Manual de Cuidados Paliativos PDF

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2020

Maria Perez Soares D’Alessandro, Carina Tischler Pires, Daniel Neves Forte, Ana Paula Mirarchi Vieira Maiello, Fernanda Pimentel Coelho, Aline de Almada Messias

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cuidados paliativos saúde medicina paliative care

Summary

Este manual de cuidados paliativos, publicado em 2020 pelo Hospital Sírio-Libanês, e Ministério da Saúde, fornece orientações práticas para profissionais de saúde sobre o tema. O guia aborda diversos aspectos, incluindo espiritualidade, ética, manejo da dor, e avaliação de prognóstico, além de considerar o contexto da pandemia de COVID-19. O manual é um recurso valioso para profissionais da área, que podem usar os exemplos de diagnósticos e tratamentos apresentados.

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Manual de Cuidados Paliativos Ministério da Saúde Secretaria de Atenção Especializada à Saúde/SAES Departamento de Atenção Hospitalar, Domiciliar e de Urgência/DAHU Coordenação Geral de Atenção Hospitalar e Domiciliar/CGAHD CONASS – Conselho Nacional de Secretários de Saúde Sociedade Beneficente...

Manual de Cuidados Paliativos Ministério da Saúde Secretaria de Atenção Especializada à Saúde/SAES Departamento de Atenção Hospitalar, Domiciliar e de Urgência/DAHU Coordenação Geral de Atenção Hospitalar e Domiciliar/CGAHD CONASS – Conselho Nacional de Secretários de Saúde Sociedade Beneficente de Senhoras Hospital Sírio-Libanês Compromisso Social Manual de Cuidados Paliativos Coordenação: Maria Perez Soares D’Alessandro, Carina Tischler Pires e Daniel Neves Forte Autores: Ana Paula Mirarchi Vieira Maiello, Fernanda Pimentel Coelho, Aline de Almada Messias e Maria Perez Soares D’Alessandro Revisores HSL: Ana Cristina Pugliese de Castro, Ana Paula de Souza Borges, Carina Tischler Pires, Daniela Achette, Daniel Neves Forte, Luis Saporetti, Luiz Filipe Gottgtroy de Carvalho, Valeria Delponte e Veridiana Schulz Apoio HSL: Guilherme Fragoso de Mello e Luiz Felipe Monteiro Correia Equipe Técnica Ministério da Saúde: GAB/SAES – Eloiza Andrade Almeida Rodrigues DAHU/SAES – Adriana Melo Teixeira e Olavo de Oliveira Braga Neto CGAHD/DAHU – Rafael Leandro de Mendonça e Iane Andrade Neves Equipe Técnica CONASS: René José Moreira dos Santos e Eliana Maria Ribeiro Dourado Manual de Cuidados Paliativos Ficha Catalográfica Elaborada pela Biblioteca Dr. Fadlo Haidar Sírio‑Libanês Ensino e Pesquisa © Reprodução autorizada pelo autor somente para uso privado de atividades de pesquisa e ensino, não sendo autorizada sua reprodução para quaisquer fins lucrativos. Na utilização ou citação de partes do documento é obrigatório mencionar a autoria. M251 Manual de Cuidados Paliativos / Coord. Maria Perez Soares D’Alessandro, Carina Tischler Pires, Daniel Neves Forte... [et al.]. – São Paulo: Hospital Sírio- Libanês; Ministério da Saúde; 2020. 175p. Vários autores: Aline de Almada Messias, Ana Paula Mirarchi Vieira Maiello, Fernanda Pimentel Coelho, Maria Perez Soares D’Alessandro; Revisores: Ana Cristina Pugliese de Castro, Ana Paula de Souza Borges, Carina Tischler Pires, Daniela Achette, Daniel Neves Forte, Luis Saporetti, Luiz Filipe Gottgtroy de Carvalho, Valeria Delponte e Veridiana Schulz 1. Cuidados Paliativos. 2. Espiritualidade. 3. Ética. 4. Guia. I. Título. CRB: 8/7548 NLM: WB 310 4 Manual de Cuidados Paliativos Índice 1. Cuidados Paliativos: Um Panorama  13 1.1. Definição e Princípios  13 1.2. Cuidados Paliativos e Cuidados Curativos  14 1.3. Aplicabilidade e Benefícios  17 Anexo - Resolução nº 41, de 31 de outubro de 2018  18 2. Espiritualidade: Como Abordar Esta Importante Demanda  23 2.1. Introdução  23 2.2. Relação entre Espiritualidade e Desfechos em Saúde  24 2.3. Necessidades Espirituais  25 2.4. Angústia Espiritual  25 2.5. Como Implementar a Assistência Espiritual  26 2.6. Abordagem da Angústia Espiritual  27 Anexo 1 – Versão Validada para o Português do Spiritual Needs Assessment for Patients (SNAP)  29 Anexo 2 – Problemas Espirituais, Características-Chave e Exemplos de Fala  31 3. Cuidando de Quem Cuida: Considerações para a Equipe de Saúde  33 3.1. O Cuidado e o Cuidador  33 3.2. O que o Cuidar Desperta no Profissional de Saúde  34 3.3. Reasseguramento do Cuidador  34 3.4. Aprimorando o Cuidado  36 4. Aspectos Ético-Jurídicos da Paliação  38 4.1. Ponderações sobre a Resolução 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina e a Discussão Jurídica Desencadeada por Esta  38 4.2. Ponderações sobre a Legislação Brasileira  41 4.3. Ponderações Éticas  42 Anexo 1 - RESOLUÇÃO CFM Nº 1.805/2006  45 5. Avaliação de Prognóstico: Considerações e Instrumentos Práticos  47 5.1. A Avaliação Prognóstica e a Tomada de Decisão em Saúde  47 5.2. Indicadores Gerais de Pior Prognóstico  48 5.3. Idosos  48 5.4. Múltiplas Comorbidades  50 5.5. Insuficiência Cardíaca  51 5.6. Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC)  54 5.7. Cirrose  56 5.8. Neoplasias Malignas  58 5.9. Insuficiência Renal  60 5.10. Demência  61 5.11. Acidente Vascular Cerebral Isquêmico  63 5.12. Outros Recursos Interessantes para Avaliação Prognóstica  64 6. Considerações sobre a Proporcionalidade de Medidas Invasivas de Suporte de Vida e seus Conflitos  66 6.1. O Cuidado Adequado  66 5 Manual de Cuidados Paliativos 6.2. O Uso Expressivo de Terapia Intensiva  68 6.3. A Priorização de Casos para Admissão em UTI  69 6.4. Tomada de Decisão Ética e Compartilhada  72 6.5. Pontos Principais  73 Anexo 1 – Escala de Katz: Adaptação Transcultural  74 7. Aspectos Gerais do Luto e Peculiares no Contexto da Pandemia de COVID‑19  75 7.1. Compreendendo o Luto  75 7.2. Luto e Distanciamento Social  77 7.3. Rituais de Despedida no Contexto da Pandemia e Distanciamento Social  78 7.4. Suporte ao Luto  78 8. Comunicação de Más Notícias: Como Abordar este Desafio  81 8.1. Premissas Básicas  81 8.2. Comunicando uma Má Notícia  82 8.3. Recursos que Podem Ser Acionados  83 8.4. Resumo dos Pontos Principais  84 Anexo – Exemplos Práticos de Diálogos  85 9. Reunião Familiar: Como Planejar e Executar Essa Importante Abordagem  88 9.1. Estratégias  89 9.2. Preparos Antes da Reunião  89 9.3. Durante a Reunião  90 9.4. Após a Reunião  92 10. Diretivas Antecipadas de Vontade e Planejamento Avançado de Cuidados  93 10.1. Diretivas Antecipadas de Vontade  93 10.2. Testamento Vital  94 10.3. Como Iniciar a Abordagem sobre Diretivas Antecipadas  94 10.4. Planejamento Avançado de Cuidados  95 11. Particularidades da Comunicação no Contexto de Distanciamento Social  98 11.1. Contextualização  98 11.2. Particularidades da Comunicação na Pandemia de COVID‑19  99 12. Dor: Avaliação e Analgésicos Não Opioides  106 12.1. Avaliação da Dor  106 12.2. Dor Total  108 12.3. Princípios no Tratamento da Dor  109 12.4. Analgésicos Não Opioides  110 Anexo 1 – Pain Assessment in Advanced Dementia – PAINAD – Escala de Avaliação de Dor em Demência Avançada  113 Anexo 2 – Behavioural Pain Scale (Escala Comportamental de Dor)  115 13. Dor: Como Manejar Opioides e Seus Efeitos Colaterais  116 13.1. Opioides Fracos  116 13.2. Opioides Fortes  117 13.3. Principais Efeitos Colaterais dos Opioides  123 13.4. Intoxicação por Opioides  124 6 Manual de Cuidados Paliativos 13.5. Uso de Opioides de Resgate  125 13.6. Rotação de Opioide  125 13.7. Tolerância, Dependência Física e Vício  126 14. Manejo da Dor: Dor Neuropática e Adjuvantes  128 14.1. Dor Neuropática  128 14.2. Adjuvantes  129 15. Delirium: Como Diagnosticar e Tratar  133 15.1. Avaliação  133 15.2. Fatores de Risco, Diagnóstico, Causa Desencadeantes e Classificação  133 15.3. Tratamento  135 15.4. Medidas Farmacológicas e Não Farmacológicas  135 Anexo 1 - Confusion Assessment Method (CAM)  139 16. Dispneia e Outros Sintomas Respiratórios  140 16.1. Avaliação  140 16.2. Tratamento  140 16.3. Outros Sintomas Respiratórios  143 17. Náuseas e Vômitos: Compreenda a Causa e Trate Adequadamente  144 17.1. Avaliação  144 17.2. Fisiologia  145 17.3. Tratamento Farmacológico  145 17.4. Tratamento Não Farmacológico  147 18. Sedação Paliativa: Conceito, Quando Indicar e Como Fazer  149 18.1. Conceito e Indicação  149 18.2. Plano Terapêutico  149 18.3. Princípios Gerais para Ajuste de Prescrição em Fase Final de Vida  151 18.4. Medicações  152 18.5. Pontos Principais  158 19. Hipodermóclise: Técnica, Cuidados e Medicações Compatíveis por Essa Via  159 19.1. Considerações Iniciais  159 19.2. Punção e Cuidados Relacionados  161 19.3. Medicações, Soluções e Diluições  164 20. Manejo da Dispneia e Outros Sintomas na Pandemia do COVID‑19  169 20.1. Contextualização  169 20.2. Manejo da Dispneia  170 20.3. Medidas Não Farmacológicas  171 20.4. Tratamento Farmacológico com Opioides  172 20.5. Ansiedade Associada com a Dispneia  173 20.6. Outros Sintomas  174 7 Manual de Cuidados Paliativos Mensagem do Hospital Sírio-Libanês A Sociedade Beneficente de Senhoras Hospital Sírio-Libanês, instituição filantrópica fundada em 1921, trabalha diariamente para oferecer assistência médico-hospitalar de excelência, sempre com um olhar humanizado e individualizado. Em uma busca constante pela evolução e contribuição para uma sociedade mais justa e fraterna, o hospital desenvolve atividades de ensino e pesquisa, integradas ao trabalho e compromisso social. O Sírio-Libanês promove estudos, compartilha conhecimento e desenvolve projetos integrados com o Ministério da Saúde e contribui para a disseminação de conhecimento e boas práticas para gestores de saúde em todo o país, como parte do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI- SUS), desenvolvido para colaborar com o fortalecimento do sistema público de saúde, visando promover a melhoria das condições de saúde da população. Lançado oficialmente pelo Ministério da Saúde em 2009, o programa é uma ferramenta de política pública de saúde financiada com recursos de isenção fiscal concedida para hospitais filantrópicos com excelência reconhecida pelo Ministério da Saúde, como é o caso do Sírio-Libanês. Dessa forma, o programa permite a transferência, desenvolvimento e incorporação de novos conhecimentos e práticas em áreas estratégicas para o SUS por meio da execução de projetos de apoio e na prestação de serviços de saúde, enquadrados em áreas específicas, por conta do uso otimizado de sua capacidade técnica e conhecimento. Atualmente são cinco grandes áreas de atuação dos projetos: estudos de avaliação e incorporação de tecnologia; pesquisas de interesse público em saúde; assistenciais em parceria com o gestor local (governos estadual e municipal), por meio da prestação de serviços hospitalares e ambulatoriais ao SUS; capacitação de recursos humanos e desenvolvimento de técnicas e operação de gestão em serviços de saúde; da qual o projeto Cuidados Paliativos no SUS – Atenção Hospitalar, Ambulatorial Especializada e Atenção Domiciliar faz parte. O projeto de Cuidados Paliativos no SUS foi elaborado em parceria entre Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), HSL e Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Nessa colaborativa o HSL 8 Manual de Cuidados Paliativos aborda a atenção hospitalar, ambulatorial especializada e domiciliar. Enquanto o HIAE realiza ações na atenção primária. Uma das ações desenvolvidas pelo HSL foi a elaboração do material apresentado a seguir e nomeado de Manual de Cuidados Paliativos. Por meio dele buscamos facilitar a difusão do conhecimento sobre o tema, trazendo evidências da literatura médica internacional e o que há de oficial no Brasil sobre o assunto de maneira prática, objetiva e compatível com a realidade do SUS. Além dos temas gerais que cobrem uma ampla gama de diagnósticos, em função da pandemia da COVID‑19, foram elaborados também materiais específicos para este contexto de infecção e distanciamento social, visando auxiliar as equipes da ponta a ofertar um cuidado adequado para os pacientes acometidos. Deste modo colaboramos para que o conhecimento seja difundido de forma justa e transparente, compartilhando os valores de solidariedade e calor humano do Sírio-Libanês com os profissionais e pacientes do SUS, bem como com os seus familiares. Serão muitos os desafios na implementação de boas práticas de Cuidados Paliativos no SUS, mas as recompensas serão ainda maiores. A consciência de que os frutos dessas atividades colaboram para a construção de uma sociedade com uma melhor assistência à saúde, mais equilibrada e mais humana é o que dá sentido ao trabalho. O Sírio-Libanês segue em sua missão de ser uma instituição de saúde excelente na medicina e no cuidado, calorosa e solidária na essência. Dr. Fernando Ganem Diretor de Governança Clínica Hospital Sírio-Libanês Vânia Rodrigues Bezerra Superintendente de Compromisso Social 9 Manual de Cuidados Paliativos Apresentação Caros(as), O Hospital Sírio-Libanês, por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS) do Ministério da Saúde (MS), deu início neste ano de 2020 ao Programa de Cuidados Paliativos no SUS – Atenção Hospitalar, Ambulatorial Especializada e Atenção Domiciliar. A iniciativa conta com a parceria do CONASS e é realizada de forma colaborativa com Hospital Israelita Albert Einstein, visa impulsionar a organização e desenvolvimento dos Cuidados Paliativos (CP) no Brasil, em consonância com as diretrizes do MS em relação à resolução nº 41 da Comissão Intergestores Tripartite (CIT) de 31 de outubro de 2018. O CP desenvolve competências relacionadas ao cuidado do sofrimento físico, psíquico, social e espiritual de pacientes que enfrentam doenças que ameacem suas vidas, bem como as suas consequências que afetam os familiares. Estas competências podem e devem ser integradas precocemente ao cuidado que busca a cura ou o controle da doença, gerando assim melhoria em qualidade de vida, além de um importante impacto econômico. Recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a qual enfatiza a necessidade de políticas nacionais de CP baseadas em evidências, os CPs devem apoiar o fortalecimento integral dos sistemas de saúde, em todos os seus níveis. Atualmente, os CPs são cada vez mais reconhecidos com uma parte essencial dos sistemas de saúde. A demanda por esse tipo de abordagem é crescente em todo o mundo devido ao envelhecimento populacional, o qual é associado às pessoas viverem com condições de saúde mais complexas, decorrentes da maior prevalência de pessoas convivendo com neoplasias e/ou doenças crônico-degenerativas. Apesar disso, fora da Europa, América do Norte e Austrália, é difícil encontrar sistemas de saúde estruturados e de qualidade nesse tipo de abordagem. O Brasil ainda apresenta desenvolvimento insuficiente, se comparado a outros países da América Latina. Infelizmente, é frequente a não compreensão adequada do termo CP, ligando-o apenas à fase final de vida. Diferentemente deste conceito antigo, entende-se atualmente que os CP são uma abordagem que deve ocorrer concomitantemente aos cuidados curativos ou modificadores de doença. Ao invés de se pensar ou indicar CP somente quando se pensava em terminalidade da vida, atualmente o conceito e a indicação de CP se relaciona ao sofrimento de uma doença grave. Desta forma, deve ser ofertado em todos os níveis de assistência (primário, secundário e terciário) e nos diferentes pontos da rede de assistência (atenção básica, domiciliar, ambulatorial, hospitalar e urgência e emergência). O baixo desenvolvimento do CP se associa ao aumento da frequência da distanásia e obstinação terapêutica que, por sua vez, leva à superlotação de Unidades de Terapia Intensiva e Unidades de Urgência e Emergência, com 10 Manual de Cuidados Paliativos aumento de custos em atendimentos de baixa qualidade, percebida por pacientes e seus familiares. Além disso, cada vez mais evidências corroboram que a distanásia, além de ser cara e sofrida, resulta em piores desfechos clínicos, como redução de sobrevida. Para evitar este ciclo, os profissionais de saúde precisam desenvolver competências de Cuidados Paliativos, conhecimento sobre os diferentes serviços de apoio na rede, assim como ter a estrutura de saúde que favoreça sua aplicação de forma ética e humanizada. O projeto Programa de Cuidados Paliativos no SUS – Atenção Hospitalar, Ambulatorial Especializada e Atenção Domiciliar - por meio do PROADI-SUS - visa então apoiar o desenvolvimento desta rede, capacitando profissionais do sistema público de saúde de diferentes pontos da Redes de Atenção à Saúde (RAS) em CP gerais. Esta proposta vem ao encontro das premissas da portaria nº 3362/2017, destacando-se sua relevância e potencial de contribuição para a governança do SUS, correlacionando-se aos objetivos do Plano Nacional de Saúde e às seguintes áreas de atuação: capacitação de recursos humanos - formação e capacitação em serviço, destinados à qualificação de profissionais de saúde/gestão de serviços, de acordo com as necessidades identificadas pelos gestores do SUS e Política Nacional de Educação na Saúde, em consonância com as diretrizes traçadas pelo Ministério da Saúde; desenvolvimento de técnicas e operação de gestão em serviços de saúde - racionalização de custos e ampliação da eficiência operacional dos serviços e sistemas regionais, com o desenvolvimento de controle de doenças no âmbito populacional, avançando nas metodologias estruturadas em torno de metas em qualidade de vida e saúde. Este Manual de Cuidados Paliativos é uma das primeiras iniciativas nesse sentido e busca oferecer subsídios teóricos essenciais para que os profissionais de saúde possam se apropriar de pontos fundamentais dessa abordagem. Sejam bem-vindos! Dr. Daniel Neves Forte Gerente de Humanização e Cuidados Paliativos Hospital Sírio-Libanês Carina Tischler Pires Gerente de Projetos PROADI do Hospital Sírio-Libanês Dra. Maria Perez Soares D’Alessandro Coordenadora Médica PROADI Cuidados Paliativos HSL 11 ATENÇÃO: As medicações, doses e os fluxos sugeridos neste documento servem como parâmetros iniciais para apoiar a atuação clínica no manejo de pacientes em cuidados paliativos. A equipe responsável pelo caso deve realizar ajustes nessas de acordo com especificidades do paciente e características de trabalho da instituição. Manual de Cuidados Paliativos 1. Cuidados Paliativos: Um Panorama Objetivo: Introduzir conceitos gerais e um panorama global dos Cuidados Paliativos. 1.1. Definição e Princípios As doenças ameaçadoras da vida, sejam agudas ou crônicas, com ou sem possibilidade de reversão ou tratamentos curativos, trazem a necessidade de um olhar para o cuidado amplo e complexo em que haja interesse pela totalidade da vida do paciente com respeito ao seu sofrimento e de seus familiares. Este tipo de cuidado foi definido em 2002 pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como Cuidados Paliativos. O cuidado paliativo é a abordagem que visa a promoção da qualidade de vida de pacientes e seus familiares, através da avaliação precoce e controle de sintomas físicos, sociais, emocionais, espirituais desagradáveis, no contexto de doenças que ameaçam a continuidade da vida. A assistência é realizada por uma equipe multiprofissional durante o período do diagnóstico, adoecimento, finitude e luto (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2007). Para uma adequada prática de cuidados paliativos são necessários conhecimento e compreensão dos seguintes princípios norteadores (MATSUMOTO, 2009): Iniciar o mais precocemente possível o acompanhamento em cuidados paliativos junto a tratamentos modificadores da doença. Incluir toda a investigação necessária para compreender qual o melhor tratamento e manejo dos sintomas apresentados. Reafirmar a vida e sua importância. Compreender a morte como processo natural sem antecipar nem postergá-la. Promover avaliação, reavaliação e alívio impecável da dor e de outros sintomas geradores  de desconforto. Perceber o indivíduo em toda sua completude, incluindo aspectos psicossociais e espirituais no seu cuidado. Para isso é imprescindível uma equipe multidisciplinar. Oferecer o melhor suporte ao paciente focando na melhora da qualidade de vida, influenciando positivamente no curso da doença quando houver possibilidade e auxiliando-o a viver tão ativamente quanto possível até a sua morte. Compreender os familiares e entes queridos como parte importante do processo, oferecendo-lhes suporte e amparo durante o adoecimento do paciente e também no processo de luto após o óbito do paciente. 13 Manual de Cuidados Paliativos O foco no cuidar inclui reconhecer e responder às necessidades do paciente e dos familiares através de uma visão ampla e transdisciplinar. Reconhecem-se as conquistas da moderna tecnologia médica, porém realiza-se uma transição gradual e equilibrada entre tentativas legítimas de manter a vida, quando se tem chances reais de recuperação, e a abordagem paliativa, através do controle de sintomas sem nunca desconsiderar a dimensão da finitude humana (BERTACHINI; PESSINI, 2011). 1.2. Cuidados Paliativos e Cuidados Curativos A relação entre cuidados curativos e paliativos ocorrerá de maneira diferente nos diversos países devido a características socioeconômicas, sistema de saúde e outras razões. Os cuidados paliativos não devem substituir os cuidados curativos apropriados. O preconizado é uma melhor e mais precoce integração dos cuidados paliativos com o tratamento ativo (WORLDWIDE PALLIATIVE CARE ALLIANCE, 2014) (ver figura 1). Figura 1.  odelo integrado de cuidados curativos e paliativos para doenças crônicas M progressivas. Tratamento Modificador de Doença (curativo, prolongador de vida ou com intenção paliativa) Cuidados paliativos Diagnóstico Adoecimento Morte Cuidado do enlutado Adaptado de: WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Knowledge into Action Palliative Care. Cancer Control, 1–42, 2007. Disponível em: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/44024/9241547345_eng.pdf;jsessionid=C3E11870D89E18DAED6CE04DC7C0D0FF?sequence=1. Todo e qualquer paciente que possui doença crônica e/ou ameaçadora da vida poderá se beneficiar com os Cuidados Paliativos - crianças, adultos e idosos. A necessidade de cuidados paliativos está presente em todos os níveis de atendimento, primário, secundário e serviços especializados. Podem ser prestados como abordagem, por todos os profissionais de saúde que sejam educados e qualificados através de treinamento apropriado; como cuidados paliativos gerais, fornecido por profissionais de atenção primária e por profissionais que tratam doenças potencialmente fatais com um bom conhecimento básico de cuidados paliativos; ou ainda como cuidados paliativos especializados, prestados por equipes especializadas neste tipo de cuidado (GAMONDI; LARKIN; PAYNE, 2013). 14 Manual de Cuidados Paliativos As principais doenças que requerem cuidados paliativos segundo as estimativas globais da OMS no contexto dos adultos (indivíduos com 15 anos ou mais) são doenças cardiovasculares (38%), neoplasias (34%), Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC – 10%), HIV/Aids (10%) e outras (ver figura 2). Na figura 3 podem ser vistas as principais doenças em crianças (considerando indivíduos até 14 anos) (WORLDWIDE PALLIATIVE CARE ALLIANCE, 2014). Figura 2. P  rincipais doenças na população adulta do Global Atlas of Palliative Care at the end of life (WORLDWIDE PALLIATIVE CARE ALLIANCE, 2014). Alzheimer e outras demências 1.65% Cirrose hepática 1.70% Tuberculose multirresistente Doenças renais 2.02% 0.80% Diabetes mellitus 4.59% Doença de Parkinson 0.48% HIV/Aids 5.71% Artrite reumatoide 0.27% Doença pulmonar Esclerose múltipla 0.04% obstrutiva crônica 10.26% Doenças cardiovasculares Câncer 34.01% 38.47% N=19.228.760 15 Manual de Cuidados Paliativos Figura 3. P  rincipais doenças na população infantil do Global Atlas of Palliative Care at the end of life (WORLDWIDE PALLIATIVE CARE ALLIANCE, 2014). Doenças cardiovasculares 6.18% Distúrbios endocrinológico, imunes ou do sangue 5.85% Câncer 5.69% Condições neurológicas* 2.31% Doenças renais 2.25% Cirrose hepática 1.06% Anormalidades congênitas* 25.06% Condições neonatais* 14.64% Desnutrição calórico-proteica 14.12% Meningite 12.62% HIV/Aids 10.23% N = 1,170,011 16 Manual de Cuidados Paliativos 1.3. Aplicabilidade e Benefícios O cuidado paliativo visa oferecer cuidados adequados e dignos aos pacientes com e sem possibilidade curativa. Na literatura internacional esse tipo de abordagem é associado de maneira consistente a uma série de benefícios e melhorias; dentre eles pode-se destacar: melhor planejamento prévio de cuidados, melhora da qualidade de vida, redução de sintomas desagradáveis, maior satisfação dos pacientes e do núcleo cuidador e menor utilização do sistema de saúde (KAVALIERATOS et al., 2016). Outro importante benefício relatado em trabalhos que avaliam o tratamento paliativo é o efeito desse tipo de abordagem nos familiares. Conversar sobre os cuidados de fim de vida e a percepção positiva dos familiares sobre a assistência nessa fase se mostrou um fator protetor para o desenvolvimento de depressão e luto complicado (MIYAJIMA et al., 2014; YAMAGUCHI et al., 2017). Transtornos de saúde mental têm um impacto importante na vida das pessoas e na sociedade. Uma melhor assistência paliativa poderia reduzir potencialmente esse impacto em familiares enlutados. Estudos mostram que a maioria das pessoas ao redor do mundo preferiria falecer em casa. No entanto, metade falece em hospitais (com grandes variações regionais). Ao mesmo tempo, há indícios na literatura de uso excessivo de medidas agressivas no fim de vida e de um uso aquém do que seria ideal de cuidados paliativos nessa fase (BROWNLEE et al., 2017). Sugerindo, assim, que temos espaço para desenvolver esse tipo de abordagem com potencial de trazer benefícios tanto para os pacientes como para o sistema de saúde, otimizando os recursos e oferecendo uma assistência alinhada com as preferências de cuidados. Não existe um único local em que se pode realizar cuidados paliativos. O local mais indicado é onde o paciente que necessita deste tipo de cuidado estiver, ou seja, no domicílio, na instituição hospitalar, ambulatório, instituição de longa permanência ou hospice (WORLDWIDE PALLIATIVE CARE ALLIANCE, 2014). A qualidade do cuidado e o local onde é realizado também se torna significativo para o processo de luto vivenciado durante o adoecimento e após o falecimento do paciente (MIYAJIMA, et al. 2014). Compreende-se então que não há tempo ou limite prognóstico para a prestação de cuidados paliativos. É amplamente defendido que estes devem ser prestados na necessidade, e não somente no diagnóstico ou prognóstico como pensado anteriormente. Todo e qualquer indivíduo doente merece ser assistido com qualidade, de acordo com suas necessidades, sendo amparados e tratados em seu sofrimento bem como dos seus familiares. A qualidade de vida e a dignidade humana estão sempre no foco dos profissionais que atuam em cuidados paliativos (WORLDWIDE PALLIATIVE CARE ALLIANCE, 2014). Em 31 de outubro de 2018, o Ministério da Saúde publicou a resolução nº 41, que normatiza a oferta de cuidados paliativos como parte dos cuidados continuados integrados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018). A resolução propõe, que nas redes de atenção à saúde, sejam claramente identificadas e observadas as preferências da pessoa doente quanto ao tipo de cuidado e tratamento médico que receberá. A resolução define que os cuidados paliativos devam estar disponíveis em todo ponto da rede, na atenção básica, domiciliar, ambulatorial, hospitalar, urgência e emergência. A partir desta publicação será possível definir diretrizes de cuidado e aprimorar a oferta do cuidado. Veja a resolução número 41 em anexo. 17 Manual de Cuidados Paliativos Referências BERTACHINI, L.; PESSINI, L. Conhecendo o que são cuidados paliativos: conceitos fundamentais. In: BERTACHINI, L.; PESSINI, L (Orgs.) - Encanto e Responsabilidade no Cuidado da Vida: lidando com desafios éticos em situações críticas e de final de vida. 1ª ed. São Paulo: Paulinas/Centro Universitário São Camilo, 2011, p. 19-55. BROWNLEE, S. et al. Evidence for overuse of medical services around the world. The Lancet, v. 390, nº 10090, p. 156–168, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(16)32585-5. Acesso em: 09 abr. 2020. GAMONDI, C.; LARKIN, P.; PAYNE, S. Core competencies in palliative care: An EAPC white paper on palliative care education - Part 2. European Journal of Palliative Care, v. 20, nº 3, p. 140–145, 2013. Disponível em: https://www.semanticscholar.org/paper/Core-competencies-in-palliative-care%3A-an-EAPC-white-Gamondi- Larkin/19ae0cb6f15fde949c2444abe2881083c334e92d. Acesso em: 10 abr. 2020. KAVALIERATOS, D. et al. Association between palliative care and patient and caregiver outcomes: a systematic review and meta-analysi. Journal of the American Medical Association, v. 316, nº 20, p. 2104–2114, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1001/jama.2016.16840 Acesso em: 09 abr. 2020. MATSUMOTO, D. Y. Cuidados Paliativos: conceito, fundamentos e princípios. In: Academia Nacional de Cuidados Paliativos (org.). Manual de cuidados paliativos. Rio de Janeiro: Diagraphic, 2009. p. 14-19. MIYAJIMA, K. et al. Association between quality of end-of-life care and possible complicated grief among bereaved family members. 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Acesso em: 13 abr. 2020 Anexo - Resolução nº 41, de 31 de outubro de 2018 Dispõe sobre as diretrizes para a organização dos cuidados paliativos, à luz dos cuidados continuados integrados, no âmbito Sistema Único de Saúde (SUS). A COMISSÃO INTERGESTORES TRIPARTITE, no uso das atribuições que lhe conferem o inciso II do art. 14-A da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, e tendo em vista o disposto no inciso I do art. 32 do Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011 em conformidade com o inciso II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e 18 Manual de Cuidados Paliativos considerando a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências; Considerando a Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012, que regulamenta o § 3º do art. 198 da Constituição Federal para dispor sobre os valores mínimos a serem aplicados anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios em ações e serviços públicos de saúde; estabelece os critérios de rateio dos recursos de transferências para a saúde e as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas 3 (três) esferas de governo; revoga dispositivos das Leis nº 8.080, de 1990, e nº 8.689, de 27 de julho de 1993; e dá outras providências; Considerando o Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011, que dispõe sobre a organização do Sistema Único de Saúde (SUS), o planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa; Considerando a Portaria nº 1.083/SAS/MS, de 02 de outubro de 2012 que aprova o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Dor Crônica; Considerando o Anexo IX da Portaria de consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que institui a Política Nacional para a Prevenção e Controle do Câncer na Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS); Considerando o Anexo X da Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que institui a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS); Considerando o Anexo XI da Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que institui a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa; Considerando o Anexo XXII da Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que aprova a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), com vistas à revisão da regulamentação de implantação e operacionalização vigentes, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), estabelecendo-se as diretrizes para a organização do componente Atenção Básica, na Rede de Atenção à Saúde (RAS); Considerando o Anexo XXIV da Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que institui a Política Nacional de Atenção Hospitalar (PNHOSP) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), estabelecendo-se as diretrizes para a organização do componente hospitalar na Rede de Atenção à Saúde (RAS); Considerando o Anexo XXV da Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde; Considerando o Anexo XXVIII, Título III, da Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que dispõe sobre as normas de financiamento e de execução do Componente Básico da Assistência Farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS); Considerando o Anexo XXVIII, Título IV, da Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que dispõe sobre as regras de financiamento e execução do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS); 19 Manual de Cuidados Paliativos Considerando o Título XI da Portaria de Consolidação nº 3/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que estabelece a organização dos cuidados prolongados para retaguarda à Rede de Atenção às Urgências e Emergências e demais Redes Temáticas de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS); Considerando o Anexo I da Portaria de Consolidação nº 3/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que trata das diretrizes para organização da Rede de Atenção à Saúde (RAS) do SUS; Considerando o Anexo IV, Capítulo I da Portaria de Consolidação nº 3/GM/MS, de 28 de setembro de 2017, que redefine a Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e estabelece diretrizes para a organização das suas linhas de cuidado; Considerando o Título IV, Capítulo III, da Portaria de Consolidação nº 5/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que trata sobre o atendimento e internação domiciliar; Considerando o Título V, Capítulo I, da Portaria de consolidação nº 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 trata do financiamento do componente básico da assistência farmacêutica; Considerando o Título V, Capítulo II, da Portaria de Consolidação nº 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 que trata do financiamento do componente especializado da assistência farmacêutica; Considerando a Resolução CFM nº 1.805/2006 que dispõe que na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal; Considerando a Resolução CFM nº 1.995/2012 que dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes; Considerando a Resolução CFM nº 2.156/2016 que estabelece os critérios de admissão e alta em unidade de terapia intensiva; Considerando que o Brasil vive um processo de envelhecimento populacional, e que este processo acompanhado do avanço tecnológico da segunda metade do século XX, no campo da medicina e da saúde, modificou a pirâmide etária e aumentou a prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) em nossa sociedade; Considerando em 2014 a Recomendação da 67º Assembleia da Organização Mundial de Saúde, uma exortação aos seus estados membros para que desenvolvam, fortaleçam e implementem políticas de cuidados paliativos baseadas em evidências para apoiar o fortalecimento integral dos sistemas de saúde, em todos os seus níveis; Considerando a pactuação ocorrida na Comissão Intergestores Tripartite (CIT) no dia 31 de outubro de 2018, resolve: Art. 1º Dispor sobre as diretrizes para a organização dos cuidados paliativos, à luz dos cuidados continuados integrados, no âmbito Sistema Único de Saúde (SUS). Parágrafo único. Os cuidados paliativos deverão fazer parte dos cuidados continuados integrados ofertados no âmbito da RAS. 20 Manual de Cuidados Paliativos Art. 2º Cuidados paliativos consistem na assistência promovida por uma equipe multidisciplinar, que objetiva a melhoria da qualidade de vida do paciente e seus famíliares, diante de uma doença que ameace a vida, por meio da prevenção e alívio do sofrimento, da identificação precoce, avaliação impecável e tratamento de dor e demais sintomas físicos, sociais, psicológicos e espirituais. Parágrafo único: Será elegível para cuidados paliativos toda pessoa afetada por uma doença que ameace a vida, seja aguda ou crônica, a partir do diagnóstico desta condição. Art. 3º A organização dos cuidados paliativos deverá ter como objetivos: I - integrar os cuidados paliativos na rede de atenção à saúde; II - promover a melhoria da qualidade de vida dos pacientes; III - incentivar o trabalho em equipe multidisciplinar; IV - fomentar a instituição de disciplinas e conteúdos programáticos de cuidados paliativos no ensino de graduação e especialização dos profissionais de saúde; V - ofertar educação permanente em cuidados paliativos para os trabalhadores da saúde no SUS; VI - promover a disseminação de informação sobre os cuidados paliativos na sociedade; VII - ofertar medicamentos que promovam o controle dos sintomas dos pacientes em cuidados paliativos; e VIII - pugnar pelo desenvolvimento de uma atenção à saúde humanizada, baseada em evidências, com acesso equitativo e custo efetivo, abrangendo toda a linha de cuidado e todos os níveis de atenção, com ênfase na atenção básica, domiciliar e integração com os serviços especializados. Art. 4º Serão princípios norteadores para a organização dos cuidados paliativos: I - início dos cuidados paliativos o mais precocemente possível, juntamente com o tratamento modificador da doença, e início das investigações necessárias para melhor compreender e controlar situações clínicas estressantes; II - promoção do alívio da dor e de outros sintomas físicos, do sofrimento psicossocial, espiritual e existencial, incluindo o cuidado apropriado para famíliares e cuidadores; III - afirmação da vida e aceitação da morte como um processo natural; IV - aceitação da evolução natural da doença, não acelerando nem retardando a morte e repudiando as futilidades diagnósticas e terapêuticas; V - promoção da qualidade de vida por meio da melhoria do curso da doença; VI - integração dos aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao paciente; 21 Manual de Cuidados Paliativos VII - oferecimento de um sistema de suporte que permita ao paciente viver o mais autônomo e ativo possível até o momento de sua morte; VIII - oferecimento de um sistema de apoio para auxiliar a família a lidar com a doença do paciente e o luto; IX - trabalho em equipe multiprofissional e interdisciplinar para abordar as necessidades do paciente e de seus familiares, incluindo aconselhamento de luto, se indicado; X - comunicação sensível e empática, com respeito à verdade e à honestidade em todas as questões que envolvem pacientes, familiares e profissionais; XI - respeito à autodeterminação do indivíduo; XII - promoção da livre manifestação de preferências para tratamento médico através de diretiva antecipada de vontade (DAV); e XIII - esforço coletivo em assegurar o cumprimento de vontade manifesta por DAV (Diretivas Antecipadas de Vontade). Art. 5º Os cuidados paliativos deverão ser ofertados em qualquer ponto da rede de atenção à saúde, notadamente: I - Atenção Básica: ordenadora da rede e coordenadora do cuidado, será responsável por acompanhar os usuários com doenças ameaçadoras de vida em seu território, prevalecendo o cuidado longitudinal, ofertado pelas equipes de atenção básica, conjuntamente com o Núcleo Ampliado de Saúde da Família (NASF-AB), com a retaguarda dos demais pontos da rede de atenção sempre que necessária; II - Atenção Domiciliar: as equipes de atenção domiciliar, cuja modalidade será definida a partir da intensidade do cuidado, observando-se o plano terapêutico singular, deverão contribuir para que o domicílio esteja preparado e seja o principal locus de cuidado no período de terminalidade de vida, sempre que desejado e possível. Será indicada para pessoas que necessitarem de cuidados paliativos em situação de restrição ao leito ou ao domicílio, sempre que esta for considerada a oferta de cuidado mais oportuna. III - Atenção Ambulatorial: deverá ser estruturada para atender as demandas em cuidados paliativos proveniente de outros pontos de atenção da rede; IV - Urgência e Emergência: os serviços prestarão cuidados no alívio dos sintomas agudizados, focados no conforto e na dignidade da pessoa, de acordo com as melhores práticas e evidências disponíveis; e V - Atenção Hospitalar: voltada para o controle de sintomas que não sejam passíveis de controle em outro nível de assistência. Art. 6º Os especialistas em cuidados paliativos atuantes na RAS poderão ser referência e potenciais matriciadores dos demais serviços da rede, podendo isso ser feito in loco ou por tecnologias de comunicação à distância. Art. 7º O acesso aos medicamentos para tratamentos dos sintomas relacionados aos cuidados paliativos, 22 Manual de Cuidados Paliativos notadamente opioides, deverá seguir as normas sanitárias vigentes e observar as pactuações entre as instâncias de gestão do SUS. Art. 8º O financiamento para a organização dos cuidados paliativos deverá ser objeto de pactuação tripartite, observado o planejamento e a organização dos cuidados continuados integrados na RAS. Art. 9º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Gilberto Occhi Ministro de Estado da Saúde Leonardo Moura Vilela Presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde Mauro Guimarães Junqueira Presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde 2. E  spiritualidade: Como Abordar Esta Importante Demanda Objetivo: D  escrever conceito, importância, avaliação e abordagem da espiritualidade em cuidados paliativos. 2.1. Introdução Em 2002, a Organização Mundial da Saúde definiu cuidado paliativo como uma “abordagem que promove a qualidade de vida de pacientes e familiares que enfrentam problemas associados a doenças que ameaçam a vida, através da prevenção e alívio de sofrimento, por meio da identificação precoce, avaliação e tratamento impecáveis da dor e outros problemas físicos, psicossociais e espirituais” (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2014). A espiritualidade, portanto, faz parte do cerne da abordagem de cuidados paliativos, conforme proposto pela Organização Mundial da Saúde. Desta forma, é interessante que esta dimensão do cuidado seja incluída no atendimento de pacientes que se encontram em situação de doença ameaçadora de vida. Viver esta situação pode ser algo transformador e resultar em crescimento, como também pode ser desesperador e angustiante (PUCHALSKI et al., 2020). 23 Manual de Cuidados Paliativos Puchalski et al. (2009) sugerem que a espiritualidade no contexto dos cuidados paliativos deve ser considerada como um sinal vital, ou seja, integrada na rotina de cuidados, abordada como qualquer outra questão médica e inserida no plano de cuidados do paciente. Há várias barreiras para a abordagem do sofrimento espiritual. Entre elas estão: desconhecimento dos profissionais sobre o conceito de espiritualidade e como abordá-lo, a preocupação em relação a instituir pontos de vista religiosos, além da ideia de que esta abordagem não é importante ou que não faz parte do seu escopo de trabalho (SAPORETTI, 2009; EVANGELISTA et al., 2016). Espiritualidade é um elemento complexo e multidimensional, intrínseco da experiência humana, que compreende a busca de cada um por sentido na vida e de transcendência (EVANGELISTA et al., 2016; PUCHALSKI et al., 2020). Estudiosos da área definem espiritualidade como “um aspecto intrínseco e dinâmico da humanidade através do qual o indivíduo busca significado, sentido e transcendência, e experimenta a relação consigo mesmo, com a família, com os outros, a comunidade, a sociedade, a natureza e o que é significativo e sagrado. Espiritualidade é expressada através de crenças, valores, tradições e práticas” (PUCHALSKI et al., 2014, p. 646). Apesar de poder incluir a busca por uma entidade divina, a espiritualidade diferencia-se da religiosidade na medida em que esta envolve, dentro de uma coletividade, a expressão da espiritualidade através de uma organização, com tradições, rituais, crenças, práticas, normas e celebrações em comum (EVANGELISTA et al., 2016; STEINHAUSER et al., 2017; PUCHALSKI et al., 2020). A espiritualidade diz respeito a uma força interior que motiva a busca por um sentido para a vida como um todo, para uma situação, para a própria história de vida; esta busca pode ocorrer por meio da religião, da arte, da música, de projetos de vida, da filosofia, do contato com a natureza, ou da ajuda àqueles que precisam (CHERNY, 2015; EVANGELISTA et al., 2016; PUCHALSKI et al., 2020). A inspiração para tal significado da vida é único e varia de pessoa para pessoa (CHERNY, 2015). É, ainda, um recurso que pode ser usado para compreender melhor a si mesmo ou para transcender e ressignificar o sofrimento (EVANGELISTA et al., 2016). É vista como algo que pode ser praticado tanto dentro quanto fora de instituições formais e que propõe a experimentação da vida como algo que é mais do que aquilo que pode ser observada materialmente. Envolve compaixão e conexão com aquilo que transcende, com algo maior do que nós mesmos (CHERNY, 2015; STEINHAUSER et al., 2017). 2.2. Relação entre Espiritualidade e Desfechos em Saúde Religiosidade, espiritualidade e crenças culturais influenciam na tomada de decisão em saúde e em desfechos de saúde (PUCHALSKI et al., 2020). Há evidência na literatura, como no estudo prospectivo de Phelps et al. (2009), de que a presença de coping religioso positivo está associada com maior preferência e recebimento de medidas agressivas no final da vida (ventilação mecânica ou ressuscitação na última semana de vida). Na discussão, os autores desse trabalho formulam que esta associação pode estar relacionada com a crença dos pacientes de que Deus possa curar através dessas medidas, que Deus pode intervir milagrosamente enquanto estão submetidas a esse suporte 24 Manual de Cuidados Paliativos intensivo, ou ainda que eles se apoiam em Deus para superar essa situação e que isso vem através de algum sofrimento. Por outro lado, também foi encontrado associação positiva entre pacientes com medidas elevadas de espiritualidade e melhor qualidade de vida (STEINHAUSER et al., 2017; BALBONI; BALBONI, 2019). 2.3. Necessidades Espirituais Os pacientes podem desenvolver angústias espirituais à medida que a doença progride. Revelam, desta forma, necessidades espirituais que estão relacionadas a ter um significado para a vida e aproveitar o máximo possível o tempo que resta. Buscam ter fé, sentir que viveram a vida de forma completa, procuram ter esperança, perdoar, amar, conectar-se e estar em paz com os outros, com Deus e com o sagrado; ter fé e acreditar (SAPORETTI, 2009; EVANGELISTA et al., 2016; PUCHALSKI et al., 2020). Boa parte dos pacientes com doença avançada desejam que suas necessidades espirituais sejam levadas em conta pelo seu médico, pois desta forma sentem que suas crenças e desejos são respeitados e que podem ajudá-los no enfrentamento da situação. Querem sentir-se esperançosos, porém de uma forma realista, e que, assim, podem encontrar sentido para o que estão vivendo (PUCHALSKI et al., 2020). Para aprofundar este tema, sugere-se o Spiritual Needs Assessement for Patientes – SNAP (SHARMA et al., 2012), uma ferramenta para avaliação das necessidades espirituais que foi validada para o português (vide Anexo 1), em pacientes oncológicos, incluindo pacientes em cuidados paliativos (TOLOI et al., 2016). 2.4. Angústia Espiritual As angústias espirituais mais comuns incluem: desesperança, sentimento de futilidade, falta de sentido, desapontamento, remorso, ansiedade de morte e ruptura da identidade (CHERNY, 2015). Também pode ser identificada como uma dor moral, decorrente da não aderência a alguma prática religiosa ou espiritual (SAPORETTI, 2009). Pode haver sobreposição entre angústia espiritual e psicológica e a linha entre ambas é muito tênue. Cada paciente vai usar uma forma diferente para expressar seu sofrimento e o profissional deve estar aberto e explorar o que o paciente trás para tentar compreender como ele enxerga seu sofrimento; descobrir qual é a lente que o paciente usa para enxergar/verbalizar como está se sentindo. Além disso, é imprescindível a abordagem de uma equipe multiprofissional, para uma avaliação mais ampla (PUCHALSKI et al., 2020). O Anexo 2 traz os principais problemas espirituais, respectivas características-chave e exemplos de relatos. 25 Manual de Cuidados Paliativos 2.5. Como Implementar a Assistência Espiritual O screening espiritual tem por objetivo avaliar a presença ou ausência de angústia espiritual e identificar aqueles pacientes que necessitam de uma avaliação espiritual mais profunda (BALBONI et al., 2017). Ferramentas de uma única pergunta podem ser usadas neste screening, como “Você se sente em paz?” (STEINHAUSER et al., 2006). Mako, Galek e Poppito (2006, p. 1108) definiram dor espiritual como “uma dor profunda no seu ser que não é física” e perguntaram para pacientes com câncer avançado se estavam sentindo dor espiritual naquele momento e qual a intensidade dessa dor, de zero (ausência de dor) a 10 (dor excruciante). Por sua vez, o histórico espiritual é mais detalhado que o screening. A idéia do histórico é permitir, através de perguntas norteadoras, que o paciente compartilhe suas crenças e valores espirituais, religiosos e culturais, identificar recursos de enfrentamento, levantar as necessidades e a característica da espiritualidade da pessoa, apontar problemas espirituais que causem sofrimento ou que influenciam na maneira como o paciente toma decisões. Desta forma, o profissional consegue compreender melhor como paciente vivencia o processo de adoecimento e estabelecer uma relação mais profunda com o doente. (BALBONI et al., 2017; PUCHALSKI et al., 2020). Dentre as ferramentas que podem ser usadas, há a ferramenta de histórico espiritual FICA, desenvolvida por Puchalski e Romer, e SPIRIT, elaborada por Maugans, que descrevem os elementos-chave que precisam ser abordados (SAPORETTI, 2009). Veja a seguir: FICA Você se considera uma pessoa espiritualizada ou religiosa? Faith (Fé) Tem alguma fé? Se não, o que dá sentido à sua vida? Importance (Importância) A fé é importante na sua vida? Quanto? Community (Comunidade) Você faz parte de alguma igreja ou comunidade espiritual? Como nós (equipe) podemos abordar e incluir Address (Abordagem) essa questão no seu atendimento? Fonte: SAPORETTI, L.A. Espiritualidade em Cuidados Paliativos. In: OLIVEIRA, R.A. (org.). Cuidado Paliativo. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, 2008. p. 521-531. SPIRIT Spiritual Belief System Qual é a sua religião? (Afiliação religiosa) Personal Spirituality Descreva as crenças e práticas de sua religião ou (Espiritualidade pessoal) sistema espiritual que você aceita ou não 26 Manual de Cuidados Paliativos Integration with spiritual community Você pertence a alguma igreja, templo ou outra forma de (Integração em comunidades comunidade espiritual? Qual é a importância que você dá a isso? espirituais ou religiosas) Quais as práticas específicas da sua religião ou Ritualized practices and restrictions comunidade espiritual (meditação ou reza)? Quais (Rituais e restrições) os significados e restrições dessa prática? Implications for medical care Quais desses aspectos espirituais/religiosos (Implicações médicas) você gostaria que eu estivesse atento? Terminal events planning No planejamento do final da sua vida, como sua (Planejamento do fim) vontade interfere nas suas decisões? Fonte: SAPORETTI, L.A. Espiritualidade em Cuidados Paliativos. In: OLIVEIRA, R.A. (org.). Cuidado Paliativo. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, 2008. p. 521-531. A avaliação espiritual é um processo mais complexo e profundo, para ouvir o paciente e compreender melhor os recursos e as necessidades espirituais do paciente e, então, fazer um diagnóstico e plano de cuidado espiritual. Normalmente, é realizada por capelão ou algum profissional com treinamento específico em cuidado espiritual (BALBONI et al., 2017, PUCHALSKI et al., 2020). 2.6. Abordagem da Angústia Espiritual O sofrimento espiritual poderá ser abordado em três níveis de complexidade: pela equipe, pelo capelão e pelo sacerdote. Para os casos mais simples, a equipe multiprofissional treinada nessa abordagem suprirá as demandas espirituais por conexão e sentido. A pessoa é convidada a compartilhar sua história e o profissional deve ouvir e explorar o conteúdo, com empatia e compaixão, validando seu sofrimento. Desta forma, o paciente pode sentir algum conforto e assim, gradativamente, ter paz (PUCHALSKI et al., 2020). Questões mais complexas como necessidade de perdão, falta de conexão com Deus e com outros, angústia existencial intensa, o ideal é referenciar para o capelão (PUCHALSKI et al., 2020). Sofrimentos relativos a aspectos religiosos específicos, como ritos e dogmas, devem ser referenciados pela equipe ou capelão ao sacerdote daquela tradição. É importante ressaltar que o sofrimento pode ser amenizado, mas nem sempre será completamente aliviado. Boa parte dos pacientes precisam de alguém que esteja de fato presente para ouvir suas dores e angústias e conseguir desta forma encontrar respostas. Por isso é tão importante que o profissional esteja atento e ouça de forma empática, criando assim um ambiente de confiança em que o paciente consiga expressar suas angústias mais profundas (PUCHALSKI et al., 2020). 27 Manual de Cuidados Paliativos Eventualmente o paciente pode solicitar ao profissional para rezar com ele ou participar de algum ritual. O profissional deve responder na maneira que se sentir confortável, lembrando que proselitismo é antiético. Pode-se solicitar que o paciente inicie a oração ou, caso não se sinta confortável, o profissional pode apenas estar presente no recinto, testemunhando o momento (PUCHALSKI et al., 2020). Outras intervenções que podem ser feitas incluem psicoterapia, como a logoterapia de Victor Frankl ou a terapia da dignidade de Chochinov, além de técnicas de meditação, como o mindfullness (BALBONI et al., 2017), que irão ajudar o paciente no encontro com o seu eu e com o que pode dar sentido para ele. Referências BALBONI, M. J.; BALBONI, T. A. 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Aprender a lidar com sentimentos de tristeza? 4. Compartilhar seus pensamntos e sentimentos com pessoas próximas a você? 5. Preocupações que você tem com sua família? 6. Encontrar significado na sua experiência com a doença? 7. Encontrar esperança? 8. Superar medos? 9. Meditação (pessoal) ou prática de orações? 10. Seu relacionamento com Deus ou algo além de você? 11. Ficar mais próximo de uma cmunidade que compartilhe de suas crenças espirituais? 12. Lidar com qualquer sofrimento que você esteja passando? Por favor, responda sobre qualquer necessidade que você tenha agora ou acha que pode ter mais tarde. De maneira O quanto você gostaria de ajuda para: Muito Um pouco Não (muito) nenhuma 13. O significado e propósito da vida humana? 14. O morrer? 15. Encontrar paz de espírito? 16. Resolver disputas antigas, mágoas ou ressentimentos entre familiares ou amigos? 17. Encontrar perdão? 18. Tomar decisões sobre seu tratamento médico que estejam de acordo com suas crenças espirituais e religiosas? 30 Manual de Cuidados Paliativos De maneira O quanto você gostaria de ajuda para: Muito Um pouco Não (muito) nenhuma 19. Visitas de um líder religioso da sua própria comunidade religiosa? 20. Visitas de um pastor/padre do hospital? 21. Visitas de membros de sua comunidade religiosa? 22. Algum ritual religioso como cânticos, acender velas ou incensos, unção, comunhão ou oração ou passe? 23. Alguém trazer para você textos espirituais com a Bíblia, Evangelho segundo o Espiritismo, Torah, Alcorão (Corão), Analectos de Confúcio ou O Livro Tibetano dos Mortos? Fonte: TOLOI, D.A. et al. Validation of questionnaire on the Spiritual Needs Assessment for Patients (SNAP) questionnaire in Brazilian Portuguese. Ecancermedicalscience, v, 10, n. 694, 2016. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5215246/. Acesso em: 14 abr. 2020. Anexo 2 – Problemas Espirituais, Características-Chave e Exemplos de Fala Problema espiritual/ Característica-chave Exemplo de fala Diagnóstico Falta de sentido “Eu me sinto inútil” Questões sobre a própria existência Preocupação “Minha vida não tem sentido” Preocupação com o que existe após a morte existencial “Pra que continuar vivendo?” Questionar o motivo do sofrimento Procura por ajuda espiritual Sentimento de ter Solidão “Deus me abandonou” sido abandonado Não ser lembrado “Ninguém mais vem me visitar” por Deus ou outros Nenhum senso de parentesco “Estou tão sozinho” “Por que Deus levou meu Raiva direcionada Incapacidade para perdoar filho, isso não é justo…” para Deus ou outros Direciona raiva para entidade religiosa “Por que justo eu fui ficar doente, nunca fiz nada de errado?” “Quero ter uma relação mais Preocupação profunda com Deus” Desejo de relação mais profunda, com a relação de estar mais perto de Deus “Quero entender melhor com a deidade minha espiritualidade” 31 Manual de Cuidados Paliativos Problema espiritual/ Característica-chave Exemplo de fala Diagnóstico Questiona ou expressa conflito sobre suas crenças “Eu não tenho mais certeza de Conflito entre crenças e que Deus ainda está comigo” Conflito com tratamento recomendado “Eu agora questiono tudo o que tinha suas crenças Questiona implicação moral ou ética significado para mim anteriormente” do tratamento recomendado “Não adianta eu rezar, nada vai mudar” Expressa preocupação com a vida/morte Desesperança sobre a vida, sobre o futuro “Não tenho mais nada pelo que viver” Aflição, Sem esperança sobre o sentido da vida “Minha vida foi encurtada” desesperança Desespero como desesperança absoluta “Eu vou morrer mesmo” Sentimento associado a perda de ente “Eu gostaria de poder voltar a andar” Luto/perda querido, de algum relacionamento, de saúde “Eu sinto tanto a falta de alguém” “Eu não mereço morrer sem dor” Culpa/vergonha Sentimento de que fez algo errado ou ruim “Eu preciso sentir dor para expiar os meus pecados” “Eu gostaria que minha Necessidade de perdão ou reconciliação esposa me perdoasse” Reconciliação de alguém ou de si mesmo “Eu preciso ser perdoado pelo que fiz” “Eu não consigo mais ir até Isolamento Estar isolado de sua comunidade religiosa a igreja que frequento” Especificidades Incapacidade para realizar “Eu não consigo mais rezar” da religião as práticas religiosas “E se tudo em que eu acredito Falta de fé ou de sentido Angústia espiritual não for verdade?” ou religiosa Crença religiosa ou espiritual ou comunidade “As pessoas dizem que eu preciso que não colabora com lidar com a doença rezar para melhorar” Adaptado de: PUCHALSKI, C. et al. Improving the Quality of Spiritual Care as a Dimension of Palliative Care: The Report of the Consensus Conference. Journal of Palliative Medicine, v. 12, n. 10, 2009. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19807235. Acesso em: 13 abr. 2020. 32 Manual de Cuidados Paliativos 3. C  uidando de Quem Cuida: Considerações para a Equipe de Saúde Objetivo: P  romover reflexões a respeito do funcionamento de autocuidado e de cuidados em equipe de saúde. 3.1. O Cuidado e o Cuidador Precisamos de segurança e cuidado desde que nascemos e estas necessidades permanecem durante toda a nossa vida; em alguns momentos mais, quando estamos muito vulneráveis ou em perigo, e em outros menos (PETERSEN; KOEHLER, 2005). Toda relação de cuidado envolve disponibilidade (física e emocional), identificação de necessidade e prazer. Tem pessoas que têm mais facilidade em identificar e expressar suas necessidades. Se não sabemos identificar e expressar o que precisamos, dificilmente saberemos pedir ajuda e é neste ponto que a exaustão profissional aparece, quando falamos especificamente de profissionais de saúde. Não sabemos pedir ajuda, ou parece que pedir ajuda é errado. Ao escolhermos o hospital ou outros cenários da saúde como ambientes de trabalho, escolhemos também, talvez sem tanta clareza, lidar com experiências que escancaram a vulnerabilidade ao nos mantermos tão próximos de um contexto permeado por sofrimentos de diversas naturezas e com a finitude. Ao mesmo tempo que para o profissional essa experiência pode fazer com que ele se sinta vivo e satisfeito, por poder fazer algo, também o aproxima da própria vulnerabilidade e impotência (KOVÁCS, 2011). Essa satisfação relacionada ao cuidado, que promove o conforto para o paciente, é um dos aspectos que regula positivamente o profissional na sua atividade laboral: quando ele tem alta o profissional se sente mais confiante no seu trabalho, reforçando o sentido de estar lá todos os dias. Porém, o cuidado deve ser sempre o balizador e reforçador do trabalho na saúde, pois a permanência da realização dos cuidados com qualidade e a disponibilidade do profissional durante toda a trajetória de adoecimento e finitude, com respeito aos valores do paciente, validando sua dignidade, é o que tem real importância. Desta forma, quando a morte, processo natural, se fizer presente, não será experimentada com desespero e desamparo pelo paciente e familiares e nem será vivenciada pelo profissional de saúde como uma derrota (VOLICH, 2004). Para existir um cuidado efetivo e conexão com as necessidades do paciente, são necessárias mais atitudes que palavras; não basta falar que faz ou entende, é importante agir (HUGHES, 2011): Aceitando a história do indivíduo com os sentimentos e as dificuldades que ele possui;  endo curiosidade e interesse para saber o que ele te conta, afinal ele é quem conhece bastante o T próprio corpo e a própria história. Não podemos pressupor respostas; 33 Manual de Cuidados Paliativos Sendo empático;  prendendo a ouvir, acolher e respeitar valores dos pacientes/familiares que sejam diferentes dos A seus como profissional; Expressando emoções de maneira suave e conectada, buscando prazer na relação com o cuidado. 3.2. O que o Cuidar Desperta no Profissional de Saúde No entanto, é importante o profissional de saúde notar o que o paciente atendido, o seu processo de adoecimento e os cuidados que ele demanda despertam no próprio profissional. Perceber se sente raiva, pouca vontade de estar com ele, prazer e/ou satisfação em cuidar. Um bom cuidado necessita também de inteligência emocional, que é saber o que sente e como melhorar isso. Por tal motivo, as instituições devem incluir capacitações profissionais não só a nível técnico como também a nível emocional, estimulando o autoconhecimento e reflexões da sua própria história de vida (KOVACS, 2003). O profissional é visto pelo paciente e por sua família como aquele que irá reestabelecer a segurança e a saúde, diminuindo a sensação de vulnerabilidade e sofrimento experimentadas, por ser uma presença mais forte, estruturante e reguladora. Buscam no profissional uma relação genuína, empática, contínua, estável e disponível. Porém, frente a doença terminal e a proximidade com a finitude, o paciente e familiares tendem a ficar mais inseguros e demandando ainda mais do profissional, o que gera uma grande sobrecarga física e emocional, podendo interferir diretamente na disponibilidade deste profissional para esta relação de cuidado, principalmente se este não percebe esta sobrecarga (MILBERG et al., 2012). 3.3. Reasseguramento do Cuidador Assim, se o paciente e o familiar se reasseguram com o profissional, ou seja, buscam o profissional para se sentir seguro, quem vai dar apoio ao profissional quando este se sente ameaçado, impotente e frágil diante de sua tarefa de cuidar? É claro que o profissional é o maior responsável pelo seu autoconhecimento, sua autocrítica e autocuidado, porém existem algumas ferramentas de reasseguramento que serão descritas a seguir (KOVACS, 2011):  onhecimento técnico – manter atualização profissional e buscar aprimoramento. A fundamentação C técnica propicia um melhor cuidado.  onhecer a própria história – pensar quantas situações difíceis, de adoecimento e de morte viveu C na própria vida, estimular reflexões sobre como as enfrentou e como elas afetam até o momento. Entender que esta foi e é a sua maneira de enfrentar algumas situações, porém não será igual para o paciente nem para a família. 34 Manual de Cuidados Paliativos  econhecimento da cultura e significado da morte para si, para o paciente e o familiar sem críticas R ou julgamentos. As diferentes crenças podem trazer conflitos se não forem respeitadas.  quipe – a equipe de trabalho pode ser fonte de grande suporte. Uma relação de confiança e troca E tanto na tomada de decisões e condutas técnicas quanto no compartilhamento de sentimentos difíceis que surgem no processo de cuidado é ideal. Podem ser organizadas reuniões técnicas frequentes para discutir condutas de cuidados de casos mais difíceis e em outro momento reuniões de suporte e apoio emocional entre a equipe. Um membro da equipe pode organizar a reunião de apoio e este lugar deve ser ocupado por todos os profissionais em algum momento. A tarefa é apenas ser o movimentador dos conteúdos, puxar comentários sobre os casos que foram percebidos como aqueles que mais mobilizaram a equipe durante a semana ou situações em que toda a equipe experimenta uma sensação de fracasso e desamparo perante um cuidado realizado.  aproximação afetiva entre as pessoas da equipe permite adequada intimidade para observar A quando o colega está sobrecarregado e manifestar sinais de exaustão física ou emocional. Essa conexão e cumplicidade permite a aproximação e o questionamento para verificar se ele precisa conversar um pouco ou gostaria de outro tipo de ajuda.  alar sobre o luto – os profissionais de saúde reconhecerem os lutos vividos durante o seu trabalho F é saudável. Alguns lutos vividos e não reconhecidos são: o luto pela morte do paciente, pela relação estabelecida com ele e com os familiares.  anter constante o exercício de não entrar em um funcionamento automático de cuidado – isso M ajudará a não cair em um nível alto de estresse e colapso. Com frequência, pode-se ter condutas de cuidados automatizadas como na realização de higiene do paciente. O que para o paciente/ familiares são momentos únicos e de compartilhamento de intimidades, que podem ser inclusive desconfortáveis, para o profissional é apenas técnico e já foi realizado outras vezes com outros pacientes no mesmo dia.  elembrar qual o objetivo do cuidado: promover controle da situação e adaptação ao adoecimento R gerando menos desconforto (físico e emocional) para o paciente frente a finitude. É curar? Controlar sintoma? Proteger de sofrimentos? Como se sentir atuante quando o resultado não é a cura e sim o cuidado? Se estamos alinhados ao nosso propósito de cuidado diminuímos a insatisfação e a frustração.  valiar constantemente a sua disponibilidade emocional para o cuidado. Não podemos cuidar bem se A não estivermos disponíveis, porém esta disponibilidade nos torna vulneráveis. Por exemplo: se eu estou prestando cuidados a uma paciente com diagnóstico de câncer de pâncreas e recentemente perdi uma pessoa que amava também por conta de um câncer de pâncreas, muito provavelmente a minha disponibilidade emocional estará comprometida, e é digno eu solicitar ajuda ou substituição do cuidado para aquele paciente, até que emocionalmente eu esteja mais fortalecido.  bservar como o paciente solicita cuidado. Tendemos a acreditar que o paciente que não questiona O ou que demanda pouco, está bem. Mas, às vezes, o silêncio e o afastamento também são um pedido de cuidado, apesar dos pedidos mais frequentes serem os verbais, o aumento da demanda e o choro. 35 Manual de Cuidados Paliativos  tenção a disponibilidade em cada encontro – se planeje para cada encontro com o paciente. Se tiver A um tempo reduzido, comunique isso ao paciente e esteja presente no tempo que estiver com ele e caso seja necessário, retorne em um outro momento com mais tempo. Isso ajuda o paciente a se organizar com as demandas que ele tem para você.  omo reagir à raiva, comportamentos agressivos ou a reatividade do paciente? Algumas vezes, por C medo ou revolta com a aproximação da morte, os pacientes podem ser rudes e grosseiros. Estes comportamentos não podem ser aceitos nem permitidos, mas eles sinalizam que emocionalmente algo está muito difícil para o paciente. Ao invés de reagir, por inicialmente acreditar que é algo direcionado a você, deve-se pontuar a emoção dele: “Percebi que o sr.(a) está bastante irritado hoje. Algo o desagradou? Estou aqui para cuidar de você”. O objetivo é evitar: Perda de sentido no cuidar e distanciamento; Sensação de não reconhecimento no trabalho; Isolamento emocional no trabalho (não compartilhar sentimentos);  obrecarga física (cefaleia, insônia etc.) e emocional (irritabilidade, humor deprimido, ansiedade, S desinteresse); Reações intensas ao estresse; Absenteísmo; Despersonalização; Diminuição da realização pessoal. 3.4. Aprimorando o Cuidado A melhor forma para aprimorar o nosso cuidado é nos atualizando tecnicamente e nos cuidando. Precisamos incluir na rotina do dia atividades que nos proporcionem prazer, bem-estar e nos conectem com as pessoas e com o que é importante para cada um de nós. Reconhecer e validar a possibilidade de oscilar; transitar entre fadiga e satisfação atrelada ao cuidado, é saudável e um ponto importante para a regulação emocional. A existência de dias mais otimistas e extrovertidos, com maior energia, em que se sente prazer no que é realizado, e dias de maior recolhimento, em que há um sentimento de tristeza e irritação, em que o propósito do cuidado é ofuscado pela exaustão é natural. A armadura do pensamento positivo, em que se está sempre sorrindo e pronto para qualquer situação não deve ser colocada, pois é anti-humana. Paradoxalmente reconhecer a própria vulnerabilidade é o que permite identificar os recursos 36 Manual de Cuidados Paliativos e potencias para lidar com a escolha de trabalhar na área da saúde como um todo ou mais especificamente nos cuidados paliativos JAMIESON et al., 2010; LAGO; CODO, 2010). Perceber o que nos faz bem e buscar reservar momentos para isso é fundamental. Não há uma formula única de atividades para atingir qualidade de vida, cada pessoa tem que buscar o que lhe faz bem. Algumas pessoas se revigoram fazendo atividades físicas, outras não sentem prazer nisso. Algumas pessoas se sentem bem ouvindo música, assistindo filmes, lendo livros e para outras isso não tem grande importância. Algumas gostam de atividades manuais (artesanato, costura, desenhar). Muitas se nutrem em momentos sociais (estar com a família, encontrar com amigos). Outras têm a fé como importante recurso. Estas são algumas entre outras tantas possibilidades. É importante aprender a se escutar e se respeitar. Olhar ao redor e construir um senso de equipe entre os colegas, de forma que pedir e oferecer ajuda passem a fazer parte da cultura de trabalho e que exista um ambiente de aprendizado em conjunto. A atualização profissional é um grande redutor de angústias, pois propicia maior confiança no trabalho executado. Referências HUGHES, D. A. Attachment: Focused Family Therapy. Workbook. 2011. JAMIESON, L. et al. The stress of professional caregivers. HANKS, G; CHERNY, N. I.; CHRISTAKIS, N. A.; FALLON, M.; KAASA, S.; PORTENOY, R.K. (ed.). 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Consulte o capítulo “Considerações sobre a proporcionalidade de medidas invasivas de suporte de vida e seus conflitos” para uma abordagem mais prática de como tomar a decisão de paliação. Em 2006, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou a resolução 1.805, que diz: “É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal” (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2006), que equivale, portanto, à permissão de realização da ortotanásia. Em anexo a este capítulo encontra-se a resolução completa. A partir disso, iniciou-se uma discussão a respeito da prática de cuidados paliativos e se, ao entender a morte como processo natural e não intervir para postergá-la, o profissional estaria fazendo algo equivalente à eutanásia1. Em 2007, o Ministério Público ajuizou uma Ação Civil Pública2 em face do CFM, pleiteando o reconhecimento da nulidade dessa resolução, sob justificativa de que: (i) o CFM não poderia reconhecer um crime como conduta ética (considerando que a resolução dizia respeito à eutanásia e não à ortotanásia); (ii) o direito à vida é indisponível e, portanto, só poderia ser restringido por lei (devidament

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