Ética e Ciências Sociais - Mestrado Integrado em Medicina - FMUL 2023-2024 PDF
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Summary
This document is a summary of the 'Ética e Ciências Sociais' course for the integrated master's in medicine at FMUL, for the 2023-2024 academic year. It covers various ethical frameworks like consequentialism, deontology, and principlism, and examines aspects of patient care and decision-making. Topics such as conflict of interest and end-of-life care are addressed.
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Mestrado Integrado Em Medicina - FMUL ÉTIKA E CIÊNCIAS SOCIAIS 2023-2024 Índice Introdução à ética..................................................
Mestrado Integrado Em Medicina - FMUL ÉTIKA E CIÊNCIAS SOCIAIS 2023-2024 Índice Introdução à ética........................................................................................... 3 Como defender uma ação eticamente?....................................................... 3 Ética do Cuidado......................................................................................... 5 Conflito de Interesses..................................................................................... 6 Diferença entre conflito e interesse............................................................. 6 Conflito de interesses.................................................................................. 6 Conflito de obrigações......................................................................... 7 Conflito de esforço/tempo................................................................... 7 Conflito intelectual/ de consciência..................................................... 7 Conflito de papéis................................................................................ 8 Conflitos conscientes e inconscientes......................................................... 8 Declarações de conflitos de interesses (CDI)............................................... 8 Relação com a Indústria - "Dilema dos pequenos presentes"...................... 9 Medicinas alternativas.............................................................................. 10 Ética na educação e ciência............................................................................ 11 Ética, Educação e Cidadania: a transformação necessária......................... 12 Novos desafios - transdisciplinaridade e construção de ciência................ 12 O princípio do respeito pelas pessoas......................................................... 12 Código de Nuremberg 1949:....................................................................... 13 Declaração de Helsinquia 1964:.................................................................. 14 Relatório de Belmonte 1979:....................................................................... 14 Dilema Vs. Problema ético.......................................................................... 15 Ética no fim de vida....................................................................................... 16 Capacidade Vs. Competência..................................................................... 18 Eutanásia Vs. Suicídio assistido.................................................................. 18 Ética no início de vida................................................................................... 20 Estatuto do embrião................................................................................... 21 Direitos do embrião – Estatuto jurídico...................................................... 22 Autonomia e Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG)............................. 24 Ética em saúde mental.................................................................................. 25 Métodos de raciocínio ético em psiquiatria............................................... 25 Reflexões da ética em saúde mental.......................................................... 26 Ética integrativa........................................................................................ 27 Internamento involuntário........................................................................ 28 Avaliação do risco em psiquiatria.............................................................. 28 Parens Patriae........................................................................................... 29 1 Estigma Público........................................................................................ 30 Estigma Privado........................................................................................ 30 Ética e integridade científica........................................................................ 32 Má conduta na investigação..................................................................... 32 Consequências da má conduta................................................................. 33 Ameaças à integridade.............................................................................. 33 Ética nas organizações................................................................................. 36 Responsabilidade dentro de um quadro de razão...................................... 36 Clima ético................................................................................................ 36 Definição de prioridades........................................................................... 36 Ética a escala de saúde pública................................................................. 37 Cuidados de emergência em cenários de desastre.................................... 38 Discussão de casos mencionados em aula................................................ 39 Ética e sistemas de saúde............................................................................. 42 Problemas com as tecnologias da saúde................................................... 42 Sistema de saúde digital............................................................................ 43 Metaverso e Telesaúde............................................................................... 44 Inteligência Artificial (IA).......................................................................... 44 Ética e comissões de ética............................................................................. 46 O futuro da bioética...................................................................................... 49 Animais, Alimentação e Ambiente............................................................. 49 Início de Vida............................................................................................50 Dados e Tecnologias................................................................................... 51 Aplicações digitais - Reconfiguração da Autonomia e da Responsabilidade.................................................................................................................. 54 Saúde e Sociedade..................................................................................... 57 Pesquisas Éticas....................................................................................... 60 2 Introdução à ética “A ética é a arte de abrir exceções.” Como defender uma ação eticamente? Existem diversos modelos ou “escolas de pensamento”: Consequencialismo: Pressupõe uma ideologia utilitarista. Podemos considerar o consequencialismo de ato, segundo o qual eu devo ponderar se a minha ação leva ao maior bem, ou de regra, o qual dita que a minha regra deve provocar o maior bem. Deontologismo: Pressupõe que a ação é justificada pelas boas intenções. No entanto, é uma ideologia que cria muitos dilemas éticos e impõe muitas limitações ao nível da autonomia do sujeito. Segundo esta ideologia a mentira é sempre errada. Principialismo: Pensar na ética através de princípios. Autonomia: providenciar informação aos doentes, permitindo que estes tomem as suas decisões. o É um dos princípios mais fortes da atualidade. Para se agir autonomamente é necessário que se seja um sujeito intencional, com conhecimento (sem demência); que se tenha um conhecimento prévio e compreensão das consequências da ação; e que não se esteja a ser influenciado externamente. o O médico da atualidade não deve ajudar o doente só com base nas suas ideologias, mas sim ajudar o doente à luz das ideologias dele. o Este princípio pode entrar em conflito com os nossos próprios valores, o que será abordado mais à frente. Não maleficência: é o princípio mais linear. Devemos agir de modo a não causar dano. o Dano = obstáculo, dificuldade ou impedimento no cumprimento de uma das partes por condições auto ou hétero lesivas. o A medicina estética entra muito neste campo: sujeitar uma pessoa ao desconforto de uma cirurgia sem justificação médica (apesar de poder ter outros contornos e benefícios no bem-estar e auto-estima das pessoas). Beneficência: realizar ações que visem beneficiar os doentes. 3 o Atualmente o médico deixou de decidir em prol do melhor para o doente, mas passou apenas a ajudar o doente a decidir. o Temos a beneficência geral e a específica (de acordo com obrigações específicas de cada indivíduo). Nota: a beneficência e a não maleficência são princípios que muitas das vezes têm de ser pesados na balança. Exemplo prático: as vacinas são extremamente importantes, mas como sabemos, também têm efeitos secundários que podem ser maus para os doentes. Aqui, apesar desta vacina poder causa um dano, tenho de valorizar o potencial que essa tecnologia (a vacina) pode trazer para aquele doente que fica imunizado contra determinado microrganismo p.e. e também pode ter um benefício em termos de contágios (melhorando a saúde pública). Outro exemplo que é bastante abordado é o uso de determinados testes de rastreio ou as chamadas “análises de rotina” em que é detetada uma anomalia, mas pode ser desvalorizável ou dever-se a um falso positivo do teste. Neste caso podemos estar a criar stress nestas pessoas ou prosseguir com mais testes (alguns até mesmo invasivos) sem que isso traga grande benefício para o doente, apesar da intenção ser boa. Justiça: evitar discriminação e garantir uma distribuição justa de recursos. o princípio que do ponto de vista formal implica uma igualdade, ou seja, todos os doentes são tratados de forma igual. No entanto, por vezes, as circunstâncias de cada pessoa podem não ser iguais e temos de considerar cada pessoa segundo a necessidade, o esforço e a contribuição. Estes são os principais, mas já há mais. Existem ainda aquilo que se podem chamar “qualidades morais” que são a empatia, a sinceridade, a integridade, resiliência, humildade e respeito, que são características que à partidos os médicos devem ter. Ética das virtudes: é aquilo que eu sou como pessoa que determina a consequência das minhas ações e para tal eu tenho de ter virtudes (como a honestidade p.e.). Algumas limitações deste modelo: O cenário muitas vezes não é suficiente para avaliar o sujeito e as ações. Valoriza a virtude do sujeito para avaliar o valor ético das suas ações. 4 Temos de saber hierarquizar a bondade e saber articular a bondade e a honestidade. Fronesis (“phronesis”): sabedoria prática. Refere-se à virtude que nos permite discernir entre o bem e o mal e tomar decisões razoáveis. Conceito de sabedoria que se adquire na prática clínica e não em teoria, e está relacionado com a sensibilidade de organizar os nossos princípios, de modo a termos capacidade de avaliar uma situação e decidir. Ética do Cuidado há significado moral nos elementos fundamentais dos relacionamentos e dependências na vida humana. a ética do cuidado procura manter relacionamentos através da contextualização e promovendo o bem-estar de quem cuida e de quem recebe cuidados estabelecendo uma rede de relações sociais. 5 Conflito de Interesses Diferença entre conflito e interesse O conflito refere-se o choque entre elementos contrários, discórdia, luta entre interesses antagónicos, oposição. O interesse depende do que convém a alguém, traz vantagem/proveito/lucro. Conflito de interesses Segundo Lobo Antunes, este acontece sempre que uma instituição ou indivíduo têm um compromisso/dever primário, mas simultaneamente aparece um dever secundário que pode levar ao risco de anular o primeiro (ou é suficientemente tentador). TENSÃO ENTRE DOIS ELEMENTOS – o conflito de interesse ocorre no momento anterior à decisão (entre estes 2 compromissos), seja ela transgredir o plano moral ou não. Não podemos dizer que há um conflito de interesses se a decisão já foi tomada. Em medicina, segundo Beauchamp e Childress (1979), o conflito de interesse surge quando, adicionalmente às obrigações de proteger e promover os interesses dos doentes, os médicos têm outro interesse (financeiro ou pessoal) que rivaliza com a fidelidade e lealdade para com os doentes. Um conceito um pouco redutor à prática médica. Por norma associamos o interesse primário ao bem-estar do doente e o secundário ao bem-estar financeiro do médico. Exemplo prático 1: Médico com ações numa determinada farmacêutica que prescreve medicação desnecessária a um doente só para lucrar posteriormente - ISTO NÃO É UM CONFLITO DE INTERESSES! Novamente é reforçada a ideia de que o conflito de interesses é o momento ANTES da tomada de decisão (neste caso da prescrição). Após a tomada de decisão podemos dizer que estamos perante uma atitude não ética. Exemplo prático 2: Imaginemos um médico que tem a possibilidade de reencaminhar doentes para a sua clínica privada a partir do hospital público onde trabalha e escolhe fazê- lo sem que haja grande benefício ou necessidade por parte do doente, apenas com o intuito de lucrar com isso – novamente, isto não é um conflito de interesses, mas sim um curso de ação não ético! 6 Se tivermos em conta que o tempo de espera para determinado procedimento pode ser muito superior no público e o doente pode estar mais impaciente e precisar dessa referenciação, e estivermos ainda a ponderar fazer a referenciação, porque sabemos que isso vai contra o compromisso primário para com a instituição pública estamos perante um CONFLITO DE INTERESSES! Compreende o período de reflexão entre os 2 compromissos. Tipos de Conflitos de Interesses: Conflito de obrigações Não é possível dizer qual é a ação mais importante ou mais moral. Não conseguimos identificar qual das obrigações prevalece. Uma obrigação não é um conceito estreitamente pessoal, mas sim algo coletivo (p.e. ter um contrato com a faculdade e com o hospital e por isso pode haver um conflito entre as aulas e as consultas). Exemplo: o cancelamento de atividades clínicas pela academia (por exemplo para dar aulas) ou para o voluntariado - é percetível que ambas as obrigações são importantes. Conflito de esforço/tempo Relacionado com o tempo devotado de esforço a cada uma das atividades. Existe um dilema entre o tempo que disponibilizamos para várias responsabilidades que temos. Existe alguma que se sobrepõe à outra? Exemplo: um médico que é investigador está a dar o tempo devido a cada uma das suas vertentes da carreira? Tempo de consulta versus tempo de laboratório. Conflito intelectual/ de consciência Entre convicções fortes que temos e o confronto que estas podem encontrar. Quando poderá existir uma forte motivação extrínseca para determinadas ações/posições. Exemplo 1: um investigador que é convidado a fazer um estudo em embriões, mas devido à sua religião ou por motivos pessoais não aceita fazê-lo. Exemplo 2: Foi publicado um estudo que falava nas diferenças anatómicas cerebrais entre sexos diferentes e entre orientações sexuais diferentes. Os resultados "favoreciam" a homossexualidade, sendo que o autor era homossexual. Não está em causa a veracidade dos resultados, mas sim a sua credibilidade porque há de facto um conflito nesta situação. 7 Conflito de papéis Assumir papéis com competências antagónicas, mas complementares. Poderemos associar a competências contraditórias e que entram em conflito dentro das obrigações do mesmo contrato de trabalho. Exemplo: médicos intensivistas que têm de fazer uma seleção dos doentes que podem ser admitidos na UCI tendo em conta não só fatores clínicos como fatores de recursos materiais e humanos. Conflitos conscientes e inconscientes Estão relacionados com o grau de consciência do agente sobre os conflitos de interesse. Os conflitos são conscientes quando o indivíduo tem noção deles e se declara, tentando mitigar a sua influência. Consideramos que os conflitos são inconscientes quando o indivíduo tem noção deles, mas acredita conseguir sem imparcial para a questão. Declarações de conflitos de interesses (CDI) Propósito: dar a conhecer ao leitor do artigo qual o contexto do investigador, para que se possa ser transparente quando existe algum interesse num determinado outcome. A declaração de conflitos de interesses procura manter a integridade do julgamento e assegurar a confiança do público nos profissionais e nas suas decisões. "A ciência não existe até ser publicada." – Drummond Rennie, 1988. Os próprios editores e revisores podem ter conflitos de interesses – muitos são investigadores que também querem ter publicações e competem com as pessoas cujos artigos editam ou revêem. Editor: chefe de uma revista indexada que em última análise é quem escolhe se um determinado artigo será publicado - existe um conflito de interesses entre aquilo que vende artigos e aquilo que pode ter mais interesse para ser publicado pelo seu valor científico. Este editor tem como missão assegurar a objetividade e imparcialidade nas publicações científicas. 8 Comportamentos não-éticos por parte deste agente: Decidir publicar um artigo de um amigo, ignorando críticas de peer reviewers. Recusar/atrasar a publicação de um artigo de um “rival científico”. Interesses financeiros em farmacêuticas. Preocupação com “saúde financeira” do seu jornal -> publicações sensacionalistas. O que deve ser declarado? Isto ainda é um tema a ser debatido. Basicamente há autores que defendem que a relações familiares e até religiosas devem ser expostas, enquanto outros apoiam a ideia de que este domínio é privado e, portanto, não deve constar na CDI. Integridade científica: Foram retirados vários artigos de grandes plataformas por terem sido confirmadas atividade fraudulentas, como manipulação de resultados. A questão da falta de declarações de conflitos pode ter consequências devastadoras. Relação com a Indústria - "Dilema dos pequenos presentes" A indústria possibilita muita formação e investigação para médicos e por isso tem um papel muito positivo para os próprios e consequentemente para as comunidades onde irá atuar. No entanto tem o lado perverso, porque pode corromper ou de certa forma incentivar a preferência por produtos dessa indústria, mesmo sem existir uma necessidade real dos doentes. Nota: Pequenos presentes podem ser canetas e amostras de produtos da indústria farmacêutica. Isto pode levar ao sentimento de dever de reciprocidade - Ideia de que não existem "prendas grátis". O estudante de medicina é não-prescritor, então estará livre de obrigações com as empresas farmacêuticas? Existem 2 linhas de pensamento relativamente à posição do estudante de medicina face à sua relação precoce com a indústria: "Something for nothing" - o estudante de medicina, não prescritor, recebe algo (exemplo: uma caneta), mas não há dever recíproco, uma 9 vez que este não pode fazer nada pela indústria que lhe ofereceu esse bem. Não havendo esse dever de retribuir, o estudante pode ficar com a ideia errada de que pode explorar a indústria. "Something for something" - nesta linha de pensamento é defendido que o estudante é moldado pela relação que estabelece precocemente com a indústria e a felicidade que lhe é proporcionada com estes presentes pequenos terá impacto no futuro. NOTA: Há quem defenda que o Juramento de Hipócrates deve ser revisto para que o médico se responsabilize e comprometa a não se deixar corromper pela indústria e pelo marketing. No sentido de alertar para a questão de não sermos influenciáveis e praticarmos medicina com responsabilidade. Medicinas alternativas Têm uma popularidade crescente. Levantam grandes questões éticas no conflito entre a beneficência e a autonomia do doente. Para além disso, as terapêuticas alternativas podem levar ao adiamento de terapêuticas convencionais. Consentimento informado: É fundamental, mas exige conhecimento. Como é que transmitimos informação se não dispomos de evidência? Nas medicinas alternativas é difícil estabelecer um consentimento informado, uma vez que não existe evidência científica que permita esclarecer os doentes quanto aos seus riscos e benefícios. Este facto faz com que seja altamente duvidosa a recomendação destas terapias pelos médicos. 10 Ética na educação e ciência Ética: "ciência que nos ensina o que é bom para o homem e para a sociedade". Compromisso para com princípios e valores que guiam a nossa ação. É uma ciência prática, no sentido em que orienta a ação. Aprende-se fazendo (“a arte de viver”). Já dizia Aristóteles, é a nossa conduta que dita o nosso caráter. “Continuar a fazer o que é correto, mesmo que estejamos sozinhos, porque valorizamos e respeitamos as pessoas sem querer apenas corresponder à validação de terceiros.” Moral: condicionamento histórico e cultural, que é mutável pois depende dos contextos - pode modificar-se ao longo do tempo. Diz o que é certo/errado dentro de um contexto e está intimamente relacionado com a norma e a lei. “O que fazemos correto quando estamos a ser observados”. Compromisso moral: respeito pelos princípios inerente a um determinado contexto (p.e. profissional) e transparência. Lei: estabelece os domínios éticos quando a sociedade não é capaz de os organizar. Educação: forma de introduzir um cidadão à realidade total para compreender e desenvolver o máximo das suas dimensões. Ajuda os indivíduos a atingir o seu máximo de potencial. “Educa-se porque nenhum ser humano é capaz de ser feliz sozinho”. Conhecer o significado das coisas, o sentido da realidade, incluindo o significado da vida, e uma necessidade primária – existe uma curiosidade inata. Cidadania: conjunto de direitos de um cidadão. Processo individual e coletivo de estar integrado numa sociedade e de fazer o máximo para respeitar os princípios de onde estamos inseridos. É o que nos acontece. O desafio entre os valores, os princípios, o conhecimento, a racionalidade e o agir humano. 11 Ética, Educação e Cidadania: a transformação necessária A educação para a cidadania visa contribuir para a formação de pessoas responsáveis, autónomas, solidárias, que conhecem e exercem os seus direitos e deveres em diálogo e no respeito pelos outros, com um espírito democrático, pluralista, crítico e criativo. A experiência resulta da aplicação humana à realidade. Ou seja, aqui estamos a falar de um saber mais prático que resulta da nossa própria vivência. Aquilo que nos acontece e as circunstâncias do dia-a-dia levam-nos a questionar como devemos agir e assim aprendemos. De certa forma é assim que ligamos a ética, a educação e a cidadania. Novos desafios - transdisciplinaridade e construção de ciência Ciência → bem público global. O conhecimento cientifico/académico é UNIVERSAL (se não tivermos em conta fatores de acesso e justiça). Os saberes, a sabedoria e a experiência de vida não são universais, mas sim PESSOAIS e tornam-se muito importantes na construção de respostas humanas, pois ela não é replicável. A construção de conhecimento alicerçado no seu valor social visa uma criação de conhecimento com impacto positivo na área onde atua e com mudanças de práticas humanas. O propósito da investigação deve ser ir ao encontro das necessidades da sociedade. O princípio do respeito pelas pessoas Ponderação: capacidade de hierarquizar as diferentes normas, pelo que, quanto mais exigente é uma decisão, mais necessário será usar a ponderação. Ajuda a determinar qual é o princípio ou a norma que supera os outros em situações especificas. Princípios éticos: Respeito pela dignidade e integridade; Respeito pela autonomia e autodeterminação (liberdade, o indivíduo faz escolhas livres e opta por aquilo que quer); Respeito pela intimidade, unicidade e privacidade (ter atenção ao contexto e espaço físico onde estamos a contactar com o doente e a quem estamos a transmitir informação do doente p.e.; é importante ter 12 em conta muita da documentação legal que enquadra esta problemática e noção de quais as implicações da quebra do sigilo e de outros direitos relacionados com a autonomia do doente); Beneficência e Não Maleficência; Justiça e proporcionalidade; Respeito pela vulnerabilidade humana; Solidariedade e cooperação (está ligado com a justiça, porque devemos ser solidários para com os doentes ou com os colegas que estão mais vulneráveis) Integridade, honestidade, transparência e idoneidade (investigação ou prática) - gera confiança e respeito pelo outro. A ética é parte integrante do processo de investigação científica, desde a sua conceção até ao seu termo. A conformidade ética (de qualquer projeto/investigação) é considerada essencial para promover verdadeira excelência em investigação. → A criação de conhecimento não deve sobrepor- se ao interesse e bem-estar do ser humano!!! Exemplo: os países em desenvolvimento já foram usados como local para fazer estudos científicos, mas onde os resultados desses estudos, que poderiam ser benéficos para aquelas populações não foram partilhados com os mesmos. A partir do momento em que os investigadores foram embora aquela população ficou vulnerável e, por isso, atualmente é exigido que haja uma partilha que vise o melhor interesse destes cidadãos e que impeça que estes sejam instrumentalizados. Para que não haja um aproveitamento da sua posição de vulnerabilidade e necessidade. Código de Nuremberg 1949: 1ª código internacional de ética - criado como resultado das experimentações durante a II guerra mundial. Definiu 3 aspetos substantivos e fundadores: o Consentimento prévio e voluntário do sujeito (ninguém pode ser investigado sem consentimento); o Liberdade de sair no decurso da investigação (qualquer pessoa pode dizer “eu não quero mais ser investigado”); 13 o Relação risco/benefício apropriado (tem de existir um benefício para a população/ pessoa que vai se investigada, pela possibilidade de poder enfrentar riscos). Declaração de Helsinquia 1964: O bem-estar não pode ser posto em causa, estando acima do interesse científico ou da sociedade; O consentimento informado deve ser escrito; Cuidado com a vulnerabilidade do sujeito (vulnerabilidade intrínseca está relacionado com características próprias; vulnerabilidade extrínseca está relacionado com as nossas relações com o exterior – pessoas, ambiente, etc) Uso limitado do placebo (falso medicamento); Cuidado com a existência de relações com o investigador; O doente deve ter benefícios na investigação. Relatório de Belmonte 1979: Definiu princípios e diretrizes éticas para a proteção de seres humanos em investigação → Compromisso moral Investigação com animais: "eu posso, mas eu devo?" - devemos ter sempre isto em consideração. Compromisso moral: é imprescindível na investigação. Compromisso em que assumo que tenho de respeitar os princípios, regras e normas. Não maleficência - não causar dano. Beneficência - fazer o bem para o doente com base nos nossos conhecimentos e as vontades dos doentes Vulnerabilidade (=ferida aberta) - quinto princípio da ética médica em que temos de tentar colocar o doente num patamar mais simétrico e não nos meter num pedestal e usufruir da nossa posição de "superioridade". Os princípios do respeito pela pessoa, beneficência e justiça foram aceites como os 3 princípios fundamentais para a conduta ética em investigação envolvendo participantes humanos. 14 Investigação com animais: O bem-estar dos animais é um valor da UE. Os animais têm um valor intrínseco que deve ser respeitado e devem ser tratados como criaturas sencientes. O uso de animais deve ser justificado, pelo que devem ser escolhidas alternativas sempre que possível, e sempre que possível devemos implementar os princípios de substituição, redução e refinamento (3R): Substituição (p.e. usar animais “inferiores”); Redução (reduzir o nº de animais utilizados nas experiências); Refinamento (melhorar as condições de vida do animal aquando da experiência, de modo a proporcionar o mínimo de dor ou sofrimento). Comunicar - tornar comum entre as partes o que é que determinada coisa significa. O processo da decisão ética vai além da decisão clínica, visa a prudência e é necessário que exista humildade intelectual para escutar o outro. O conhecimento não constitui por si só um qualquer valor absoluto, devem existir limites sobre as interrogações. Nem tudo o que é tecnicamente possível é eticamente aceitável. Dilema Vs. Problema ético Dilema: não tem resposta. Tem 2 alternativas - escolhas trágicas, porque não há alternativa que seja melhor que a outra e haverá sempre um valor que será quebrado. Há um problema ético quando estamos perante um caso em que temos princípios, valores, deveres ou normas em conflito. O dilema pressupõe duas alternativas, o que implica abdicar de alguns princípios em prol de outros; no entanto, um problema é mais amplo e depende de contexto (há mais do que duas alternativas). 15 Ética no fim de vida Macroética: questão mais alargada que diz respeito a todos, correspondendo a temas que entram na discussão pública como a eutanásia e o suicídio assistido, por exemplo. Microética: questões mais pessoais. Aqui incluímos a narrativa dos doentes, as suas crenças e valores e a sua família (contexto social). A nossa sociedade é plural e nesse sentido não nos podemos guiar por um único registo ético ou um único sistema de referência. Fim de vida: situações de doenças incuráveis, com prognóstico reservado, em que os doentes podem decidir pelos seus cuidados. Nas questões de fim de vida temos de saber separar a ética do direito. Temos de ter consciência que apesar de podermos discutir temas como a eutanásia e o suicídio assistido, estas prática ainda não são legais em Portugal. Ética Vs. Direito: Podemos discutir questões éticas e ter uma posição, mas existe o limite da lei. No entanto, nem tudo o que está legislado é ético e nem tudo o que é ético está legislado. Quando falamos de assuntos desta natureza temos de saber adaptar o nosso vocabulário. O nosso objetivo é ir ao encontro das necessidades do doente e fazemos isso com recurso à medicina narrativa. Quando falamos em ética do fim de vida centramo-nos nestes pontos: Pedidos de acabar com a própria vida; Adequar os níveis de atuação consoante o caso clínico do doente; Manutenção da hidratação e alimentação no fim de vida → temos de apurar quando é que o prolongamento destas necessidades é inadequado. Nós não somos autoridade moral unilateral e nesse sentido todas as decisões devem ser tomadas em equipa – de forma multidisciplinar. Se possível, estas decisões são feitas com o doente, e caso não seja possível devemos basear-nos na construção de valores em companhia com a família. No contexto de fim de vida é importante distinguir competência de capacidade. Isto porque o processo de tomada de decisões no final de vida prende-se sobretudo com o princípio da autonomia! Quando o doente não tem a capacidade de decidir por ele mesmo e de assinar o consentimento informado, podemos recorrer a outros documentos como a declaração 16 antecipada de vontades. Esta pode ter sido redigida previamente (se recorrermos a profissionais dos cuidados paliativos e da bioética precocemente p.e.) e assim conseguimos planificar antecipadamente os cuidados que o doente deseja receber ou não. Caso isso não exista partimos para a reconstrução da narrativa do doente e a sua história de valores, de forma a compreender qual é a melhor decisão. Existe ainda a possibilidade de designar uma pessoa (previamente) que aja como uma decisora nestas situações em que o doente não consegue decidir e tem de ser feito um pedido ao tribunal - Lei 31 de 18 de Julho de 2018. Há uma transferência de autonomia do doente para este representante legal. O representante legal tem de ser nomeado pelo juiz! Existe o estatuto de "maior acompanhado" e até este ser apresentado, o médico pode tomar as decisões pelo doente, no seu melhor interesse (claro que é importante falar com as famílias, mas neste caso, mesmo que a família processe o médico por tomar a decisão, se não houver um documento que comprove que a pessoa x da família é um representante legal da pessoa y (no caso de um maior de idade), o médico é a entidade com maior autoridade). Outros aspetos relacionados com o fim de vida: A alimentação no fim de vida é algo que tem de ser ponderado! Pode haver mais malefício em providenciar a alimentação, porque pode haver uma pneumonia de aspiração ou outras condições que agravem o estado de saúde do doente e em cuidados paliativos é mais importante tentar dar conforto ao doente com o mínimo de complicações (princípio da não maleficência). Relativamente à medicação usada, segundo o princípio da justiça, não faz sentido usar antibioterapia que poderia estar a ser usada noutros doentes que precisam deles e que não estão "condenados". Não se deve fazer análises e submeter o doente em fim de vida a exames desnecessários que causam dor. No caso de haver uma vontade muito grande de um doente viver até, por exemplo, ao aniversário da filha, podemos aplicar mais cuidados de prolongamento de vida para tentar corresponder ao desejo do doente: isto demonstra a necessidade de estar atento e ouvir a narrativa do doente. É importante incluir a família no processo de adequação dos cuidados de saúde - diálogo! Muito cuidado com o vocabulário que usamos: dizer 17 que um dado cuidado é inadequado à luz das necessidades do doente ao invés de dizer que é fútil! Capacidade Vs. Competência Competência: conceito jurídico (definido por um juiz) -> útil para conflitos de direitos (p.e. entre o direito à vida e o direito à autodeterminação). Capacidade: conceito clínico (definido pelo médico). Eutanásia Vs. Suicídio assistido A diferença entre estes 2 conceitos relaciona-se com o princípio da autonomia, que é tratado de forma diferente. Eutanásia: quando o médico provoca a morte diretamente, administrando os medicamentos. Suicídio assistido: o medico fornece ao doente a medicação, mas o doente tem a sua autonomia e decide por si se vai usar essa medicação. Há uma transferência de autonomia do momento da morte. Nota: em Portugal ainda não é legal a eutanásia/suicídio assistido (pelo menos até à data da elaboração desta sebenta). Este pedido deve ser consciente e pode ser pedido perante um sofrimento insustentável. Temos de ter em mente que quando estamos doentes as nossas perceções da vida mudam e podemos alterar as nossas vontades. Sendo uma posição de extrema vulnerabilidade é importante fazer uma boa avaliação do doente e da sua história de crenças e valores. Quando alguém pede para ser morto, há que perceber o que pode ter acontecido na prestação de cuidados para que aquele doente pense que aquela é a melhor solução. O doente perde a sua dignidade. Sofrimento moral: As decisões nunca devem ser tomadas sozinhos, mas sim em conjunto com a equipa médica. Assim, depois a responsabilidade é distribuída e é mais fácil de digerir o sofrimento. Ao compreendermos melhor o que leva o nosso doente a querer morrer podemos encontrar estratégias para minimizar o ser sofrimento e até levá-lo a mudar de opinião, por exemplo, se este estiver a caminhar para uma situação 18 de isolamento social, podemos procurar incluir família e amigos de modo a reverter esta condição, promovendo assim uma melhoria do bem-estar deste doente. Teoria do duplo efeito: é eticamente e moralmente correto. Autorização para utilização de medicamentos que, em benefício do controlo de sintomas, podem provocar a morte do doente como efeito secundário. O uso de medicamentos em doses muito elevadas ou que são muito fortes tem de estar bem descrito no diário clínico e deve ser muito bem avaliado, pois existem várias guidelines a seguir para poder administrar esse tipo de medicação. 19 Ética no início de vida Procriação medicamente assistida: As técnicas de PMA surgiram com o intuito de resolver um grande problema de saúde → a infertilidade. A infertilidade é vista pela OMS como uma doença, a qual se define pela ausência de gravidez ao fim de um ano de relações sexuais regulares e desprotegidas. Apresenta uma incidência de 10-15% e a sua prevalência tem vindo a aumentar. Considera-se um grave problema de saúde pública. A PMA contribuiu para a dissociação de alguns conceitos, nomeadamente: Sexualidade versus Fecundação Fecundação versus Gestação Relação médico-doente: Atualmente é uma relação horizontal. O médico engloba o doente no processo de decisões, respeitando a sua autonomia. No entanto, em PMA, a realidade é ligeiramente diferente pois a relação é com dois indivíduos, logo são duas entidades autónomas que devem ser respeitadas. Vê-se muitas vezes um claro domínio da vontade dos pais, que é sobreposta aos interesses da criança que se pretende criar. Outras entidades que podem entrar na equação: dador de gâmetas, casal dador de embriões, grávida de substituição (=barriga de aluguer). Por outro lado, o médico pode ter pouca disponibilidade para determinadas opções devido a questões pessoais, mesmo que as técnicas existentes estejam aprovadas e não contornem a lei. A autonomia e a liberdade reprodutiva vieram converter o desejo de ter um filho numa reivindicação do direito a um filho. Atualmente estamos a atravessar uma alteração do modelo tradicional de família: Famílias monoparentais femininas ou casal homossexual feminina o Por norma apenas precisam de dador de esperma Famílias monoparentais masculinas e casal homossexual masculino o Precisam de dadora de oócitos e uma grávida de substituição o A grávida de substituição não é a dadora de oócitos 20 O exercício das escolhas autónomas em PMA não se pode sobrepor ao dever da responsabilidade das pessoas, relativamente aos seus desejos reprodutivos, assim como aos seus embriões e crianças nascidas. Isto porque estas são seres frágeis e vulneráveis, sem consciência livre e autónoma e, portanto, dependentes das decisões dos seus pais. Autonomia = dever de responsabilidade Questões relevantes dentro deste tema: Podemos equiparar o desejo e o direito a ter um filho? DPGI → Diagnóstico Podemos fazer DGPI apenas por indicação médica? genético pré-implantação Quais os destinos dos embriões excedentários? Quais os riscos da gestação de substituição? Quais as questões associadas a inseminação post-mortem? Nota: a questão da interrupção voluntária da gravidez também entra neste tema da ética no início de vida. Após o nascimento, a responsabilidade é dos pais em mútuo acordo, e quando este não existe recorre-se a tribunal. Estatuto do embrião É o conjunto de afirmações que se deduzem do seu ser biológico e ontológicos, assim como o conjunto de valores, direitos e obrigações a que dá lugar a sua relação com o meio que o rodeia. Estatuto Biológico → embrião como forma de início de vida A vida humana tem início com a fecundação: o espermatozoide atravessa a zona pelúcida para se juntar ao ovócito. Numa fecundação in vivo esta ocorre na trompa de Falópio e depois demora 5 dias a chegar ao útero, já em fase de blastocisto, onde irá ocorrer a nidação. Numa fecundação in vitro tradicional colocamos os ovócitos e espermatozoides em conjunto dentro do aparelho reprodutor feminino (não interferimos com a fecundação) ou podemos fazer uma microinjeção do espermatozoide no ovócito. A fecundação não é um momento. Mas sim um processo que dura de 25 a 30 horas. O estatuto biológico e fácil de definir, pois inicia-se quando termina a fecundação. O momento da singamia é crucial para podermos falar de um novo organismo. O desenvolvimento epigenético é controlado pelo genoma, e 21 ocorre sem solução de continuidade nem momentos privilegiados. No entanto, a ciência biológica não pode pronunciar-se sobre o início da vida humana pois esta é uma questão filosófica. Ora, para esta questão temos de qualidade a qualidade ontológica desta nova vida. Estatuto Ontológico (filosófico) Quando é que o embrião passa a ser uma pessoa? O embrião é um ser humano? O embrião é dotado de dignidade? Será um sujeito de direito? Dificilmente teremos unanimidade nestas respostas… O ser humano pode ser considerado uma pessoa a partir de diferentes fases e isso acaba por moldar a forma como as pessoas (pais) vão agir. P.e., se considerarmos que após a fecundação passamos a ter uma pessoa humana, não é considerada a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) nem a experimentação em embriões. Há quem ache que é desde a nidação, ou a partir do 14º dia, do 30º dia, nas 8 semanas de embriogénese, 12 semanas gestação… Direitos do embrião – Estatuto jurídico Constituição da República Portuguesa (art 24º) - DIREITO À VIDA: o "1. A vida humana é inviolável" Código civil (art 66º) - COMEÇO DA PERSONALIDADE: o 1. A personalidade adquire-se no momento completo do nascimento completo e com vida. o 2. Os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do seu nascimento. O estatuto do embrião define aquilo que nós enquanto médicos podemos manipular. Os embriões podem ser manipulados e selecionados e tal é realmente um problema ético que deve ser salvaguardado. Lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA): A PMA só podia ser usada quando havia uma infertilidade diagnosticada ou quando existe risco de transmissão de doenças de origem genética, infeciosa ou outras. Atualmente já é possível qualquer mulher requerer a procriação medicamente assistida, o que abre portas para que casais de mulheres e mulheres solteiras possam ter filhos. O acesso aos homens ainda não está legislado pois estes precisam de recorrer a gravidezes de substituição, cuja prática ainda não está aprovada em Portugal. 22 Condições de admissibilidade à utilização da PMA (2016): As técnicas de PMA podem ainda ser utilizadas por todas as mulheres independentemente do diagnóstico de infertilidade. Podem recorrer às técnicas de PMA os casais de sexo diferente ou os casais de mulheres, respetivamente casados ou casadas ou que vivam em condições análogas às dos cônjuges, bem como todas as mulheres independentemente do estado civil e da respetiva orientação sexual. Lei nº72/2021 de 12 de novembro: inseminação post mortem é permitida em Portugal, se existir um projeto parental previamente definido e consentido, ou seja, uma mulher pode engravidar do companheiro que já tenha falecido se tiverem sémen do mesmo conservado. Proibições à utilização da PMA: Não é feito quando a probabilidade de desenvolver uma doença genética com procriação in vivo seja muito baixo; Não permite a escolha do bebé (tirando quando existe elevado risco de doença genética ligada ao sexo ou se houver necessidade de criar uma "criança medicamento" (que seja histocompatível com outra pessoa)); Não pode ser usada para clonagem reprodutiva; Não pode ser usada para a criação de quimeras ou híbridos; Não se pode ser usada para criar embriões para investigação. Destino dos embriões -> quando os embriões se encontram criopreservados e não são usados pelo casal beneficiário, podem ter 1 de 3 destinos: o Doação para outras mulheres; o Doação para investigação científica; o Serão destruídos caso os beneficiários não aceitem nenhuma das opções anteriores (existe um prazo legal para a manutenção destes embriões). Doação para investigação pode levantar várias opiniões: Se o embrião não foi considerado uma pessoa humana -> a utilização não levanta objeções; Se se considerar o embrião uma pessoa: o Podemos achar que é mais digno estes serem usados ao serviço da ciência do que morrerem sem qualquer finalidade; o Podemos achar que é melhor deixar morrer o embrião do que o utilizar como uma "coisa" ao serviço dos outros. 23 Decisão médica e objeção de consciência: Não somos obrigados a fazer algo se isso vai contra os nossos valores (quer profissionais, quer éticos ou mais pessoais). Quando moralmente alguém é contra a ética praticada, pode recusar fazer determinado procedimento. Infertilidade → doença que se define pela ausência de gravidez ao fim de 1 ano de relações sexuais regulares desprotegidas. Tem um impacto individual e social. NOTA: não é possível que a dadoras de ovócitos seja também a gestante de substituição (isto foi falado a propósito das famílias monoparentais de homens). Autonomia e Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) A decisão de uma IVG deve ser tomada pela grávida. No caso de uma mulher grávida ser menor de 16 anos ou psiquicamente incapaz, o consentimento pode ser delegado para o seu representante legal. 24 Ética em saúde mental Os psiquiatras quando avaliam o comportamento procuram encontrar razões para esse mesmo comportamento. É muito difícil avaliar o comportamento humano sem contextualização histórica, social e cultural. Antes dos anos 80 -> medicina paternalista: o médico é que decidia Na doença mental em particular, os doentes eram vistos como “desencadeadores” de problemas na sociedade, daí serem alvos de abordagens mais autoritárias que assentavam no medo. A partir dos anos 80 -> legalismo: os tribunais tinham o direito de regular o poder dos médicos sobre os doentes. A partir de 2016 -> novo legalismo: tentativa de identificar possíveis doenças mentais em pessoas com desabilidades sociais. Métodos de raciocínio ético em psiquiatria A psiquiatria da atualidade, no ponto de vista médico é considerada o patinho feio. É muito dificil aplicar na psiquiatria os mesmos processos éticos que aplicamos noutras áreas da medicina. Jennifer Radden argumenta que a ética na psiquiatria é distintiva das demais áreas na medida em que os seus doentes são muito mais vulneráveis. Nesse sentido, temos de ajustar as nossas abordagens. Utilitarismo em ética de saúde mental: Os psiquiatras tendem a aderir mais a princípios de direitos e deveres do que calculações diretas do utilitarismo… isto porque cada caso é tão particular que é difícil criar leis universais. No entanto, as legislações são necessárias no contexto de segurança pública, e nesse sentido os princípios utilitaristas têm vindo a ter mais adesão nas 25 decisões em contexto psiquiátrico. Para além disso, os sistemas de saúde (por pressão económica) têm vindo a provocar maior adesão utilitarista. Kant em ética de saúde mental: Nesta ideologia, a construção da personalidade numa dimensão racional permite a construção de máximas de ação moral também elas racionais. Defende o respeito da humanidade essencial dos pacientes. A doença mental pode ser vista como uma disfunção da capacidade racional. Essa perspetiva tem vindo a ser debatida na legislação da saúde mental - questão da autonomia kantiana. Abordagem principialista: Algo que tem vindo a ser dificil de aplicar no contexto da saúde mental. Por exemplo, em relação ao internamento involuntário por um lado temos a questão de restringir a liberdade da pessoa, mas por outro temos a própria segurança do doente. Abordagem casuística: Considera que existe uma integridade entre a lei e a ética, mas há uma separação. A ética pode abrir exceções, mas a lei não. O conceito de sigilo médico aqui fica cinzento… por exemplo no caso de Tarasoff, em que houve uma falha em avisar uma vítima em risco de homicídio, sendo que essa informação foi conseguida em contexto de uma sessão de terapia. Reflexões da ética em saúde mental Virtuosidade em psiquiatria: 26 Ética do cuidado em psiquiatria: A ideia de que tudo o que é cuidado é positivo para a relação com o doente. Está associado a que as ações são boas apenas porque cuidam (independentemente do que cuidam). O seu conceito base tem vindo a ser criticado por ser demasiado vago pois considera-se que tem muito pouco valor na relação com doente na medida em que é tudo relativo. As emoções são claramente valorizadas neste campo. O conceito do outro: É um conceito bastante complexo. Em contexto psiquiatrico, quando eu encontro alguém diferente de mim eu tendo a categorizá-lo em termos de doença. O doente vê-se categorizado e objetificado pela doença que tem, mas importa não esquecer que em psiquiatria há doenças muito complexas como o transtorno de personalidade boderline ou PTSD. O ato do diagnóstico psiquiátrico pode reduzir a experiência do doente a “apenas um fenómeno a ser explicado”. Ética integrativa Ética política em psiquiatria: Os psiquiatras devem estar alertados e preocupados com a alocação equitativa de recursos de saúde. Os psiquiatras têm de cuidar também (embora às vezes se esqueçam na relação) da alocação do custo de saúde. Ao participarem neste "contrato social" podemos cair num extremo em que os psiquiatras só tomam conta da sociedade por tirarem a liberdade a doentes psiquiátricos, e por outro lado podem colocar os doentes em situações de grande vulnerabilidade. Ética pós-moderna: A sociedade contemporânea desorganizou a estrutura relacional e os funcionamentos sociais; Em consequência o indivíduo vê-se com dificuldade em encontrar a sua posição moral, muito dificil de defender ou de moralizar. Requer ao indivíduo estar constantemente a avaliar-se, melhorar-se. 27 Internamento involuntário Atualmente um psiquiatra tem o poder de tirar a liberdade de um cidadão e forçá-lo a receber tratamento. Motivos para o médico querer internar o doente contra a sua vontade: Quando existe risco (contra outros ou contra o próprio); Quando é necessário fazer um diagnóstico específico (ex: esquizofrenia ou doença bipolar); Quando há perda da capacidade de decidir por motivos psiquiátricos; Quando sabemos que há benefícios no tratamento. Quando usamos o internamento involuntário estamos a diminuir a autonomia do doente, por isso é necessário que isso seja justificado. CRPD = United Nations – Convention on the Rights of Persons w/Disabilities É um documento muito importante sobre o tratamento involuntário, que procura promover, proteger e garantir os direitos humanos. Esta convenção foi uma forma dos estados tentar reduzir o número de internamentos involuntários ou até interrompê-los. Avaliação do risco em psiquiatria A questão do risco é fundamental em psiquiatria (podemos falar do risco para o próprio, para terceiros, para a sociedade etc.) sendo o tratamento compulsivo um mecanismo de controlo desses mesmo risco. Avaliar o risco em psiquiatria é sempre desafiador, e há uma tendência para o subestimar. As leis de saúde mental têm este foco no risco, o que propicia o adiamento do tratamento até ao momento em que a sua condição deteriora ao ponto de se tornar perigosos… atualmente tenta-se centrar a questão do tratamento compulsivo numa tentativa de evitar a detioração mais agravada do sujeito. Às vezes este tratamento compulsivo permite que aquelas pessoas não cheguem a ter comportamentos que possam ter um impacto muito negativo e que as possam, p.e., levar à prisão. Estas leis tendem a enfatizar o perigo como uma característica da doença mental e muitas estigmatizam o papel do psiquiatra e criam expectativas irrealistas sobre a capacidade do psiquiatra de prever e mitigar o risco. No entanto, há uma linha que precisa de ser tratada, porque não se deve abusar dos tratamentos para controlar as pessoas. Quando decidimos restringir a 28 liberdade e autonomia de uma pessoa, este ato tem de ser devidamente justificado e ponderado à luz dos benefícios que isso pode trazer para o doente e para o panorama geral. Enquanto médicos temos a responsabilidade de registar quais os motivos que levaram a um internamento compulsivo (algo que não aparece em vários registos médicos e que perpetua um estigma social). Fatores que NÃO devem pesar nesta avaliação: Pressão da família; Pressão da polícia; Fatores organizacionais (se há mais recursos em ambulatório num hospital, então o doente vai ser encaminhado para essa via). É importante ter em conta que o internamento compulsivo também pode levar a exclusão social e por isso devemos medir o benefício que o tratamento irá trazer para o doente. Deve ser pesado de forma individual para cada doente e não de uma forma standard e padronizada. Se no internamento não tivermos nenhum tratamento para oferecer àquele doente (como pode acontecer em casos de doenças relacionadas com a alimentação), pode não ser o mais ético recorrer ao internamento forçado, pois não conseguimos provar que aquele internamento é a ação que irá trazer maior benefício para o doente. Dentro do internamento compulsivo, pode haver formas de dar alguma autonomia aos doentes (podem escolher a hora a que querem acordar, se querem comer sopa etc.). Estes fatores podem ajudar na construção da relação, da confiança por tentarmos reduzir a negatividade da experiência. Parens Patriae Vem já do tempo dos reis esta ideia de o Estado atuar como protetor quando necessário, nomeadamente quando certos adultos são incapazes de cuidar de si. O estado tem responsabilidade sobre a nossa saúde física quando sou internada contra a minha vontade, na medida em que me retiraram a minha autonomia, e nesse sentido são responsáveis pela minha segurança. É uma doutrina associada a uma situação de cuidado temporário, diferindo do termo adoção. É daqui que surge o conceito de "maior acompanhado". Justificação moral = Proteção dos cidadãos + Dever da beneficência 29 Avaliação da capacidade em doença mental É importante termos noção que a avaliação da capacidade em saúde mental é bastante diferente… Uma coisa é eu não ter capacidade no sentido em que estou deprimido então só penso em coisas negativas… e estar confuso também é diferente. É importante então distinguir: Incapacidade médica e incapacidade psiquiátrica, sendo que o psiquiatra apenas se pode pronunciar quanto ao segundo, e infelizmente nem sempre acontece. Medical incapacity hold o não têm capacidade para decidir + têm uma doença mental Involuntary psychiatry hold o pacientes com doença mental sem insight e que precisam de tratamento Estigma Público Estereotipo → crenças negativas que temos em relação a um grupo. Preconceito → temos uma emoção negativa quando vemos esse grupo. Discriminação → quando temos um comportamento contra um grupo que consideramos diferente. Os doentes mentais são vistos como crianças. O medo da doença mental ainda está muito presente na nossa sociedade. Numa situação de assalto, se fingirmos sermos doentes mentais podemos provocar medo no assaltante e ele foge… temos mais medo de doentes mentais do que de atos criminosos. Estigma Privado Estes conceitos podem estender-se a um nível mais privado, no sentido em que uma pessoa pertencente a um destes grupos pode sentir-se mal por isso. Estereotipo → crença negativa relativamente à nossa própria competência. Preconceito → quando nos sentimos tristes ou mal por causa da nossa condição. Discriminação → quando não procuro ajuda porque sinto que não vou conseguir ter ajuda. 30 Consequências do estigma Redução da Redução da Redução do insight sobre a Vulnerabilidade auto-estima performance própria doença Como reduzir o estigma? Criar campanhas/Protestos. Educar as pessoas e expô-las a pessoas com doença mental (isto parece ser o que mais muda a percepção das pessoas sobre este grupo de cidadãos). Educação nas escolas. Perturbação de abuso do álcool VS perturbação de dependência do álcool Perturbação do abuso: ato isolado. Perturbação de dependência: é um problema recorrente da pessoa. Há uma pena acrescida (penal) quando cometemos um crime sob a influencia de álcool. Na doença alcoólica é preciso que a pessoa queira ser tratada. Pessoas inimputáveis: que não podem ser julgadas por crimes por terem uma doença mental, sendo que se o fizerem são internados (antes era para a vida toda, agora já tem de ser integrado na sociedade). Tratamento ambulatório compulsivo: é estabelecido pelo doente (autorizado previamente por ele). Este compromete-se a que sempre que estiver doente (tiver algum episódio) poderá ser tratado contra a sua vontade (porque tem noção que não terá capacidade para decidir). 1998 - lei da saúde mental: o doente pode ser internado contra a sua vontade (era enviado um fax para o tribunal e em 5 minutos o doente perde a sua autonomia). Julho 2023 - Nova lei da Saúde Mental → A lei passa a impedir que as medidas de internamento tenham, na prática, uma duração ilimitada ou mesmo perpétua, prevalecendo o entendimento de que nenhum cidadão – imputável e inimputável – pode ser privado de liberdade com carácter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida. 31 Ética e integridade científica Integridade: característica desejável -> quando aplicada à investigação falamos da adesão aos princípios éticos. Valores da Integridade: o Qualidade. o Benefício coletivo. o Equidade e justiça. o Diversidade e inclusão. Princípios da Integridade: o Transparência, escrutínio, crítica e reprodutibilidade. o Igualdade de oportunidades. o Responsabilidade, respeito e prestação de contas. o Colaboração, participação e inclusão. o Sustentabilidade. Integridade Na investigação Académica Científica Apresenta como Adesão ativa a Disciplina que se princípios éticos e às limitação que nem dedica a investigar a normas profissionais toda a verdade é má conduta na que são essenciais publicada e nem tudo investigação. para uma prática o que está acessível responsável. constitui a verdade. Investigação científica: busca da verdade, do conhecimento, obtida através do estudo sistemático do pensamento, observação e experimentação fiáveis. Má conduta na investigação: Fabricação: inventar resultados e registá-los como reais. Falsificação: manipulação de materiais, equipamento ou processos de investigação ou alteração, omissão e supressão injustificadas de dados e resultados. Plágio: utilizar o trabalho e ideias de outras pessoas sem dar o devido crédito à fonte original, violando os direitos de autor. 32 A fabricação e falsificação têm várias implicações nomeadamente em termos de atrasar o progresso científico. Consequências da má conduta: Para os investigadores: danos na carreira e reputação, perda de bolsas e subsídios, consequências penais… Para os participantes na investigação: danos na saúde/vida, custos para o sistema de saúde. Para as instituições e áreas de investigação: danos colaterais para os colegas e instituição, perda de reputação e financiamento. Para a sociedade: aumento da desconfiança e desinteresse na ciência, com compromisso da sua credibilidade. Ameaças à integridade Politização da ciência. o Ex: caso de senhor turco que foi condenado a prisão por 15 meses depois de ter publicado resultados acerca de investigação ambiental da poluição num determinado curso de água, à revelia do governo, que não queria que esses dados fossem revelados -> neste caso a integridade do cientista não foi comprometida, mesmo após a pressão do governo e este preferiu sofrer as represálias legais a ter de corromper a sua integridade. Desinformação. o Caso da pandemia e infodemia, onde foram criadas diversas notícias ou informações falsas que puseram em causa o combate à pandemia (as pessoas que criaram e perpetuaram informação falsa relativamente a este tema, quebraram a sua integridade, pondo em risco a saúde pública). Houve rejeição do uso de máscaras e das vacinas que atrasaram a ciência e o combate à pandemia. Nota: Evitar palpites e conclusões precipitadas quando se fala para o público. Ciência comercializada. o Há grandes investimentos feitos na investigação científica com fundos públicos e privados. Há empresas que escolhem não investir em medicamentos, porque o seu retorno monetário é menor (quando a patente expira passa a ser possível serem 33 explorados por outras empresas, que formam os genéricos, mais baratos. Quando isso acontece as empresas podem desistir de estudar esses fármacos para outros usos devido à desvalorização financeira). Ciência apressada, ciência desleixada (floppy science). o Não nos deixa ver nem testar todas as hipóteses devido à pressão que existe sobre os investigadores em serem os primeiros a publicar ou a descobrir algo (quer para seu próprio benefício e prestígio, quer por pressões externas -> isto tem um reverso que muitas vezes acaba por ser um entrave no progresso científico -> aquilo que se descobre tem muitas falhas e não é reprodutível, por exemplo, e isso afasta financiamento futuro e acaba por resultar em outcomes negativos, à custa dessa pressa e pouco brio profissional). "Publicar ou Perecer". o A ideia de que vamos desaparecer se não conseguirmos fazer muitas publicações e se não conseguirmos chegar aos jornais e revistas com maior grau de impacto vamos “desaparecer”. Isto leva a que algumas pessoas queiram os seus nomes em qualquer trabalho, mesmo que a sua contribuição não seja valorizável, ficando assim com créditos indevidos. Existe uma perversão do conceito de autoria que tem vindo a ser cada vez mais rigoroso. Os trabalhos devem especificar o que cada um fez para esse trabalho e tem de haver uma distinção entre autores e pessoas com contribuíram de outras formas, quer seja revisão, aconselhamento ou meramente com o equipamento necessário ao estudo. o Deve evitar-se a oferta da presença de autoria honorária a seniores (como acontece, por vezes, quando o diretor de serviço fica com créditos sem ter feito nada). Modelos generativos de linguagem (chatgpt p.e.). o Podemos ter textos por inteligência artificial -> pode resultar em fraude e plágio. o Como o chatgpt não tem personalidade jurídica não se pode considerar um autor (e se lhe perguntarmos diretamente é isso que ele nos vai responder). o Estas ferramentas podem ser usadas para de certa forma fazer uma revisão de artigos com base em palavras-chave para desse modo compreender se existe alguma repetição ou fabricação p.e., 34 MAS também pode ser usado por pessoas preguiçosas e com pouca integridade. Contudo, o chatgpt é uma ferramenta útil e que pode ser usada, por exemplo, como forma de análise de texto para pessoas que não sabem muito de inglês. o A pressão de hoje em dia e a velocidade a que se tem de publicar pode instigar a prevaricação. O investigador deve ser um ativista que deve reportar situações em que possa haver uma quebra ou um incentivo à quebra dessa mesma integridade ou valores éticos. Ciência aberta -> práticas para partilha de dados de informação, software, fluxos de metodologia e artigos de livre acesso para aproximar os investigadores entre eles e mesmo com o público Regra da ciência aberta: passa pela partilha de dados tão aberta quanto possível e tão fechada quando necessário (para proteger direitos, patentes, privacidade dos participantes ou propriedade intelectual p.e.). Quando a investigação é feita com dinheiros públicos deve ficar preferencialmente em open access. 35 Ética nas organizações Ética das organizações: uso intencional de valores na tomada de decisão da organização. Missão, visão e valores: aumenta a confiabilidade da instituição. Favorece o alinhamento dos vários profissionais para esse objetivo comum. Responsabilidade dentro de um quadro de razão É um modelo que se foca nos aspetos éticos das tomadas de decisão, garantindo que as mesma são éticas mesmo que não favoreçam nenhuma das partes interessadas. Portanto, as decisões são tomadas segundo princípios éticos mesmo que não favoreçam uma parte interessada. Vai ao encontro de um propósito maior. Os cinco componentes chave são: Comprometimento, obrigação, vontade, intenção e propriedade. Clima ético Integrar valores substanciais e processuais dentro dos mecanismos e estrutura da organização pode contribuir para um ambiente/cultura ético dentro da mesma. Isto exige alguma transparência, e que nós saibamos o que está a acontecer. É necessário um gestor para ajudar os profissionais a alinhar as suas atitudes com os valores da organização para que trabalham (SNS p.e.). Nos cuidados de saúde primários existe um valor monetário que é atribuído à unidade de saúde, consoante as características da população (idade, nº de habitante etc) que ajudam a calcular esse valor. Caso essa unidade saia do valor padrão, serão pedidos esclarecimentos ao médico, para justificar porque é que gastou mais dinheiro do que o esperado. Deve ser consultado um especialista em ética para ajudar no processo de tomada de decisões. Definição de prioridades É o processo de decidir como alocar os recursos em contexto de necessidade "conflituosas" dentro de um sistema de saúde. É um desafio universal para todos os sistemas de saúde, independentemente se o financiamento é publico ou privado. 36 Micro: pensado de paciente para paciente (p.e. escolher entre 2 doentes quem deve ser ventilado). Meso: como distribuo o dinheiro ou o tipo de serviço conforme o hospital ou a região (p.e. quando decido fechar as urgências num determinado hospital). Macro: como escolhemos os programas prioritários ao nível do sistema de saúde no geral (p.e. quais as estratégias de saúde pública que devem ser aplicadas). Isto é importante ser pensado, porque o dinheiro não é infinito. o Exemplo: pode ser mais interessante e barato prevenir a obesidade com medidas como por exemplo aumentar o preço ou remover comida e bebidas açucaradas das máquinas de venda automática do que investir esse dinheiro no tratamento cirúrgico e farmacológico da diabetes. Os aumentos das despesas em contexto de saúde estão insustentáveis e impacta a capacidade dos estados financiarem outros serviços essenciais como educação ou infraestruturas necessárias… A definição da prioridade é vital para a sustentabilidade dos próprios sistemas de saúde. Quando definimos prioridades devemos ter em contas estes 4 fatores: Relevância. Revisão. Publicidade (o racional por detrás da decisão deve ser partilhado de forma aberta e transparente). Reforço (os líderes dentro da organização são responsáveis por garantir que essas necessidades são suprimidas e que as prioridades são cumpridas - justiça). “Uma vez que temos recursos limitados, como é que escolhemos quem é que vai receber os cuidados?” - Este é o maior problema ético subjacente. Ética a escala de saúde pública Até que ponto a relação médico-doente e o sigilo associado deve ser mantido, se corremos um risco de ameaça de saúde pública? Caso clínico: mulher que teve relações sexuais desprotegidas e quer fazer o despiste para IST, mas caso tenha alguma coisa não quer que isso seja comunicado ao marido, nem às autoridades. 37 Existem doenças de notificação obrigatória, como é o caso da tuberculose, em que se entende que o benefício para a saúde pública de saber os contactos na comunidade daquela pessoa naquela condição é superior a não o fazer e nesse caso é quebrado o sigilo médico. O sigilo médico só deve ser quebrado em situações específicas em que exista perigo para a pessoa ou para terceiros, mas deve ser fundamentado e devemos ter a certeza antes de o quebrar. Pedir sempre primeiro ao doente para ser ele a contar ao marido. Caso ele não o faça é necessário que o médico zele pela saúde do marido e por isso pode quebrar o sigilo médico. Doenças que devem ser reportadas: Doenças recorrentes na população (ex: clamídia, doença de Lyme) Outbreaks de uma doença (ex: legionela, influenza, hepatites virais) Doenças inesperadas/raras (ex: sarampo, varicela, ébola) Critérios para reportar a doença: Gravidade e potencial de mortalidade associada. Grau de transmissão (seja humano-humano ou animal-humano). Capacidade (ou não) de controlo e tratamento. o Não faz sentido reportar uma doença para a qual não temos cura a não ser que esteja associada a um elevado risco de propagação. Cuidados de emergência em cenários de desastre Médicos de saúde pública: pensam a nível macro na parte custo-efetiva da tomada de decisões. Todos os médicos têm de gerir recursos (numa situação de emergência ou catástrofe podemos ter de tomar decisões mais extremas e deve haver planos). Por vezes temos de pensar no que é melhor para a população e não naquilo que é melhor para o indivíduo em particular -> criação de planos de atuação em caso de castástrofe. Via Verde AVC → priorização da pessoa para atribuir os recursos necessários à pessoa que mais necessita deles. Também a triagem hospitalar (que se baseia na triagem de Manchester) tem de ter critérios que permitam fazer a distinção entre a gravidade da 38 situação clínica do doente e isso vai ser indicativo do tempo que a pessoa vai ficar à espera sendo que isso condiciona os recursos e mobiliza-os para ajudar uma pessoa primeiro, em detrimento de outras → problema ético que é justificado através de princípios. É um fundamental para aumentar a sobrevivência e diminuir custos. Quarentena → há uma limitação da liberdade do cidadão em prol do bem maior que é a contenção da doença, fazendo assim com que seja possível não esgotar imediatamente os recursos disponíveis (se todos ficassem doentes ao mesmo tempo seria impossível dar resposta): Justiça Vs. Liberdade. Impacto cognitivo e psicológico da quarentena: negativo em muitos casos. Consultas ou atendimento ao domicílio → mudo a posição de poder (a pessoa está no seu conforto); não é propriamente melhor ou pior, apenas diferente e deve ter em conta vários fatores: o Tem de ser garantido que os profissionais têm as condições para exercer nesse meio, sem que se crie stress psicológico ou fadiga por compaixão. o Com o envelhecimento da população tendemos para uma hospitalização domiciliaria. o Recurso a tecnologia para acompanhamento à distância dos doentes. Alguns aspetos interessantes que foram mencionados na aula: A maioria dos recursos atualmente estão mais concentrados nos hospitais e não nos cuidados de saúde primários, apesar de se estar a tentar mudar isso. Não podemos ter um código ético sem uma comissão de ética que ativamente procure verificar se esse mesmo código está a ser cumprido. Trabalhar para os comités de ética em Portugal é pro-bono. As queixas são uma mina de ouro para a instituição, porque assim conseguimos ver o que estamos a fazer mal e podemos melhorar. Discussão de casos mencionados em aula Caso 1: caso da aula gravada sobre a mulher que quer fazer rastreio de clamídia, porque teve relações sexuais fora da relação e se ti ver clamídia não quer que o marido saiba. O que fazer? 39 Ligar ao marido para o informar → está correta, porque o homem está em risco (justifica-se quebrar o sigilo médico). Reportar às autoridades de saúde → está correto, porque é uma doença de notificação obrigatória. Referenciar o doente a outro médico (evita que haja uma quebra na relação com o doente) → conflito de obrigações (para com as pessoas que nos são próximas e para pessoas que nos são distantes) → depende da relação que temos com o doente, que no caso de um médico de família é normalmente grande. Não fazer o exame para não ter dilema → evitar esta opção. Nenhuma das anteriores. Quebra do sigilo médico: Quando há riscos para terceiros. Quando há riscos para o próprio. Quando alguém nasce ou morre (porque se uma mãe não quiser dizer ao pai que nasceu uma criança, isto não é aceitável e devo contar na mesma, porque o pai tem direito a saber). No caso de uma doente adolescente que diz ao médico que está a sofrer de abusos e não quer que os pais saibam. Quando conseguimos apurar que isso é verdade, devemos reportar às autoridades! Quando uma rapariga é abusada, existe vergonha e pode mudar a dinâmica familiar e por isso deve ser tido em conta que por vezes contar é pior do que não contar. Caso 2: o hospital está sem dinheiro e tem uma cafetaria sem uso e surge a oportunidade de meter lá um mcdonalds, devemos fazê-lo? Isto vai contra os valores e princípios da organização logo, não se deve aceitar esta proposta → devemos procurar outra opção. Os médicos cardiologistas opõem-se. Exemplo: A sala de reuniões da pneumologia de Santa Maria foi financiada pela tabaqueira (conflito de interesses). 40 Caso 3: estrangeiro que vem a Portugal para ter acesso a uma terapêutica que é uma questão de vida ou de morte e que cá ele consegue aceder gratuitamente, mas no seu país de origem não teria acesso gratuito. Dilema ético. PREP -> 100€ cada comprimido. Pode haver um abuso (as pessoas podem ter relações sexuais desprotegidas achando que estão imunes). Esta medicação apenas previne o HIV, mas não para as outras DSTs (atualmente há muitos doentes com sífilis a fazer PREP). O uso continuado desta medicação pode levar a resistência aos antibióticos. Caso 4: 3 pessoas precisam de um ventilador: um senhor com IC, uma jovem e o primeiro-ministro. Posso desligar um ventilador de uma pessoa que esteja viva para dar a outra pessoa que precise? Fazer um julgamento com base em critérios. Só o posso fazer se a pessoa estiver em morte cerebral. Medimos os QALYs (Quality Adjusted Life Years) e DALYs (Daily Adjusted Life Years) → para conseguir perceber que pessoa salvar. Na china era retirado o ventilador a qualquer pessoa que tiver uma capacidade de sobrevida inferior a x% →> isto levou ao aumento do burnout médico. 41 Ética e sistemas de saúde Problemas com as tecnologias da saúde Inclusão digital: capacidade de assegurar que a tecnologia avançada é acessível a todas as organizações e cidadãos. o Existem muitos portugueses infoexcluídos. o Se existem ferramentas, por exemplo de IA, que ajudam a diminuir o erro médico, porque é que há organizações que vão ter acesso e outras não e de que forma é que isso vai condicionar os cuidados prestados ("porque é que não tenho direito a um hospital informatizado, mais avançado?" -> problema ético e de iniquidade social). Serviços de Tele/Meta saúde minimamente disruptivos: com alta qualidade. Serviços clínicos digitais de confiança incluído app's de mHealth, soluções à base de IA, terapêuticas digitais. o Apesar de ser um excelente aliado importa compreender que estas apps são um auxílio e, pelo menos para já, não uma substituição da nossa atuação e do nosso saber. Isto também é verdade, porque a IA não consegue ter em conta contextos e emoções no raciocínio clínico. Inovação na saúde e economia dos dados em saúde: espaços para o armazenamento da informação em saúde e para a exploração, integração e inovação feita a partir desses dados. o Houve uma altura em que os registos médicos estavam todos em papel e quando não havia mais espaço eram deitados fora. As tecnologias permitem-nos guardar muito mais informação, mas até onde podemos ir? Soberania digital e sustentabilidade: criação de infraestruturas digitalmente avançadas e processos de cibersegurança, soberania governamental e arquiteturas custo-efetivas. Manter sob o nosso controlo a nossa informação de saúde, sem leeks e sem qualquer tipo de ameaça aos nossos dados pessoais. o Ainda temos vários problemas de segurança e privacidade para resolver. 42 Sistema de saúde digital Preventivo. Paperless. Empoderador. Personalizado. Responsável (consegue identificar o que correu mal e melhorar). Pacientes digitais: criam as suas próprias soluções digitais. ATENÇÃO: Uma pessoa excluída digitalmente (não consegue aceder a um email, marcar uma consulta online etc.) terá menos saúde. Doenças digitais: todo e qualquer contexto em que o uso digital condiciona a saúde do indivíduo. Muitas relacionadas com a saúde mental. À medida que fomos evoluindo digitalmente, foram sido inventados novos aparelhos como pacemakers ou os medidores de glicémia que são implantados e nos dão informação a todo o momento. Não sabemos até que ponto é que estes aparelhos vão evoluir, mas podem apresentar problemas éticos, não só relativos aos dados recolhidos, como com a capacidade que vamos ter de manipular a fisiologia da pessoa por exemplo. Terapêutica digital: tratar ou definir uma doença com uso de software. Exemplos de tecnologias atuais e do futuro: o Acessórios digitais como o pacemaker (entra no corpo do ser humano); o Micro/Nano robots que são capazes de remover proteínas ao nível da glia que causam doenças; o Pós-humanos: criação de um ser humano a partir das suas memórias e vivências (vimos um vídeo disto em IntroMed). MINDware “Peopleware" -> como é que as pessoas se preparam para usar esta tecnologias. "Userware" -> como é que estas tecnologias são usadas de uma forma que faz sentido para o utilizador (médico ou doente). 43 "Integrativeware" -> integração de dados de diferentes sistemas de informação. Metaverso e Telesaúde Objetivo: aproximar os indivíduos através da tecnologia. Metaverso: espaço de realidade virtual que providencia uma experiência imersiva 3D que combina múltiplas abordagens diferentes, juntamente com espaços de interação física-digital. Avatar: representação virtual de algo real -> pertence ao metaverso (posso ter um avatar de uma cama ou de um pacemaker). A realidade aumentada ou realidade virtual já é usada como forma de ensino em medicina. Inteligência Artificial (IA) Inteligência artificial: ciência que procura estudar e compreender o fenómeno da inteligência e, ao mesmo tempo, um ramo da engenharia, na medida em que procura construir instrumentos para apoiar a inteligência humana. Um sistema de IA, para além de ser capaz de armazenar e manipular dados, consegue também adquirir, representar e manipular conhecimentos. Teste de Turing: a partir do momento que eu conseguir ligar para alguém e ser atendido por IA, que se faz passar por um humano, e eu não consigo perceber, podemos efetivamente dizer que aquele mecanismo de IA é mesmo IA. Em que contexto usar IA? Cirurgias (já se usa bastante a robótica em cirurgia para a tornar cada vez mais precisa e menos invasiva, melhorando os outcomes para a pessoa que está a receber essa intervenção). Métodos Complementares de Diagnóstico (já se pode reconhecer padrões em radiologia ou anatomia patológica e auxiliar o diagnóstico). Análise de dados para otimizar resultados, prever erros etc. Profissionais e organizações KIWI (Knowledgeable, Intelligent, wise e Interoperable) -> são capazes de trabalhar com robots, usar as ferramentas para conseguir comunicar com os colegas e dessa forma integrar mais os diferentes profissionais para servir melhor o doente (por exemplo articular com o nutricionista, dentista, colega de outra especialidade através destas 44 ferramentas digitais, sem que o doente tenha consultas estanques e seja ele a transmitir informação ou através da leitura de relatórios). Sabedoria: combinar o uso das tecnologias e a confiança nas capacidades pessoais para fazer um julgamento das limitações que a tecnologia pode ter. ATENÇÃO: a IA aprende com o que lhe ensinam, sendo que esta acaba por ter preconceitos. Contextos diferentes terão diferentes necessidades e será necessário fazer um ajuste para diferentes países por exemplo, de forma que não se criem vieses no diagnóstico. 45 Ética e comissões de ética Contextualização histórica: O microbiologista alemão Albert Ludwig Sigesmund Neisser, injetava soro de doente sifilíticos em prostitutas para avaliar a eficácia da vacina. No entanto, fê-lo sem pedir consentimento nem dava informação acerca o que estava a fazer. Foi pedido pelo parlamento prussiano, a criação de um documento de medidas restritivas para a investigação em seres humanos, que bania qualquer investigação onde os participantes não dessem consentimento, não fossem informados acerca dos possíveis efeitos secundários, o médico não desse a sua autorização ou fosse realizado em menores. Isto levou ao surgimento das “Guidelines de Weimar” → documento que reforçou a liberdade dos participantes em participar em estudos. Códigos fundadores: Código de Nuremberg; Declaração de Helsínquia; Relatório de Belmont. Declaração de Barcelona: outras dimensões da autonomia passam a ser tidas em conta como a capacidade de continuar a ter ideias, de agir de forma racional e informada. Convenção de Oviedo: levou a protocolos relacionados com a investigação biomédica. o Passou a haver um maior controlo sobre o poder médico, sendo o doente apoiado na sua decisão, independentemente de qual seja. o Todas as pessoas com incapacidade passaram a poder recorrer a alguém que as ajuda a tomar a decisão. 46 Unesco 2005: declaração universal em direitos humanos e bioética: o Respeito pela vulnerabilidade e integridade. o Respeito pela privacidade, confidencialidade e justiça. o Respeito pela diversidade cultural. Estes documentos levam à formação das comissões de ética (a primeira a surgir em Portugal foi em 1986 em Coimbra). Comissão de ética nos hospitais: corpos independentes que avaliam os protocolos e a investigação clínica em seres humanos. Composição de uma comissão de ética: deve ser o mais heterogenia possível! Devemos ter representação de vários profissionais. Tarefas: levar a cabo uma avaliação a cada 6 meses e garantir a dignidade humana dentro da instituição. Para além disso também participam no treino de membros e noutras atividades que promovem a conduta integra e ética dos profissionais de saúde. Para ser realizado um estudo de investigação ético, deve cumprir 7 preceitos: 1. Ter valor científico social. 2. Ter validade científica. 3. Os sujeitos de investigação têm de ser selecionados de forma justa. 4. Risco/benefício tem de ser favorável. 5. Revisão do trabalho tem de ser independente. 6. Tem de haver consentimento informado. 7. Têm de ser respeitados todos os sujeitos no estudo. Estes preceitos têm como objetivo melhorar a qualidade da investigação, não de atrasar a investigação! 12 regras básicas para a investigação: 1. Respeita a integridade e dignidade das pessoas. 2. Não maleficência. Riscos comunicados. 3. Reconhece os direitos do individuo à privacidade e proteção de dados. 4. Honra o requerimento de consentimento informado e diálogo com os sujeitos. 5. Trata os animais com respeito e trabalha debaixo de condições humanas. 47 6. Realiza trabalhos em animais de acordo com os 3 R´s: Replacement, Reduction e Refinement. 7. Respeita o princípio de proporção – não impõe mais que o necessário. 8. Trata as preocupações sociais com seriedade. 9. Tenta prevenir a sua disponibilidade para mau uso ou uso maléfico por entidades terroristas. 10. Reconhece o indivíduo como um todo. 11. Respeita a biodiversidade e não impõe tratamentos que alterem o ambiente de forma irreversível. 12. Cresce no entendimento de que os benefícios são bons para a sociedade. Vulnerabilidades a considerar: Cognitiva – incapacidade de entender (burrinho). Médica – tem doença grave e está desesperado. Alocacional – âmbito social (dinheiro). Diferencial – psicopatologia. 48 O futuro da bioética Mudanças climáticas Visão geral dos desafios Aumento da população em idade avançada Desigualdades em saúde futuros Aumento dos problemas em saúde mental Dimuição da fertilidade Aumento das tecnologias digitais Declínio da biodiversidade Aumento da urbanização Animais, Alimentação e Ambiente “Desextinção” - Reviver animais e plantas extintos em laboratório. o Exemplo: através de utilização de técnicas de edição genómica, para tentar criar um híbrido de mamute e de um elefante asiático. Alternativas à carne animal - Há um crescente interesse e investimento em alternativas à carne cultivada e à base de plantas que tentam imitar a carne de animais. O perfil ambiental da alternativa da carne, parece promissor em alguns cenários, mas há pouca evidência independente sobre os efeitos da produção em grande escala. Edição do genoma em animais de criação - A edição do genoma pode permitir modificações em animais de criação que anteriormente não eram viáveis. o Exemplo 1: produzir gado sem chifres para evitar danos noutros bovinos e criadores. o Exemplo 2: fazer porcos e galinhas resistentes a certas doenças. 49 Meio ambiente e saúde - A saúde humana está intimamente ligada à saúde de outros animais e do ambiente. Perigos ambientais como contaminantes alimentares e a poluição atmosférica têm sido associadas a doenças graves, incluindo cancro, depressão e doenças cardíacas. As alterações climáticas afetam as determinantes sociais e ambientais em saúde – ar limpo, água potável segura, alimentos suficientes e abrigo seguro. Biossegurança - Surtos de vírus como COVID-19, Zika e Ébola destacaram o papel dos laboratórios de biossegurança de alta contenção nas respostas de saúde pública. Estes laboratórios estão envolvidos na caracterização do ser humano e seres patogénicos animais, auxiliam na vigilância de doenças e a conduzir pesquisas pré- clínicas que sustentem a linha para o desenvolvimento de diagnósticos, terapêutica e vacinas. Início de Vida Congelamento de óvulos, espermatozóides e embriões - À medida que as técnicas de congelamento melhoram, o congelamento de gametas e embriões tem vindo a surgir como uma solução viável de prolongar e preservar a fertilidade. O número de pessoas que optam por congelar os óvulos está a aumentar e algumas empresas oferecem o congelamento de óvulos como benefício aos funcionários. O prazo de armazenamento para gametas e embriões congelados eletivamente será, em breve, de 10 para 55 anos. Intervenção fetal - podem ser realizadas intervenções cirúrgicas em fetos no útero para controlar condições de risco de vida e prevenir incapacidades, por exemplo, para reparar válvulas cardíacas, drenar bexigas bloqueadas e correção de hérnias diafragmáticas. Estas disciplinas expõem tanto os fetos como as grávidas a uma série de riscos de longo e curto prazo e envolvem compensações complexas entre benefícios e riscos fetais e maternos. Edição de genoma na reprodução humana - Usar a edição do genoma para alterar o DNA de embriões, espermatozoides ou óvulos para ajudar um casal a ter um filho sem uma doença hereditária específica. Atualmente, isso é ilegal no Reino Unido. Antes que possa ser permitido, é amplamente aceite que é necessário considerar a segurança clínica das técnicas e do seu impacto potencial no bem-estar da pessoa no futuro, e sobre a discriminação e a divisão na sociedade. 50 Sequenciamento completo do genoma de recém-nascidos - Oferecer sequenciamento do genoma aos pais de todos os bebês recém-nascidos para poder identificar riscos nos bebés de desenvolverem doenças e criar um recurso de dados genéticos para investigação em saúde. É provável que isto esteja disponível num futuro próximo para pais através de empresas comerciais de testes genéticos. Barriga de aluguer - Quando uma mulher dá à luz um filho em nome de outra pessoa ou de um casal. Atualmente, os futuros pais têm que esperar até que a criança nasça para depois recorrerem ao tribunal para se tornarem pais da criança. Também há falta de clareza em torno do pagamento. Substituições de útero – já existem investigadores que conseguiram manter cordeiros prematuros vivos em úteros artificiais por diversas semanas. Esta tecnologia pode ajudar a melhorar os resultados para bebés prematuros no futuro. Olhando mais adiante, se mais pessoas ou todas as grávidas um dia gerarem a gravidez fora do corpo humano, o uso de úteros artificiai