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This document, titled Didática, analyses concepts and historical perspectives of the act of teaching and learning. It explores various theories of learning and the role of the teacher in their mediation within a social and culture context.

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Didática NATALIA SUPINO RIBEIRO DE ALMEIDA DIDÁTICA Natalia Supino Ribeiro de Almeida 2023 CASA NOSSA SENHORA DA PAZ – AÇÃO SOCIAL FRANCISCANA, PROVÍNCIA FRANCISCANA DA IMACULADA CONCEIÇÃO DO BRASIL – ORDEM DOS FRADES MENORES...

Didática NATALIA SUPINO RIBEIRO DE ALMEIDA DIDÁTICA Natalia Supino Ribeiro de Almeida 2023 CASA NOSSA SENHORA DA PAZ – AÇÃO SOCIAL FRANCISCANA, PROVÍNCIA FRANCISCANA DA IMACULADA CONCEIÇÃO DO BRASIL – ORDEM DOS FRADES MENORES PRESIDENTE Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM DIRETOR GERAL Jorge Apóstolos Siarcos REITOR Frei Gilberto Gonçalves Garcia, OFM VICE-REITOR Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO Adriel de Moura Cabral PRÓ-REITOR DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO Dilnei Giseli Lorenzi COORDENADOR DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD Franklin Portela Correia CENTRO DE INOVAÇÃO E SOLUÇÕES EDUCACIONAIS - CISE Franklin Portela Correia REVISÃO TÉCNICA Marina de Fátima Ferreira Nascimento PROJETO GRÁFICO Centro de Inovação e Soluções Educacionais - CISE CAPA Centro de Inovação e Soluções Educacionais - CISE DIAGRAMADORES Simone Aparecida Barbosa © 2023 Universidade São Francisco Avenida São Francisco de Assis, 218 CEP 12916-900 – Bragança Paulista/SP A AUTORA NATALIA SUPINO RIBEIRO DE ALMEIDA Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, Mestra e Doutora em Educação pela mesma instituição. Professora de cursos preparatórios para concursos das carreiras jurídicas e pedagógicas. Docente e Coordenadora do Curso de Pedagogia do Centro Universitário Unifafibe. Pesquisadora na área de educação, cultura e subjetividade com escritos científicos publicados em diversas revistas e anais. Professora efetiva na rede municipal de ensino de Ribeirão Preto, estado de SP. O REVISOR TÉCNICO MARINA DE FÁTIMA FERREIRA NASCIMENTO Graduada em Letras, Mestra e Doutora em Educação pela Universidade São Francisco (USF). Graduada em Pedagogia pela Universidade Nove de Julho (UNINOVE).Atuou na formação continuada de professores de linguagem no quadriênio 2018-2021. De- sempenhou distintas funções no setor educacional: professora, coordenadora pedagó- gica e vice diretora. Atua como professora de Linguagem e Literatura para o Ensino Médio. Participa do gru- po ALTER-LEGUE/USF. Suas pesquisas são centradas nesses temas: ensino e apren- dizagem de gêneros discursivos/textuais; gêneros discursivos/textuais orais; leitura - produção de textos e formação docente. SUMÁRIO UNIDADE 01: CONCEITUALIZANDO DIDÁTICA...................................................6 1. Didática: histórico e conceito................................................................................ 8 2. O processo de ensino e de aprendizagem........................................................... 12 3. Teorias de aprendizagem e a mediação do professor......................................... 18 4. Educação, instrução e ensino.............................................................................. 28 UNIDADE 02: DIDÁTICA DO ENSINO BÁSICO.....................................................35 1. Ética, educação e docência................................................................................. 36 2. Educação e Didática............................................................................................ 43 3. Didática nos Anos Iniciais: princípios e métodos................................................. 50 4. As principais tendências pedagógicas................................................................. 54 UNIDADE 03: DIDÁTICA COMO ORGANIZADORA DAS PRÁTICAS EDUCATIVAS 64 1. Organização dos tempos e espaços escolares.................................................... 65 2. Planejamento escolar: autonomia e gestão......................................................... 72 3. Tipos de planos de ensino: Plano de Curso; Plano de Unidade; Plano de Aula.. 76 4. Recursos Didáticos.............................................................................................. 79 5. Avaliação dos processos didáticos....................................................................... 83 UNIDADE 04: DIDÁTICA E DIVERSIDADE............................................................92 1. A sala de aula e outros espaços de aprendizagem.............................................. 92 2. A relação pedagógica na prática educativa.......................................................... 98 3. A diversidade e as interações na escola atual..................................................... 102 4. Processos didáticos e criação de estratégias de ensino inclusivo....................... 107 Conceitualizando Didática UNIDADE 1 CONCEITUALIZANDO DIDÁTICA 1 INTRODUÇÃO A atuação profissional do pedagogo na escola compreende uma série de elementos e ações que exigem formação continuada, dedicação pessoal e a adoção de uma postura reflexiva que lhe permita a constante reinvenção de suas práticas e conhecimentos acerca dos objetivos que pretende alcançar em cada contexto. Essas práticas e conhe- cimentos englobam diversos fenômenos sociais, históricos, políticos e culturais que se articulam e constituem aquilo que se concebe como educação. A educação é uma prática exigida não apenas para a vida em sociedade, mas para que o educando possa adquirir as habilidades, valores, saberes e atitudes necessários à atuação e à transformação do meio social. Desse modo, a ação educativa deve ser compreendida como um processo complexo que não se resume à transmissão e à me- morização de conteúdos e informações, e sim, que se refere a um conjunto de estraté- gias voltadas à formação crítica e completa do educando de acordo com as demandas surgidas das relações humanas (DELORS, 2001). É nesse contexto que o estudo da didática, concebido como campo da ciência pedagó- gica dedicado à compreensão do ato de ensinar, se destaca como aspecto indispensá- vel à perfeita atuação profissional na área da educação. Para tanto, é importante lem- brar que ensinar e aprender caminham juntos tanto no trajeto de evolução do estudante quanto no processo de formação e atuação do professor. A relação que se estabelece entre professor e estudante é, portanto, ponto fundamental na compreensão sobre a maneira como a didática é definida e desenvolvida nos pro- cessos de ensino e de aprendizagem, pois as atividades educativas se estabelecem fundamentalmente no campo das relações humanas e, como tal, deve considerar as peculiaridades relativas a cada um dos envolvidos para que possa surtir os efeitos de- sejados de acordo com as demandas específicas de cada qual. Para Veiga (1991-1998), com frequência, a didática é predominantemente concebida e investigada a partir das ações do professor acerca do desenvolvimento e da transmis- são dos saberes e da promoção de oportunidades de aprendizagem que possam ofere- cer ao educando possibilidades de uma participação ativa e democrática na construção de seus próprios conhecimentos. 6 Viabilizar essa participação constante do estudante em experiências educativas que priorizem o desenvolvimento completo das múltiplas potencialidades do educando de forma atrativa e interessante, adequar as estratégias pedagógicas às demandas esco- lares individuais e coletivas tanto internas quanto externas à instituição, articular ações 1 transversais e interdisciplinares que tenham o educando como o foco de suas preten- sões, são algumas das perspectivas investigadas pela didática. Universidade São Francisco Entretanto, as práticas educativas desenvolvidas na escola não se desvinculam das vivências e características sociais que as permeiam. Ao contrário disso, as práticas educativas se inscrevem nas circunstâncias sociais de cada época e de cada contexto social, de tal maneira que, da mesma forma que recebem os efeitos que se originam dessas circunstâncias, também geram seus efeitos sobre elas, modificando-as e trans- formando-as tal como são modificadas e transformadas (GADOTTI, 1995-2001). Sendo assim, se em suas práticas, o professor age de forma desconectada do contexto social que permeia a si e a todos os envolvidos nos processos de ensino e aprendiza- gem tornando-se um executor mecânico de atividades pedagógicas improvisadas ou elaboradas de forma exclusivamente técnica e ausente de significados que as façam ter sentido para o educando, seu papel se reduz à mera reprodução de saberes e ações formuladas externamente aos desafios e às especificidades do processo de ensinar e aprender que, por sua vez, depende da articulação coletiva e democrática de diversos elementos para se consolidar como efetivo, eficaz e de qualidade (VEIGA, 1991-1998). Assim, mesmo diante do fato de que o professor desempenha funções de inquestio- nável relevância para o desenvolvimento dos processos de ensino e aprendizagem, cabe reforçar que o trabalho pedagógico desempenhado nas instituições escolares se inscrevem e decorrem de práticas sociais constituídas por especificidades diversas, que variam a cada contexto temporal, histórico e social, sistematizando relações que per- passam tanto os objetivos específicos do desenvolvimento pedagógico quanto aqueles referentes à formação humana do educando. A história da didática no Brasil revela que seus percursos procuraram atender às pe- culiaridades educacionais específicas de cada cenário histórico e social atrelando suas práticas às demandas particulares que emanavam de cada um deles e se transformavam conforme a evolução dos tempos. O surgimento do termo “didática” ocorreu em períodos muito mais antigos, mais especificamente, com Jan Amos Comênio que, no século XVII, escreveu a obra Didática Magna tratando dos métodos referentes ao ato de ensinar e ao papel do professor na sua construção e aplicação nas propostas educativas. Evidentemente, a contar do século XVII, quando o termo ganhou força e visibilidade, muitas mudanças ocorreram a respeito de seu conceito e caracterização, de acordo com as exigências específicas de cada contexto. Essa perspectiva evidencia que os processos de ensino e aprendizagem são compostos de perspectivas práticas e teóri- cas que se conectam em torno das demandas históricas, políticas, sociais e culturais que permeiam a realidade pedagógico-escolar, o que demanda que a relação entre pro- fessores e alunos sejam consolidadas sobre fundamentos mais amplos que lhes tragam o suporte necessário a que sua construção seja capaz de permitir que as finalidades estabelecidas sejam alcançadas em sua totalidade. Didática 7 Conceitualizando Didática Em grande parte das vezes, os professores têm como principal objetivo de seu traba- lho proporcionar aos alunos o melhor aprendizado possível. Entretanto, para que essa finalidade possa ser alcançada, diversas questões merecem ser analisadas como forma 1 de garantir que os processos de ensino e aprendizagem sejam efetivos e eficazes para além da simples memorização de informações. As competências e capacidades mais amplas da criança devem ser colocadas como aspecto central e norteador do trabalho pedagógico, o que se faz por meio de recursos e ações que sejam não apenas relevantes para a apropriação de conteúdos, mas para a formação do ser humano na totalidade dos aspectos que a compõem, sejam elas intelectuais, físicas, emocionais, morais ou sociais. SAIBA MAIS Para conhecer um pouco mais sobre Jan Amos Comênio e sua Didática Magna, acesse a obra Jan Amos Comênio escrita por Jean Piaget disponível no portal Domínio Público. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me4674.pdf Acesso em: 30 mar. 2022. 1. DIDÁTICA: HISTÓRICO E CONCEITO Para o estudo adequado dos aspectos históricos e conceituais sobre didática é preciso compreender que ela se refere a um campo de investigação da pedagogia dedicado às análises sobre as práticas e teorias relativas ao ato de ensinar. Não se pode perder de vista, porém, que apesar de corriqueiramente essas análises se referirem ao papel do educador, o ato de ensinar envolve as relações e os aspectos alusivos tanto ao profes- sor quanto ao aluno, constituindo-se por diretrizes que não se resumem a elementos exclusivamente técnicos ou burocráticos limitados ao interior da instituição escolar. Diferentemente disso, a didática se produz no âmago das relações humanas, o que torna parte delas em suas especificidades, características e finalidades. Disso se extrai que cada método, prática ou estratégia elaborado no universo didático contempla em si saberes e particularidades que são próprias de cada um dos envolvidos em seus pro- cessos e suas respectivas circunscrições. Com efeito, entendida a didática como campo da pedagogia dedicada ao ato de ensinar, é preciso analisar as suas perspectivas históricas de acordo com alguns acontecimen- tos específicos e tendências que orientam a maneira como seus significados se produ- zem (e se produziram ao longo dos tempos) e como as suas práticas são construídas e aplicadas em cada contexto educativo. Apesar de aparentemente não correlacionados ao paradigma escolar que se tem na atualidade, no Brasil, os jesuítas foram os principais educadores a executar essas fun- ções no período colonial. Nesse momento histórico, amplamente caracterizado pela in- tensa exploração econômica decorrente das demandas de um arranjo social orientado por um modelo econômico basicamente agrário e exportador, a educação não era con- siderada um fator social relevante, sendo por isso praticada com severas diferenças, a depender da classe social para a qual se direcionava (VEIGA, 1991-1998). 8 O plano educacional dos jesuítas se baseava no chamado Ratio Studiorum, que se trata- va de uma coletânea pedagógica instrutiva que orientava os jesuítas a respeito do exercí- cio das funções docentes e cujos ideais pautavam-se no ensino das práticas cristãs aos nativos, convertendo-os ao cristianismo por meio do ensino de teorias relativas a teologia, 1 filosofia e humanismo, vinculadas à formação moral fundamentada nas virtudes previstas no evangelho cristão. Esse plano alicerçava-se em padrões da pedagogia tradicional reli- giosa e não tinha qualquer relação com a realidade social colonial brasileira. Universidade São Francisco CURIOSIDADES O Ratio Studiorum pode ser considerado como precursor dos encaminhamentos didáticos no Brasil, mesmo não sendo genuinamente brasileiras a sua elaboração e consolidação. Apesar de sua forte influência, após o fim das funções jesuítas no país, determinadas pela reforma pombalina no ano de 1759, não houve grandes movimentos pedagógicos que tenham trazido impactos significativos no campo da didática. Somente no início do século XIX, com a expansão da cultura do café e, consequen- temente, a consolidação de um arranjo social repaginado pela urbanização e comer- cialização exportadora, é que um novo paradigma educacional ganha corpo. O ensino religioso é suprimido em nome de um Estado laico e as escolas passam a operar sob a finalidade de perpetuar e propagar os ideais socioeconômicos que consolidam a classe burguesa, como forma de garantir a manutenção de sua hegemonia (VEIGA, 1991- 1998). A essa nova conduta pedagógica correspondem ações como métodos de ensino cen- trados no professor que, por sua vez, transmite a todos os alunos, indistintamente, co- nhecimentos dados como verdades absolutas e inquestionáveis, a hierarquização das relações escolares pautadas no binômio mando-obediência, a aferição da aprendiza- gem pela capacidade mimética do aluno (ou seja, pela sua capacidade de memorizar o maior número possível de informações e reproduzi-las), a realização de avaliações que têm como objetivo principal os resultados numéricos sobre os objetivos supostamente alcançados e tantas outras. É assim que, no contexto da pedagogia tradicional, a didática se formula a partir de uma organização curricular enrijecida e dogmática que se ocupa tão somente de questões intelectuais na formação da criança, fazendo dela receptora apática de informações que jamais podem ser criticadas ou questionadas. Na década de 1930, ante a grave situação econômica vivenciada em decorrência da crise cafeeira no Brasil, o campo educacional sofreu intensas transformações, mais es- pecificamente, com o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova (1932), que preconizou a rearticulação educacional no contexto das mudanças sociais e econômicas atraves- sadas à época. E foi no contexto dessa nova organização que a didática surgiu como parte dos cursos de formação de professores, especialmente por sua reconhecida im- portância ante a possibilidade e a necessidade de transformar a escola de acordo com as novas demandas sociais da época. Didática 9 Conceitualizando Didática De acordo com o art. 20 do decreto-lei n. 1.190/39, que tratou sobre a organização da Faculdade Nacional de Filosofia, a didática passava a ser curso e disciplina dos cursos de formação de professores, integrando sua grade curricular de forma definitiva. 1 Art. 20. O curso de didática será de um ano e constituir-se-á das seguintes disciplinas: 1. Didática geral. 2. Didática especial. 3. Psicologia educacional. 4. Administração escolar. 5. Fundamentos biológicos da educação. 6. Fundamentos sociológicos da educação. Assim, o modelo didático que perpassou o período ditatorial instituído por Vargas de 1930 até 1945 se consubstanciou em métodos que priorizavam o caráter tecnicista dos processos de ensino e aprendizagem e ignoraram os elementos sociais, históricos, sociais e culturais que circundam as práticas pedagógicas e seus atores, fato que via- bilizou a consolidação de um perfil docente que absorveu essas características tornan- do-se essencialmente técnico (VEIGA, 1991-1998). A partir do ano de 1945, novas perspectivas sociais, políticas e econômicas passaram a vigorar no Brasil. A aceleração da economia e o fortalecimento do capital estrangeiro nas transações nacionais propagaram uma onda desenvolvimentista que, rapidamente, gerou efeitos sobre os paradigmas educacionais gerando uma clara polarização entre as diferentes classes sociais, inclusive nas instituições educacionais. Mesmo diante das grandes mudanças, a didática permanecia em desenvolvimento me- diante a predominância dos elementos técnico-metodológicos em detrimento daqueles relativos às características históricas, sociais, políticas e culturais que permeavam a sua produção. Acentuava-se, portanto, o enfoque tecnicista conferido à educação, o que se reforçou entre os anos de 1960 a 1968 com o avanço do poderio militar. Diferentemente do que ocorria na pedagogia nova, a pedagogia tecnicista era emba- sada por pressupostos como o da neutralidade científica, na racionalidade, na produti- vidade, na objetivação das práticas pedagógicas e aprendizagens e na fragmentação do processo de ensino e aprendizagem tal como nos modelos industriais e fabris. De acordo com Saviani (2005, p. 34), Se na pedagogia tradicional a iniciativa cabia ao professor e se na pedago- gia nova a iniciativa deslocou-se para o aluno, na pedagogia tecnicista o ele- mento principal passou a ser a organização racional dos meios, ocupando o professor e o aluno posição secundária. A organização do processo conver- teu-se na garantia da eficiência, compensando e corrigindo as deficiências do professor e maximizando os efeitos de sua intervenção. No paradigma tecnicista, portanto, o distanciamento entre teoria e prática é, dessa forma, mais evidente e, no âmbito de sua execução, o professor assume papel de simples executor de tarefas pré-determinadas e burocracias institucionais que tornam sua atuação ainda mais hierarquizada e formal. A didática é por ele concebida e 10 instrumentalizada como mais um recurso útil no alcance dos resultados exigidos (VEIGA, 1991-1998). Já na década de 1980, o Brasil enfrenta novas dificuldades socioeconômicas que, igual- 1 mente, interferem nas perspectivas didáticas articuladas no campo escolar. A ascensão de novas modalidades de governo ocasiona o fim da ditadura militar que, apesar de en- cerrada em termos formais, ainda perpetuava efeitos que necessitavam ser encerrados. Universidade São Francisco É nesse contexto que as lutas sociais ganham forças e passam a ser parte das mais diversas esferas nacionais, inclusive a educacional, de onde aflora a perspectiva crítica sobre a educação. Nessa perspectiva, o foco dos processos educativos não está em uma ou outra pessoa, em uma ou outra posição na instituição escolar, mas na formação humana do sujeito e suas reverberações na vida em sociedade (SAVIANI, 2005). Nesse novo aparato histórico-crítico, a escola passa a se consolidar não mais exclusi- vamente como reprodutora de formalidades e burocracias técnicas e institucionais, mas como espaço de crítica e reflexão sobre a estrutura e organização histórica vigente. É nesse cenário que a didática assume a importante função de articular e esclarecer o papel social do percurso de ensino e aprendizagem trilhado na escola. Tendo isso em vista, no cerne do paradigma da pedagogia crítica, as ações pedagógicas ultrapassam as barreiras meramente técnicas associando-se a recursos que articulem escola, sociedade, famílias, culturas, política, pesquisa, avaliações e relações humanas nas suas mais diversas modalidades e posições. Essa configuração didática amplia as possibilidades e os recursos de que o docente pode se servir em suas práticas cotidia- nas e proporciona, de maneira bastante facilitada, a articulação entre o processo de ensino e aprendizagem trilhado e a realidade social que o permeia. Nessa perspectiva é possível perceber que o parâmetro crítico conferido à didática pro- picia não apenas novas possibilidades de ensino, aprendizagem e formação social para os educandos, mas também, novas possibilidades de reflexão e reinvenção para os professores que, por sua vez, passam a consolidar suas práticas sobre a possibilidade de se servirem de recursos que não mais estejam atrelados a um tecnicismo exacerba- do ou à discriminação e ausência de equidade entre os envolvidos. A partir da década de 1990, importantes mudanças sociais acontecem gerando efeitos sobre as mais diversas instituições sociais, como o trabalho, a família e a escola. A mun- dialização dos modos de vida, trabalho, organização, política e economia trouxe novas regras e perspectivas que geraram importante impacto social sob os mais diferentes formatos, o que se refletiu inclusive sobre a educação. Modificações na organização da estrutura escolar, na composição das turmas e nas finalidades educacionais, trouxeram grandes transformações para as rotinas docentes. Diante desta nova configuração, o professor passou a acumular funções que, pelo volu- me de demandas, poderiam não necessariamente ser executadas de forma satisfatória em todas as oportunidades. Novas configurações para os sistemas educacionais, novas expectativas sobre o trabalho educativo, novas aferições pretendidas para os processos avaliativos e novos Didática 11 Conceitualizando Didática de atuação docente e discente, provocaram a produção de práticas pedagógicas redesenhadas com vistas à consolidação de uma organização pedagógica reformulada em favor do atendimento do novo formato social que se instaurava e que permanece até 1 os dias atuais reverberando seus efeitos tanto sobre a ciência pedagógica num sentido mais amplo, quanto sobre a didática como parte de sua contextualização. É nesse sentido e contexto histórico-social que, na atualidade, a didática se define como ramo da ciência pedagógica que tem como objeto de estudo os processos de ensino e aprendizagem consubstanciados nas relações que se estabelecem entre o ato de ensinar e de aprender a partir do esforço docente mediador no sentido da consolida- ção de oportunidades educativas articuladas em torno tanto dos aspectos pedagógicos e curriculares, quanto dos históricos, sociais e culturais que permeiam a realidade e vivências de todos os atores envolvidos (SAVIANI, 2005). 2. O PROCESSO DE ENSINO E DE APRENDIZAGEM Os atos de ensinar e de aprender podem gerar uma quantidade infindável de entendi- mentos a seu respeito não somente por se tratarem de uma temática que contempla uma grande diversidade de possibilidades teórico-conceituais, mas por se referirem a questões que perpassam as mais diversas áreas de conhecimento e atuação. No entanto, é a multiplicidade de dimensões que caracteriza o ensino e a aprendizagem que os coloca diante da necessidade de que sejam compreendidos no contexto de seu enfoque didático como forma de que reducionismos ou superficialidades não minimizem o seu papel e a sua profundidade científica em quaisquer contextos ou situações. No campo educacional, o processo de ensino e aprendizagem corresponde ao nome que se atribui ao conjunto de práticas, relações e interações que ocorrem entre professores e alunos no trajeto que percorrem em favor da formação completa do educando. Trata-se justamente de um percurso evolutivo que não se dá de forma isolada e pontual, mas sim, contínua, constante, ininterrupta. Esses aspectos definem seu caráter processual. Os processos de ensino e aprendizagem estão, dessa maneira, intimamente relacio- nados com a forma como se concebe a educação, de modo que as concepções que definem e produzem o paradigma educacional vigente reverberam seus efeitos sobre a maneira como os processos de ensino e aprendizagem são elaborados, executados e concebidos em cada situação específica. 2.1 OS PROCESSOS DE ENSINO E DE APRENDIZAGEM E AS CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO De acordo com Saviani (2005), a ciência pedagógica contempla concepções de educa- ção diversas que influenciam de maneira significativa a prática e a aplicação das ações pedagógicas no cotidiano escolar, as condutas docentes, a organização curricular, a uti- lização dos instrumentos avaliativos, dentre tantos outros elementos. Segundo o autor, (...) podemos considerar que, do ponto de vista da pedagogia, as diferentes concepções de educação podem ser agrupadas em duas grandes tendên- cias: a primeira seria composta pelas concepções pedagógicas que dariam 12 prioridade à teoria sobre a prática, subordinando esta àquela sendo que, no limite, dissolveriam a prática na teoria. A segunda tendência, inversamente, compõe-se das concepções que subordinam a teoria à prática e, no limite, dissolvem a teoria na prática. No primeiro grupo estariam as diversas moda- lidades de pedagogia tradicional, sejam elas situadas na vertente religiosa 1 ou na leiga. No segundo grupo se situariam as diferentes modalidades da pedagogia nova. Dizendo de outro modo, poderíamos considerar que, no primeiro caso, a preocupação se centra nas “teorias do ensino”, enquanto Universidade São Francisco que, no segundo caso, a ênfase é posta nas “teorias da aprendizagem”. (SAVIANI, 2005, p. 1) Historicamente, a primeira tendência teve grande reforço até o início do século XX, mo- mento em que as especificidades da segunda tendência ganharam forças e importante destaque sobre a primeira sem necessariamente excluí-la completamente das práticas escolares até os dias atuais. Na perspectiva de Saviani (2005), portanto, a primeira tendência teria como questiona- mento principal o como ensinar, ou melhor, quais seriam os métodos mais adequados para se promover o ato de ensinar. Enquanto que na segunda tendência, o questiona- mento fundamental se referiria ao como aprender, ao como compreender as próprias possibilidades de aprendizagem ao longo do processo educacional. A primeira tendência, que diz respeito às perspectivas da pedagogia tradicional, tem como foco o caráter instrucional, a formação intelectual, o que faz do professor um agente primordial na transmissão dos conhecimentos necessários a essa instrução e formação e, por conseguinte, transportam os alunos para a condição de ouvintes aos quais cabe o dever de assimilar os conteúdos transmitidos e reproduzi-los conforme o esperado quando solicitado (SAVIANI, 2005). Na perspectiva em menção, as práticas educativas são estabelecidas sem uma preocu- pação efetiva a respeito das características individuais e sociais do educando, mas sim, em consonância com as teorias e os conteúdos que devem ser transmitidos de acordo com a sua faixa etária, fase de desenvolvimento e resultados esperados em que se en- quadre o seu perfil. O principal condutor do trabalho pedagógico nesse caso, portanto, é o desenvolvimento intelectual como ponto de partida para futuras práticas. Por outro lado, a segunda tendência, que diz respeito às perspectivas pedagógicas renovadoras, direciona-se sempre para as questões referentes ao como aprender, ou seja, a teorias dedicadas à investigação sobre como as aprendizagens acontecem ao longo do desenvolvimento humano. Diferentemente do que se passa na tendência tra- dicional, nas tendências renovadoras, a centralidade das práticas e dos processos pe- dagógicos não está em conteúdos ou em aspectos instrucionais do intelecto, mas sim, no aluno e em suas iniciativas pessoais no sentido da aprendizagem. No contexto desta perspectiva, o foco do trabalho pedagógico deixa de ser o suporte ao desenvolvimento do intelecto e passa a ser as práticas e os métodos de aprendizagem, o que significa dizer que, a centralidade em questão é transferida “do aspecto lógico para o psicológico, dos conteúdos cognitivos para os métodos ou processos de apren- dizagem, do professor para o aluno, do esforço para o interesse, da disciplina para a espontaneidade, da quantidade para a qualidade (SAVIANI, 2005, p. 2). Didática 13 Conceitualizando Didática As concepções pedagógicas que se fundamentam na aprendizagem priorizam os as- pectos práticos sobre os teóricos, pois são justamente os primeiros que definem e de- limitam os últimos. Essas concepções se consolidam de maneira mais robusta espe- 1 cialmente no início do século XX, perpetuando-se para os períodos subsequentes por novas versões como o construtivismo e o sociointeracionismo, que se revelam como algumas das mais conhecidas atualmente. É importante observar que a maneira como as tendências pedagógicas se estabelecem tem impacto direto na atuação profissional do professor em suas respectivas ações pedagógicas. Conforme já destacado, as práticas pedagógicas não se dissociam de seu contexto histórico, social, cultural, político, e esse raciocínio se mantém para as práticas do professor, ou seja, assim como qualquer outra prática, aquelas inerentes ao professor são orientadas, elaboradas e aplicadas de acordo com as circunstâncias de produção em que estão inscritas. Dessa maneira, para uma atuação docente que ocorre no âmbito das concepções tradi- cionais, a postura adotada pelo professor se caracterizaria por condutas mais hierarqui- zadas, autoritárias, repletas de rigorismos. Já no âmbito das concepções renovadoras, a postura adotada pelo professor se voltaria para práticas mais compartilhadas, coope- rativas, pautadas em estratégias interdisciplinares e relações simplificadas e assertivas a respeito das possibilidades de aprendizagem e evolução do aluno em seu processo. A propósito, no âmbito da compreensão das diferentes concepções pedagógicas desta- cadas por Saviani (2005), cabe também um importante destaque ao caráter processual inerente às práticas de ensino e aprendizagem. As tradicionais não concebem as práti- cas de ensino e aprendizagem como parte de um processo a ser percorrido pelo aluno ao longo da escolarização. Diferentemente disso, compreendem essas práticas de maneira fragmentada, dissociada de uma correlação que as articule em torno de uma lógica evolutiva que conduza o aluno a aprofundar e ampliar seus conhecimentos a cada nova aprendizagem. Isso porque, o foco de suas atenções está voltado exclusivamente para a memorização e reprodução de conteúdos, o que, segundo suas perspectivas, não exigiria estratégias grada- tivas de aprendizagem. As concepções renovadoras, por outro lado, uma vez centradas na aprendizagem, con- cebem as práticas pedagógicas como uma construção lógica que se consolida a partir da correlação estratégica de elementos e ações que se articulam com a finalidade de promover a evolução formativa do educando de acordo com as possibilidades e carac- terísticas da aprendizagem para cada contexto de suas vivências. Essa organização pedagógica tanto favorece ao educando a partir de suas próprias experiências construir seus novos conhecimentos, quanto viabiliza que o professor participe das etapas de seu desenvolvimento de forma igualitária, mediadora e não mais rígida e autoritária como nas tendências tradicionais (SAVIANI, 2005). Tendo em vista o panorama teórico acima traçado acerca das duas grandes tendências pedagógicas explicitadas por Saviani (2005), sua análise comparativa e resumida se faz de extrema relevância para que com isso se possa visualizar com maior clareza os efeitos gerados por cada uma no campo didático. 14 OBJETO DE APRENDIZAGEM Quadro 01. Infográfico comparativo das concepções tradicional e renovadora 1 Concepção tradicional Concepção renovadora Universidade São Francisco ` Tem como foco o caráter instru- ` Tem como foco o aluno e suas cional, a formação intelectual. iniciativas pessoais no sentido da aprendizagem. ` Parte da teoria para a prática. ` Parte da prática para a teoria. ` Concebe a aprendizagem como fruto da memorização e reprodu- ` Concebe a aprendizagem como ção de conteúdos. fruto de um processo formativo que parte das experências pré- ` O professor é o detentor de sa- vias do educando. beres que são transmitidos como verdades inquestionáveis. ` O professor participa das práticas educativas de forma igualitária e mediadora. Fonte: elaborado pela autora. Em relação ao quadro apresentado, infere-se, primeiro, que a existência de uma con- cepção não elimina a existência da outra; segundo, que as duas grandes concepções pedagógicas carregam consigo características contextuais inerentes ao período histó- rico e social em que se consolidaram e que permanecem a se consolidar, tanto no que se refere a seus embasamentos teóricos quanto práticos. A maneira como seus pres- supostos se organizam, orienta as ações pedagógicas adotadas na escola, fato que as torna completamente diversas a depender da concepção que as orienta. Embora a coexistência de ambas seja verificável em diversas circunstâncias, a pre- dominância da concepção pedagógica renovadora se sobressaiu no Brasil a partir da década de 1930, especialmente pelo apoio de grandes estudiosos como Anísio Teixeira e suas perspectivas embasadas nas teorias de John Dewey, que não tardaram em re- verberar sobre as práticas educativas a elas filiadas. CURIOSIDADES John Dewey foi um filósofo e pedagogo estadunidense cujas teorias se enquadram nas con- cepções pedagógicas renovadoras. Segundo ele, a criança deve ser educada na totalidade de suas capacidades de forma autônoma, livre e democrática como forma de se promover um processo de ensino e aprendizagem completo e com sentido. Dewey acreditava que uma boa educação é aquela que associa teoria e prática desmistificando a ideia de que escola e vivências sociais são elementos distintos. Anísio Teixeira, intelectual educador brasileiro, também preconizou as perspectivas pedagó- gicas renovadoras tendo idealizado transformações na educação nacional que marcaram o século XX. De acordo com o educador, a democratização da educação e a formação con- tinuada dos profissionais da educação são indispensáveis para o sucesso na formação de cidadãos completos e capazes de transformar a sua própria realidade social. Didática 15 Conceitualizando Didática 2.2. AS CONTRAPOSIÇÕES ÀS CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS RENOVADORAS A consolidação das concepções pedagógicas tradicionais no Brasil precedeu a predo- 1 minância das concepções renovadoras, que emergiram após anos de transformação histórica e social permeada pelo questionamento aos paradigmas utilizados para a arti- culação das práticas educativas nas escolas até então (SAVIANI, 2005). Considerando que a escola é parte da sociedade e, como tal, espaço de diversidade e convivência entre os diferentes elementos sociais, políticos e culturais, as transfor- mações ocorridas na sociedade após o século XIX geraram efeitos imediatos sobre a educação, exigindo-lhe uma renovação que fosse capaz de atender às demandas sociais que emergiam dessas novas configurações. Nesse caso, a transformação da sociedade refletiu-se nos andamentos das escolas exigindo por parte delas, igualmen- te, uma transformação que caminhasse no sentido da evolução social, paralelemente às suas concepções. As demandas provenientes dessas transformações, ocorridas no Brasil mais especifi- camente a partir da década de 1930, caminhavam na direção contrária aos paradigmas que caracterizavam as práticas educativas até então, qual seja, aqueles referentes às concepções pedagógicas tradicionais. Iniciou-se então um movimento no sentido da su- peração desses paradigmas para que, tal como ocorria na sociedade, a escola pudesse também se reinventar e atender às novas exigências que se impunham. Foi nesse contexto que as concepções pedagógicas renovadoras ganharam forças e passaram a se posicionar contrariamente à continuidade das condutas autoritárias, uni- laterais e repressivas, e favoravelmente à construção democrática e coletiva de novas finalidades para a educação e que pudessem traduzir os anseios dos novos tempos acerca da formação de um cidadão ético, completo, crítico e transformador. Entendendo que a escola se insere, produz e é produzida pela sociedade, a urgência de uma reforma educacional se fez presente em todas as suas circunstâncias, exigin- do para tanto, que as suas práticas e organização passassem a se pautar em novas teorias as quais tivessem o educando como o centro de seus objetivos e, dessa forma, priorizassem a aprendizagem efetiva, eficaz e significativa como foco das finalidades atribuídas aos processos de ensino e aprendizagem. Foi dessa maneira, transformadora e contextualizada, que os processos de ensino e aprendizagem ganharam novas perspectivas que se atrelaram às modificações ocorri- das na sociedade e que, como tal, passaram a demandar da escola o posicionamento ativo sobre o papel crítico e social que lhe incumbia: a formação de um cidadão capaz de viver e transformar a sociedade em que se insere. É certo que o movimento renovador recebeu árduas críticas desde o início de sua ins- tauração. Importantes estudiosos e teóricos da área se contrapuseram às perspectivas renovadoras argumentando que as bases teóricas e morais que orientavam sua con- cepção pedagógica não poderiam ser aceitas e sustentadas em razão do risco de tornar a criança objeto de um ideal pedagógico e não parte de finalidades concretas que a permitissem exercer os seus diferentes papeis na sociedade (SAVIANI, 2005). 16 Essas críticas e contraposições às perspectivas renovadoras foram inicialmente refor- çadas pelos adeptos da pedagogia religiosa, que tinham grande espaço e influência sobre as instituições educacionais da época. Esse fato fez com que muitas dessas instituições mantidas pelo controle religioso, permanecessem regidas pelos ideais pe- 1 dagógicos tradicionais defendidos por seus mantenedores e reproduzidos em condutas, materiais e orientações por eles elaborados. Universidade São Francisco Apesar das posições antagônicas, o movimento renovador gradativamente ganhava for- ças e disseminava seus parâmetros pelas práticas pedagógicas, gerando renovações até mesmo sobre as perspectivas que se mantinham adeptas ao modelo tradicional. Por essa razão, o período entre 1930 e 1945 foi marcado pelo estabelecimento de um equilíbrio entre as concepções tradicionais e renovadoras, sendo que a predominância dessas últimas se tornou mais evidente a partir de 1945, quando as suas influências se tornam efetivamente perceptíveis nas propostas legislativas e nas orientações pedagó- gicas adotadas nas escolas (SAVIANI, 2005). Note-se que a maneira como as concepções pedagógicas foram analisadas se refere a um debate pautado nas questões relativas à predominância ou não de uma perspectiva sobre a outra de acordo com as características de cada período histórico e social. Isso não implica, necessariamente, que concepções pedagógicas não predominantes sejam desconsideradas, pois suas contribuições para a modulação dos processos de ensino e aprendizagem a cada tempo, são igualmente valiosas. 2.3. O BINÔMIO ENSINO-APRENDIZAGEM As reflexões a respeito do processo de ensinar e aprender permitem a identificação dos movimentos teóricos, práticos e metodológicos que caracterizam este binômio no contexto escolar. Dentre os fatores que embasam esse movimento estão as propostas de organização curricular, o modelo de gestão escolar adotado, o perfil das famílias e da comunidade escolar, a formação docente e as perspectivas teóricas utilizadas como fundamento nas práticas educativas. Cada um desses fatores gera efeitos importantes sobre a maneira como os atos de en- sinar e aprender se estabelecem e são desenvolvidos em cada fase da escolarização. Por essa razão, seu estudo demanda uma análise que os compreenda como parte de um complexo que, uma vez articulado, se consolida como o percurso pedagógico a ser trilhado pelo educando no sentido da sua formação. Nesse sentido, os processos de ensino e aprendizagem podem ser considerados como sistemas educativos caracterizados pela intensa interação entre fatores diversos que os produzem, delimitam e definem de acordo com seu contexto e com cada momento do desenvolvimento da criança. Esses sistemas envolvem alunos, gestores, professores, fa- mílias, objetivos, conteúdos, métodos, recursos, finalidades e quaisquer outros elementos que estejam relacionados ou que sejam necessários para a formação da criança. Do ponto de vista das concepções pedagógicas, por exemplo, os processos de ensino e aprendizagem que são constituídos sobre as bases tradicionais se consolidam a partir de fatores como as bases teóricas pautadas na ênfase à memorização e à reprodução de in Didática 17 Conceitualizando Didática formações, na pouca preocupação com a formação crítica e reflexiva da criança, nas ações educativas centradas no professor, nas posturas docentes autoritárias, entre outras. Em contrapartida, os processos de ensino e aprendizagem que são constituídos sobre as 1 bases renovadoras, se consolidam a partir de fatores como os fundamentos teóricos que enfatizam a aprendizagem crítica, autônoma e democrática, as ações educativas centra- das no aluno, as posturas docentes cooperativas e mediadoras. Nesse cenário, é pos- sível compreender que ensino e aprendizagem são ações pedagógicas que caminham juntas ao longo de um fazer gradativo que se estabelece pela formação total da criança. Essa diferenciação entre as possibilidades de consolidação dos processos de ensino e aprendizagem indicam que o mesmo se trata de um elemento que pode ser construído, produzido e desenvolvido sob diferentes perspectivas, fato que diz respeito ao profes- sor diretamente. É função do professor planejar, elaborar e consolidar estratégias peda- gógicas que estejam em consonância com as necessidades e peculiaridades coletivas e individuais da criança. É nesse sentido que lhe incumbe o dever de articular suas estratégias fazendo uso dos recursos e embasamentos que mais atendam àquilo que o aluno demanda para que possa trilhar um processo de ensino e aprendizagem que lhe permita não apenas desenvolver e aprimorar suas habilidades intelectuais, mas as múltiplas potencialidades de que possa lançar mão em suas vivências dentro e fora da escola. É nesse sentido que os processos de ensino se fazem ainda mais relevantes, pois integram e são in- tegrados pela diversidade das práticas sociais que cercam a cada um dos envolvidos. 3. TEORIAS DE APRENDIZAGEM E A MEDIAÇÃO DO PROFESSOR A compreensão sobre a maneira como os processos de ensino e aprendizagem aconte- cem e as peculiaridades de cada um dos seus momentos exige o conhecimento sobre as teorias que o investigam. Partindo desse pressuposto, é possível definir as teorias da aprendizagem como paradigmas e embasamentos teóricos dedicados ao estudo dos processos de aprendizagem humana. Para que o ser humano possa se desenvolver em sua completude, é necessário que aprenda novas informações a cada nova experiência vivenciada. Cada qual se serve de seus próprios recursos para se apropriar das informações em questão, seja qual for sua natureza (idiomas, cálculos, linguagens, ciências etc.). Nesse sentido, as teorias da aprendizagem se apresentam como o ramo da ciência pedagógica que se ocupa de sistematizar e compor as peculiaridades e especificidades relativas ao campo do aprendizado humano em suas diferentes possibilidades. Cabe ressaltar que as teorias da aprendizagem são diversas e se embasam em di- ferentes correntes do pensamento pedagógico, psicológico, antropológico e outras fontes científicas a elas relacionadas. Com isso, elas procuram reconhecer a dinâmica que se estabelece nos processos de ensinar e aprender, partindo dos estudos sobre o desenvolvimento humano e a relação entre os conhecimentos prévios e os novos saberes obtidos. 18 O principal fator que diferencia uma teoria da aprendizagem de outra, no entanto, é a perspectiva teórico-científica de que cada uma se utiliza. Algumas dessas teorias abor- dam a aprendizagem sob o ponto de vista do comportamento, outras, sob o ponto de vista do desenvolvimento biológico do ser humano e outras, ainda, acerca das capaci- 1 dades intelectuais e cognitivas. Como se trata de um campo de estudos bastante vasto, algumas dessas teorias ganharam destaque no meio educacional, servindo como fun- damento para estudos e práticas que vigoram nos dias atuais. Universidade São Francisco A seguir, seguem algumas das principais teorias da aprendizagem. 3.1. TEORIA BEHAVIORISTA DE SKINNER Burrhus Frederic Skinner foi um importante psicólogo e filósofo estadunidense que vi- veu na primeira metade do século XX e se dedicou aos estudos sobre o desenvolvi- mento humano segundo perspectivas teóricas bastante peculiares. Skinner foi um dos principais precursores das teorias behavioristas e acreditava na ideia de que o compor- tamento é fator determinante para que a aprendizagem possa efetivamente acontecer. De forma mais ampla, o termo “behaviorismo” se refere à perspectiva metodológico- -científica que se dedica a compreender o comportamento humano com base em fatos objetivos, observáveis, não introspectivos. De acordo com a perspectiva behaviorista, o ambiente tem forte influência sobre a maneira como se dá o desenvolvimento humano, pois para ela, o homem é produzido pelas influências externas que recebe. Tendo isso em vista, a teoria behaviorista de Skinner se propôs a compreender o com- portamento dos seres humanos a partir do estudo das repostas que poderiam ser ob- servadas e não das especulações a respeito do que supostamente ocorria no interior do corpo humano; o que não necessariamente significa dizer que desconsiderava as condições fisiológicas específicas de cada um (NOGUEIRA; LEAL, 2018). Para a teoria behaviorista ora em discussão, o comportamento humano ativo independe de um estímulo prévio, pelo contrário, o comportamento não estaria associado de forma obrigatória a nenhum estímulo, sendo, portanto, autônomo e não condicionado (o que não necessariamente significa dizer que a teoria desconsidere a existência dos estímulos). É o que denominou “condicionamento operante”, que o meio molda e produz o re- pertório comportamental dos seres humanos. O termo “operante” foi utilizado para se reportar a qualquer comportamento capaz de gerar efeitos no meio, logo, o conceito de condicionamento operante de Skinner se refere a um mecanismo de aprendizagem de novos comportamentos aos quais se associam métodos de reforço para que esses comportamentos possam se repetir ou não (NOGUEIRA; LEAL, 2018). Desse modo, quando se associa algum tipo de recompensa a um comportamento con- siderado como positivo (para que seja assim reforçado e repetido) e nenhuma recom- pensa quando o comportamento é considerado negativo (para que se gere a expecta- tiva do reforço no caso da realização do comportamento aceito, inibindo-se com isso, a repetição do comportamento negativo em menção). Didática 19 Conceitualizando Didática Ao longo de suas pesquisas, Skinner procurou investigar uma tecnologia comportamen- tal que pudesse se organizar pelo reforço positivo, a partir da qual se reforçaria, tanto no campo individual quanto no coletivo, a manutenção do comportamento desejado em 1 detrimento do comportamento indesejado. EXEMPLO No contexto dessa perspectiva, essa situação pode ser verificada, dentre tantas outras, nos casos em que há uma criança que faz cenas quando quer ganhar algo e recebe o que pre- tende em razão das cenas que faz. O comportamento por ela adotado é reforçado pela re- compensa obtida. Se em vez de receber o que deseja, a criança referida perceber que seu comportamento não é aceito e não encontra reforço em nenhuma das respostas obtidas, autonomamente modificará este comportamento, pois as suas cenas não mais são reforça- das e o comportamento aceito é que passa a ser recompensado (NOGUEIRA; LEAL, 2018). Note-se que esse mecanismo de reforço não compreende a punição como parte das possibilidades de modificação do comportamento, já que no lugar dela está a recom- pensa como fato gerador do reforço positivo. No campo da educação, para o behaviorismo de Skinner, a prática de educar está as- sociada à aquisição de comportamentos que sejam vantajosos para o desenvolvimento do indivíduo, inclusive no âmbito familiar. “De acordo com o teórico, a maior parte das atividades humanas é operante e não reflexa, ou seja, o indivíduo, na maior parte do tempo, opera no seu meio, do que se pode extrair que ele produz estímulos e reforça- dores e não apenas responde a eles (NOGUEIRA; LEAL, 2018, p. 89). No que se refere especificamente aos processos de ensino e aprendizagem, a teoria behaviorista não os compreende como algo inato ou espontâneo nos seres humanos, mas como fruto de um planejamento pedagógico dedicado que se ocupe das individua- lidades dos alunos e os objetivos que se pretende que cada um alcance, o que se torna possível quando diferentes contingências são adotadas para reforçar os comportamen- tos necessários à aprendizagem integral. 3.2. ABORDAGEM EPISTEMOLOGIA GENÉTICA DE JEAN PIAGET Ainda no campo das teorias da aprendizagem, Jean Piaget, psicólogo e cientista su- íço, centrou seus estudos nas estruturas cognitivas e trouxe grandes transformações para as perspectivas educacionais de sua época ao demonstrar, a partir de sua teoria da epistemologia genética, que o pensamento infantil se difere do pensamento adulto. Essa premissa embasou todo o arcabouço teórico piagetiano que se sucedeu. Segundo a abordagem epistemologia genética, é preciso compreender os mecanismos mentais e intelectuais de que o ser humano se serve para compreender as questões de mundo em seus mais diversos contextos. Para tanto, o autor defende que, a partir do nascimento, os indivíduos passam por fases de desenvolvimento cognitivo e, em todos eles, possuem papel ativo na construção de seu próprio conhecimento (DE LA TAILLE; OLIVEIRA; DANTAS, 1992). 20 IMPORTANTE Para a teoria da epistemologia genética, o desenvolvimento cognitivo ocorre em quatro estágios: 1 01. Sensório-motor: se inicia com o nascimento e perdura aproximadamente até os dois anos de idade. O conhecimento é adquirido a partir das capacidades motoras, sensoriais Universidade São Francisco e exploratórias da criança. O desenvolvimento físico é que proporciona maiores possibi- lidades de interação com o meio. 02. Pré-operatório: perdura aproximadamente entre os dois e sete anos de idade. Tem como principal característica o predomínio do pensamento egocêntrico e a confusão entre elementos concretos e abstratos. É marcado pelo aparecimento da linguagem oral. 03. Operatório concreto: perdura, em média, dos 7 aos 11 anos de idade. Marcado pelo início das análises lógicas e pelo declínio do egocentrismo, fator que intensifica as pos- sibilidades de interação. 04. Operatório formal: dos 12 anos em diante. Consolidação do raciocínio lógico e sistema- tizado, apropriação de conceitos e ideias (inclusive as pautadas em elementos abstratos). A abordagem em estudo considera que o desenvolvimento cognitivo da criança se dá por mecanismos de assimilação e acomodação. A assimilação se refere à capacidade de incorporar um novo conhecimento a esquemas mentais já consolidados, que já pos- sui previamente. Já a acomodação seria a habilidade do sistema cognitivo da criança de ajustar-se a esse novo conhecimento alterando os esquemas mentais já existentes com a finalidade de adequar a cognição ao novo conhecimento assimilado (DE LA TAILLE; OLIVEIRA; DANTAS, 1992). Ao assimilar um novo conhecimento e acomodá-lo, a criança atinge o que Piaget deno- minou equilíbrio, situação em que as estruturas mentais, agora modificadas pela apro- priação e pelo ajuste do novo conhecimento aos saberes prévios, estão ainda mais complexas e desenvolvidas. A assimilação acontece quando a criança passa por novas experiências (ou seja, quando é exposta a novas sonoridades, estímulos visuais, com- plexos linguísticos etc.) e procura integrar os novos dados perceptuais recebidos às suas estruturas cognitivas preexistentes. EXEMPLO Quando uma criança está, por exemplo, aprendendo a reconhecer os animais e, até o momen- to, o único animal que reconhece é o gato, pode-se dizer que a organização que possui em seus esquemas mentais prévios é a deste animal (gato), essa é a informação que tem assi- milada. Quando apresentada a um outro animal que seja semelhante ao gato, como um tigre, surge a necessidade da diferenciação entre ambos, no intuito de que não sejam confundidos mentalmente pela criança. A diferenciação do gato para o tigre ocorre pelo mecanismo denomi- nado acomodação. Ao compreender as diferenças que individualizam cada um dos animais, a criança acomodará esses novos estímulos aos esquemas que já possuía consolidando novos esquemas às suas estruturas cognitivas que, por sua vez, se tornam ainda mais completas e específicas. Assim ocorre com cada um dos aprendizados de que a criança se apropria. Didática 21 Conceitualizando Didática É notável, portanto, que Piaget procurou analisar a educação por uma óptica científica e inovadora, o que lhe permitiu servir-se de métodos que o conduziram à compreensão sobre a origem e a consolidação do conhecimento humano, fato que inevitavelmente 1 gerou importantes efeitos sobre a maneira como os processos de ensino e aprendiza- gem passaram a ser conduzidos e sobre a elaboração das práticas educativas especí- ficas para cada momento do desenvolvimento humano. 3.3. ABORDAGEM SOCIOCULTURAL DE VYGOTSKY No início da infância, dentre os recursos mais eficazes de que a criança dispõe para a aprendizagem, estão as interações. Os sons, as cantigas, as falas, as texturas, as quantidades, as transformações e tantos outros elementos próprios de cada contexto formativo, se apresentam como percursos adequados a serem trilhados rumo à aquisi- ção de conhecimentos nessa fase. Essas observações iniciais embasam a teoria sociocultural de Lev Vygotsky, psicólo- go bielorrusso que realizou diversos estudos na área do desenvolvimento humano, da aprendizagem e do papel indispensável assumido pelas relações sociais nesses pro- cessos. Para ele, a constituição dos seres humanos se dá pelas relações que estabe- lecem com o outro. A abordagem sociocultural destaca a aprendizagem como aspecto indispensável ao de- senvolvimento humano, pois, segundo ela, o desenvolvimento é promovido pela apren- dizagem, de modo que a criança necessita aprender para se desenvolver, o que faz a partir das interações (DE LA TAILLE; OLIVEIRA; DANTAS, 1992). São as interações que permitem que o indivíduo obtenha informações externas que são por ela internalizadas criando processos internos que constituem novos saberes. Por essa razão é que, no âmbito dessa perspectiva teórica, o universo sociocultural em que se insere o indivíduo tem extrema relevância, oferecendo grande diversidade de possibilidades interativas e instrutivas que uma vez internalizadas, mobilizam as com- petências individuais do sujeito construindo e ampliando seu plano interior. Note-se que, de acordo com essa articulação, a aprendizagem se consolida como uma experiência socialmente constituída e que depende de intervenções mediadoras que viabilizem os trajetos interativos nas mais diversas situações. A chamada zona de de- senvolvimento proximal se perfaz como uma dessas possibilidades de mediação que propiciam a consolidação dos recursos necessários a que a aprendizagem aconteça de forma autônoma, orgânica e natural. GLOSSÁRIO Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP): é a distância existente entre as ações que a criança consegue praticar de forma autônoma e independente (nível real) e aquelas para as quais depende da intervenção alheia para que possa executar (nível potencial). A ZDP é, justamente, o intervalo entre esses dois momentos do processo de desenvolvimento (DE LA TAILLE; OLIVEIRA; DANTAS, 1992). 22 A zona de desenvolvimento proximal permite que o professor verifique as habilida- des que estão próximas de ser alcançadas pela criança e as potencialidades que possui para que possa alcançá-las. Essas percepções tornam o professor mais sen- sível aos estímulos e ações que sejam necessários para o incentivo e a ampliação 1 da aprendizagem. Sendo assim, partindo do princípio de que a mediação é considerada, nesta teoria, Universidade São Francisco como um aspecto de reconhecida relevância para que a aprendizagem possa se con- solidar, a zona de desenvolvimento proximal se perfaz como campo ideal de articulação e execução do trabalho mediador docente, pois no seu contexto é que os estímulos e as ações acima referidos se tornam executáveis. Uma vez identificados os níveis de desenvolvimento da criança, a abertura de oportuni- dades de aprendizagem que viabilizem a internalização de conhecimentos que a levem a realizar autonomamente aquilo de que ainda não é capaz, é tarefa do professor que, como tal, deve assumir o papel de mediar e oferecer as situações de aprendizagem e não de transmitir verdades absolutas sem conexão com a bagagem cognitiva de que o aluno já dispõe (DE LA TAILLE; OLIVEIRA; DANTAS, 1992). Nas práticas educativas ocorridas na sala de aula, portanto, o desenvolvimento da criança se torna possível à medida que se criam condições favoráveis à aprendizagem, como o ambiente atrativo e organizado, os materiais adequados para cada atividade, a adequação das estratégias às características da faixa etária e assim por diante. Para tanto, é indispensável a observação sobre os saberes prévios que a criança já traz consigo de suas vivências sociais, históricas e culturais, e quais deles a criança já domina ou pode dominar à medida que evoluir em seu processo de aprendizagem. Para a teoria sociocultural, saberes diversos desenvolvem-se também de maneira di- versa, cabendo, portanto, ao educador, acolher as especificidades de cada um, avaliar e conduzir as melhores estratégias aplicáveis a cada caso proporcionando os melhores percursos para as interações sociais. 3.4. ABORDAGEM PSICOGENÉTICA DE HENRI WALLON Henri Wallon nasceu na França, no final do século XIX. Graduado em Filosofia e, mais tarde, em Medicina, dedicou-se ao estudo do desenvolvimento infantil, especialmente sob o ponto de vista da Psicologia. A teoria psicogenética walloniana, portanto, baseia- -se no fato de que, para fins de seu efetivo desenvolvimento, a criança deve ser consi- derada na totalidade de suas potencialidades, sejam elas físicas, cognitivas, biológicas, sociais ou afetivas. A propósito, um dos conceitos mais marcantes dessa teoria se refere ao papel exercido pela afetividade no desenvolvimento humano colocando-a como um de seus aspectos centrais. Para Wallon, o desenvolvimento somente pode acontecer quando o ambiente oferece os estímulos necessários para tal, o que se obtém pelas manifestações afetivas (DE LA TAILLE; OLIVEIRA; DANTAS, 1992). Didática 23 Conceitualizando Didática PARA REFLETIR Note-se que a abordagem psicogenética de Henri Wallon não se refere à afetividade necessa- 1 riamente como sinônimo de carinho, amor, mas sim, como o resultado de manifestações que podem ocorrer pelas emoções, pelos sentimentos e pelas interações sociais ao longo de toda a vida. Por essa razão é que o desenvolvimento infantil deve se reforçar pelo estabelecimento de vínculos que propiciem a ampla manifestação afetiva da criança em todas as situações. Como forma de justificar a maneira como se dá o desenvolvimento da criança, Wallon propôs a teoria dos campos funcionais, reforçando a existência de constructos cogni- tivos que se articulam no processo de desenvolvimento em questão. Para o autor, a criança dispõe de quatro desses constructos: o movimento, a afetividade e a cognição. O movimento, segundo a teoria psicogenética de Wallon, seria uma das primeiras ati- vidades cognitivas a se desenvolver, oferecendo o suporte necessário ao desenvolvi- mento dos demais campos funcionais mesmo antes do domínio da linguagem oral. Já a afetividade, seria o compilado dos domínios sobre as emoções, sentimentos, sensibi- lidade e suas respectivas formas de expressão, o que considera indispensável para o desenvolvimento completo (DE LA TAILLE; OLIVEIRA; DANTAS, 1992). A inteligência ou cognição, por sua vez, está mais vinculada a fatores biológicos do desenvolvimento humano e evolui no contexto da articulação desses fatores com as relações e interações sociais vivenciadas pelo indivíduo. Por essa razão, a psicogênese walloniana se ocupa da formação da pessoa completa, considerando a integração de todos os elementos que permeiam o desenvolvimento humano e o máximo das capaci- dades individuais ao longo do processo. IMPORTANTE Assim como para a teoria da epistemologia genética de Jean Piaget, a teoria psicogenética de Henri Wallon considera que o desenvolvimento humano ocorre em fases, mas para essa última, em cinco e não quatro como para a primeira. Segundo Wallon, ao longo dessas fases, a predominância da cognição e da afetividade se alterna e se estabelece da seguinte maneira: 01. Estágio impulsivo-emocional (0 a 1 ano): a criança se expressa corporalmente e se co- munica pelas habilidades sensoriais. Predominância da afetividade. 02. Estágio Sensório-motor e Projetivo (1 a 3 anos): intensa interação com o mundo exterior, por isso a importância de se oferecer ambientes de aprendizagem diversificados. Predo- minância cognitiva. 03. Estágio Personalismo (3 a 6 anos): descoberta da criança sobre a diferenciação entre si e o outro. Importante a realização de atividades que promovam o reconhecimento e o respeito às diferenças. Predominância afetiva. 04. Estágio Categorial (6 a 11 anos): intensa descoberta do mundo e diferenciação de signi- ficados sobre objetos, relações, fenômenos etc. Importante ampliar as experiências que propiciem essas descobertas. Predominância cognitiva. 05. Estágio Puberdade e Adolescência (a partir dos 11 anos): reconhecimento da personali- dade, identidade e individualidade. Predominância afetiva. 24 A caracterização desses cinco estágios, indica que a teoria walloniana compreende o desenvolvimento humano como um processo que oscila dialeticamente entre a afetivi- dade e a cognição, ou seja, que a aprendizagem não se dá de forma linear podendo ser composta dos mais diversos elementos e especificidades sem perder de vista o impor- 1 tante papel exercido também pela dimensão motora na sua evolução. Universidade São Francisco 3.5. TEORIA DA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA DE AUSUBEL David Ausubel, pesquisador estadunidense nascido no início do século XX, é bastante conhecido no campo educacional em razão de sua teoria sobre o conceito de apren- dizagem significativa, que se contrapunha ao paradigma behaviorista que vigorava à época de sua apresentação. Ao contrário do que propunha o behaviorismo, a teoria da aprendizagem significativa consi- dera como aspecto crucial dos processos de ensino e aprendizagem na escola, os conheci- mentos prévios que o educando traz consigo. Para a concepção de aprendizagem de Ausu- bel, aprender é sinônimo de ressignificar e ampliar os conhecimentos dos quais o educando já tenha se apropriado em suas estruturas mentais. Quanto maior o número de conexões feitas entre conhecimentos prévios e novos, mais ampliado esse conhecimento será. Tendo isso em vista, a teoria da aprendizagem significativa leva em conta todas as peculiaridades que caracterizam as vivências do educando, como a sua história, sua cultura, sua família, seus costumes e seus interesses (RONCA, 1994). A teoria de Ausubel considera o professor como um dos personagens mais importantes dos processos de ensino e aprendizagem, pois cabe a ele viabilizar situações de apren- dizagem que, além de instigantes e motivadoras, possibilitem a construção autônoma e eficaz do conhecimento. Para isso, é preciso que haja o máximo possível de circulação e compartilhamento de informações, de modo que os educandos possam compreendê- -las e refletir sobre elas. PARA REFLETIR Uma boa situação de aprendizagem para a perspectiva da teoria da aprendizagem significati- va de Ausubel, é aquela em que o professor cria situações em que o educando possa pensar sobre os assuntos estudados contextualizando-os em suas práticas sociais. Para tanto, pode se utilizar de recursos como resolução de problemas, estudos de caso, rodas de conversa e quaisquer outras metodologias que possibilitem a articulação entre os conhecimentos curri- culares e aqueles de que o educando já dispõe de suas vivências sociais. Para essa teoria, sempre que o estudante se coloca diante de um novo conhecimen- to, suas estruturas mentais previamente existentes se reconfiguram tornando-se mais complexas pelo aprofundamento obtido com o novo conhecimento apropriado. Essas estruturas se expandem continuamente e, por essa razão, torna-se necessária a cons- tância significativa dos processos de ensino e aprendizagem, o que somente se alcança pelas conexões dos novos conhecimentos com os prévios que, por sua vez, ancoram de maneira significativa, o novo conhecimento recebido (MOREIRA; MASINI, 1982). Didática 25 Conceitualizando Didática A conexão do novo conhecimento com o conhecimento prévio é construída a partir de um sistema de relevância que motiva a aprendizagem, consolidada quando o conheci- mento prévio que já integrava as estruturas mentais da criança é modificado e ampliado 1 pela relação de relevância que estabeleceu com o novo. Novas ideias e informações podem ser aprendidas e retidas na medida em que conceitos relevantes e inclusivos estejam adequadamente claros e disponíveis na estrutura cognitiva do indivíduo e funcionem, dessa forma, como ponto de ancoragem para as novas ideias e conceitos (MOREIRA; MASINI, 1982, p. 4). Note-se, por fim, que para a teoria em estudo, a aprendizagem somente pode ser con- siderada como significativa quando um novo conhecimento se conecta de forma livre e autônoma a outro já existente e para que essa conexão possa acontecer, é preciso que o ato de aprender seja potencializado pela oferta de situações significativas de ensino. Por isso, também para essa teoria, o professor tem papel absolutamente indispensável na formação do educando pela proposta de oportunidades de aprendizagem que efeti- vamente promovam a sua evolução no trajeto formativo. 3.6. APRENDIZAGEM E MEDIAÇÃO DOCENTE As teorias da aprendizagem trazem os fundamentos que explicam a maneira como o ato de aprender se vincula ao desenvolvimento humano e, apesar de cada qual con- templar as suas especificidades científicas, trazem em comum a percepção de que o professor assume importante papel nesse universo. Já se evidenciou também, que o processo de aprendizagem se posterga ao longo da vida, não se resumindo a um único contexto, local ou situação. Tendo isso em vista, a instituição escolar é um desses vários locais, estabelecendo-se como o espaço em que se produzem as aprendizagens sistematizadas que articulam os saberes científicos e escolares com os saberes prévios obtidos pelos alunos em suas práticas sociais (AL- TENFELDER, 2015). Feitas essas considerações, torna-se evidente que o papel desempenhado pelo profes- sor nos processos de ensino e aprendizagem são de extrema importância, tanto no que diz respeito à elaboração das ações educativas que os compõem quanto aos recursos e métodos utilizados para o alcance de cada uma de suas finalidades. No contexto das concepções tradicionais da educação, o educador se apresenta como o centro desses processos por ser ele o responsável por promover o maior acúmulo possível de informações que são transmitidas aos educandos como verdades inques- tionáveis, prontas apenas para serem memorizadas e rememoradas nos momentos de avaliação (FREITAS, 2010). Observe-se inclusive, que nos processos de ensino e aprendizagem organizados sob essa perspectiva pedagógica, os modelos avaliativos caracterizam-se por terem finalidades quantitativas e classificatórias que se ocupam apenas de aferir a aprendizagem como sinônimo da quantidade de conteúdos memorizados e reproduzidos. Essas condutas avaliativas geram rotulações que em nada colaboram para o desen- volvimento holístico da criança justamente por classificar seu desempenho por critérios 26 que não são hábeis a refletir de forma fidedigna, os elementos que efetivamente reflitam as características do trajeto formativo percorrido (FREITAS, 2010). Já no contexto das concepções pedagógicas renovadoras, o foco das ações educati- 1 vas transfere-se para o estudante que, por sua vez, deixa de manifestar uma postura apática e passiva, para assumir uma conduta ativa na construção e na apropriação dos seus próprios conhecimentos. Diante dessa reconfiguração é que o papel mediador do Universidade São Francisco professor ganha espaço, passando a atuar como um facilitador da aprendizagem por meio de estratégias pedagógicas que proporcionem à criança um processo que lhe faça sentido (ALTENFELDER, 2015). GLOSSÁRIO No campo da educação, o termo “mediação” se refere à pratica docente caracterizada por ter como centro de suas atenções o aluno em seu processo de ensino e aprendizagem. O professor que adota postura mediadora caracteriza-se por ser um incentivador e motivador da aprendizagem ativamente constituída. Diferentemente do que acontece com as concepções tradicionais, nas renovadoras, os modelos avaliativos igualmente se reconfiguram tendo o aluno como foco central de seus procedimentos. Ao contrário de aferir dados numéricos, nesse caso, os instrumen- tos avaliativos são utilizados de forma contínua e ao longo de todo o processo de ensino e aprendizagem para que se possa definir as prioridades institucionais, acompanhar e verificar todo o trajeto evolutivo do estudante reestruturando, substituindo ou adotando novas estratégias a cada demanda para que, além do professor, a própria criança possa se inteirar de seu desempenho ao longo do percurso. Observe-se que tanto para as concepções tradicionais quanto para as concepções renovadoras, o professor se faz presente como parte fundamental dos processos de ensino e aprendizagem, diferenciando-se apenas pela maneira como cada concepção aborda o seu papel: enquanto na primeira é ele o centro das atenções como transmissor dos conhecimentos absolutos, na segunda, cede sua centralidade ao educando para o qual oportuniza a aprendizagem, fazendo uso de ações educativas interessantes, atrativas e interdisciplinares constantemente avaliadas para que se possa observar a evolução do aluno em sua totalidade. Essa diferenciação torna clara a relevância da mediação nos processos de ensino e aprendizagem, o que se evidencia de forma ainda mais robusta pelas teorias da apren- dizagem. De uma forma geral, as teorias em menção destacam que o ato de aprender não se estabelece de forma isolada, desconectada das práticas sociais da criança, isso implica em que o professor adote a postura mediadora como premissa para a articu- lação entre os saberes escolares e os saberes oriundos de suas experiências sociais (DELORS, 2001). Portanto, para que essa postura mediadora possa se consolidar, cabe ao professor adquirir novas habilidades que lhe permitam agir como orientador dos processos de en- sino e aprendizagem, construindo suas estratégias pedagógicas a partir do acolhimento Didática 27 Conceitualizando Didática de elementos como as características históricas, sociais e culturais dos alunos, o perfil cognitivo de cada um, os conhecimentos prévios de que já se apropriaram, as metodo- logias mais adequadas de acordo com as bases que fundamentam a aprendizagem e 1 tudo quanto considere ser necessário. De fato, a aprendizagem é composta de relações humanas e suas inconstâncias, con- dição que a sujeita a múltiplas possibilidades de organização, articulação e efeitos. Compreender a maneira como se consolida nos diferentes momentos do desenvolvi- mento humano, portanto, é indispensável para que se possa oferecer os percursos mais eficazes e adequados (DELORS, 2001). É justamente nesse aspecto que mediação e aprendizagem se articulam de forma indis- sociável: o educador assumindo papel de norteador das práticas educativas a partir de condutas dialógicas que privilegiem o acolhimento das diferenças e o desenvolvimento completo, autônomo e democrático do educando. 4. EDUCAÇÃO, INSTRUÇÃO E ENSINO Como forma de se compreender e ampliar os estudos sobre a didática, é antes ne- cessário reforçar que não se pode tratá-la como elemento restrito aos limites de uma instituição ou sala de aula. Para compreender o seu papel e significado, é necessário contextualizá-la nas práticas e vivências sociais. Nesse sentido, ao se buscar compreender a educação em seus diferentes aspectos, é preciso conceber o fenômeno educativo de maneira integrada, como parte das re- lações e atividades humanas ocorridas nas mais diferentes situações. É no âmago desse conjunto de saberes indispensáveis à formação docente que a Didática surge como fator essencial. A ciência que investiga a teoria e a prática da educação nos seus vínculos com a prática social global é a Pedagogia. Sendo a Didática, uma disciplina que estuda os objetivos, os conteúdos, os meios e as condições do processo de ensino tendo em vista finalidades educacionais, que são sempre sociais, ela se fundamenta na Pedagogia; é, assim, uma disciplina pedagógica. Ao estudar a educação nos seus aspectos sociais, políticos, econômicos, psico- lógicos, para descrever e explicar o fenômeno educativo, a Pedagogia recor- re à contribuição de outras ciências como a Filosofia, a História, a Sociologia, a Psicologia, a Economia. Esses estudos acabam por convergir na Didática, uma vez que esta reúne em seu campo de conhecimentos, objetivos e mo- dos de ação pedagógica na escola (LIBÂNEO, 1990, p. 16). Com efeito, a principal função do educador é justamente o ato de ensinar que “consiste em dirigir, organizar, orientar e estimular a aprendizagem escolar dos alunos”, de onde se pode extrair que ensino e aprendizagem se conectam indissociavelmente nos per- cursos que trilham em seu desenvolvimento (LIBÂNEO, 1990, p.16). É, portanto, em razão dos atos de ensinar e aprender que se mobilizam os conhecimentos pedagógicos em torno do alcance da formação completa do educando. Assim como para as ações educativas, as práticas docentes que a elas se conectam são igualmente parte de um contexto social que produz efeitos sobre a maneira como se articulam, se aplicam e se reestruturam. Dessa forma, o exercício profissional do 28 professor, tal como as ações educativas, encontra subsídios e contrariedades nos sig- nificados sociais que as fundamentam ou refutam. Esse fato é fundamental para a compreensão de que tanto as ações educativas como 1 as relações professor-aluno, as metodologias e a própria síntese da Pedagogia não são estáticas e sim, variáveis, se modulam a cada novo contexto do qual faça parte. Sendo assim, para esse campo de atuação, a educação deve sempre ser compreendida a par- Universidade São Francisco tir da observação e da compreensão das circunstâncias em que se inscreve. Vê-se, ademais, que a relevância sobre a função social da escola e do próprio pro- fessor, se intensifica à medida que se dá conta de que para que possa exercer suas funções na totalidade de suas responsabilidades, é antes preciso um resgate e levanta- mento criterioso sobre os elementos contextuais e saberes prévios que caracterizam a realidade escolar de cada um dos alunos. 4.1. DEFINIÇÕES SOBRE EDUCAÇÃO, INSTRUÇÃO E ENSINO A educação é produto e produtora das práticas sociais, sendo indispensável para a construção e manutenção das relações na sociedade. Por esse motivo, a preocupação sobre a oferta de um modelo educativo sólido, completo e de qualidade perpassa os direitos e deveres sociais, pois dele depende a formação que formará ou não, cidadãos aptos a atuar em seu contexto. É por meio da ação educativa, que os elementos que compõem o meio social passam a fazer parte da formação de seus sujeitos. Essas ações podem, segundo Libâneo (1990), gerar influências não intencionais ou intencionais. As influências educativas não intencionais são aquelas que decorrem de fatores do meio social, do contexto de vivência do sujeito em sociedade, e promovem a aquisi- ção de conhecimentos não necessariamente vinculados a uma instituição ou a um currículo obrigatório. As influências educativas intencionais, por sua vez, são decor- rentes de objetivos previamente estabelecidos, como os decorrentes das estruturas curriculares obrigatórias, por exemplo. Há, nessa última, uma intencionalidade educa- tiva que orienta as práticas direcionadas à formação, é o caso da educação oferecida na escola, por exemplo. Partindo dessas constatações, a educação escolar se apresenta como campo fértil para a articulação intencional de diversos saberes, influências, culturas e relações provenientes dos mais diferentes lugares e vozes da sociedade, o que torna a es- colarização, um meio indispensável à formação de um sujeito que, pela apropriação estratégica dos conhecimentos, se torna hábil a reconhecer, criticar e transformar a própria realidade (LIBÂNEO, 1990). Tal como a educação, num cenário de compreensão mais amplo, o ato de ensinar é também compreendido como produto e produtor dos elementos sociais. Além de cum- prir com as exigências e demandas sociais, o ato de ensinar, que se difere dos atos de educar ou de instruir, propicia situações de aprendizagem que podem estar associadas à reflexão crítica sobre a assimilação de conhecimentos. Didática 29 Conceitualizando Didática IMPORTANTE De acordo com Libâneo (1990), os termos “educação”, “instrução” e “ensino” se definem da 1 seguinte maneira: 01. Educação: processo de desenvolvimento humano orientado pelas características do contexto e práticas sociais que a permeiam. Modalidade de influência educativa cuja finalidade é a formação do sujeito. 02. Instrução: se refere ao desenvolvimento das capacidades intelectuais e cognitivas do indivíduo. A instrução é parte do processo educativo. 03. Ensino: corresponde aos recursos mobilizados para a concretização da instrução. É o campo principal da educação e instrução. Assim, pode-se concluir que a educação praticada na escola articula interação e ensino segundo objetivos intencionalmente definidos a partir das exigências sociais, institucio- nais e políticas a ela atribuídas. Pela educação escolar, portanto, é que os indivíduos, em igualdade de acesso e oportunidades, encontram as possibilidades de acessar sa- beres a que possivelmente não alcançariam fora da escola. 4.2. EDUCAÇÃO E DIDÁTICA A atividade educativa, considerada como prática social, ocorre nos mais diversos gru- pos, setores e instituições (famílias, escolas, instituições religiosas, associações etc.), perpassando a realidade dos sujeitos em todos os aspectos de suas vivências indepen- dentemente de suas características pessoais, culturais ou etárias. Como visto, a educação escolar se estabelece como um conjunto de práticas educati- vas intencionais que se articulam no contexto das instituições educacionais, o que não a desvincula do cenário social em que se insere. Com isso, a escola torna democrático o acesso aos conhecimentos sobre o mundo e oportuniza a formação e a construção do pensamento crítico, reflexivo e politizado; o que faz pela sistematização entre os saberes escolares e os saberes socioculturais que integram as vivências do educando. Na escola, o processo de ensino e aprendizagem que se desenvolve a partir das prá- ticas, instrução e ensino consiste justamente no conjunto de estratégias educativas aplicadas em favor da apropriação dos conhecimentos que dão suporte à evolução do educando em sua trajetória. Nesse sentido, para tornar eficaz e completo este pro- cesso, é necessário que, além de se servir de recursos e estratégias condizentes com as demandas, características e interesses de todos os envolvidos, seja orientado por finalidades estabelecidas em consonância com o sujeito que se pretende formar. Tarefa que incumbe à Pedagogia. A Pedagogia é um campo de conhecimento que investiga a natureza das finalidades da educação numa determinada sociedade, bem como os meios apropriados para a formação dos indivíduos, tendo em vista prepará-los para as tarefas na vida social. Uma vez que a prática educativa é o processo pelo qual são assimilados conhecimentos e exp eriências acumulados pela 30 prática social da humanidade, cabe à Pedagogia assegurá-lo, orientando-o para finalidades sociais e políticas, e criando um conjunto de condições metodológicas e organizativas para viabilizá-lo. (LIBÂNEO, 1990, p. 24) Com isso se torna possível compreender a relação que se estabelece entre educação, 1 pedagogia e didática. A pedagogia, como ciência que trata das questões e dos méto- dos relativos ao ensino e à instrução dos indivíduos, é composta de diversos ramos de Universidade São Francisco estudos dedicados à abordagem de cada uma dessas questões e métodos de forma específica e aprofundada. Um desses ramos é a didática, direcionada a investigar “os fundamentos, condições e modos de realização do ensino” (LIBÂNEO, 1990, p. 25). À didática cabe a investigação sobre as especificidades do ensino sem perder de vista o seu compromisso com a aprendizagem. O estudo da didática permite que se tenha acesso a conhecimentos sobre o que é o ato de ensinar, em que aspectos o ato de ensi- nar se relaciona ao ato de aprender, as metodologias de ensino e aprendizagem e suas interfaces sociais, os embasamentos científicos que justificam cada um dos métodos de ensino e a formação docente. Sendo, portanto, a instrução a responsável pela apropriação dos conhecimentos ne- cessários à vida em sociedade e o ensino, o responsável pelo conjunto de ações in- dispensáveis para que a instrução aconteça de forma efetiva e duradoura, é função da didática proporcionar ao docente os saberes pedagógicos, teóricos e científicos que oportunizem a elaboração de práticas que articulem os conhecimentos socioculturais do educando e os conhecimentos sistematizados a serem desenvolvidos na escola, pelo uso de recursos e procedimentos que estejam igualmente conectados às demandas que são provenientes dessas relações. O exercício docente é político, é prática social e, como tal, se realiza a partir de relações em que se manifestam os interesses dos mais diversos atores sociais. É a partir desse cenário que as ações educativas se organizam, são planejadas e executadas, de modo que, da mesma forma, a didática deve estar a serviço dos interesses daqueles à qual se dirigem os seus efeitos, tanto dentro, quanto fora da escola. PARA REFLETIR Segundo Libâneo (1990), os estudos sobre a didática se concentram na investigação sobre a mediação entre objetivos e conhecimentos do ensino nas instituições educacionais. Na prática, essa perspectiva implica em que os objetivos e conhecimentos inerentes a cada processo educativo considerem os fatores sociais, históricos, culturais, políticos, econômicos e tantos outros. Ao serem desenvolvidos, portanto, é necessário que o educando possa visu- alizar claramente a aplicabilidade e a correlação entre eles. Isso para que esses processos traduzam os anseios sociais e os torne parte da formação recebida na escola como forma de que cada saber ali obtido possa ter sentido diante das práticas e vivências do educando em seu cotidiano social. Note-se que, por mais simples que possa parecer, o ato de ensinar é uma tarefa com- plexa que demanda preparo profissional e inclinação pessoal no sentido da realização de um planejamento pedagógico de cunho democrático e acolhedor, capaz de conside- rar as diferenças e necessidades de cada um para a consolidação de um ensino que se Didática 31 Conceitualizando Didática sirva de recursos e metodologias alinhados às finalidades sociais, históricas, culturais e pedagógicas da educação. É dessa maneira, portanto, que educação e didática se articulam pelas relações que se 1 estabelecem entre alunos, professores, sociedade, ensino e instrução. Cada situação didática vincula-se a questões sociais, a objetivos educacionais, a interesses individu- ais e são esses fatores que norteiam as estratégias a serem utilizadas em cada uma dessas situações respeitando-se, para tanto, a centralidade do aluno como aspecto principal dos processos de ensino e aprendizagem. CONCLUSÃO De todo o estudado, é preciso que se analise a didática de acordo com propostas modifica- das em torno do modo de pensar e agir docentes de forma que, a partir deles, o professor se torne capaz de buscar a efetiva democratização do ensino concebido como um processo em que todos os atores tenham respeitadas as suas peculiaridades e demandas. Essas considerações justificam a importância de uma formação docente robusta e con- tinuada que seja capaz suprir as inúmeras exigências impostas ao trabalho do profes- sor. Os estudos e a compreensão sobre a didática são parte dessa formação e devem compor os estudos desse profissional ao longo de toda a sua carreira, principalmente porque, sendo a didática um ramo da pedagogia igualmente contextualizado pelas prá- ticas sociais em constante transformação, é necessário também criticá-la e reinventá-la de acordo com as demandas de cada grupo e de cada tempo. Apesar dos incontáveis esforços, é certo que a didática, isoladamente, não é suficiente para a formação total e completa do cidadão crítico, fato que lhe exige a composição com diversos fatores políticos, sociais, históricos e culturais que, uma vez articulados, desvelam os obstáculos que a impedem de alcançar construções contextualizadas e socialmente comprometidas com a formação de um sujeito que seja capaz de compre- ender, criticar e transformar a sua própria realidade. 32 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALTENFELDER, Anna Helena. 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