se uma vontade clara de romper com as regras e valores instituídos, ou seja, um desejo de mudança, de atualização das artes de modo que estas estejam a par do seu tempo e sejam um reflexo da sociedade que as cria. Neste caso, o tempo do progresso científico e técnico, da máquina, da velocidade, da revolução urbana, da revolu- ção dos costumes, ou seja, da vida moderna. Estas tendências inovadoras manifestaram-se em todos os cam- pos de atividade cultural e artística (arquitetura, pintura, escultura, dança, música, literatura, teatro, cinema) e são habitualmente designa- das por Modernismo 1 . A literatura desta época denota uma visão mais intimista, subje- tiva e pessimista do mundo, denunciando as injustiças sociais e expres- sando o desencanto e a crise de valores. As inovações traduziram-se numa multiplicidade de estilos arrojados, que se integram no moder- nismo. Escritores como Kafka (1883-1924), Górki, André Malraux (1901-1976), Garcia Lorca (1898-1936), Virginia Woolf, Jean-Paul Sartre, entre outros, são alguns dos mais célebres autores modernistas 3 . Através das suas obras, procuraram analisar os problemas da época, valorizando os sentimentos humanos, as aspirações e questões sociais 2 . O modernismo reúne, em si, várias correntes ou movimen- tos de vanguarda cultural que, no seu conjunto, acabaram com o academismo vigente, encontrando novas linguagens técnicas, formais e temáticas 4 que revolucionaram a plástica e as artes europeias. As vanguardas: ruturas com os cânones das artes e da literatura Entre os finais do século XIX e os inícios do século XX, assistimos a profundas inovações na sociedade, na ciência e na técnica, que se repercutiram na literatura e nas artes. A arte espelha sempre o seu tempo e a sociedade que a cria. Os novos modos de vida e as novas formas de pensar, de trabalhar e de viajar influenciaram os artistas, dando origem a movimentos inovadores que romperam com as nor- mas e as "escolas" da época. Inovação e provocação são duas das características que, de um modo geral, marcaram a arte neste período. A inquietação, a instabili- dade e as transformações sociais e morais resultantes da Grande Guerra originaram novas formas de encarar as artes e a literatura, evi- denciando-se uma vontade clara de romper com as regras e valores instituídos, ou seja, um desejo de mudança, de atualização das artes de modo que estas estejam a par do seu tempo e sejam um reflexo da sociedade que as cria. Neste caso, o tempo do progresso científico e técnico, da máquina, da velocidade, da revolução urbana, da revolu- ção dos costumes, ou seja, da vida moderna. Estas tendências inovadoras manifestaram-se em todos os cam- pos de atividade cultural e artística (arquitetura, pintura, escultura, dança, música, literatura, teatro, cinema) e são habitualmente designa- das por Modernismo 1 . A literatura desta época denota uma visão mais intimista, subje- tiva e pessimista do mundo, denunciando as injustiças sociais e expres- sando o desencanto e a crise de valores. As inovações traduziram-se numa multiplicidade de estilos arrojados, que se integram no moder- nismo. Escritores como Kafka (1883-1924), Górki, André Malraux (1901-1976), Garcia Lorca (1898-1936), Virginia Woolf, Jean-Paul Sartre, entre outros, são alguns dos mais célebres autores modernistas 3 . Através das suas obras, procuraram analisar os problemas da época, valorizando os sentimentos humanos, as aspirações e questões sociais 2 . O modernismo reúne, em si, várias correntes ou movimen- tos de vanguarda cultural que, no seu conjunto, acabaram com o academismo vigente, encontrando novas linguagens técnicas, formais e temáticas 4 que revolucionaram a plástica e as artes europeias. A rutura nas artes Na arte, o Modernismo foi um amplo movimento que englobou todos os ismos vanguardistas da primeira metade do século XX, os quais partilhavam um sentimento comum: a ideia de que o mundo tinha mudado por completo e a arte tinha de se renovar, abandonando as regras do Naturalismo e do Academismo. O Fauvismo O Fauvismo nasceu em 1905, no Salon d'Automne de Paris. Esta corrente artística valorizava a pintura pelas suas características específicas: a cor e a bidimensionalidade. Este movimento pictórico é marcado pela simplificação das formas e a valorização das cores for- tes, tons puros e quentes, fortemente contrastados (vermelho-verde; azul-amarelo, etc.), de forma a alcançar a expressividade máxima. A cor passou a ser utilizada para delimitar planos, criando a perspetiva e modelando o volume. Tornou-se também totalmente independente do real, já que não era importante que a cor aplicada estivesse de acordo com a realidade. É a cor que dá a expressividade às obras; as formas simplificadas e as cores planas acentuavam a bidimensionalidade das representações, nas quais a composição e a perspetiva eram tra- tadas empiricamente. Entre 1905 e 1908, o movimento fauve congregou numerosos artistas, entre os quais Albert Marquet (1875-1947), Maurice Vlaminck (1876-1958), André Derain (1880-1954), Raoul Dufy (1877-1953), Puy (1876-1960), Manguin (1874-1949) e outros. Contudo, o francês Henri Matisse (1869-1954) foi, indubitavelmente, o fundador do Fauvismo e o seu principal executante 1 , sendo considerado o líder deste movi- mento. O Expressionismo O Expressionismo nasceu na Alemanha, em 1905. Privilegiava a dimensão emocional e espiritual da realidade, considerada como um grito, no contexto de uma sociedade que vivia uma industrialização acelerada, com rápida transformação de cidades e estilos de vida, mas que, em contrapartida, mantinha uma mentalidade antiquada, domi- nada por um rígido autoritarismo. O Expressionismo afirmou-se como uma arte do espírito 2 e surgiu como uma reação ao positivismo, propondo uma arte pessoal e intuitiva 3 , em que predominasse a visão interior do artista -- a "expressão" -- em oposição à mera obser- vação da realidade -- a "impressão". Propõe a deformação da reali- dade para expressar de forma subjetiva a natureza e o ser humano.  O Cubismo Das experimentações formais e técnico-construtivas de dois pin- tores, o espanhol Pablo Picasso (1881-1973) e o francês Georges Braque (1882-1963), nasceu o Cubismo . A partir da obra As Meninas de Avinhão de Pablo Picasso 1 , a pintura experimentou uma evolução apenas comparável com a introdução da perspetiva no século XV. O Cubismo valoriza o volume das coisas, dispensando os ele- mentos acessórios. As formas são representadas como volumes geo- métricos que se sobrepõem. Em vez de representarem algo a partir de um ponto de vista, representam um mesmo objeto visto de várias perspetivas. Esta atitude representa um corte com o passado, aban- donando a tradicional perspetiva renascentista e a ilusão do espaço. Os pintores que mais marcaram este movimento foram Cézanne (1839- -1906), Braque (1882-1963), Pablo Picasso (1881-1973) e Juan Gris (1887-1927). O Futurismo No início do século XX, um grupo de artistas italianos tinha como principal premissa a exaltação do futuro e dos novos mitos que a modernização impunha à sociedade. Rejeitava o moralismo e o pas- sado e valorizava o presente e as ideias de progresso e de velocidade 4 , a civilização da máquina e do futuro. Os primeiros futuristas euro- peus também exaltavam a guerra e a violência. Em 1909, publicaram o Manifesto Futurista, no qual se podia ler: "Proclamamos que o esplen- dor do mundo foi enriquecido por uma nova beleza, a beleza da veloci- dade". O Futurismo foi inicialmente influenciado pelo Cubismo e pelo Abstracionismo. Giacomo Balla (1871-1958), Umberto Boccioni (1882- 1916), Robert Delaunay (1885-1941) 2 e Marcel Duchamp (1887- 1968) são alguns dos artistas desta corrente. O Abstracionismo O Abstracionismo assume, numa definição simplista, a ideia de que os objetos representados não são iguais aos da nossa realidade. Desenvolvendo-se entre 1918 e 1933, definiu-se como "a arte que não contém em si nenhuma relação, nenhuma evocação com a realidade, mesmo quando esta foi o ponto de partida do artista" (Michel Seuphor, 1901-1999). O artista abstrato rejeita a linguagem do visível e cria uma arte da alma, capaz de expressar de forma autêntica as realidades espirituais, não representa objetos concretos, faz uma combinação de cores e de formas 3 . O Dadaísmo Este movimento artístico nasceu em Zurique, com uma estética baseada nas premissas da luta contra a razão, a linguagem e a própria arte. Impressionados pelo clima de sofrimento e de caos espiritual criado pela guerra, o movimento Dada pretendia negar os conceitos de arte e de objeto, bem como as técnicas artísticas: a autêntica arte seria a antiarte. As primeiras manifestações deste movimento surgi- ram com Marcel Duchamp (1887-1968), que pintou uma versão da Gio- conda, de Leonardo da Vinci, acrescentando-lhe bigodes e uma legenda obscena, procurando desvalorizar algo a que normalmente se atribui valor, mas dando-lhe uma nova função (ready-made), manifes- tando rebeldia e desobediência ao até então estabelecido 1 . Esta corrente artística ficou conhecida por Dadaísmo , ou simplesmente Dada, afirmando-se sobretudo em Zurique, a partir de 1916, com reper- cussões na literatura, no cinema, no teatro, na pintura, na escultura e na fotografia. O Surrealismo O Surrealismo surgiu em Paris, na década de 1920, sucessor do movimento Dada, e encetou uma nova e fecunda etapa da arte con- temporânea: uma interpretação orientada pelo inconsciente. O Surrealismo foi um movimento literário e artístico, envolvendo a pintura, a escultura, a fotografia e o cinema, e influenciando a moda, a decoração e a publicidade. Fundado por André Breton, desenvolveu-se no período entre as duas grandes guerras, constituindo uma das cor- rentes mais importantes da primeira metade do século XX. Influenciado pelas teorias psicanalistas de Freud, o Surrealismo valorizava o papel do inconsciente na atividade criativa 2 , em que o artista tenta ver para além da realidade e do racional, enfatizando o sonho e a alucinação 3 . Na literatura, surge a escrita imediata, sem muita reflexão, produ- zida em estado de semiconsciência. Desta forma, o Surrealismo valorizou a liberdade física e espiri- tual de cada artista/criador A cultura de massas e o desejo de evasão O extraordinário desenvolvimento dos meios de comunicação de massas -- os media --, transformados numa poderosa indústria, moldou a cultura do século XX. A cultura de massas passou, gradualmente, a ser uma "indús- tria cultural" que transforma uma vasta gama de bens culturais em con- sumíveis. Destinada, essencialmente, à ocupação dos tempos livres das grandes massas, esta "indústria cultural" foi criada para "compen- sar" as multidões trabalhadoras, em especial, da monotonia e da solidão próprias das sociedades desenvolvidas, independentemente do desejo de lucro por parte dos seus promotores 1 . Tradicionalmente, a noção de cultura era concebida como fenó- meno elitista (cultura de elite) 3 ; as elites eram mais ou menos coinci- dentes com os grupos sociais dominantes. A cultura de massas caracteriza-se por:   conforme a própria designação sugere, ser pensada e elaborada para ser transmitida às grandes massas na forma de bens de consumo culturais;   se direcionar para o imediato, isto é, para a ação, compreensão e transmissão dinâmicas do presente, para o "culto da novi- dade", para a "fuga" aos problemas do quotidiano, num claro desejo de evasão 2 ;   ser multifacetada, quer nos seus conteúdos, quer nas formas em que se apresenta, sendo de duração efémera;   geralmente abordar os temas de um modo superficial;   ser difundida pelos mass media, como os jornais, a rádio, o cinema e, mais recentemente, a Internet;   tender a formar um "tipo de pessoa média", através de modelos de comportamento, atitudes, valores, crenças, com vista à sua integração passiva no sistema político, económico, social e cul- tural vigente;   recorrer à publicidade e à propaganda com uma dupla função: económica (procurar inculcar necessidades de consumo) e sociocultural (procurar impor códigos de comportamentos e escalas de valores). A cultura de massas surge, assim, como forma cultural típica dos indivíduos nas sociedades industrializadas ocidentais, na primeira metade do século XX.  Os grandes entretenimentos coletivos Foi, de facto, na década de 20 do século XX, com o desenvolvi- mento da rádio e da indústria de discos e gramofones, que a música adquiriu também grande popularidade entre as massas. Igor Stravinsky, na sua partitura para o bailado A Sagração da Pri- mavera (1913), e Arnold Schönberg, com Variações para Orquestra (1928), fizeram a transição entre o elitismo da música clássica de orquestra e a popularidade da música moderna ligeira, libertando aquela de algumas das convenções já não apropriadas para o novo ritmo imposto pela vida urbana. Paralelamente, na América dos anos 20, surgiu o jazz e populari- zou-se o samba e o Carnaval no Rio de Janeiro. Na década de 1930, apoiado no ritmo da música jazz, nasceram, nos salões de bailes euro- peus, novos tipos de dança: o swing e o lambeth walk 3 . No ano de 1900, realizou-se, em Paris, a Exposição Universal e os II Jogos Olímpicos (a primeira olimpíada da Era Moderna realizara-se em Atenas, em 1896). Os Jogos Olímpicos fomentaram a ideia do desporto mundial 2 . O futebol, o ciclismo e o automobilismo transformaram-se em desportos de massas 1 . Considerados, de início, como atividades de lazer, rapidamente se tornaram em negócios de vulto, com repercus- sões em todos os setores da economia e da sociedade, congregando interesses, paixões e conflitos. Em 1936, os Jogos Olímpicos realizaram-se em Berlim; Adolf Hitler tentou manipulá-los através de propaganda das suas ideias racistas. Por ironia do destino, o grande herói desses jogos foi um atleta negro dos EUA: Jesse Owens. Novas modalidades foram-se afirmando, como o ténis de mesa, o esqui, o montanhismo e a natação. Através das manchetes dos jornais e das reportagens desporti- vas divulgadas pela rádio, aumentaria cada vez mais o interesse pelo desporto, sobretudo por parte do público não praticante. O reconheci- mento mundial de grandes feitos desportivos transformaria os recor- distas em vedetas conhecidas do grande público. Numa sociedade em que se vão acumulando tensões conflituais, nos espetáculos de massas, especialmente nos desportivos, verifica- -se a canalização desses conflitos quando os espetadores descarre- gam tensões acumuladas, frustrações e insegurança sobre adversários, árbitros e autoridades policiais. Os media: veículo de modelos socioculturais Os media servem à informação, à cultura, à educação, aos divertimentos, à publicidade, à propaganda\...; foram, e são, por isso, instrumentos de grande influência nas mãos de potências políticas, industriais, financeiras, religiosas. Privilegiando uma linguagem simpli- ficada e acessível a todos, os media provocaram uma estandardi- zação de comportamentos . A imprensa A liberdade de expressão trazida pelo liberalismo e o advento do comboio, que transporta os jornais no próprio dia aos mais distantes locais, são alguns dos fatores que explicam a grande difusão e a enorme importância que os jornais ganharam ainda no século XIX e sobretudo no século XX. Na primeira metade do século XX, a imprensa escrita periódica não parou de crescer, impulsionada quer pela adesão do público, quer pelas estratégias de promoção dos editores que pas- saram a noticiar o insólito e até o quotidiano (roubos e crimes sensa- cionalistas, eventos sociais, etc.) 1 e 2 . A rádio O aperfeiçoamento da telegrafia sem fios (TSF), por Marconi, em 1896, abriu o caminho à rádio que se torna, entre as duas guerras, o mais popular dos meios de comunicação. Nos EUA, aquando das elei- ções em que Wilson foi eleito (1916), durante a 1.ª Guerra Mundial e, ainda, no triunfo da Revolução Socialista de 1917, na Rússia, foi o mais influente meio de comunicação. Também os regimes ditatoriais da Europa da década de 30 utilizaram com mestria a rádio como instru- mento de propaganda das suas ideologias. Depois da 1.ª Guerra Mundial, a descoberta dos transístores e da modulação de frequência possibilitou o fabrico de aparelhos cada vez mais pequenos 4 e a reprodução, cada vez com mais qualidade, das sonoridades musicais, com crescente adesão do público. Durante a 2.ª Guerra Mundial, a rádio desempenhou um impor- tante papel na política e na formação da opinião pública 3 . A invenção da televisão (a 1.ª patente é de 1923; a 1.ª emissão ao público é de 1930, em Nova Iorque), embora com o tempo viesse a reti- rar à rádio grande parte do seu impacto, não lhe retirou nem a impor- tância, nem a especificidade, nem a comodidade. Para todos, a rádio foi um importante meio de difusão cultural.  Os media: veículo de modelos socioculturais O cinema Nascido em França pela mão dos irmãos Lumière, o cinema rapi- damente se universaliza, encontrando excelentes cultores na Europa, na América e na Ásia 2 e 3 . Inicialmente, o cinema constituía um divertimento análogo ao circo e era dirigido a um público popular; de feira em feira, mudando de lugar para renovar o público, os exploradores apresentavam os seus filmes até ao desgaste completo da película! A partir do dia em que, em 1903, o filme The Great Train Robbery foi apresentado e alcançou grande sucesso, o cinema jamais deixou de despertar um grande inte- resse no público. Esta fácil aceitação transformou a arte cinematográ- fica numa poderosa máquina de fazer dinheiro -- uma verdadeira indústria 1 . Sobrevivendo às guerras, às crises e mesmo à era da televisão, o cinema, inicialmente mudo e depois sonoro, tem permanecido, em todo o mundo, como uma fonte de aventura, romantismo, sonho e diversão. Os filmes ofereciam a imagem de um certo estilo de vida, impunham modelos e modas e, mais tarde, ideologias, nomeadamente por parte dos regimes ditatoriais em ascensão. O cinema transformou-se, assim, num poderoso meio de difusão de modelos socioculturais. Criou novos mitos de popularidade, encar- nados na "estrela" cinematográfica em Itália, Rússia, França, EUA. As "estrelas" passaram a ser consideradas simultaneamente seres huma- nos e divinos, como na mitologia grega. A literatura Na primeira metade do século XX, surgiram também escritores que, aproveitando o gosto das grandes massas por um género de lite- ratura de "suspense", difundiram a novela policial. Georges Simenon e Agatha Christie 6 constituíram os expoentes máximos deste género. A banda desenhada A banda desenhada representou também um género com grande popularidade. A "história aos quadradinhos" 4 tornou-se um sucesso mundial; heróis de banda desenhada, como o Super-Homem, o Tio Patinhas, o Tintim... tornaram-se símbolos mundiais. Destacou-se tam- bém Walt Disney (1901-1966), um símbolo universal, enquanto realiza- dor do cinema de animação 5 (banda desenhada) Síntese da unidade!   A 1.ª Guerra Mundial e a Revolução Socialista Soviética provocaram transformações geopolíticas na Europa e no resto do Mundo: alterou-se o mapa político com o desmembramento dos grandes impérios e o nascimento de novos Estados; na URSS, em 1917, estalou uma revolução que pôs no poder um regime comunista cujas ideias tiveram um considerável impacto a nível mundial.   A década de 1920 ficou também marcada por transformações económicas como a perda da hegemonia europeia, e os EUA passaram à situação de credores da Europa e alcançaram o estatuto de primeira potência mundial, exportando não apenas produtos, mas também ideias e modas com os mass media a divulgar por toda a europa as novas tendências dos "loucos anos 20". Implementaram-se novos métodos de produção, aumentou o consumo e a economia acelerou, contudo, o sistema económico, instável e especulativo, mostrou várias fragilidades.   O choque da 1.ª Guerra Mundial, as crises subsequentes e a evolução técnica do mundo industrial contribuíram para alterações na mentalidade das sociedades ocidentais. A década de 1920 ficou marcada por alterações nas mentalidades e nos costumes, pelo arranque dos movimentos de emancipação feminina e pela mudança de comportamentos sociais.   Estas mudanças traduziram-se ainda na emergência do relativismo científico, na desvalorização do positivismo, na influência da Psicanálise e na rutura com os cânones das artes e da literatura clássica europeia, através de movimentos de vanguarda (Modernismo) As dificuldades económicas e a instabilidade política e social Os governos da 1.ª República (1910-1926) empreenderam refor- mas na economia, na sociedade, na política e na educação. Contudo, o país não conseguiu recuperar dos problemas económicos que, alguns anos antes, contribuíram para a queda da Monarquia. O regime estava fragilizado, vivia-se uma crise económica, agravada com a participa- ção de Portugal na 1.ª Guerra. Apesar da grande atividade legislativa, os governantes tiveram dificuldade em levar a cabo as reformas pretendidas, perdendo, gra- dualmente, a confiança da população que os havia apoiado 4 . Ao nível interno, as maiores dificuldades resultaram, em primeiro lugar, dos entraves causados pela oposição ao regime, apoiada funda- mentalmente pelos setores mais conservadores da sociedade:   a Igreja, que se opunha ao anticlericalismo da política republi- cana;   os notáveis do regime anterior (descendentes da antiga nobreza, grandes latifundiários, etc.), apoiantes do regresso do rei D. Manuel II e da Monarquia;   alguma alta burguesia (das finanças, do comércio e da indús- tria), descontente com o carácter demasiado popular e social da legislação promulgada pela República e, portanto, não disposta a colaborar com o regime. Esta oposição monárquico-religiosa tentou, muitas vezes, restau- rar a Monarquia. Mas, para além dos adversários da República, havia ainda problemas com os próprios republicanos 3 . A 1.ª República caracterizava-se pela supremacia das câmaras eletivas (Câmara dos Deputados e Senado, que constituíam o Con- gresso), representantes da Nação, sobre os órgãos do poder executivo (Governo), de eleição indireta ou de nomeação. Esta situação transfor- mou o Congresso no órgão-chave do regime, onde todas as leis, todos os decretos e todos os atos político-governativos eram discutidos e votados. Esta forma governativa era democrática, mas morosa e gera- dora de impasses. A Constituição de 1911 instituiu um regime de democracia parlamentar no qual os governos, para aprovarem leis, necessitavam de uma maioria de deputados no Parlamento que os apoiasse, o que raramente aconteceu. Além disso, os desentidenti- mentos frequentes entre os restantes partidos criaram uma situação de instabilidade política 1 . Esta situação fez com que os governos tivessem uma duração curta, sucedendo-se uns após outros 2 . Nos cerca de 16 anos que durou a 1.ª República, o país teve 45 governos e 8 presidências da República.  Dificuldades económicas Em Portugal, o primeiro quartel do século XX foi caracterizado pela degradação da situação económico-financeira, pela agitação social e pela instabilidade política, situação agravada pela participa- ção de Portugal na 1.ª Guerra Mundial 1 . Apesar das medidas propostas e de uma breve recuperação das contas do Estado, conseguida por Afonso Costa, a crise económica manteve-se:   a agricultura continuou pouco produtiva, sobretudo a produ- ção de cereais que tinham, por isso, de ser importados;   a industrialização foi lenta;   o comércio continuou com uma balança comercial deficitária, com elevado índice de importações; a moeda continuou a des- valorizar; o poder de compra dos assalariados e das classes médias diminuiu. O descontentamento com a República O agravamento da inflação, a multiplicação das greves e as ações terroristas (levadas a cabo por anarquistas e bolchevistas), o anticlericalismo dos republicanos, as nacionalizações dos bens da Igreja e as reformas socializantes operadas pelo Partido Democrático no poder fizeram aumentar os adversários do regime democrático par- lamentar. Entre esses adversários estavam os proprietários rurais, a classe média das cidades (que tinham constituído a base social da República) e o povo, que se mostrava revoltado com o aumento dos impostos e a diminuição do seu poder de compra. Neste contexto, surgiam na Europa novas tendências políticas autoritárias, nomeadamente na Itália e na Espanha, que iam conquistando cada vez mais adeptos em Portugal. A burguesia e as camadas populares, que tinham apoiado a implantação da República, em 1910, sentiam-se desiludidas com o regime 2 . A classe média, a princípio defensora do regime republi- cano, foi a que mais sofreu os efeitos da inflação e da desvalorização da moeda. O operariado beneficiou da criação de legislação laboral e assistencial, como o direito à greve, a fixação e redução dos horários de trabalho e a assistência social, mas também se sentia frustrado com a política republicana. Continuava a ser um grupo pouco representativo e sem poder, desiludido com a República, manifestava-se na rua e organizava greves. Muitos outros, face à falta de trabalho e às dificulda- des que se viviam no país, emigravam procurando melhores condi- ções de vida noutros países, sobretudo no Brasil 3 .  A queda da 1.ª República O regime republicano estava desacreditado e alguns grupos, des- contentes com o rumo da nação, organizavam a resistência e procura- vam o apoio dos militares para formarem um governo "forte", capaz de defender os interesses da população, à semelhança do que acontecia noutros países da Europa (Itália e Espanha). Assim, apesar de alguma melhoria na situação económica geral do país, a partir de 1923, com um orçamento de Estado mais equilibrado e uma redução substancial da dívida pública, e da implementação de importantes reformas ao nível da educação e da segurança social, o regime democrático parla- mentar da 1.ª República iria ser derrubado. O contexto de crise e a agitação social contribuíram para o apoio ao golpe militar liderado por Sidónio Pais, em finais de 1917, o qual instaurou um regime autoritário em Portugal 1 . Logo no ano seguinte, em 1918, Sidónio Pais foi assassinado. Portugal voltou a ser regido por governos eleitos, mas a instabilidade e a contestação conti- nuaram. Ao descontentamento das classes populares juntou-se o dos grandes proprietários que temiam a perda dos seus bens por causa da influência do comunismo que se tinha afirmado na Revolução Soviética. Também uma parte da população católica ficou descontente por causa dos "ataques" à Igreja, levados a cabo pelas políticas da 1.ª República. Em 28 de maio de 1926, um golpe de Estado, chefiado pelo general Gomes da Costa 3 , derrubou o regime republicano. Organi- zado a partir da cidade de Braga e culminando com uma marcha militar sobre Lisboa, contou com o apoio do exército, que foi aderindo à mesma ao longo do seu percurso. Com a chegada dos militares ao poder, o Parlamento foi dissol- vido, as liberdades individuais foram suspensas e foi instaurada uma ditadura militar . Ao chegarem a Lisboa, os revoltosos encerraram o Parlamento. O presidente da República, Bernardino Machado, renun- ciou ao cargo. Era a falência da 1.ª República. Em 1928, a situação económico-financeira agravou-se e o general Óscar Carmona, eleito presidente da República, chamou António de Oliveira Salazar para ministro das Finanças, que, através de uma política de forte austeri- dade, resolveu a crise financeira 2 . O seu prestígio e a sua crescente influência política acabariam por lhe garantir a chefia do governo a par- tir de 1932.  Naturalismo versus vanguardas Apesar de a literatura portuguesa ter vivido uma época de crise, nos primeiros quarenta anos do século XX, não podemos deixar de reconhecer a existência e importância de alguns grandes escritores, adeptos dos movimentos modernistas e considerados uma impor- tante geração de intelectuais: Raul Brandão (1867-1930), Ferreira de Castro (1898-1974), Aquilino Ribeiro (1885-1963), Miguel Torga (1907- -1995), Fernando Pessoa (1888-1935). A evolução política europeia e a degradação político-social da 1.ª República, em Portugal, abriram portas para a formação de algumas correntes literárias mais ou menos antagónicas, entre elas o movi- mento do Integralismo Lusitano (com a revista Nação Portuguesa) e o movimento da Seara Nova (com a revista Seara Nova). O Integralismo Lusitano foi um movimento liderado por António Sardinha. Este movimento elitista queria reconduzir Portugal aos cami- nhos da tradição, tanto na política como na cultura. Do grupo Seara Nova 3 fizeram parte nomes como Jaime Cortesão (1884-1960), Raul Proença (1884-1941), António Sérgio (1883-1969), Raul Brandão, Aquilino Ribeiro, entre outros. Seguiram uma linha de racionalismo crítico e de doutrinação político-social democrática. Mas o sentimento de crise coletiva e de inconformismo mani- festou-se através de um grupo modernista à volta da revista Orpheu (1915). Mário de Sá-Carneiro (1890-1916), Almada Negreiros (1893- 1970) 1 e Fernando Pessoa 2 constituíram as personalidades literá- rias que mais se destacaram neste grupo. O Modernismo dos poetas do Orpheu reagia contra a "mediocri- dade" dos saudosistas agarrados ao passado, rompendo com o provin- cianismo que tendia a instalar-se na cultura portuguesa. A imaginação, a criatividade e o arrojo dos escritores modernistas escandalizaram muitas pessoas da época. A geração do segundo grupo modernista constituiu-se à volta da revista Presença (1927-1940) e revelou alguns poetas notáveis: José Régio, Casais Monteiro e Miguel Torga. Na prosa, distinguiram-se, entre outros, Aquilino Ribeiro, Ferreira de Castro e Miguel Torga. Fernando Pessoa (1888-1935) começou a escrever muito cedo, mas o único livro que publicou em vida foi a Mensagem, em 1934. A obra poética de Fernando Pessoa expressou-se numa nova linguagem, "criadora de uma nova consciencialização literária, que atualmente ainda está em curso" (A. J. Saraiva). A obra de Pessoa continua a cons- tituir um manancial de pesquisa entre filólogos e historiadores da litera- tura do nosso tempo 2 .  O movimento modernista nas artes plásticas Até cerca de 1920, a pintura portuguesa foi marcada por uma tendência naturalista que produzia retratos da burguesia da época e representações de temas populares. Contudo, as novas ideias que nasciam e se desenvolviam noutros países europeus e nos EUA iam chegando a Portugal. A renovação da pintura portuguesa centrou-se em artistas como Amadeo de Souza-Cardoso 1 e nos grupos ligados às revistas Orpheu, de Fernando Pessoa (1915), e Portugal Futu- rista (1917), fundada por Almada Negreiros, mas apreendida pela polícia logo à saída da tipografia. Em 1916, Amadeo de Souza-Cardoso, nas exposições de Lisboa e Porto, intitulou-se como "impressionista, cubista, futu- rista e abstracionista". Muitos atribuem-lhe o título de "génio", dada a enorme versatilidade e variedade da sua obra. Almada Negreiros considerou estas primeiras exposições como "as pri- meiras descobertas de Portugal no século XX"; para um público desconhecedor do Modernismo, as mesmas eram símbolo de polémica e escândalo. Almada Negreiros 2 foi pintor desenhador, romancista, poeta, bailarino, crítico de arte, autor de tapeçarias e vitrais. Entre as obras mais conhecidas deste artista, destacam-se os frescos que executou para as gares marítimas de Lisboa. Mais tarde, na década de 50, Almada Negreiros apresentou composi- ções abstratas de esquemas geométricos que vieram dar uma nova dimensão à sua obra. Outro ícone do Abstracionismo foi Maria Helena Vieira da Silva (1908-1994) 3 e 4 , artista portuguesa que viveu em França, adquirindo nacionalidade francesa. Produziu uma vasta obra desde a ilustração à produção de grandes painéis de azu- lejo, desenvolvendo uma arte original, sob valores estéticos não figurativos, revelando, em transposição quase poética, a recor- dação de elementos da paisagem urbana lisboeta. Arquitetura e escultura modernistas em Portugal, na primeira metade do século XX O clima de instabilidade social e política, vivido durante a 1.ªRepú- blica, e a participação de Portugal na 1.ª Guerra Mundial refletiram-se na arquitetura portuguesa, pois provocaram um atraso na renovação artística. No entanto, alguns arquitetos distinguiram-se nas duas pri- meiras décadas do século XX, tais como José Luís Monteiro (1848-1942) e Ventura Terra (1866-1919), em Lisboa, e Marques da Silva (1869-1947), no Porto, continuando, simultaneamente, a utilizar os esquemas da arquitetura oitocentista. Paralelamente a estes, outro grupo procurou o "reaportuguesa- mento da arte de construir"; foi o caso de Raul Lino (1879-1974), autor da célebre Casa dos Patudos 1 , em Alpiarça, projetada a pedido do político José Relvas. Um outro grupo de jovens arquitetos procurou a criação de um "estilo português": Carlos Ramos (1897-1969), Cottinelli Telmo (1897-1948), Raul Tojal (1899-1969), Pardal Monteiro (1897-1957) e Keil do Amaral (1910-1975); era a época da renovação dos edifícios públicos e da expansão urbana de Lisboa. O edifício em que melhor se definiu a síntese arquitetónica entre as formas do Modernismo e as tendências decorativas e nacionalistas (influenciadas pela ideologia do Estado Novo) foi o pavilhão (de ferro, madeira e gesso) da Exposição do Mundo Português 3 , na Praça do Império, em Belém (1940). Este pavilhão, o mais importante de um complexo de edifícios, foi da autoria de um grupo de arquitetos coorde- nados por Cottinelli, tendo sido demolidos no final da exposição. Um arquiteto deste grupo, Pardal Monteiro, viria a ser o autor da primeira igreja construída em estilo assumidamente modernista: a Igreja de Nossa Senhora de Fátima 2 , em Lisboa. Os vitrais desta igreja são da autoria de Almada Negreiros e o friso da entrada foi escul- pido por Francisco Franco (1885-1955). No Porto, alguns arquitetos, como Morais Soares e Cunha Leão, iniciaram um movimento de renovação a caminho da modernidade, movimento que teria o seu impulso mais dinâmico na obra de Carlos Ramos, quando este esteve à frente da Escola de Belas-Artes da capi- tal do Norte. No início da década de 1950 do século XX, esse movi- mento de renovação viria a ser marcado pelas obras do arquiteto Siza Vieira (n. 1933) 4 .  Síntese da unidade!   Em Portugal, a 1.ª República não conseguiu superar os problemas que herdara já dos anos anteriores e assistiu a uma crescente oposição por parte da opinião pública.   As dificuldades políticas, económicas e sociais, em particular a instabilidade política, a inflação galopante e a queda do nível de vida das populações, juntamente com as consequências da participação de Portugal na 1.ª Guerra, levaram ao descrédito do regime republicano e à aceitação do golpe militar de 28 de maio de 1926, que pôs fim à 1.ª República e instaurou o regime de Ditadura Militar.   A arte e a literatura em Portugal acompanharam algumas das tendências de outros países europeus. Coexistiam então duas tendências artísticas: uma mais conservadora e outra que viu nascer os movimentos modernistas em Portugal As origens da Grande Depressão No final da 1.ª Guerra Mundial e ao longo da década de 1920, os EUA viveram um período de grande prosperidade económica. Multiplica- ram-se as empresas industriais e agrícolas e a produtividade aumentou significativamente. Porém, por volta de 1924, a agricultura e alguns setores indus- triais começaram a dar sinais de crise: a mecanização e os novos méto- dos de produção causaram um grande aumento da produção. Produzia-se mais do que o necessário. Como consequência, deu-se uma baixa dos preços. A oferta cresceu mais do que a procura, entrando-se, assim, numa crise de superprodução 1 . Entre 1924 e 1929, a Bolsa de Valores de Nova Iorque (Wall Street) registou movimentos fora do comum e a especulação com ações tor- nou-se o grande atrativo do momento. Oferecia-se enriquecimento imediato e fácil a quem adquirisse ações. Na Bolsa de Nova Iorque, os títulos eram vendidos a valores muito altos e eram muitos os que arris- cavam investir. Esta situação provocou um excesso de otimismo nos investidores que chegavam a pedir empréstimos para investir na Bolsa. Como resultado da grande procura de ações, a cotação das empresas subia sem, contudo, terem aumentado os seus lucros 3 . Tratava-se, assim, de uma falsa prosperidade. Os especuladores recorriam ao crédito para pagar as ações e a situação começou a preocupar os banqueiros e os economistas. Em 1929, houve uma subida das taxas de juro, o que tornava mais difícil pagar as dívidas aos bancos. O mercado de ações abrandou e as cota- ções começaram a descer. A 24 de outubro de 1929 dá-se um crash na Bolsa de Wall Street ( crash bolsista ); este dia ficou conhecido por Quinta-Feira Negra 2 . O pânico apoderou-se dos investidores, os acionistas tentaram vender as suas ações, o valor destas baixou verti- ginosamente, mas ninguém comprou. A baixa da cotação dos títulos da Bolsa continuou e as grandes empresas metalúrgicas, como a United States Steel e a Chrysler, viram os seus índices descer, até 1932, respetivamente, de 250 para 22 e de 135 para 5. A Bolsa entrou em rutura, e a economia parou: os stocks de mercadorias acumularam-se, os preços baixaram vertiginosamente 4 , as empresas reduziram ou pararam a produção 5 . Os investidores que tinham pedido empréstimos para pagar as ações não tinham agora como os pagar: os bancos declaram falência. Sem crédito muitas empresas são obrigadas a fechar, assim, a crise alastrou-se rapida- mente. Aumenta o desemprego, diminui o consumo, baixam os preços verificando-se um processo de deflação . Entra-se, assim, num ciclo de crise, num período de depressão económica.  A mundialização da crise Após a 1.ª Guerra Mundial, os EUA tornaram-se a principal potên- cia económica do Mundo. Assim, rapidamente se sentiram os efeitos da Crise de 1929 em outros países. O governo americano cedeu eleva- dos empréstimos aos países europeus para se recuperarem após a Guerra. Os EUA importavam grandes quantidades de matéria-prima a países de África, da Ásia e da América Latina, funcionando como motor de outras economias. A dependência da economia europeia em rela- ção à americana arrastou a crise para o lado de cá do Atlântico. Quando estalou a crise, os investidores e o próprio governo ame- ricano retiraram os capitais que tinham aplicado em bancos e empre- sas da Europa e reduziram as suas importações, levando assim à falência de muitas empresas na Europa. A crise alastrou à Europa e mundializou-se 1 ; a Alemanha, a Inglaterra e a Áustria foram os paí- ses mais atingidos. A retirada dos capitais americanos originou a falên- cia de bancos 3 (o Kreditanstal, na Áustria, e o Danat, na Alemanha\...), e, consequentemente, o corte do crédito que provocou a ruína em cadeia de numerosas empresas, por não poderem pagar a importa- ção das matérias-primas. Em 1931, a libra inglesa baixou em cerca de 40% e esta desvalo- rização arrastou a descida das moedas de outros países, incluindo o escudo português. A desvalorização das moedas e a inflação dos preços desorganizaram os pagamentos internacionais, o que dificultou as relações entre países e o comércio externo. As colónias e os países menos desenvolvidos da Ásia, da África e da América Latina, exportadores de matérias-primas e de produtos alimentares, foram igualmente afetados, pois as grandes potências deixaram de importar os seus produtos. A década de 1930 ficou assim marcada por uma quebra acen- tuada da produção industrial, em todo o mundo capitalista 2 . Das grandes potências económicas mundiais, apenas a URSS não foi afe- tada, isto porque tinha um modelo económico diferente e fechado, o modelo socialista.  Da crise económica à crise social e política Proprietários, industriais, agricultores e desempregados viam as suas condições de vida degradarem-se dia após dia e, através de mani- festações e greves, exigiam com mais insistência a intervenção do Estado. O desemprego tornou-se uma realidade, provocando o agrava- mento dos problemas sociais 1 . A crise, que começou por ser finan- ceira, passou a económica e a social, trazendo profundas alterações no "modo de vida americano" que se vinha instalando nas sociedades oci- dentais desde o final da 1.ª Guerra Mundial. A crise instalou-se rapidamente abalando todos os setores da economia causando grande incerteza entre as populações. Famílias que viviam bem perdem os seus bens e veem-se sem casa, sem traba- lho e sem quaisquer meios de subsistência 2 . As pessoas esperam horas em filas para obterem alguma comida que é distribuída pelo governo. Neste clima de crise económica, aumentaram as tensões raciais, a mendicidade, a criminalidade, os suicídios e muitos outros aspetos de miséria social. Os EUA, a Europa e, por arrasto, muitos países que dependiam do comércio com estas economias do Ocidente mergulharam num ciclo de crise (excesso de produção leva à baixa de preços, menores lucros, falências, desemprego, redução do consumo, encerramento de fábri- cas por não escoarem a produção, desemprego, redução do poder de compra, redução do consumo...). A Grande Depressão de 1929 vinha, assim, pôr em evidência fraquezas do capitalismo e da democracia liberal, gerando fortes críticas de diferentes grupos:   os comunistas, animados pela revolução soviética, viam a crise como resultado das contradições do capitalismo que, segundo Marx, redundaria na crise geral do sistema e na sua autodestrui- ção; era, pois, de aproveitar o momento, intensificando a luta de classes, com vista à revolução;   os socialistas (reformistas e sociais-democratas) defendiam que, para a superação da crise, seriam necessárias profundas reformas no sistema, que proporcionassem uma mais justa dis- tribuição da riqueza, uma socialização da economia;   outros consideravam que só um Estado forte, com um chefe forte, podia "salvar" a economia e a população da ruína. Desta forma, a crise vinha pôr em causa o capitalismo liberal e o parlamentarismo, provocando o confronto de perspetivas sobre o rumo a seguir nas economias ocidentais 3 . O agudizar da crise trouxe profundas mudanças políticas, na Europa e nos EUA, nos anos 30, como veremos adiante.  O descrédito na democracia liberal O otimismo que caracterizou os primeiros anos do século XX foi, no período entre as duas grandes guerras, substituído por um pessimismo que se manifestou sobretudo entre as classes médias e os grupos intelectuais. Proprietários, industriais, agricul- tores e desempregados, viam as suas condições de vida a degra- darem-se dia após dia e, através de manifestações e greves, exigiam a intervenção do Estado na economia 1 . O desem- prego tornou-se uma realidade, provocando o agravamento dos problemas sociais. As repercussões da crise americana de 1929 travaram a recuperação económica e trouxeram grandes dificul- dades aos países europeus. A Grande Depressão de 1929 pôs em evidência fraquezas do capitalismo e da democracia liberal. Alguns grupos critica- vam fortemente este modelo económico e defendiam outras solu- ções, como o comunismo, por exemplo. A afirmação de ideias antiparlamentares  Os governos que não conseguiram ultrapassar a crise foram pos- tos em causa crescendo o apoio a ideias como o antiparlamenta- rismo, o nacionalismo agressivo e a defesa de soluções violentas e ditatoriais para os problemas colocados pela crise. Nos países derrotados na 1.ª Guerra Mundial, como a Alemanha, ou insatisfeitos com o resultado da guerra, como a Itália, a crise assu- miu formas violentas, revestindo-se de características nacionais. Daí a formação de grupos de extrema-direita, compostos por ex-militares, profissionais liberais, estudantes e desempregados pertencentes a uma classe média, que se degradava socialmente, e sensíveis aos temas nacionalistas, racistas e antiliberais. É desta forma que se explica a emergência de regimes assentes no totalitarismo , como foram os casos do sucesso do fascismo de Mussolini na Itália, no pós-guerra, e do nazismo de Hitler na Alemanha 2 . O avanço do comunismo na URSS e as crises económicas e sociais do pós-guerra, agudizadas após 1929, ajudaram a consolidar a desconfiança em relação às democracias parlamentares e à sua incapacidade governativa, justificando a adesão às doutrinas totalitá- rias, atrás referidas, por parte das classes médias, rurais e urbanas, da Igreja (que receava o carácter anticlerical e antirreligioso da esquerda), das classes possidentes e até de certas franjas do operariado indus- trial. Neste contexto, emergem pela Europa governos marcados por ideais totalitários, nacionalistas e imperialistas 3 que vão conduzir a um novo conflito mundial. Os fascismos: elites e culto ao chefe O fascismo definiu os seus princípios por oposição aos ideais das democracias liberais, afirmando-se como totalitário. Para além desta característica, a ideologia fascista fundamentou-se, ainda, nou- tras, como por exemplo:   o antiparlamentarismo, isto é, em lugar da ideia de igualdade entre os Homens, o fascismo proibia o sufrágio universal, que confere igualdade política a todos os cidadãos 3 ;   o partido único, cuja filiação no Partido Fascista de Itália ou no Partido Nazi na Alemanha, conferia ao cidadão um estatuto superior e o acesso facilitado a cargos e benesses;   o culto do chefe, ou seja, o desdém pelo sistema democrático, considerado por Mussolini "um regime sem rei, mas que o subs- titui por numerosos reis", pretendia criar um "mundo novo" 4 , personificado na figura de um líder carismático e inquestionado 3 . Hitler afirmava que a unidade do Estado se exprimia pela divisa: "Um só Povo, um só Império, um só chefe". A separação de poderes, considerada nos regimes democráticos uma garan- tia de justiça, deixou de existir;   a superioridade que reconhecia e atribuía às suas elites, arregi- mentadas nos quadros do partido único que se organizava como uma força paramilitar, com milícias armadas próprias. Os mem- bros do partido representavam para o Estado os melhores, os mais aptos e, portanto, era entre eles que se recrutavam os car- gos de maior responsabilidade no Estado e na Administração, fomentando assim a adesão dos cidadãos à organização parti- dária. Estas elites eram preparadas desde a infância pela forte propaganda levada a cabo pelo regime nas escolas e entre os jovens 1 : controlo dos programas e dos professores, criação de associações infantis e juvenis que integravam atividades recreativas, desportivas e paramilitares, através das quais os jovens eram doutrinados na ideologia do regime. A crença na superioridade das elites, às quais estes jovens acre- ditavam pertencer, patenteia a afirmação e a aceitação da desigual- dade, princípio que o fascismo defendia e promovia entre as pessoas e os grupos.  Da crise à autarcia e ao corporativismo A Itália estava a viver uma crise económica e social. Assustados com a insegurança, com a contestação operária e com a hipótese do comunismo, industriais e proprietários passam a apoiar o Partido Nacional Fascista, liderado por Mussolini. Este partido organizava milícias armadas, os "camisas negras", para perseguir de forma vio- lenta sindicalistas, grevistas e membros dos partidos de esquerda 3 . Mussolini prometia repor a ordem e recuperar a economia do país, mensagem que foi cativando cada vez mais pessoas. Em 1922, o rei de Itália, Victor Manuel III, receando uma guerra civil, convidou Mussolini a formar governo. Em 1924, realizaram-se elei- ções que, com a ajuda de diversas fraudes, deram a maioria dos luga- res no Parlamento ao Partido Nacional Fascista. Mussolini, o duce (chefe) passou a governar de forma autoritária e tornou-se senhor absoluto da Itália. As corporações italianas e a Frente do Trabalho Nacional-Socia- lista tinham como principal função manter a classe trabalhadora sob vigilância do Estado, de modo a impossibilitar a contestação social. Contra o individualismo e o marxismo, o fascismo italiano criou uma forma inovadora de regulamentar a ligação capital-trabalho e as relações socioeconómicas -- o Corporativismo . Aceitando a proprie- dade privada, mas negando o individualismo liberal, começou por orga- nizar as diferentes profissões em corporações que admitiam no seu seio dois únicos sindicatos 1 : um que reunia todos os patrões dessa profissão, a nível nacional; e outro para os operários dessa mesma pro- fissão. As corporações foram oficializadas em 1926 pela Lei Rocco e submetidas à gestão do Ministério das Corporações, criado em 1927. Substituindo o princípio marxista da luta de classes pelo da coo- peração entre as classes, o fascismo italiano proibiu as greves e os loc- kout e promoveu a ideia da autarcia . O êxito imediato do corporativismo levou Mussolini a transformar estes sindicatos fascistas em sindicatos unificados de patrões e empregados, criando, em 1934, as corporações mistas. Cinco anos depois, em 1939, a estrutura corporativa invadiu a própria orgânica do Estado italiano quando a Câmara dos Deputados foi substituída pela Câmara dos Fasci e Corporações, composta pelos altos representan- tes do partido único (o Conselho Nacional do Partido) e pelos represen- tantes das corporações mistas (Conselho Nacional das Corporações), ambos designados por Mussolini. Deste modo, o Estado fascista assumiu-se, verdadeiramente, como um Estado corporativo defensor do trabalho de todos por uma "causa comum" 2 -- a pátria.  Fascismo: a negação dos direitos e liberdades Com carácter autoritário, elitista e antidemocrático, o fascismo, os regimes totalitários, de um modo geral, visavam a adesão das mas- sas e o apoio popular, mas de uma forma pacífica e obediente, procu- rando o enquadramento das massas. Para isso, os regimes fascistas impuseram uma imagem de poder, de força, de trabalho e de ordem, planeada com o apoio de atualizadas técnicas de propaganda política, cuja ação se estendia a todos os aspetos da vida cultural do país: rádio, imprensa, espetáculos, arte, desporto 1 . Essa imagem assentava também no vincado cunho militarista do governo e do partido único (os chefes apareciam ao público de farda militar, impondo respeito e ordem), bem patente nos numerosos comícios e festejos oficiais 2 que se assemelhavam a gigantescas paradas militares, as quais leva- vam as multidões a estados de exaltação coletiva. Destinadas a cativar emocionalmente o cidadão, estas manifes- tações oficiais do poder eram acompanhadas, no dia a dia, por outras práticas de propaganda que procuravam estreitar as relações entre o cidadão e o Estado, como a filiação quase obrigatória, como já referido anteriormente. Uma vez inscritos, os cidadãos passavam a ser mais controlados pelas organizações partidárias a que eram convidados a pertencer, devendo mostrar-se militantes cumpridores e fiéis. A inscrição de todos os trabalhadores nos sindicatos fascistas era obrigatória (devido à extinção e proibição dos sindicatos livres), nos quais a defesa dos interesses dos trabalhadores estava a cargo do partido único que se encarregava de os harmonizar com os do patro- nato. Para intimidar, perseguir e punir os opositores e vigiar a popula- ção 4 , foram também criados organismos de censura e as polícias políticas 3 , como a Organização de Vigilância e Repressão Antifas- cista (OVRA) ou as milícias armadas do partido único, como os Camisas Negras do Partido Nacional Fascista. O fascismo não se limitou ao controlo político e ideológico, apro- vou também leis raciais 5 que limitavam as liberdades dos estrangei- ros, judeus e povos que considerava de outras raças ou etnias. Estas leis foram precedidas pelo "Manifesto da Raça", assinado por cientis- tas, em julho de 1838, e aprovado pelo rei Emanuel II. Estas leis preten- diam humilhar e afastar estes grupos ou seus descendentes tendo se tornado gradualmente mais rígidas. Casamentos mistos, frequência de escolas públicas, trabalho em organismos estatais e profissões liberais eram algumas das proibições impostas aos judeus, entre outros, em Itália entre 1938 e 1945. O nazismo na Alemanha Após a Guerra, a Alemanha passou a ser governada por um regime democrático que ficou conhecido por República de Weimar. Este governo sofria grande oposição, pois era acusado de ter aceitado o Tratado de Versalhes, sem defender os interesses da Alemanha, sendo responsabilizado pela situação de crise económica e contesta- ção social em que o país vivia 2 . Foi neste clima de descontentamento que um pequeno partido político se afirmou -- o Partido Nacional Socialista ou Partido Nazi 1 . Liderado por Adolf Hitler desde 1921, este partido, baseado numa forte propaganda nacionalista, reuniu cada vez mais seguidores. Defendia a ideia de uma Alemanha forte e rica, mas só para "verdadeiros" ale- mães, assumindo um carácter racista e de antissemitismo. Combatia o comunismo e a democracia em geral. Tal como acontecera em Itália, também na Alemanha estas ideias agradaram a muitos cidadãos, desgastados por anos de crise. Foi sobretudo na classe média, disposta a tudo para recuperar o seu nível de vida, que Hitler recrutou os seus apoiantes mais fanáticos. Alguns grupos de intelectuais e defensores do comunismo continuaram a ten- tar fazer-lhe oposição. O nazismo desenvolveu uma política econó- mica de protecionismo da indústria alemã. Hitler pôs em prática um vasto programa de construção de obras públicas, com o objetivo de criar emprego e aumentar o consumo, dinamizando, assim, a econo- mia. À população era pedido que trabalhasse mais para contribuir para a recuperação do país 3 . Em 1933, o presidente da República nomeou Hitler para chance- ler (chefe do governo). Nas eleições de 1934, Hitler recorreu a uma forte propaganda financiada por comerciantes, banqueiros e indus- triais e foi eleito também Presidente da República, passando a acumu- lar os dois cargos. As ideias fascistas eram veiculadas através de hábeis programas de propaganda 4 divulgados em cartazes, na rádio e na novidade da época -- a televisão. Para incutir na juventude e na população em geral as ideias do regime, foi criado todo um sistema de educação que promovia as ideias nazis e foram fundadas instituições, como a Juventude Hitleriana, os "camisas castanhas" e a Liga das Raparigas Alemãs (que as treinava para serem mães, esposas ou enfermeiras). Para intimidar, perseguir e punir os opositores instalando um "equilíbrio pelo medo", foi proibida a criação de partidos de oposição e de sindicatos e foram criados organismos de censura, uma polícia política (GESTAPO), as Secções de Assalto (SA) e as Secções de Segu- rança (SS)  controlo político, social e cultural da população No nacional-socialismo ou nazismo, a importância dada às elites assumiu um carácter radical e extremista, nascendo o mito da raça superior, a raça alemã pura ou os alemães de tipo ariano, fazendo uma apropriação incorreta do evolucionismo de Darwin, que defendia a teo- ria da transformação das espécies, de acordo com as condições ambientais e a seleção natural. Para Hitler, e para os nazis, os povos superiores eram os?

Use Quizgecko on...
Browser
Browser