Dissertação de Mestrado: A Festa do Vaqueiro de Porto da Folha (PDF)
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Universidade Federal de Sergipe
2022
José Abraão Rezende Goveia
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Summary
This master's dissertation explores the Festa do Vaqueiro de Porto da Folha in Sergipe, Brazil, examining its historical context and significance. Using primary sources and interviews, the dissertation investigates the organization and dynamics of the event over 49 years. The study aims to provide historical context and interdisciplinary learning opportunities for students.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO (POSGRAP) MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE HISTÓRIA (PROFHISTÓRIA) JOSÉ ABRAÃO REZENDE GOVEIA A FESTA DO VAQUEIRO DE PORTO DA FOLHA: CORDELIZANDO VAMOS ENSINANDO A HISTÓ...
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO (POSGRAP) MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE HISTÓRIA (PROFHISTÓRIA) JOSÉ ABRAÃO REZENDE GOVEIA A FESTA DO VAQUEIRO DE PORTO DA FOLHA: CORDELIZANDO VAMOS ENSINANDO A HISTÓRIA E ESTUDANDO O ALTO SERTÃO SERGIPANO SÃO CRISTOVÃO/SE 2022 JOSÉ ABRAÃO REZENDE GOVEIA A FESTA DO VAQUEIRO DE PORTO DA FOLHA: CORDELIZANDO VAMOS ENSINANDO A HISTÓRIA E ESTUDANDO O ALTO SERTÃO SERGIPANO Dissertação de Mestrado entregue ao Programa de Mestrado Profissional em Ensino de História da Universidade Federal de Sergipe como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Lucas Miranda Pinheiro SÃO CRISTÓVÃO-SE 2022 JOSÉ ABRAÃO REZENDE GOVEIA A FESTA DO VAQUEIRO DE PORTO DA FOLHA: CORDELIZANDO VAMOS ENSINANDO A HISTÓRIA E ESTUDANDO O ALTO SERTÃO SERGIPANO Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Ensino de História da Universidade Federal de Sergipe como parte dos requisitos à obtenção do título de Mestre em Ensino de História. Orientador: Prof. Dr. Lucas Miranda Pinheiro BANCA EXAMINADORA Orientador:__________________________________________________________________ Prof. Dr. Lucas Miranda Pinheiro Universidade Federal de Sergipe – UFS Membro interno:_____________________________________________________________ Prof.ª. Drª. Andreza Santos Cruz Maynard Universidade Federal de Sergipe - UFS Membro externo:_____________________________________________________________ Prof. Dr. Magno Francisco de Jesus Santos Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN Membro interno:_____________________________________________________________ Prof. Dr. Paulo Heimar Souto SÃO CRISTÓVÃO – SE 2022 A todos os meus familiares que sempre me estenderam a mão durante a minha caminhada profissional: minha mãe, minhas duas irmãs, meu pai e sobrinha. Sigamos fortes nas lutas da vida. AGRADECIMENTOS O momento de agradecer é o instante em que passa, em nossa mente, toda a trajetória, de ter entrado no mestrado profissional, e de perceber que durante todo esse percurso em momento nenhum estivemos sozinhos, pois, precisamos sempre uns dos outros, em todas as lutas, conquistas e dificuldades que enfrentamos na vida. Desse modo, agradeço a todos os meus familiares que sempre estiveram presentes em minha vida. À minha mãe Rosa, humilde, humana, sempre me ajudando a não perder o foco, com muito carinho e cuidando de mim, fazendo-me sentir confortável todas as vezes que descia do meu quarto, onde escrevi essa dissertação. Ou mesmo quando eu chegava do trabalho e o almoço e/ou jantar estava quentinho, gostoso, me esperando para me alimentar e bater um papo com ela, minha irmã e meu pai em nossa mesa. Tudo isso me dava um certo fôlego para manter o ânimo na pesquisa. Agradeço também à minha irmã Iara, que mora conosco em nossa casa, sempre compreensiva, determinada, disposta, que muito me ajudou, organizando minhas coisas, me incentivando a não desanimar, dando um grande suporte. A ti, mana grande, é a minha gratidão. Agradeço ainda à minha irmã Maiara, residente em Aracaju. Agradeço muito às nossas conversas, mulher sábia para enfrentar as adversidades da vida, sempre tendo um bom conselho, além de ser muito animada e contagiante no momento de tomarmos uma cervejinha. Muito obrigado, mana, você conhece a nossa história e superação. Ao meu pai, agradeço a toda nossa caminhada e as conversas descontraídas na calçada na porta de nossa residência em Porto da Folha, momento que nos relaxava através de risadas sobre assuntos diversos. À minha sobrinha, Maria Madalena, de 9 anos de idade, que sempre bem delicada colocava uma bacia com água e tirava as cutículas de minhas unhas dos pés, me possibilitando relaxar com as suas mãozinhas tocando meus pés. Exponho tudo isso, pois, acredito na união familiar, mesmo que tenhamos momentos de desentendimentos – que sempre são superados –, precisamos um do outro sempre e, na escrita dessa dissertação, vocês foram extremamente fundamentais. Meu muito obrigado, família! Ao entrar no mestrado profissional, conheci colegas de profissão, no qual aprendi muito com eles. Sempre estava atento às suas discussões e às participações nas aulas e admiro a todos, mas sempre há aqueles mais próximos, em que as conversas e risadas se estendiam nas redes sociais. Assim, obrigado pelo companheirismo Caroline, Junior, Ruy, Simone e Leila, vocês são profissionais que muito admiro, sempre disse isso em nossas conversas! Agradeço também à comissão que organiza a festa do vaqueiro de Porto da Folha- SE, por me possibilitar pesquisar os documentos da sociedade, disponibilizando fotografias, diálogos, sanando dúvidas sobre a temática que escrevia. Continuemos todos firmes e dispostos a valorizar as manifestações culturais do nosso lugar, assim como de outros lugares também. Por fim, agradeço a todos os professores do Mestrado Profissional em Ensino de História – Profihistória (UFS), pelos ensinamentos, parcerias, momentos de grandes aprendizados e discussões. Nesse sentido, lembro que fiquei muito contente quando a professora Andreza fez um comentário em uma das atividades da disciplina que lecionava, afirmando a possibilidade de utilização do cordel como meu produto no PROFHISTÓRIA. Do mesmo modo, o Professor Paulo Heimar que nos fazia refletir em suas aulas, juntamente com o professor Joaquim Tavares, sobre a possibilidade do uso de entrevistas e das fontes orais no ensino de história. Agradeço ao meu orientador, Lucas Miranda, por toda a compreensão. Sempre que conversávamos, procurava me deixar leve para que minha dissertação fosse escrita com sentimento, emoção, sempre me encorajando a seguir em frente sem desanimar, propondo força para concluir o trabalho. Ao Professor Itamar Freitas, meu muito obrigado pela longa jornada de discussões, construções e desconstruções sobre o conhecimento histórico e seu ensino em sala de aula. Foram três disciplinas cursadas e participações em cursos, entre outros momentos que o professor Itamar se dispunha a interagir e ensinar a todos da turma, meu muito obrigado. Assim, espero com essa dissertação continuar o meu trabalho com o cordel, em sala de aula, ajudando no aprendizado dos alunos, interagindo com colegas professores que buscam essa forma de escrita para utilizar também em suas aulas. Obrigado a todos os meus colegas, alunos e equipe diretiva das escolas que leciono em Sergipe e Alagoas, que acreditaram em mim, incentivando, organizando meu horário para participar das aulas do mestrado. Continuaremos juntos, muito obrigado a todos, sigamos firmes com saúde, paz e disposição para viver a vida. CORDEL MINHAS AULAS DE HISTÓRIA EM CORDEL (Cordelista José Abraão Rezende Goveia) A todos aqui presente Entre esses recursos Com alegria venho saudar O cordel se pode usar Pois chegou o grande dia Pois esse faz parte Tenho que me orgulhar Da cultura popular Trazendo esse cordel No Ensino de História Para a banca apreciar Nos ajuda a pensar Nesse trabalho tenho dito O Ensino de História E o cordel utilizado Muito tem destacado Em minhas aulas de História Sobre a história local Esse tem dado resultado Tem também estudado Sendo através dessa pesquisa Pois a realidade do aluno Um pouco mais estudado Deve ser valorizado Sou professor de História Vivemos em um mundo Do nosso alto sertão De forte globalização Trabalho em escolas Onde cada individuo Dessa bela região Mora em uma região E sobre história local As vezes migrando Vou propor uma discussão Para garantir o pão São os versos de cordel Conhecendo sua história Em minhas aulas ensinado O aluno pode ajudar Sobre diversos temas A muda a realidade Com esses tenho estudado De seu lugar de morar Ajudando os alunos Reivindicando direitos A melhorar o aprendizado Podendo participar O cordel é dinâmico A escola é o local E tem rima criativa De toda essa discussão Ajudando na leitura Propondo aos alunos De forma participativa Formas de interação Propondo aos alunos Trazendo seus contextos Discutir sobre a vida Ampliando a visão O Ensino de História Levando os alunos Passa por transformações Realidades a conhecer Onde novas abordagens Onde a história local Vem entrando nas discussões Aproxima pra valer Aos materiais didáticos Cada município e região Se propõe ampliações Sua história escrever Aqui nessa pesquisa Vamos um pouco estudar Sobre a História Do nosso lindo lugar Sendo Porto da Folha Que iremos abordar A festa do vaqueiro É sua maior atração Atraindo pessoas De toda a região Essa recebe o nome Da capital do gibão Para esse Mestrado Um folheto se produziu Em formato sextilha Sobrea festa se discutiu Contando a história De como ela surgiu A todos os leitores Fica minha gratidão Espero que gostem De toda essa discussão Pois essa história Diz respeito ao sertão RESUMO As festas, ao longo do tempo, vêm fazendo parte da história da população brasileira, com seus rituais, simbolismos, tradições, costumes, estruturas, seus significados e (re)significados, mudanças e permanências, continuidades e transformações, essas vêm sendo celebradas e transmitindo experiências sociais e culturais diversas. O objetivo desse trabalho é proporcionar, aos alunos da educação básica, conhecimentos sobre a Festa do Vaqueiro de Porto da Folha-SE, relacionando esse evento a uma construção histórica no tempo, bem como de forma interdisciplinar. Diante dessa proposta, foi realizada entre os anos de 2020 e 2022 uma pesquisa de campo sobre a referida festa, de forma a procurar entender a sua organização e dinâmica durante os 49 anos de sua existência. Com isso, fizemos um levantamento documental através da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, que organiza a festa, através de seu regimento, atas de reuniões, listas de frequências, fichas de sócios da entidade, uma entrevista, e diálogos com alguns dos seus associados, alguns moradores da cidade, alunos e lideranças religiosas do município, ou seja, realizamos um levantamento de registros fotográficos na entidade mencionada - entre seus sócios e moradores antigos, na paróquia e na prefeitura municipal -, e analisamos a legislação da Festa do Vaqueiro nas esferas municipal e estadual, assim como pesquisamos acontecimentos sobre a festa registrados em boletins de ocorrência na Delegacia de Polícia de Porto da Folha-SE entre os anos de 2009 a 2019. Nesse sentido, com esse levantamento, relacionamos o produto dessa pesquisa ao cordel, prática realizada pelo autor desta pesquisa em suas aulas de história, em que é utilizado sextilhas de cordel para ensinar aos seus alunos. Dito isto, foi produzido para esse trabalho cem páginas de um folheto de cordel formato sextilha com ilustrações sobre a história da festa do vaqueiro de Porto da Folha-SE, com o intuito de serem utilizadas pelos alunos em sala de aula. Já no tocante às vaquejadas, vaqueiros e festas populares, teoricamente discutimos com João Capistrano de Abreu (1962), Euclides da Cunha (2012), Câmara Cascudo (1984), Laura de Albuquerque Maurício (2006), José Adeilson dos Santos (2018), Giulle Vieira da Mata (2003), Maria Luíza Coelho Cavalcanti (2017), Mary Del Priore (1994). Quanto à história local, atentamo-nos para os pesquisadores Circe Bittencourt (2009), Marcos Martins (2010), Maria Auxiliadora Schimdt (2007). Analisamos, também, a BNCC e articulamos seus objetos do conhecimento à Festa do Vaqueiro de Porto da Folha-SE e ao uso do cordel em sala de aula, como parte das vivências de nossos alunos, na qual estes possam compreender conceitos, problematização e valorizem as suas histórias e desenvolvam senso crítico frente a sua realidade social, econômica, cultural e histórica. Palavras Chaves: Ensino de História- Festa do Vaqueiro- História local- Folheto de Cordel- Porto da Folha ABSTRACT The festivities, over time, have been part of the history of the Brazilian population, with their rituals, symbolisms, traditions, customs, structures, their meanings and (re)meanings, changes and continuities, continuities and transformations, these have been celebrated and conveying diverse social and cultural experiences. The objective of this work is to provide, to students in the final years of elementary school, knowledge about the Festa do Vaqueiro in Porto da Folha-SE, relating this event to a historical construction in time, as well as in an interdisciplinary way. In view of this proposal, a field research was carried out between 2020 and 2021 on the aforementioned party, in order to seek to understand its organization and dynamics during the 49 years of its existence. With that, we carried out a documentary survey through Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, which organizes the party, through its regiment, minutes of meetings, attendance lists, membership sheets of the entity, an interview, and dialogues with some of its members, some city residents, students and religious leaders of the municipality, that is, we carried out a survey of records photographs in the aforementioned entity - among its members and former residents, in the parish and in the municipal government -, and we analyzed the legislation of the Festa do Vaqueiro at the municipal and state levels, as well as we researched events about the party recorded in police reports. from Porto da Folha-SE between 2009 and 2019. In this sense, with this survey, we relate the product of this research to cordel, a practice carried out by the author of this research in his history classes, in which cordel sextiles are used to teach to your students. That said, thirty-six pages of a string booklet in a sextilla format with ilustrativos about the history of the cowboy festival in Porto da Folha-SE were produced for this work, in order to be used by students in the classroom. Regarding vaquejadas, cowboys and popular parties, theoretically we discussed with João Capistrano de Abreu (1962), Euclides da Cunha (2012), Câmara Cascudo (1984), Laura de Albuquerque Maurício (2006), José Adeilson dos Santos (2018) , Giulle Vieira da Mata (2003), Maria Luíza Coelho Cavalcanti (2017), Mary Del Priore (1994). As for local history, we pay attention to the researchers Circe Bittencourt (2009), Marcos Martins (2010), Maria Auxiliadora Schmidt (2007). We also analyzed the BNCC and articulated its objects of knowledge to the Festa do Vaqueiro in Porto da Folha-SE and to the use of cordel in the classroom, as part of the experiences of our students, in which they can understand concepts, problematize and value their stories and develop a critical sense in face of their social, economic, cultural and historical reality. Keywords: Teaching History- Festa do Cowboy- Local History- Cordel Brochure- Porto da Folha LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figuras Figura 1- Mapa do Estado de Sergipe e as divisões de suas oito microrregiões.....................58 Figura 2- Mapa do Estado de Sergipe localizando o município de Porto da Folha.................59 Figura 3- Celebração de Missa na Paroquia Nossa Senhora da Conceição, Porto da Folha-SE, 1977...........................................................................................................................................62 Figura 4- Mural pintado pelo Frei Juvenal Vieira Bomfim, no altar da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, Porto da Folha, Sergipe, 1970.............................................................63 Figura 5- Parte superior do mural pintado pelo Frei Juvenal Vieira Bomfim, no altar da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, Porto da Folha, Sergipe, 1970.......................................65 Figura 6- Parte central e inferior do mural pintado pelo Frei Juvenal Vieira Bomfim, no altar da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, Porto da Folha, Sergipe, 1970........................66 Figura 7- Parte inferior do mural pintado pelo Frei Juvenal Vieira Bomfim, destruído, no altar da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, Porto da Folha, Sergipe, 2018...............67 Figura 8- Cartazes de divulgação da festa do vaqueiro de Porto da Folha de 1984, 1985,1986, 1989 respectivamente................................................................................................................79 Figura 9- Montagem do palco oficial da 49ª festa do vaqueiro de Porto da Folha-SE, 2019.79 Figura 10- Entrega da premiação no palco oficial da festa do vaqueiro de Porto da Folha- SE em 1977.....................................................................................................................................80 Figura 11- Palco oficial com apresentações e praça lotada de pessoas na festa do vaqueiro, 2019...........................................................................................................................................81 Figura 12- Multidão na Praça da Matriz Nossa Senhora da Conceição durante shows...........83 Figura 13- Desfile de encerramento da festa do vaqueiro em Porto da Folha, 1988...............85 Figura 14- Desfile de encerramento da festa do vaqueiro em Porto da Folha, 1988...............86 Figura 15- Alvorada festiva, benção do vaqueiro e entrega da chave da cidade ao presidente da festa, 2018............................................................................................................................86 Figura 16- Alvorada festiva, mine-trio e comissão a frente do cortejo, 2018.........................87 Figura 17- Multidão acompanhando o cortejo, 2018...............................................................87 Figura 18- Grupo de mulheres Divas Viajantes a caminho da alvorada festiva da 48ª festa do vaqueiro, 2018...........................................................................................................................89 Figura 19- Curral do parque de vaquejada Nilo dos Santos, em dia de pega de boi no mato, 2018...........................................................................................................................................91 Figura 20- Vista área do parque de vaquejada, no sábado da festa, atrai uma multidão de pessoas 2018.............................................................................................................................92 Figura 21- Momento da disparada, onde os vaqueiros correm para pegar o boi, 2018...........93 Figura 22- Rainha da vaquejada de Porto da Folha, nos anos de 1975-1976..........................95 Figura 23 e 24- Etapa de montaria do concurso da rainha da vaquejada de Porto da Folha, 2016...........................................................................................................................................96 Figura 25- Etapa final do concurso e encontro de rainhas da vaquejada de Porto da Folha, 2018...........................................................................................................................................97 Figura 26- Multidão de pessoas assistindo a etapa final do concurso da rainha da vaquejada de Porto da Folha, 2018............................................................................................................98 Figura 27- Momento da benção dos vaqueiros na 49º festa do vaqueiro de Porto da Folha, 2019...........................................................................................................................................99 Figura 28- Monumentos da praça do boi, relacionado as atividades de trabalho com o gado. Porto da Folha, 2021...............................................................................................................104 Figura 29- Praças dos bois, no sábado da festa do vaqueiro. Porto da Folha, 2019..............104 Figura 30- Multidão de pessoas montadas a cavalo pelas ruas na festa do vaqueiro. Porto da Folha, 2019.............................................................................................................................107 Figura 31-- Comemoração em casa de amigos durante a festa do vaqueiro. Porto da Folha, 1973.........................................................................................................................................107 Figura 32e 33- Diversão entre grupo de amigos na 49ª festa do vaqueiro, 2019...................109 Figura 34- Grupo de zabumbeiros em meio aos participantes da festa do vaqueiro, 1975...111 Figura 35- Entrega da premiação aos vaqueiros, 1992..........................................................115 Figura 36- Entrega da premiação aos vaqueiros, 2019..........................................................116 Figura 37- Momento de paga de boi no mato por quatro vaqueiros, 2019............................117 Figura 38- Localização geográfica do Monumento Natural Grota do Angico, em Canindé do São Francisco e Poço Redondo, 2012.....................................................................................125 Figura 39 - Corrida de boi no mato na Caatinga, parque de vaquejada, Porto da Folha-SE, 2019.........................................................................................................................................126 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1- Divisão por idade dos sócios contribuintes da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, conforme ficha de cadastro de sócios 2018/2021....................................................70 Gráfico 2- Divisão por sexo dos sócios contribuintes da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, conforme ficha de cadastro de sócios 2018/2021..........................................................71 Gráfico 3- Nível de escolaridade dos sócios contribuintes da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, conforme ficha de cadastro de sócios 2018/2021....................................................71 Gráfico 4-Distribuição dos sócios contribuintes da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, por profissão, conforme ficha de cadastro de sócios da entidade 2018/2021.................72 Gráfico 5- Distribuição dos sócios contribuintes da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, local de moradia, conforme ficha de cadastro de sócios da entidade 2018/2021............72 Gráfico 6-Distribuição dos sócios contribuintes da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, que moram em residências próprias ou alugadas, conforme ficha de cadastro de sócios da entidade 2018/2021...............................................................................................................73 Gráfico 7- Total de assinaturas masculinas e femininas conforme atas e lista de presença nas reuniões na Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos........................................................74 LISTA DE TABELAS Tabela 1- Distribuição dos sócios contribuintes da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, referente a naturalidade e locais de residência, conforme ficha de cadastro de sócios da entidade 2018/2021...................................................................................................................73 Tabela 2- Ocorrências registradas no mês de setembro entre os anos 2009 e 2019...................111- 112 LISTA DE SIGLAS BNCC – Base Nacional Comum Curricular BO – Boletim de Ocorrência CEB - Câmara de Educação Básica CEBs – Comunidades Eclesiais de Base CF- Constituição Federal CHESF- Companhia Hidrelétrica do São Francisco CNE - Conselho Nacional de Educação CONSED- Conselho Nacional de Secretários de Educação DCNEF- Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental DESO – Companhia de Saneamento de Sergipe EMC- Educação Moral e Cívica IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IHGB - Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação MEC- Ministério da Educação e Cultura ONGs – Organizações não Governamentais OSPB - Organização Social e Política do Brasil PCN- Parâmetros Curriculares Nacionais PROFHISTÓRIA - Programa de Mestrado Profissional em Ensino de História SNUC – Sistema Nacional de Unidade de Conservação SSP – Secretaria de Segurança Pública STF- Supremo Tribunal Federal UC – Unidade de Conservação UFS – Universidade Federal de Sergipe UNDIME - União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação UNESCO - Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e a cultura UNIT – Universidade Tiradentes USP- Universidade de São Paulo SUMÁRIO INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 17 1. O ENSINO DE HISTÓRIA E SUA ESTRUTURA ESCOLAR NO BRASIL.......... 30 1.1 Ensino de história no Brasil para refletir............................................................................ 30 1.1.1. O Ensino de História no século XIX e XX no Brasil..................................................... 31 1.1. 2 O Ensino de História no Brasil no final do século XX e primeiras décadas do XXI..... 35 1.2. É pertinente estudar a festa do vaqueiro de Porto da Folha? O que isso tem a ver com a história local? E mais ampla?................................................................................................... 41 2.NO NORDESTE BRASILEIRO: CONTEXTUALIZANDO AS VAQUEJADAS DE PEGA DE BOI NO MATO.................................................................................................... 46 2.1. A dinâmica da festa do vaqueiro, e o diálogo com alguns intelectuais da temática.......... 46 2.1.1. Do presente ao passado a tradição de pegar o boi no mato na festa do vaqueiro........... 51 3. A FESTA DO VAQUEIRO DE PORTO DA FOLHA-SE (1969-2019)........................ 57 3.1 A localização geográfica e a população do lugar............................................................... 57 3.1.1. Porto da Folha-SE, o ambiente da festa.......................................................................... 57 3.2 A festa do vaqueiro e a tradição das pegas de boi no mato de Porto da Folha-SE............. 69 3.3 Das reuniões na Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos durante o ano: as corridas de boi no mato no sábado da festa............................................................................................ 71 3.3.1. Preparando a festa........................................................................................................... 71 3.3.2. A alvorada festiva........................................................................................................... 85 3.3.3 A escolha do gado, para correr no mato.......................................................................... 90 3.3.4. O concurso para a escolha da rainha da vaquejada........................................................ 94 3.3.5. Entre o sagrado e o profano: a benção do vaqueiro e a fé na Virgem da Conceição..... 99 3.3.6. A concentração na praça dos bois................................................................................. 103 3.3.7. No mato, nas praças, nas ruas, nas casas, no clube, no palco, assim é a festa............. 106 3.4. As pegas de boi no mato e á vegetação da Caatinga....................................................... 120 3.4.1. A Caatinga.................................................................................................................... 122 4. O USO PEDAGOGICO DA LITERATURA DE CORDEL EM SALA DE AULA, FAVORECE OS ESTUDOS DA HISTÓRIA LOCAL?................................................... 129 4.1 O uso do cordel na sala de aula: revisando a literatura.................................................... 130 4.2. Construindo sextilhas de cordel....................................................................................... 140 4.3. Os documentos Legais e as possibilidades do uso do cordel em História Local............. 142 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................... 146 REFERÊNCIAS................................................................................................................... 151 APÊNDICE A – PERCURSOS PARA A PRODUÇÃO E ILUSTRAÇÃO DO FOLHETO DE CORDEL.......................................................................................................................... 159 APÊNDICE B – PRODUTO 1: “ESTUDANDO A HISTÓRIA DO ALTO SERTÃO SERGIPANO: A FESTA DO VAQUEIRO DE PORTO DA FOLHA-SE EM UMA PELEJA DE CORDEL”..................................................................................................... 165 APÊNDICE C – A SEQUÊNCIA DIDÁTICA E O MOMENTO HISTÓRICO DE SUA PRODUÇÃO...................................................................................................................... 266 APÊNDICE D – PRODUTO 2: “ESTUDANDO A HISTÓRIA DO ALTO SERTÃO SERGIPANO: A FESTA DO VAQUEIRO DE PORTO DA FOLHA-SE EM UMA PELEJA DE CORDEL” E SUA SEQUÊNCIA DIDÁTICA............................................. 269 APENDICE E – ROTEIRO DE DIÁLOGOS COM ALGUMAS LIDERANÇAS RELIGIOSAS DO MUNICÍPIO DE PORTO DA PORTO DA FOLHA-SE.................... 293 APENDICE F – ROTEIRO DE DIÁLOGOS COM MULHERES PARTICIPANTES DA FESTA DO VAQUEIRO E DA SOCIEDADE RECREATIVA PARQUE NILO DOS SANTOS PORTO DA FOLHA-SE.................................................................................... 296 APENDICE G – ROTEIRO DE DIÁLOGOS COM SOCIOS DA SOCIEDADE RECREATIVA PARQUE NILO DOS SANTOS, EX- PRESIDENTES DA FESTA, AUTONOMOS E COMERCIANTES DE PORTO DA FOLHA-SE................................ 297 APENDICE H – ROTEIRO DE DIÁLOGOS COM ALUNOS DO CENTRO DE EXCELÊNCIA GOVERNADOR LOURIVAL BAPTISTA PORTO DA FOLHA-SE.... 298 ANEXO A – DOCUMENTOS, REGIMENTO, LEGISLAÇÃO ENVOLVENDO A FESTA DO VAQUEIRO DE PORTO DA FOLHA – SE................................................. 299 ANEXO B – TERMO DE CESSÃO DE DIREITO DE USO DO DEPOIMENTO.......... 314 17 INTRODUÇÃO Dentro da diversidade cultural, e de manifestações que ocorrem no território brasileiro, as festas populares ocupam um lugar de destaque, de modo que cada uma delas possuem especificidades nos locais, nos municípios onde são realizadas, procissões para homenagear padroeiros, festas juninas, natalinas, de reis, vaquejadas, festas do mastro, de rodeios, da colheita da uva, do feijão, o carnaval, entre várias outras - que, frisamos, fazem parte do calendário festivo do Brasil. Estas festas, além de se constituírem como momentos de descanso e lazer, também representam momentos de alegrias, descontração, frustrações, reivindicações, revanches de grupos que compõem a sociedade - estando inseridas em contextos políticos, religiosos, econômicos, simbólicos etc. Muitas vezes, tais festas mantém um laço tão estreito com os moradores de uma localidade, confundindo estes com a festividade. No Nordeste brasileiro, por exemplo, as vaquejadas se tornaram uma tradição através das corridas de pega de boi, tanto no mato como de mourão, conforme podemos observar no município pernambucano de Serrita, que realiza anualmente vaquejada de pega de boi no mato, como também no município sergipano de Porto da Folha, que há 49 anos realiza sua festa do vaqueiro. As festas de vaquejadas, por sua vez, são festividades que ocorrem em diversas partes do Brasil, durante todo o ano, de maneira que têm como finalidade comemorar as atividades de trabalhos realizadas por vaqueiros na criação e no manejo do gado, em fazendas e propriedades rurais. Ademais, no tocante às vaquejadas, devemos aludir que, normalmente, estas são realizadas em parques de vaquejadas, destacando-se no sertão nordestino os parques de caatingas fechadas, para as pegas de boi no mato. Em linhas gerais, são comemorações muito características do nordeste brasileiro, trazidas por pecuaristas e vaqueiros na época da expansão colonial século XVII, aprimorando-se no século XIX e associando às comemorações locais sertanejas, segundo afirma Santos (2018). Nesse sentido, propomos, para esse trabalho, a possibilidade dos alunos dos alunos da Educação Básica terem acesso a um material didático, que aborde aspectos da festa do vaqueiro de Porto da Folha- SE, em que estes possam obter conhecimento sobre a construção histórica desse evento, o que ela representa, o significado para a sua vida, de modo a interagir com esse acontecimento local não somente nas aulas de História, mas também de forma interdisciplinar através das disciplinas como Geografia, Ensino Religioso, Arte, Ciências, entre outras. 18 Com base nos objetivos específicos traçados para essa pesquisa, procuramos contextualizar as vaquejadas de pega de boi no mato que ocorrem no Nordeste brasileiro, em especial quanto à festa do vaqueiro - sendo esta que ocorre anualmente no município sergipano de Porto da Folha-SE. Dito isto, observamos ainda, nesse contexto, as mudanças e permanências dessas festividades nas localidades onde são realizadas, bem como as influências que estas sofrem devido aos fatores geográficos, políticos, econômicos, culturais e ambientais. Assim, possibilitando conhecer um pouco da sua dinâmica e como ela se compõe e tem se estruturado ao longo do tempo. Por fim, elaboramos um folheto de cordel, em formato sextilha, que possa ser utilizado por alunos da Educação Básica. De antemão, antes de contextualizar a escolha e definição do tema para a pesquisa, acreditamos ser de muita importância falar um pouco sobre a minha trajetória como professor de História de duas escolas de redes públicas estaduais: uma localizada no sertão sergipano e a outra localizada no sertão alagoano. Em síntese, com 14 anos de idade comecei a trabalhar em uma rede de supermercados em Aracaju. Após quatro anos nesse trabalho, pedi demissão e iniciei em um outro trabalho em um hospital da rede particular, também localizado em Aracaju, contudo, sempre tive o desejo de ter uma profissão e de cursar uma graduação em História. Em contrapartida, não poderia deixar de trabalhar, além de que os exames de vestibulares da Universidade Federal de Sergipe (UFS) eram muito concorridos e impossibilitava-me conseguir acesso. Já no ano de 2005, ainda trabalhando no hospital, resolvi fazer o vestibular da Universidade Tiradentes (UNIT) - isto é, de forma que continuaria trabalhando durante o dia e cursando Licenciatura em História à noite. Com isso, durante os três anos, o meu salário era praticamente para pagar as mensalidades e despesas com o curso, que cursei com muita dedicação, concluindo em 2009. Ao concluir o curso de licenciatura em história, sentia o desejo de atuar na minha área de formação. Mais adiante, fui demitido do hospital e, logo, iniciei as minhas atividades como professor de História em uma escola particular em Aracaju. No ano de 2012, porém, ocorreu o concurso público para o quadro do magistério da rede estadual de Sergipe, no qual participei e fui classificado, de modo a assumir o cargo em 2013, no Colégio Estadual Governador Lourival Baptista, localizado em Porto da Folha, Sergipe. Em 2013, também, foi realizado concurso público para o magistério da rede estadual de Alagoas, em que também fui classificado, assumindo a função em 2014. Desde então, tenho assumido a minha profissão de professor de História em regência de classe nas duas redes públicas de ensino. 19 Nesse sentido, a partir das experiências em salas de aula, através da convivência com os alunos - tanto do sertão sergipano, como alagoano -, percebi o quanto é desafiadora a realidade da Educação brasileira. Além disso, muito do que tínhamos aprendido na universidade, era preciso ser ressignificado para aquela realidade, ou seja, um certo ceticismo deveria dar lugar a algo mais concreto, associando a minha condição de professor e a realidade dos alunos, ali envolvidos. Depois de 8 anos de experiências ininterruptas em sala de aula, como professor de História, tenho percebido que a educação escolar é de fundamental importância para a consolidação da democracia em qualquer país. Outra percepção consiste na constatação de que, em sala de aula, as relações educativas entre professores e alunos devem ser pautadas no diálogo, nas discussões e no respeito. Assim, sempre ao me dirigir para o meu local de trabalho, algumas perguntas por parte de alguns alunos e colegas de trabalho chamavam a atenção, sendo estas sobre a importância da educação, sobre o papel do professor, do aluno, enfim, de toda a comunidade escolar. Devemos frisar, inclusive, que esses discursos aconteciam de formas variadas, de maneira a se constituírem em várias percepções sobre a escola e os acontecimentos do dia a dia da sociedade em geral relacionados à educação. Diante de alguns questionamentos dirigidos à minha pessoa, durante esses anos de experiência profissional, tenho observado que o nosso campo de atuação disciplinar ainda não é bem compreendido por alunos e colegas de trabalho. Exemplo desta impressão refere-se às muitas vezes que, no ambiente escolar, há questionamentos provocativos, a saber: Para que serve estudar História? Qual a importância de conhecer o passado para a minha vida? Para que saber sobre pessoas que já morreram se não conheço nem as que estão vivas ao meu redor? Para que conhecer sobre a História e conflitos sobre a expansão territorial, sobre capitanias hereditárias, sobre colonização? Qual o sentido disso tudo para a vida atual? Esses questionamentos devem causar reflexões nos professores de História, especialmente por desafiá-los, de modo a tornarem esse campo do conhecimento mais valorizado pelos estudantes e sociedade em geral. Para tentar responder a estes questionamentos, faz-se necessário se ter em mente um conceito de História. No entanto, isto não se constitui em uma tarefa tão fácil, visto que o seu conceito varia e não é único - tal qual as correntes do pensamento historiográfico. Em outras palavras, não existindo um conceito mais abrangente que consiga dar conta de toda a sua amplitude - uma vez que o conceito de História é complexo e falta uma unanimidade para a sua reflexão - e que consiga abarcar todos os sentidos que ela possui. 20 Diante disso, para a corrente historiográfica positivista que predominou no século XIX, a história era uma ciência comprometida com a verdade absoluta dos fatos, que não era algo fictício. Dessa forma, seus estudos deveriam ocorrer de uma forma cronológica e linear, além de que o uso das fontes históricas era limitado aos documentos oficiais em que se privilegiavam datas cívicas, acontecimentos políticos e a visibilidade de heróis nacionais. Em resumo, era uma história pouco reflexiva, cujos vestígios humanos do passado eram aqueles disponibilizados pelo Estado ou pelas Instituições Oficiais, através de seus documentos registrados cronologicamente e de forma linear (VASCONCELOS, 2012). Contudo, uma outra corrente historiográfica que surgiu nas primeiras décadas do século XX, passou a ser chamada de Escola dos Annales, que tinha como um dos seus principais membros o historiador Marc Bloch (1886-1944). No livro intitulado Apologia da História: ou o ofício do historiador, Bloch (2001) procurou responder um questionamento do seu filho sobre o que é a História. Para o autor, a princípio, a História consiste na ciência dos homens, porém esse era um conceito ainda muito vago e acrescenta: “A História é a ciência dos homens no tempo” (BLOCH,2001, p.57). A diversidade de definições que o conceito de História passa, ao longo do tempo, não encontra unanimidade entre os especialistas – tendo em vista que alguns discordam da cientificidade desse campo do conhecimento. Todavia, a análise da categoria de tempo tem se constituído como algo indispensável para o desenvolvimento de pesquisas históricas, afinal, revela ações humanas que auxiliam em qualquer reflexão histórica. Com isso, diante da realidade que nos cerca, percebemos como muitas questões presentes precisam encontrar respostas no passado por meio de leituras que sirvam de embasamento para esse entendimento. Além disso, de mesmo modo, alguns acontecimentos do presente ainda são uma continuidade do passado, como também existem acontecimentos do passado que, aparentemente, deixaram de existir são e silenciados conforme diversos interesses, precisando das pesquisas historiográficas para serem revistos ou visibilizados. Segundo Luis Fernando Cerri (2011), “o passado não está salvo das intenções do presente de dar tal ou qual significado ao tempo, aos personagens históricos, à nação. O presente - bem como o futuro - depende de um passado relativamente móvel, que possa ser relido” (CERRI, 2011, p.18-19). Como exemplo do uso do passado no presente, utilizaremos as reivindicações femininas a fim de se inserirem no mundo do trabalho, em espaços sociais, na política, através da luta por igualdade de gênero, em organizações de passeatas e manifestações por visibilidade feminina. Nesse sentido, estes movimentos sociais e feministas precisam, cada 21 vez mais, refletir sobre o passado das mulheres, para lutar no presente por sua maior participação em todas instituições e organismo da sociedade, em que historicamente mais se valorizou a presença masculina do que a feminina, de forma que a partir disso se insere a importância do ensino de História, tanto no espaço escolar quanto por meio de movimentos sociais feministas que analisam o passado com os olhos do presente. Para chegarmos a toda essa discussão devemos salientar, antes de tudo, que se faz necessário que o indivíduo conheça a sua própria identidade cultural de forma particular (a sua história), do meio em que vive, como também a identidade coletiva que forma o seu grupo e a nação (a história nacional). Para tanto, o ensino de História formal, assim como o informal, é muito importante, pois, esse extrapola o senso cognitivo, passando a fazer parte da ordem sociocultural (CERRI,2011). Dito isto, um dos desafios do ensino de história escolar é formar um cidadão com capacidade política de se relacionar e conviver com os outros. Entretanto, formar um cidadão político requer toda uma interação, no qual este intelectualmente perceba as relações entre o presente - passado – presente, e cuja história nacional deva ser contextualizada com o local e o global, de maneira a desenvolver, ainda, a “capacidade de observar, fazer comparações e identificar semelhanças e diferenças entre a diversidade de acontecimentos no presente e no passado” (BITTENCOURT, 2009, p.126). Para Luis Fernando Cerri (2011), ainda, o estudo da história pode ser refutado, questionado a todo momento e podendo se transformar. Dessa forma, a análise intelectual da história permite compreender que esse campo do conhecimento não é composto de verdades absolutas, e que o uso desse conhecimento permite se debruçar, esmiuçar sobre os diversos acontecimentos que estão ligados ao tempo, origens, vinculação de sujeitos históricos, projetos e interesses, possibilitando que a subjetividade do conhecimento histórico promova reflexão, participação, atuação e mobilização para os acontecimentos da vida em sociedade, em uma dinâmica através dos diversos sujeitos históricos e sociais. Assim, ao propormos essa discussão, o que nos chama a atenção consiste na importância dada, pelos alunos, às aulas de história, ou seja, em que alguns não estão nem um pouco atentos aos conteúdos que estão sendo abordados; já outros escutam, de forma passiva, a explicação do professor, mas não conseguem entender os conceitos do conhecimento histórico. Em outros termos, tais alunos não assimilam, nem relacionam, ao seu contexto social e de vida, essas situações, o que demonstra as dificuldades de muitos alunos de se posicionarem como sujeitos históricos, de perceberem que no ambiente e local em que vivem existe uma legitimidade da História e que isso pode ser utilizado, em sala de aula e no ensino 22 de História, como uma forma de problematizar situações que precisam ser resolvidas, percebidas, criticadas - ou mesmo criarem propostas ou projetos para solucioná-las ou reivindicá-las. Diante do exposto, sempre nos chamou a atenção as medidas que poderiam ser utilizadas para aproximar os alunos, através de sua realidade, das aulas de História, tornando estas mais interessantes e contextualizadas às suas necessidades. Com o ingresso em 2020 no PROFHISTÓRIA - Programa de Mestrado Profissional em Ensino de História da UFS, por meio das discussões promovidas pelos professores e das leituras indicadas para as aulas, percebemos que nunca teríamos uma resposta ou um método definitivo para enfrentarmos essa realidade. Desse modo, cada medida adotada poderia auxiliar na resolução de um determinado problema, porém, nem todos estariam resolvidos, cabendo a adoção de iniciativas para amenizá-los, apesar de não conseguirmos extinguir definitivamente no “chão da sala de aula”. Com isso, quando adentrei no programa do mestrado, apresentei - nas atividades, artigos e trabalhos de conclusões das disciplinas - o meu trabalho com a literatura de cordel, este tendo como objetivo aproximar as minhas aulas de História dos alunos das escolas que leciono no sertão sergipano e alagoano. A final, apesar do uso do cordel não resolver todos os problemas da realidade vivenciada por tais alunos, esta é uma forma dinâmica e criativa de escrever, em versos rimados, sobre diversos conteúdos de História, como assuntos e problematizações da realidade desse alunado, podendo ser um meio de reivindicação, denúncias, críticas, reflexões, sobre problematização desse contexto histórico. Devemos aludir, contudo, que isso não torna o cordel a solução de tudo, embora seja um meio de aprendizado, produção textual e de diversas manifestações através da arte poética. Para delimitarmos o nosso tema de pesquisa, na dissertação do mestrado, começamos a buscar uma temática para as aulas de História que estivesse ligada à realidade do nosso alunado. O município sergipano de Porto da Folha, por exemplo, está localizado na região do alto sertão, onde sempre se destacaram as atividades da pecuária extensiva e que, em diversas localidades dessa região, durante todo o ano, acontecem as práticas culturais e festivas das corridas de pega de boi no mato. A própria sede municipal de Porto da Folha realiza, desde 1969, a sua tradicional festa do vaqueiro, caracterizada pelas corridas de boi no mato. Dessa forma, ao levarmos em consideração que, no ano de 2020, a festa do vaqueiro iria completar 50 anos de sua criação, consideramos oportuno trazer essa temática para minhas aulas de História, como para a dissertação no PROFHISTÓRIA, uma vez que essa temática está inserida na realidade de meu alunado, bem como faz parte da História de parte 23 da sociedade sergipana. Salientamos, porém, que, por conta da pandemia da COVID-19, não houve festa do vaqueiro entre os anos de 2020-2021, sendo adiadas as comemorações dos 50 anos para o pós-pandemia, quando as medidas sanitárias de segurança estiverem liberadas. Todos esses acontecimentos, portanto, nos estimulou a continuar com o tema, assim como a partir do incentivo de colegas, professores da escola, do curso e do nosso alunado. Tendo como propósito aproximar minhas aulas de História da realidade do aluno no ano de 2019, antes de ingressar no PROFHISTÓRIA, produzi com uma turma de alunos do 8º ano do ensino fundamental um cordel em formato de sextilhas sobre as pegas de boi no mato na região, de forma que percebi que os alunos se sentiam envolvidos pela temática, uma vez que se tratava de algo relacionado à sua localidade. Além disso, cada indivíduo contava com a sua própria percepção sobre essas práticas culturais. Mais adiante, já matriculado no programa de mestrado, isto também me estimulou a continuar com a temática. Quanto ao cordel formato sextilha, produzido com a turma de alunos, seguem abaixo as estrofes dessas rimas retratando a tradição de corre boi no mato: Cordel pega do boi no mato no relato do vaqueiro (Cordelista José Abraão Rezende Goveia e alunos 8º Ano do ensino fundamental do Centro de Excelência Governador Lourival Baptista) É dia de vaquejada Nas quebradas do sertão Vou prepara meu gibão Enfrentando os perigos Pra corre boi no mato De pegar o barbatão Na caatinga do sertão Quando o boi sai do curral O boi é muito valente Grande é a emoção Mas derrubo com a mão Esporando o cavalo Com meu amigo de gibão Com amigos vaqueiros Levantando a poeira A serra hoje vou subir Dentro da competição Para correr boi ligeiro E ninguém me impedir Lá dentro da caatinga No parque Nilo dos Santos O boi corre sem parar Agora vou competir Com o meu cavalo Não posso desapontar Quando entro no curral Esse boi é ligeiro Com meu cavalo ligeiro Mas vou lhe derrubar Lá na arquibancada Vejo um companheiro Quando volto arranhado Que devido a idade Grande é a emoção Deixou de ser vaqueiro Pois sei que cumprir Com minha obrigação Para ser um vaqueiro De manter nessas terras Tem que ter disposição Nossa maior tradição Para correr na caatinga 24 De volta da caatinga Que pude participar Vamos comemorar Se Deus permitir Mais uma corrida Para o ano vou voltar Assim, o uso da literatura de cordel continua sendo uma prática recorrente em minhas aulas de história. Porém, as pegas de boi no mato na festa do vaqueiro fazem parte da minha infância, uma vez que não tínhamos muitos recursos para frequentar espaços de lazer e este se constituía em uma opção de descontração, como também um momento de rever amigos, vizinhos e familiares, especialmente aqueles que tiveram a necessidade de ir morar em cidades como Aracaju, a 190 quilômetros de Porto da Folha, - geralmente para trabalhar e estudar -, distanciando-se do nosso convívio diário. Outro destaque quanto às pegas de boi, consiste no fato de que é um momento de hospedar, em nossa casa, tios, tias, primos e amigos. Em linhas gerais, a festa do vaqueiro passou a se constituir em um momento de descanso e lazer, modificando nossas rotinas de estudos e trabalho, de maneira a tornar a cidade mais agitada e movimentada nos três dias de festa. No entanto, ao fazermos um levantamento de acontecimentos preliminares sobre ela, surgiu a decisão definitiva de pesquisar sobre o tema. Ademais, um fator que auxiliou nessa escolha foi a euforia com que os alunos da escola que leciono ficam nas semanas que antecedem a festa, de modo a comentarem sobre a preparação dos cavalos, sobre as atrações musicais, sobre a grandiosidade da festa, sobre a alegria e expectativas em participarem. Para Maria Auxiliadora Schimdt (2007), o estudo da história local permite a aproximação do aluno com a sua realidade, sendo está uma estratégia pedagógica que possibilita uma maior apropriação do conhecimento histórico, visto que aquilo que é ensinado é vivenciado pelo aluno que, ao observar determinados fenômenos e acontecimentos de sua localidade, cria seus pontos de vistas. Diante disso, o professor de História, atento a esta situação, deve procurar mediar o aprendizado para que o aluno interaja com o conhecimento histórico local e mais abrangente, dentro das suas experiências de vida e em grupo - tanto na escola, como também em outros espaços sociais. Os estudos na escola, acerca da festa do vaqueiro de Porto da Folha, apesar de sua importância, resumem-se às apresentações de alunos encourados (com gibão1 de couro, guarda peito, perneiras e chapéus de couro) em desfiles de 7 de setembro. Outrossim, consistem ainda em apresentações em feiras culturais sobre biografias de filhos ilustres que criaram a festa - como Frei Angelino -, construção de maquetes, encenações sobre as pegas de 1 Segundo o Dicionário Online de Português, gibão é uma vestimenta de couro utilizada pelos vaqueiros que pastoreiam gado. Disponível em: https://www.dicio.com.br/gibão/ Último acesso em 20/01/2022. 25 boi no mato, assim como nas construções de cordéis, conforme já mencionado neste trabalho. Todavia, é preciso problematizar mais essa festividade, uma vez que existe uma variedade de público e de interesses inseridos neste espaço. Nesse aspecto, mesmo tais estudos realizados nas escolas sendo importantes, estes geram exclusão de parte de segmentos da sociedade porto-folhense que participam da organização da festa, visto que é de grande proporção e envolve um grande público. Uma outra problemática diz respeito à forma como a festa é estudada de forma isolada, parecendo que esta acontece dentro de uma “bolha” desconectada de outros acontecimentos e lugares, tornando-a com um aspecto autossuficiente. Em resumo, tudo isso desfavorece o processo de aprendizagem dos alunos que, sem relacionar tais acontecimentos às situações mais amplas, não entendem os processos de continuidades e transformações que a referida festa sofreu e vem sofrendo ao longo de sua existência, ou seja, a sua historicidade. Assim, diante da necessidade de estudos mais aprofundados sobre a festa, procuramos utilizar um recurso metodológico através de levantamentos de obras sobre a temática, em que percebemos que são poucas as pesquisas sobre o tema. Contudo, os materiais encontrados serviram de subsídio para essa pesquisa, ajudando-nos na busca de um conceito e da historicidade do evento, isto é, possibilitando modificar um cenário no qual muitos envolvidos com a festividade acabam excluídos, em especial quando a história da festa é contada em eventos na escola e em outros espaços. Nessas obras levantadas sobre vaquejadas, seus registros, e locais onde estas ocorrem - destaca-se o Nordeste brasileiro -, verificamos o envolvimento de questões ambientais, em que buscamos dados em sites governamentais brasileiros. Para entendermos os bastidores da festa, recorremos a uma pesquisa de campo através de registros feitos pela Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos 2, em atas de reuniões mensais, listas de frequência de sócios, dados cadastrais em fichas de sócios, diálogos com associados, de modo a procurarmos entender a organização e a amplitude do festejo, recorrendo também às nossas lembranças pessoais, uma vez que sempre participamos da festa desde a infância. Ademais, também analisamos boletins de ocorrência registrados entre os anos de 2009 a 2019 na Delegacia de Polícia, situada no município de Porto da Folha-SE, relatando acontecimentos que envolveram a festa ou em decorrência dela. Atentamo-nos, ainda, para as informações contidas no regimento da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, como em legislações municipais e estaduais, em que 2 Localizada a Rua Antônio José Pereira, 127, Centro, Porto da Folha, Sergipe. 26 podemos perceber como a festa do vaqueiro foi sendo incorporada, consolidada e, gradativamente, adquiriu importância para o governo municipal e estadual. Outro fator relevante é que também incluímos, nesta pesquisa, diálogos com lideranças religiosas do município (católica, evangélica e do espiritismo). Com isso, podemos perceber seus argumentos, pontos de vista, fundamentos e como participam ou não da festa do vaqueiro no território porto-folhense. Na intenção de verificarmos transformações e permanências na dinâmica da festa e contextualizá-la quanto à história local, de modo a facilitarmos o nosso trabalho de ilustração no folheto de cordel formato sextilha, fizemos um importante levantamento de registros fotográficos junto ao acervo da Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos, junto a antigos moradores e sócios do parque de vaquejada, acervo paroquial e municipal. Com base nesse levantamento e mediante o contexto de informações obtidas, foi realizada uma produção de cem páginas de um folheto de cordel em formato de sextilhas, sendo as estrofes acompanhadas por ilustrações em que foi entregue um roteiro a um desenhista Gladston Barroso e cujas ilustrações e versos estão relacionadas aos acontecimentos da festa. Em síntese, essa aproximação entre as estrofes de sextilhas e as ilustrações tem como objetivo melhorar a interpretação e compreensão do festejo, tornando-o mais didático para os alunos da Educação Básica e, assim, produzindo um material que refletisse o resultado da pesquisa. Além disso, as estrofes do folheto de cordel foram produzidas pelo autor da dissertação e cordelista, José Abraão Rezende Goveia; já a ilustração foi de autoria de Gladston Barroso e a diagramação feita por Adilma Menezes. Quanto ao aspecto do folheto, aludimos que traz uma narrativa que acontece através de uma peleja 3(batalha) entre dois jovens estudantes do ensino fundamental (Antônio e Beatriz), que resolvem apresentar, na semana cultural da festa do vaqueiro de Porto da Folha, a História da festa em formato de versos de cordel, de modo a provocar a peleja no palco oficial da festa. Para a construção dos versos, os estudantes recorreram ao seu professor de História, que usa em suas aulas o cordel como ferramenta pedagógica. Assim sendo, este ajudou os dois alunos a fazerem os levantamentos bibliográficos referentes à festa, bem como auxiliou na construção dos versos rimados. Os dois alunos envolvidos na peleja são fictícios, acontecimento que não impede de estar relacionado a fatos reais, uma vez que muitos cordelistas utilizam as pelejas para versar 3 Segundo o Dicionário Online de Português, peleja é a ação ou efeito de pelejar; ato de combater, de batalhar, de discutir. Disponível em: https://www.dicio.com.br/peleja/ Último acesso em 20/01/2022. 27 sobre diversos assuntos. Nesse caso, especificamente, pretendemos que esse folheto de cordel proporcione ensino e aprendizagem aos alunos, especialmente no que se refere a um aspecto da história local que são as festas populares - aqui, a Festa do vaqueiro de Porto da Folha, Sergipe. Devemos frisar, ainda, que, mesmo já fazendo uso do cordel em minhas aulas de história, alguns questionamentos surgiram para a reflexão, tais como: Será que um folheto de cordel, sobre uma festa popular, constitui-se em um instrumento pedagógico capaz de facilitar o ensino e a aprendizagem nas aulas de História? É possível um cordel que faz uso de alunos fictícios ser algo capaz de ampliar a concepção que os alunos da Educação Básica têm do ensino de História, de modo que se reconheçam como sujeitos históricos? Nesse aspecto, buscando refletir e discutir sobre os questionamentos apontados nessa pesquisa, dividimos esse trabalho em quatro capítulos. O primeiro capítulo é chamado de “O Ensino de História e sua estrutura Escolar no Brasil”, em que apresentamos algumas discussões e reflexões sobre o papel do ensino de História em períodos anteriores e na contemporaneidade, seus limites, possibilidades e desafios, no ambiente escolar e seus reflexos em outros espaços sociais. No primeiro capítulo também abordamos como esse componente curricular foi se construindo, estruturando-se e se modificando ao longo do tempo no Brasil, enfrentando inclusive períodos de governos imperiais, republicanos, democráticos e de regimes ditatoriais. Assim, este tópico mostra, na atualidade, a importância de fazermos usos de formas individuais e coletivas da História local, contextualizando está com festas populares, em que nas aulas de História os alunos tenham a possibilidade de desenvolver conhecimentos sobre a sua realidade, contextualizando acontecimentos mais amplos em um mundo globalizado. Para essa discussão e empreitada, ainda quanto ao primeiro capítulo, estabelecemos um diálogo através da escrita e do pensamento teórico de intelectuais ligados ao ensino de História, a saber: Catelli Junior (2009), Circe Bittencourt (2009), Cristina Meneguello (2019), Elza Nadai (1992/1993), Luiz Fernando Cerri (2011), Marcos Martins (2007), Maria Auxiliadora Schimdt (2007), Selva Guimarães Fonseca (2003), entre outros. No segundo capítulo, “No nordeste brasileiro: contextualizando as vaquejadas de pega de boi no mato”, apresentamos ao leitor, por meio de referenciais teóricos em obras, dissertações e teses, as principais características das vaquejadas de pega de boi no mato no Nordeste, assim como essas são organizadas e realizadas e, sobretudo, estão relacionadas a um contexto histórico em que, desde o período colonial, nas margens de rios como o São Francisco, o gado era criado à solta, e os proprietários de fazendas mandavam seus vaqueiros irem atrás do gado no mato. 28 Neste capítulo, ainda, é possível perceber que essas festas ocorrem em várias partes do Nordeste brasileiro, como no município pernambucano de Serrita4. No século XIX foram se estruturando até mais recentemente ser alvo de discussões no Supremo Tribunal Federal- STF, no tocante à sua legalidade e ao uso de animais e maus tratos. Em outros termos, nesse sentido, dividindo a sociedade entre os que a defendem como manifestação cultural, e os que defendem os animais. Dito isto, recorremos aos trabalhos como os de João Capistrano de Abreu (1962), Euclides da Cunha (2012), Câmara Cascudo (1984), Laura de Albuquerque Maurício (2006), José Adeilson dos Santos (2018), Giulle Vieira da Mata (2003), Maria Luíza Coelho Cavalcanti (2017), entre outros. Quanto ao terceiro capítulo, este ficou com o seguinte título “A Festa do Vaqueiro de Porto da Folha-SE (1969-2019)”, no qual tratamos de forma detalhada da festa do vaqueiro e as pegas de boi no mato que ocorrem no município sergipano de Porto da Folha. Nessa parte da pesquisa, tratamos de aspectos geográficos e históricos em que ocorrem os festejos. Apresentamos, também, como se dá a organização da festa no decorrer de cada ano pela Sociedade Recreativa Parque Nilo dos Santos e abordamos, ainda, os principais acontecimentos dos três dias de festa, conforme ocorria e ocorre a escolha da rainha da vaquejada. Enfim, tratamos de mudanças, permanências, continuidades, transformações que a festa vem passando ao longo do tempo. Ademais, no terceiro capítulo, abordamos a relação que a festa tem com o bioma da caatinga, tendo em vista que as pegas de boi no mato acontecem em parques de vaquejada cobertos por essa vegetação, e o município está localizado geograficamente onde predomina a Caatinga, aproveitamos a oportunidade para discutir a importância desse bioma para o planeta - e mesmo o parque de vaquejada Nilo dos Santos não sendo uma unidade de conservação, o fato dele manter preservado a vegetação nativa da região favorece a adoção de práticas sustentáveis, bem-estar das pessoas, local de descanso, diversão e lazer. Todos esses debates tiveram como base os estudos de autores como Martinho Nantes (1979), Francisco Carlos Teixeira da Silva (1981), Felisbello Firmo de Oliveira Freire (1906), Idenilson Albuquerque (2019), Manoel Alves de Souza (2015), Mary Del Priore (1994), entre outros. No quarto e último capítulo, abordamos sobre o uso do cordel em sala de aula, com o seguinte título “O Uso Pedagógico da Literatura de Cordel em Sala de Aula, favorece os estudos da História Local?”, fazendo um levantamento e revisão de obras dedicadas ao 4 Onde ocorre a missa do vaqueiro e na semana anterior à missa, ocorre a feira e a festa do vaqueiro, com diversas manifestações como a vaquejada de pega de boi no mato. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pe/serrita/historico. Acesso em: 20/01/2022. 29 emprego do cordel como recurso didático e pedagógico, a partir do qual percebemos os ganhos na aprendizagem que se pode obter, por meio do uso criativo de uma arte sequencial nas aulas de qualquer disciplina - nesse caso, especificamente no âmbito das aulas de história. Para esse debate, devemos salientar, recorremos aos posicionamentos defendidos por autores como Ana Cristina Marinho e Hélder Pinheiro (2012), Verônica Diniz da Silva (2016), Claudia Zilmar da Silva Conceição e Carlos Magno Gomes (2016), Maria Conceição Evaristo (2001), Ary Leonan Lima Santos (2018), entre outros. Ainda no tocante ao quarto capítulo, discutimos sobre o uso do cordel e da História local relacionando a alguns documentos legais que normatizam a legislação educacional brasileira e em Sergipe, a exemplo da BNCC, da LDB e do currículo de Sergipe, nos quais foram possíveis observar as dificuldades relacionadas a esse ensino local nesses documentos. Dito isto, aludimos que, mesmo existindo essas limitações na legislação, é importante e imprescindível os professores de História, em sua área de ensino, estabelecerem articulação entre a História da localidade do seu alunado aos contextos mais abrangentes e globalizantes. 30 1. O ENSINO DE HISTÓRIA E SUA ESTRUTURA ESCOLAR NO BRASIL 1.1 Ensino de história no Brasil para refletir O ensino de História no Brasil tem uma trajetória pautada em dimensões históricas que envolvem uma lógica política, econômica, cultural, social e também religiosa – que muitas vezes privilegia uma minoria detentora do poder em detrimento a uma maioria que fica às margens do processo educacional. Quanto a esta última parcela, a maioria, mencionamos que ela continua sofrendo com as desigualdades que persistem no país. Diante do exposto, o olhar, por parte do professor de História - em perceber que a estrutura desse ensino foi causadora de exclusão - precisa ser conhecido e analisado por esses profissionais constantemente, para que suas práticas em sala de aula, na atualidade, sejam constantemente repensadas e se tornem as mais inclusivas possíveis. De forma tradicional, o ensino de História no Brasil seguiu um percurso em que, comumente, os conteúdos da disciplina eram transmitidos de maneira que levava o aluno a decorar o assunto ou, ainda, a preparar a cola para ser utilizada no dia da prova. Quanto aos conteúdos, estes não faziam sentido para a vida do aluno, tampouco para a construção de uma consciência histórica, crítica, reflexiva, que fosse importante para ele atinja objetivos significativos ou mesmo para lutar por mudanças nas localidades em que vive - região ou país. Com isso, a disciplina História era vista, por muitos, como odiosa, distante de sua realidade, sem sentido. A pesquisadora Elza Nadai, na década de 1990, escreveu um texto sobre o percurso do ensino de História no Brasil. Em parte do escrito, a autora faz o seguinte questionamento: “Terão os estudantes superado a ideia de que a História, como é ensinada, é realmente odiosa, os professores partido para a organização de outras práticas pedagógicas mais significativas?” (NADAI 1992/1993, p.143). Com isso, a pergunta de Nadai (1992) ainda serve para a segunda década do século XXI, pois, muitas escolas públicas e professores continuam sem recursos didáticos e pedagógicos adequados para a melhoria do ensino. Na atualidade, a postura de alguns alunos também chama a atenção sobre como o ensino de História continua sendo praticado, uma vez que, quando propomos a leitura do livro didático, alguns afirmam ser chato e se fazemos um resumo do assunto no quadro, com os principais tópicos, alguns afirmam que o professor somente escreve e não explica. Além disso, se levamos um filme sobre determinado contexto histórico, então nos afirmam que a escola não dispõe de meios adequados para projetá-lo, fazendo-nos perder tempo da aula 31 arrumando o espaço para adequar a turma para a execução deste recurso. Em resumo, essas situações, entre outras, levam alguns alunos a terem uma impressão negativa quanto a esse campo de conhecimento, além de ficarem dispersos durante a aula. A estrutura do ensino de História tem uma trajetória em que as críticas e a desvalorização, que partem de alguns discentes, façam parte da persistência de um ensino mnemônico, de uma relação hierárquica entre professor(a) e aluno(a), da falta de uma estrutura adequada na escola que permita ao professor o desenvolvimento com maior eficiência na formação de sujeitos conscientes. Apesar das tentativas de muitos professores de História, que buscam dinamizar suas aulas, criando recursos didáticos, pesquisando materiais, jogos, filmes, ilustrações, fotografias, cordéis, que chamem a atenção do aluno para a aula, essas atitudes ainda não são suficientes. Afinal, em uma sala de aula, cada aluno tem suas especificidades, interesses, gostos, compromissos ou não com os estudos, além de que nem todos gostam ou encontram sentido na História ensinada, o que deve ser respeitado. Dessa maneira, cabe ao professor, nas suas atribuições e obrigações, continuar persistindo para tornar o ensino de História significativo para o seu alunado, dando-lhe sentido, contextualizando com a realidade vivida no chão da escola. 1.1.1. O Ensino de História no século XIX e XX no Brasil O ensino de História, desde o século XIX, esteve presente nas escolas primária e secundária no Brasil. Sua principal característica é a constituição da “identidade nacional” com métodos e conteúdos para atingirem esses objetivos (BITTENCOURT, 2009). Tratava-se de um ensino baseado em personalidades políticas, heróis nacionais, em que ocorria variação a depender do contexto sociopolítico e servia para a formação do império brasileiro, cuja parte significativa da população não tinha acesso a essas instruções. Existia o ensino da História pátria de forma optativa, e o ensino da História sagrada, em que as narrativas valorizavam “os grandes homens”. Quanto a estes, eram vistos como exemplos que os discentes deveriam seguir. Ademais, baseava-se em um modelo eurocêntrico de ensino, no qual se valorizava a ordem, a obediência às hierarquias, de forma que os colonizadores portugueses eram vistos como pessoas que tiveram um papel somente benéfico na formação da nação. Nesse passado, ainda, conforme esse ensino, a trajetória de vida de índios, negros, mulheres, não aparecia, isto é, tais trajetórias eram silenciadas em uma historiografia linear, em que os fatos deveriam ser narrados tal qual aconteceram, baseados em documentos oficiais. 32 Em 1838, no Colégio Pedro II, foi introduzido no ensino secundário e na grade curricular a disciplina História. Daí por diante esta passou por transformações em seus conteúdos e métodos, de modo que fazia parte tanto do currículo das humanidades clássicas, como do currículo científico. Entretanto, suas características ficaram inalteradas e esse ensino tinha como finalidade “domesticar”, civilizar e homogeneizar os indivíduos para a formação de uma identidade nacional. Os estudos da disciplina História se dividiam em História antiga, medieval, moderna e contemporânea, além da História sagrada. Além disso, tal disciplina fazia parte do currículo humanístico clássico e não tinha uma finalidade prática imediata, de maneira que atendia aos interesses da elite como uma forma de destacar os letrados e os iletrados (BITTENCOURT,2009). Assim, existiam entre o final do século XIX e início do século XX o ensino secundário nas escolas públicas, privadas e confessionais (essas existiram até a década de 1950). Nestas escolas, ainda, estudava-se o latim e os textos da literatura clássica, mas em 1850 a História da pátria foi separada da História geral, atendendo aos interesses de uma minoria que se mantinha no poder e instituiu as mudanças nos currículos escolares. O final do século XIX foi marcado por mudanças significativas na vida das pessoas, principalmente da burguesia que passava por um processo de modernização e industrialização. Tais mudanças afetaram a educação, já que essa elite burguesa exigia a implantação de novas disciplinas no currículo a fim de atender seus interesses. Entre essas disciplinas, destacavam-se Matemática, Física, Química e Biologia, de forma que esta inclusão consistia em uma crítica ao modelo de currículo humanista em decorrência da industrialização, que se fortalecia na Europa e norte da América. Diante disso, dois modelos de currículo acabaram se articulando, cuja História acabou se separando definitivamente da História sagrada, mas continuou a ser um meio de conhecimento direcionado às elites, sendo esta vista como a única capaz de direcionar a nação ao progresso. Fonseca (2006) afirma que somente em 1930 esse modelo de ensino - que privilegiava a classe de pessoas brancas, dos heróis nacionais e datas cívicas marcantes - começou a ser contestado, isto devido a uma corrente de professores ligados a ideias anarquistas. Nesse período também foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, que passou a escolher os conteúdos escolares que seriam trabalhados nas escolas do Brasil. O Ministério supracitado centralizava, em suas mãos, essas escolhas, em que pouca coisa se alterou em relação ao ensino de História, isto é, que permaneceu com características mnemônicas. O ensino de História, entre o final do século XIX e início do século XX, obedecia a um modelo conhecido como catecismo, no qual o aluno deveria aprender de forma decorada a 33 se expressar - tanto de forma escrita, como de forma oral. Diante disso, caso cometesse erros ou tivesse comportamentos considerados inadequados, os alunos estavam passíveis de punições. Em outras palavras, apreender história era saber de cor nomes, datas, fatos, ou seja, não consistia em um ensino reflexivo, mas de aplicação de métodos tradicionais, mnemônicos (BITTENCOURT, 2009). A partir de 1930, fundamentados na psicologia cognitiva, surgem no Brasil os Estudos sociais, de modo que com essa proposta de ensino se valorizava a aproximação da criança quanto à sua realidade social. Para tanto, o ensino deveria aproximar o tempo e o espaço como forma de inserção do aluno. Devemos salientar, também, que o modelo era adotado pelas escolas americanas e, posteriormente, a lei 5.692 de 1971 implantou os estudos sociais em outras séries, substituindo História e Geografia – que passavam a ser estudados e discutidos de forma mínima e sob o controle do Estado ditatorial. Em 1971, a lei 5.692 descaracterizou o ensino secundário, fazendo com que o ginasial fizesse parte do primário e o colegial se tornasse uma espécie de curso profissionalizante. Nesse momento, inclusive, foram instituídos os estudos sociais, em que foram fundidas as disciplinas de História e Geografia, e criadas as disciplinas de OSPB- Organização Social e Política do Brasil e EMC- Educação Moral e Cívica, nos oito anos do ensino primário. Quanto a esta implementação, nas aulas dessas disciplinas era comum ainda que os professores solicitassem, aos alunos, que desenhassem e pintassem os símbolos nacionais, bandeira, brasão, personalidades políticas, de maneira que alguns desses trabalhos eram utilizados em desfiles cívicos na comemoração da independência no dia 7 de setembro. Schimidt e Cainelli (2009) afirma que o ensino de História continuou sendo ensinado no segundo grau, porém, de forma bastante reduzida, tendo em vista que para quem cursava o curso técnico em contabilidade e administração, por exemplo, somente estudava a disciplina no primeiro ano. Já no curso cientifico, no entanto, o ensino de História continuava atendendo aos interesses das elites, e sobre a tutela do regime militar (1964-1985). Da mesma forma que no ensino de primeiro grau, no segundo grau os métodos se tornaram mais ativos em substituição aos mnemônicos, contudo, as aulas eram realizadas e centralizadas pelos professores, de modo que se exigia muitos conteúdos, leitura, aplicação de questionários. No tocante às provas, estas aconteciam geralmente aos sábados, visto que os alunos deveriam ser preparados para vestibulares. Segundo Bittencourt (2009), essa grande quantidade de conteúdo que os alunos deveriam estudar propiciava o uso da “cola”, isto é, as aulas continuavam decorativas, em que até mesmo as disciplinas de exatas, que deveriam ser realizadas em laboratórios, passaram a ser decoradas. 34 Na década de 1960, as escolas passaram a desenvolver estudos do meio e a utilizar outros instrumentos de ensino. Essa situação passou a ser controlada pelo governo militar, que instituía que qualquer ato contrário ao governo poderia ser considerado como subversivo à ordem e ser enquadrado enquanto crime de lesa pátria. Dito isto, o ensino de História nesse período ficava sob o critério da instrução nacional, em que predominava a tentativa de implantação de um ensino que seguisse a ordem, às normas e às regras militares. Com efeito, os direitos e garantias individuais eram limitados e, caso ocorressem acontecimentos considerados contrários ao regime, o indivíduo poderia ser preso, exilado, torturado ou morto. É somente na década de 1970 que a igreja católica, os movimentos ligados à teologia da libertação, as universidades em 1980, estudantes, intelectuais e outros setores da sociedade começam a lutar para combater o regime ditatorial, que governou o Brasil durante mais de vinte anos (CERRI,2011). Após o período da ditadura militar no Brasil (1964-1985), começou a ocorrer no país discussões sobre propostas curriculares mais inclusivas, cujas escolas passaram a se tornar um local de debates, aprendizado crítico e reflexivo, ideal para superar o tempo sombrio do período militar. Assim, o ensino de História, nesse contexto, deveria se tornar mais inclusivo e abrangente com estudos sobre política, economia, cultura, sociedade, identidade, em que os indivíduos têm os seus ideários e devem lutar por justiça, liberdade, igualdade, melhorias sociais, de moradia, saneamento básico, escolas de qualidade, entre outros. Segundo Bittencourt (2009), a década de 1980 trouxe reflexões importantes sobre reformulação curricular. Desse modo, os debates acerca dos conteúdos que deveriam ser mantidos ou substituídos ganham força nesse período. De um lado, havia grupos que defendiam a manutenção dos mesmos; do outro, aqueles que viam a necessidade de conteúdos que abrangessem o alunado das camadas mais populares, ou seja, defendiam os conteúdos tradicionais considerados importantes, mas com a inserção de outros conteúdos com temas mais significativos para os alunos, com uma visão maior de mundo. As discussões dos temas recaem sobre os conteúdos mais adequados para os alunos das escolas públicas. Quanto às escolas das elites, existia jogos de interesse, bem como existia ainda a necessidade de mudança, uma vez que a escola passa a ser vista não apenas como um local de transmissão de conteúdo, mas também como espaço de reflexão sobre a vida em seus diversos aspectos. Analisar um pouco o percurso do ensino de História no Brasil nos faz refletir que esta disciplina, por muito tempo, coexistia em torno dos interesses de quem detinha mais recursos 35 e deixava na exclusão aquelas narrativas que não possuíam validação social, de maneira que esse ensino vivia subjugado a um status quo de obediência quanto a quem obtinha poder. Nesse sentido, o ensino da disciplina atendia a quem tinha notoriedade nacional, privilégios e é isso que se verifica no ensino dessa disciplina durante o século XIX e em boa parte do século XX. No final deste último, devemos aludir, o ensino de história passa por transformações, tendo uma nova importância em ampliar os temas abordados nas aulas, despertando o aluno para um olhar do mundo crítico, participativo e consciente de seu papel como um sujeito histórico ativo, na construção da história. Diante do mencionando, faz-se cada vez mais necessário que nós, professores de história, tenhamos um olhar atento para que determinadas práticas e conteúdos, que podem causar exclusão, não se repitam em sala de aula. Em síntese, é necessário levar o nosso aluno a reconhecer a si mesmo como parte do processo histórico, como o reconhecimento do grupo ao qual este pertence e poder ajudá-lo, também, a transformar uma determinada realidade. O ensino de História deve conduzir, portanto, os estudantes às práticas democráticas, de alteridade, respeito e de não submissão a quem procurar se perpetuar no poder. No tocante ao professor, importante frisarmos que, enquanto profissional, este deve se atentar às possibilidades de recursos que podem auxiliar a melhorar esse ensino, conforme o que estamos tentando fazer nesse trabalho. 1.1. 2 O Ensino de História no Brasil no final do século XX e primeiras décadas do XXI A trajetória do ensino de História, na atualidade, exige do professor provocar no aluno a percepção de que o processo histórico é repleto de continuidades e rupturas, e que essas são categorias de análise, em que a primeira conduz à existência de determinados acontecimentos do passado no presente; e a segunda introduz a cisão desse processo, trazendo alterações de forças que impedem que momentos do futuro não sejam igual ao presente. Em resumo, são essas as categorias de análise, continuidade e rupturas, permanências e mudanças, transformações dos processos históricos, que tornam inteligíveis as ações do homem no tempo (MENEGUELLO, 2019). Assim, um ensino de História que não esteja atrelado às transformações sociais, que reflita a realidade do aluno, que o ajude a se construir enquanto cidadão de direitos e deveres, para com o meio em qual vive, causando impactos visíveis, é passível de questionamento pelos alunos, de forma a tornar esse campo de conhecimento pouco atrativo para estes. Um outro acontecimento que afeta o ensino de História está no âmbito do político, econômico e 36 social, que passamos a enfrentar na última década com a perda de direitos sociais que levaram anos para serem conquistados com muita luta – e, salientamos, estamos perdendo nesta década. Tais acontecimentos também estão atrelados ao contexto da globalização, que é apontada de forma simplificada por Silva e Silva (2010) como “um processo de integração global, definindo-se como a expansão, em escala internacional, da informação, das transações econômicas e de determinados valores políticos e morais” (p.169). Esse fenômeno tem impactado de forma direta todas as pessoas, incluindo os alunos, que têm passado a conviver com pessoas de diversas partes do mundo, especialmente em decorrência das necessidades econômicas, ou seja, muitos trabalhadores têm migrado do seu local de origem para outros, inserindo-se e, muitas vezes, modificando aspectos dos costumes e da cultura local, produzindo identidades plurais, às vezes contestadas, e gerando, não raro, desigualdades (WOODWARD, 2014). No Brasil, a década de 1990 foi marcada pela adoção de políticas neoliberais, sobretudo no governo de Fernando Henrique Cardoso, inserindo-se no contexto da “nova ordem mundial”, cujas práticas consistiam em: (...) retomada do liberalismo do século XIX, que defende, sobretudo a tese do Estado mínimo, ou seja, menor intromissão de Estado no mercado e na economia. Os neoliberais acreditam na hegemonia do setor privado na desigualdade social como algo positivo para desenvolver a concorrência, selecionando os competitivamente mais aptos (SILVA; SILVA,2010, p.171). Nesse período se realizou e muito se falou sobre privatizações no Brasil. Nessa seara, podemos mencionar vários setores e instituições, inclusive Universidades públicas, de modo a provocar manifestações de movimentos sociais, sindicatos, sociedade civil, que passavam a lutar por uma educação de qualidade e pública, e que esta atendesse a todos, sem distinção de classes. Seguindo o que estabelece a constituição federal de 1988, em 1996 foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN). Desse modo, através dessa Lei, o ensino de História do Brasil passa a ser marcante na definição do marco que subsidia a composição do conteúdo escolar e dos livros didáticos na área de História, a saber: Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela. [...] 37 § 4º. O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígenas, africana e europeia (BRASIL, 1996, Art.26) Nesse sentido, as mudanças que percebemos nos livros didáticos de História partiram de reivindicações, de movimentos sociais, professores, que percebiam a necessidade de um ensino de História que abordasse temas que não eram estudados em um passado recente. Estas pressões recaiam sobre os legisladores e governantes que foram impulsionados a realizarem acordos para a aprovação de uma legislação mais inclusiva, participativa e heterogênea, no trato com a diversidade social brasileira, porém, na prática muita coisa precisou, e ainda precisa ser feita, para que a lei alcance os efeitos desejados. Em consonância com a aprovação da LDBEN, são publicados, em 1997, os PCN- Parâmetros Curriculares Nacionais, com a definição dos conteúdos das disciplinas escolares nas escolas, bem como a preposição de temas transversais a serem desenvolvidos no interior das mesmas. Em 1998, a Câmara de Educação Básica (CEB), do Conselho Nacional de Educação (CNE), aprovou a resolução que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental (DCNEF). Com isso, a aprovação da legislação na década de 90, do século XX, estruturava a organização de um ensino, incluído o de História, cuja pluralidade de ideias e de concepções pedagógicas fossem respeitadas na elaboração dos livros didáticos. Dessa maneira, não mais poderia predominar o pensamento de uma ideologia única, e nem autoritária, dos governantes que estivessem no poder. A partir desta conquista – e por meio dos setores, da sociedade civil, sindicatos, professores, movimentos sociais, entre outros –, foi possível promover, em sala de aula, reflexões e debates cada vez mais pautados nos princípios democráticos e de construção da cidadania. Todavia, a globalização está inserida nesse contexto, em que aproxima os indivíduos – por meio do comércio, da informação, comunicação, transportes –, assim como também gera o individualismo, a competitividade e as buscas aceleradas de obtenção de lucros. Com a globalização, ainda, acentuam-se as desigualdades e estas afetam os alunos de muitas escolas públicas, a exemplo dos que estudam em Porto da Folha, Sergipe. Assim sendo, os avanços tecnológicos fazem, muitas vezes, as pessoas desprezarem o que é considerado velho, o que, de certa forma, impacta o ensino de História, que passa a ser considerado coisa antiga, do passado, sem importância, desvalorizado (BERUTTI; MARQUES, 2009). Mesmo diante dessa situação, o ensino de História torna-se cada vez mais importante, conforme nos diz Cerri (2011) somos seres de cultura e agimos em sociedade. Além disso, na 38 relação com a natureza – de forma rica, dinâmica, variada, criativa –, participamos das relações entre o sagrado e o profano, bem como participamos de cultos em irmandades, orixás. Também, somos capazes ainda de produzirmos uma variada culinária e participamos de rituais religiosos e de festas, ou seja, não servimos unicamente para trabalhar e consumir, não somos uma coisa apenas. Pelo contrário, entre tantas outras, somos plurais, diversos, heterogêneos, e semelhantes em alguns aspectos, mas não iguais. Segundo Moreira e Vasconcelos (2007), a capacidade humana de produzir a diversidade, faz com que o ensino de História se torne importante, visto que possibilita a observação das experiências do passado, tornando-se conscientes de nossa identidade social. Mesmo que a História não se dedique unicamente ao passado, esse conhecimento nos faz conhecer a nós mesmos, o grupo do qual fazemos partes e grupos dos quais não estamos inseridos, isto é, esse papel exercido pelo ensino de história pode nos tornar cidadãos consciente da necessidade de agir no mundo e transformá-lo. Estudar História na atualidade no Brasil é muito importante, pois, ajuda na construção de identidades e aguça o nosso olhar para compreendermos nossa realidade, ajudar a transformá-la. Nesse aspecto, podemos salientar que essa situação foi percebida no final do século XX, através dos acontecimentos que envolveram a reformulação curricular, a exemplo do PCN. Em síntese, as pluralidades de identidades precisavam encontrar espaço no ambiente escolar, para que todos se sentissem, de alguma forma, incluídos nesse contexto de formação e discussão (CIRCE BITTENCOURT, 2009). As identidades, nesse sentido, não consistem em algo “pronto e acabado” ou, ainda, é algo dado pela natureza e tampouco pela cultura. Em contrapartida, tais identidades estão em permanente construção, ou seja, não é fixa, não é inalterada, mas podem sofrer transformações ao longo da vida à medida em que o indivíduo interage com a natureza e com a cultura de maneira a incorporar elementos dessa vivência à sua existência, de forma significativa (SILVA, 2014). Com efeito, as identidades devem ser constantemente discutidas na escola e no ensino de História, uma vez que estas estão atreladas às estruturas narrativas e aos interesses sociais, assim como faz parte do processo de produção humana – consigo mesmo e com o outro. O ensino de História e o papel da escola na atualidade auxilia na construção da identidade e, consequentemente, da cidadania (CIRCE BITTENCOURT, 2009). Afinal, com a variedade de temas que pode ser discutida nesses espaços – relacionando o passado ao presente e procurando mostrar que erros do passado não devem se repetir na atualidade –, o 39 aluno deve ser orientado a construir uma identidade livre, mais em consonância e com respeito ao outro, ou seja, pautado em conceitos de cidadania. Para trabalhar em sala de aula e no ensino de História no século XXI, é de fundamental importância que o professor conheça o conceito de cidadania que deseja aplicar, uma vez que este, ao longo do tempo, vem passando por transformações, segundo, Silva e Silva (2010). O conceito de cidadania que temos hoje é fruto das chamadas Revoluções burguesas, particularmente da Revolução Francesa e da independência do EUA do século XVIII, mas também da Revolução Industrial (...) A rigor a podemos definir como um complexo de direitos e deveres atribuídos a um indivíduo que integra uma Nação, complexo que abrange direitos políticos, sociais e civis (...) Em resumo, podemos entender a cidadania como toda prática que envolve a reivindicação, interesse pela coletividade, organização de associações, luta pela qualidade de vida, seja na família, no bairro, no trabalho, ou na escola, ela implica um aprendizado continuo, uma mudança de conduta diante da sociedade de consumo que coloca o indivíduo como competidor pelos bens da produção capitalista (SILVA; SILVA, 2010, p.47-50). A cidadania trabalhada no ensino de História possibilita, ao aluno, conhecer seus direitos e seus deveres no convívio social, percebendo que o conceito não surgiu de uma hora para outra, mas que vem se constituindo ao longo do tempo e conforme os interesses e as lutas das diversas sociedades. Ao mesmo tempo, tal conceito se manifesta também nas diferentes instituições, associações, família, Estado, trabalho, entre outros, gerando processos de emancipação e de ocupação de espaços. Dito isto, procurando romper com a linearidade e o determinismo dos estudos da História, na década de 1980, os estudos voltados para a História temática ganham força. Segundo esse conceito, a historiografia e a História ensinada em sala de aula passavam a ter a possibilidade de abordar sujeitos históricos “esquecidos” por esse campo de conhecimento e estudos. Em sala de aula, esta perspectiva permite que os alunos e os professores interajam com as suas realidades, de modo a abordar temas e Histórias de sujeitos anônimos locais, sentindo-se estes c